Jim Galluro alcançou a entrada do Banco de Tucson.
Antes de entrar no edifício, voltou a cabeça, para voltar a assegurar-se de que ninguém o observava. Teve, apenas, o tempo necessário para divisar uma sombra que se movimentava nas suas costas. Ainda esboçou o gesto de se virar, para usar o revólver. O vulto moveu-se rapidamente e Jim Galluro recebeu uma pancada na cabeça, junto da orelha. Sem sentidos, deslizou para o chão, largando arma.
O homem que o agredira apressou-se a evitar que o revólver caísse no solo, provocando um ruído que o denunciaria. Habilmente, apanhou a arma no ar, ao mesmo tempo que, com o braço livre, amparava a queda de Jim, a quem colocou suavemente no solo, encostado a uma coluna.
Depois, Juan Rode -- a ele se devia aquela intervenção — entrou no Banco, decididamente, pisando o solo com força e perguntando, em voz alta:
— Está aí alguém? Quem quer que seja não se mova!
Tinha um revólver em cada mão. A claridade que reinava no interior, distinguiu os vultos da filha e de Robert Joyce, defronte do enorme cofre, aberto de par em par.
O jovem voltou-se, velozmente, perguntando:
— Que faz você aqui? Para que são estas armas?
— Passei e vi a porta aberta. Vou levá-lo ao xerife, agora mesmo!
Joyce suspirou, aliviado.
— Receava que... Mas não se preocupe, senhor. Eu sou o banqueiro e isto não é um assalto, como pensa. Vim aqui retirar dinheiro para um pagamento urgente.
Juan Rode, que se mantinha sorridente, irónico, sob o olhar raivoso da filha, replicou, em tom amável:
— E verdade, jovem. Reconheço-o. Ao passar, vi a porta aberta e admiti que houvesse novidade. O dever de todo o cidadão honrado é evitar um roubo... foi uma imprudência da sua parte deixar a porta aberta, de noite. Há sempre a possibilidade de um oportunista se aperceber do facto e entrar, para levar o dinheiro.
Robert Joyce agradeceu-lhe a boa vontade e Juan Rode meteu as armas nos coldres e saiu. Robert fechou imediatamente o cofre, depois de entregar os mil dólares à companheira.
— Foi, realmente, uma imprudência da minha parte — reconheceu. -- Esse homem é um tipo decente. Quando o vi entrar, com os revólveres em punho... tive medo, por ti, Carmen. Mas, por sorte, demos com um homem honrado.
Contendo a fúria que a dominava, a jovem retorquiu:
— Sim, deve ser um homem honrado, Bob...
Saíram do edifício e Robert fechou a porta. Carmen procurou Jim, com o olhar, segura de que o pai o impedira de levar a cabo o assalto planeado... por qualquer dos meios que deviam ser usuais nele. Robert propôs:
— Acompanho-te ao hotel, Carmen, e, se quiseres, iremos juntos procurar o velho, para lhe entregarmos o dinheiro.
Carmen respondeu, quase com aspereza:
— Não é preciso, Bob. Já te causei muitos incómodos e receio que esse velho idiota não saiba bem o que quer. Pensando bem, decidi não fazer caso dele. Na realidade, pergunto a mim própria se terá valido a pena levantar o dinheiro... acredita que estou arrependida de to ter pedido!
Robert estava demasiado enamorado da jovem para se zangar por tão pouco. Assim, não se sentiu molestado com as suas palavras nem com o tom em que foram pronunciadas.
Acompanhou-a até ao hotel e, embora Carmen estivesse desejosa de se ver só, entreteve-a numa longa despedida. Por fim, a jovem pôde subir ao quarto. Antes de abrir a porta, viu que havia luz no interior, pela frincha, junto do chão. Com as feições endurecidas, entrou.
Juan Rode estava de pé, junto da cama, em cima da qual se encontrava Jim Galluro.
— Estávamos à tua espera, Carmen — disse Juan. — Correste com o rapaz do Banco?
— Que remédio! — respondeu a jovem, agressivamente. — Graças a ti, perdemos uma oportunidade magnífica. Que fizeste a Jim? Que lhe fizeste?!
Foi o próprio Jim quem lhe respondeu:
— Atacou-me pelas costas, quando eu ia a entrar no Banco! Que quer você, Tom? Qual é a sua ideia? Porque não nos deixou completar o «trabalho»? Não me parece leal proceder assim, para com a sua filha...
Receoso, perguntou a Carmen:
— Ele adiantou-se-nos? Deitou a mão ao «nosso» dinheiro?
Com desprezo, a jovem respondeu:
— Não sejas parvo... Ele quer, apenas, proteger-me. A um cavalheiro, virtuoso, a quem a ideia de a filha cometer um roubo horroriza!... Tom «El Toro»! O bandido que matou e roubou, em todo o Texas, transformado em moralista!
Juan Rode sorria, tranquilo.
— Não só não quero que roubes, Carmen, como não te quero convertida numa assassina. Esse Robert Joyce é um bom rapaz, que não merece ser enganado e assassinado por uma rapariga tão bonita como tu...
— Vai para o diabo! Ninguém o ia assassinar. Ter-nos-íamos limitado a encerrá-lo num quarto e, a estas horas, estaríamos longe de Tucson, com todo o dinheiro do cofre! — protestou Carmen.
— Achas que Jim se limitaria a isso? — troçou Juan. — Foi ele quem te disse?
— Claro que sim! Não vês que ele nem sequer ia armado?
Juan abriu bruscamente o casaco de Jim, deixando à mostra o coldre vazio. Depois, atirou para cima da cama o revólver de calibre trinta e oito que recolhera, à entrada do Banco.
— És uma parva! Um Galluro nunca deixa testemunhas, nem permite que ninguém o persiga, se o puder evitar. Ele ia assassinar esse jovem, sabendo que seria demasiado perigoso deixá-lo vivo e que, matando-o, tinha muitas possibilidades de escapar. Não é verdade, Jim?...
Jim recolheu o revólver, que apontou para Juan.
— Começo a estar farto de você, Tom! — rosnou. — Embora seja o pai de Carmen, não vou permitir que...
Juan Rode abriu a mão direita, mostrando um punhado de munições.
— Não sejas imbecil, rapaz! Essa arma está descarregada. Se queres que desapareça da tua vida, deixa a minha filha em paz! Enquanto ela for tão tola que aceite a tua companhia, estarei perto de ti. Não te esqueças...
Carmen afastou-se, para dar caminho ao pai, que se dirigia para a porta. Juan Rode sorriu aos dois jovens, antes de sair, acrescentando:
— E será melhor que não pensem no banqueiro! Passarei a vigiar-te bem, Galluro...
O homem que entrou na taberna era forte, um pouco gordo, até. Completamente calvo, a sua cabeça brilhava como se estivesse envernizada. Vestia uma velha samarra descolorida e usava dois revólveres, grandes e brilhantes, em coldres presos às coxas.
Depois de olhar para todos os lados, o desconhecido aproximou-se do balcão e trocou algumas palavras com o taberneiro, que lhe apontou uma mesa. Ao dirigir-se para lá, o recém-chegado observou o homem que ali se encontrava, de cotovelos apoiados no tampo da mesa.
— Você queria ver-me? — perguntou.
— Se você se chama Roger Modol, sim, quero falar consigo. Sente-se.
O desconhecido não se mexeu, dizendo, em tom receoso:
— Você sabe quem eu sou..., mas eu não sei quem você é.
— Chamo-me Jim Galluro.
Roger Modol sentou-se logo, comentando, secamente:
— Conheço o seu irmão. Que é feito dele? Já o enforcaram?
Jim fez um gesto de impaciência.
— Nada sei do meu irmão, há muito tempo. Mas não o mandei chamar para lhe falar dele.
— Com certeza. E o seu irmão não me interessa para nada. A sua cabeça não está a prémio e eu só me interesso por tipos importantes. Diga o que tem para dizer.
Jim Galluro olhou para Modol com certo respeito.
— Tenho a certeza de que este lhe interessará. Veja...
Retirou um papel do bolso e entregou-o ao interlocutor. Este grunhiu:
— Tenho um papel igual a este, na minha coleção. Que há com este homem?
— Diz-se que oferecem por ele a maior recompensa até hoje firmada, no Texas e no Arizona.
— É verdade. E depois?
Jim Galluro passou a língua pelos lábios ressequidos, antes de responder:
— Pode ser para si, Modol. Você tem fama de apanhar as maiores recompensas... Eu posso pôr-lhe nas mãos esse homem, Tom «El Toro». Está em Tucson.
Modol arregalou os olhos.
— Em Tucson?! Não tenho conhecimento de nenhum assalto importante, praticado aqui...
—Pois, temo-lo cá. A descansar, ou algo no género.
— Tem a certeza?
— Absoluta.
Roger Modol amarrotou o papel entre as mãos.
— O que ganha você com isto, Galluro? Deitar a mão a Tom «El Toro» é tarefa difícil. Muitos o tentaram e... Ele nunca esteve preso, sequer. Há muitas cidades do Texas em que seria determinado dia oficial de festejo, no dia em que enforcassem Tom «El Toro», mas...
Jim Galluro baixou a voz, até a converter num murmúrio:
— Senhor Modol, eu posso entregar-lho, pouco menos que atado de pés e mãos. Contacto com ele, com alguma frequência. Posso levá-lo aonde você disser e o resto é por sua conta...
Modol sorriu com desprezo.
— Entendo. Você quer dizer que pode atraiçoá-lo, vendê-lo. Por quanto?
Galluro respondeu, sem se ofender:
— Quero uma terça parte da recompensa. Creio que é justo. Por que não bebemos uma cerveja e falamos sobre este assunto?
Roger Modol replicou:
— A quarta parte, jovem. E só se você me for de alguma utilidade, realmente.
Jim Galluro suspirou. Interessava-lhe muito parte da recompensa oferecida pela captura de Tom «El Toro», mas, mais do que isso, queria ver-se livre do pai de Carmen. Jim estava verdadeiramente enamorado da jovem e sabia que jamais se poderia casar com ela, enquanto Juan Rode vivesse.
— Aceito a quarta parte, Modol — decidiu-se.
Roger Modol voltou-se e pediu a cerveja.
Jim estava recostado na porta fechada do quarto de Carmen. A jovem, olhando para a rua, pela janela, disse, de mau humor.
— Ali está ele, como sempre. Não cessa de nos vigiar. Que havemos de fazer, Jim?
Galluro respondeu:
— Em Tucson, nada. Tivemos um «trabalho» a realizar, aqui, e ele estragou tudo, como viste. Acabou por ser mal empregado todo o tempo que perdemos com o palerme do banqueiro. E, vá lá, ainda recuperámos os mil dólares... Agora, temos de sair de Tucson, quanto antes.
Carmen comentou, com desespero:
— Ele irá atrás de nós!
Jim Galluro sorriu, matreiro:
— Bem, não há dúvida de que o teu pai é um homem esperto, mas nós também não somos parvos... pensei em tudo, Carmen. No fim desta rua, há um estábulo, com duas saídas. Aposto que o teu pai não o sabe!
— E que ganhamos com isso?
— Vamos deixar aqui os nossos cavalos. Ficar sem eles, para nos vermos livres do teu pai... é um bom preço! Iremos até ao estábulo, como quem passeia. Como é natural, ele ficará cá fora, a vigiar-nos, aguardando a nossa saída. Mas nós fugiremos pela outra, em cavalos que compramos lá.
Carmen concordou:
— Parece-me boa ideia. Quando a poremos em prática ?
— Quando anoitecer. A pouca luz facilitar-nos-á a fuga.
Aproximou-se da janela e olhou para Juan Rode, no exterior. O pai de Carmen passeava, de um lado para o outro, sem deixar de observar o hotel.
— Repara — disse Galluro. — Não deixa de nos vigiar, por um só momento!
Com um sorriso maligno, pensou: «Mal sabes o que te espera, Tom! Roger Modol é um tigre, quando está em jogo uma boa recompensa!» Foi até ao «saloon» do hotel e ali esteve, bebendo e jogando uma partida de cartas, de apostas baixas, com alguns clientes. De vez em quando, Juan Rode entrava no hotel...
As oito horas, Jim subiu ao quarto de Carmen, para a ir buscar. Desceram, de braço dado. Sorrindo, contente, Carmen comentou:
— Como vai ser divertido enganá-lo, a ele, sempre tão seguro de si próprio! Só lamento uma coisa, Jim...
— O quê ?
— Não me despedir de Robert Joyce. Foi muito bom rapaz, para além de tudo.
— Ao diabo com ele! A que vem essa conversa ?
Quando chegaram ao estábulo, Jim procurou Roger Modol. Avistou-o, quase no mesmo instante. Estava recostado num dos pilares de madeira que sustinham o alpendre. Com o chapéu descaído para os olhos, fumava, com ar indiferente.
Ele e Jim trocaram um breve olhar de inteligência, antes de o último entrar no estábulo, na companhia de Carmen. Imóvel, Model aguardou. Pouco teve de esperar.
— É verdade! — murmurou, admirado. — E Tom «El Toro» quem aí vem!
Atirou a ponta do cigarro para o chão e pisou-a. Juan Rode avançava pela rua, com passo vivo. Ao chegar junto da porta do estábulo, parou, com um sorriso nos lábios. «São uns ingénuos...», pensou. «Sei muito bem que o estábulo tem outra saída». Ia a entrar no estábulo quando Roger Modol interveio, depois de se ter aproximado, silenciosamente, com cuidados que lhe tinham valido inúmeros êxitos . Em voz baixa, mas ríspida e incisiva, ordenou:
— Quieto, Tom! Estás sob a mira do meu revólver. Será melhor que não faças qualquer movimento estranho, porque eu não sou um curioso. O meu nome é Modol e sei bem o que faço. Já deves ter ouvido falar de mim... Se tentares tocar nas armas, mato-te! Vales o mesmo, morto ou vivo... com a diferença de que, sem vida, não darás tanto trabalho. Assim, garanto-te que só estou à espera de que dês um pretexto para te crivar de chumbo.
Juan não esboçou qualquer reação. Conhecia, de facto, a fama de Modol...
— Que faz você aqui? — perguntou. — Isto não é o Texas, você bem sabe. Neste território...
Roger interrompeu-o:
— Aqui, Tom «El Toro» não vale nada, mas no Texas representa uma boa maquia e eu vou levá-lo a El Paso, onde me pagarão a recompensa.
Aproximou-se mais de Juan, para lhe tirar as armas. O foragido não se moveu, sabendo que seria inútil tentar surpreender Modol, numa situação como aquela.
— É uma grande viagem... — comentou. — Acha que conseguiremos ir tão longe ?
Modol adiantou a mão esquerda, tirando-lhe o revólver daquele lado. Depois, com a mesma precisão de gestos, recolheu o da direita. Entretanto, tinham-se aproximado alguns curiosos. Ninguém fez qualquer pergunta. Um deles murmurou:
— Modol... Apanhou outra «peça de caça», ao que parece.
Juan continuava a olhar para o estábulo. Jim Galluro, incapaz de resistir à tentação de ver o que se passava, deixou Carmen no outro extremo do estabelecimento, e aproximou-se da porta por onde entrara.
— Parece-me que o grande Tom se encontra em apuros!... — murmurou.
Juan Rode sorriu-lhe, cansado.
— És um jovem cheio de recursos... Quanto vais receber, de recompensa?
Galluro respondeu, cinicamente:
— Muito pouco, mas resta-me a satisfação de o saber arrumado.
— Fraca consolação...
Galluro prosseguiu:
— E a certeza de que não voltará a dar-me cabo dos negócios!
Modol já guardara as armas tiradas ao famoso bandido. Agarrou nas algemas de aço que sempre levava, presas ao cinturão, e ordenou a Juan:
— Volte-se, mas com cuidado. Não se esqueça de que vale tanto morto como vivo.
Juan voltou-se para ele, devagar, e sorriu, trocista, ao ver as algemas que Modol segurava com a mão esquerda.
— Você não deixa escapar um único pormenor — comentou. —. Por que é que os tipos como você não se fazem policias, de uma vez?...
— Porque os policias ganham pouco e nós, os caçadores de recompensas, ganhamos muito. Estenda as mãos e junte-as. E não se esqueça...
— Já sei, já sei... Prefere levar-me morto. Descanse que tenho boa memória. Aqui tem as minhas mãos. Não lhe proporcionarei a satisfação de me dar um tiro... De resto, falta muito para chegarmos ao Texas e nunca se sabe o que pode acontecer!
Estendeu os braços, oferecendo os pulsos juntos. Modol adiantou as algemas, abertas. A prática permitia-lhe manejá-las perfeitamente com uma das mãos.
— Alegro-me de ver que é prudente, Tom — observou, com um sorriso. — Pessoalmente, nada tenho contra si. E, agora...
Antes de entrar no edifício, voltou a cabeça, para voltar a assegurar-se de que ninguém o observava. Teve, apenas, o tempo necessário para divisar uma sombra que se movimentava nas suas costas. Ainda esboçou o gesto de se virar, para usar o revólver. O vulto moveu-se rapidamente e Jim Galluro recebeu uma pancada na cabeça, junto da orelha. Sem sentidos, deslizou para o chão, largando arma.
O homem que o agredira apressou-se a evitar que o revólver caísse no solo, provocando um ruído que o denunciaria. Habilmente, apanhou a arma no ar, ao mesmo tempo que, com o braço livre, amparava a queda de Jim, a quem colocou suavemente no solo, encostado a uma coluna.
Depois, Juan Rode -- a ele se devia aquela intervenção — entrou no Banco, decididamente, pisando o solo com força e perguntando, em voz alta:
— Está aí alguém? Quem quer que seja não se mova!
Tinha um revólver em cada mão. A claridade que reinava no interior, distinguiu os vultos da filha e de Robert Joyce, defronte do enorme cofre, aberto de par em par.
O jovem voltou-se, velozmente, perguntando:
— Que faz você aqui? Para que são estas armas?
— Passei e vi a porta aberta. Vou levá-lo ao xerife, agora mesmo!
Joyce suspirou, aliviado.
— Receava que... Mas não se preocupe, senhor. Eu sou o banqueiro e isto não é um assalto, como pensa. Vim aqui retirar dinheiro para um pagamento urgente.
Juan Rode, que se mantinha sorridente, irónico, sob o olhar raivoso da filha, replicou, em tom amável:
— E verdade, jovem. Reconheço-o. Ao passar, vi a porta aberta e admiti que houvesse novidade. O dever de todo o cidadão honrado é evitar um roubo... foi uma imprudência da sua parte deixar a porta aberta, de noite. Há sempre a possibilidade de um oportunista se aperceber do facto e entrar, para levar o dinheiro.
Robert Joyce agradeceu-lhe a boa vontade e Juan Rode meteu as armas nos coldres e saiu. Robert fechou imediatamente o cofre, depois de entregar os mil dólares à companheira.
— Foi, realmente, uma imprudência da minha parte — reconheceu. -- Esse homem é um tipo decente. Quando o vi entrar, com os revólveres em punho... tive medo, por ti, Carmen. Mas, por sorte, demos com um homem honrado.
Contendo a fúria que a dominava, a jovem retorquiu:
— Sim, deve ser um homem honrado, Bob...
Saíram do edifício e Robert fechou a porta. Carmen procurou Jim, com o olhar, segura de que o pai o impedira de levar a cabo o assalto planeado... por qualquer dos meios que deviam ser usuais nele. Robert propôs:
— Acompanho-te ao hotel, Carmen, e, se quiseres, iremos juntos procurar o velho, para lhe entregarmos o dinheiro.
Carmen respondeu, quase com aspereza:
— Não é preciso, Bob. Já te causei muitos incómodos e receio que esse velho idiota não saiba bem o que quer. Pensando bem, decidi não fazer caso dele. Na realidade, pergunto a mim própria se terá valido a pena levantar o dinheiro... acredita que estou arrependida de to ter pedido!
Robert estava demasiado enamorado da jovem para se zangar por tão pouco. Assim, não se sentiu molestado com as suas palavras nem com o tom em que foram pronunciadas.
Acompanhou-a até ao hotel e, embora Carmen estivesse desejosa de se ver só, entreteve-a numa longa despedida. Por fim, a jovem pôde subir ao quarto. Antes de abrir a porta, viu que havia luz no interior, pela frincha, junto do chão. Com as feições endurecidas, entrou.
Juan Rode estava de pé, junto da cama, em cima da qual se encontrava Jim Galluro.
— Estávamos à tua espera, Carmen — disse Juan. — Correste com o rapaz do Banco?
— Que remédio! — respondeu a jovem, agressivamente. — Graças a ti, perdemos uma oportunidade magnífica. Que fizeste a Jim? Que lhe fizeste?!
Foi o próprio Jim quem lhe respondeu:
— Atacou-me pelas costas, quando eu ia a entrar no Banco! Que quer você, Tom? Qual é a sua ideia? Porque não nos deixou completar o «trabalho»? Não me parece leal proceder assim, para com a sua filha...
Receoso, perguntou a Carmen:
— Ele adiantou-se-nos? Deitou a mão ao «nosso» dinheiro?
Com desprezo, a jovem respondeu:
— Não sejas parvo... Ele quer, apenas, proteger-me. A um cavalheiro, virtuoso, a quem a ideia de a filha cometer um roubo horroriza!... Tom «El Toro»! O bandido que matou e roubou, em todo o Texas, transformado em moralista!
Juan Rode sorria, tranquilo.
— Não só não quero que roubes, Carmen, como não te quero convertida numa assassina. Esse Robert Joyce é um bom rapaz, que não merece ser enganado e assassinado por uma rapariga tão bonita como tu...
— Vai para o diabo! Ninguém o ia assassinar. Ter-nos-íamos limitado a encerrá-lo num quarto e, a estas horas, estaríamos longe de Tucson, com todo o dinheiro do cofre! — protestou Carmen.
— Achas que Jim se limitaria a isso? — troçou Juan. — Foi ele quem te disse?
— Claro que sim! Não vês que ele nem sequer ia armado?
Juan abriu bruscamente o casaco de Jim, deixando à mostra o coldre vazio. Depois, atirou para cima da cama o revólver de calibre trinta e oito que recolhera, à entrada do Banco.
— És uma parva! Um Galluro nunca deixa testemunhas, nem permite que ninguém o persiga, se o puder evitar. Ele ia assassinar esse jovem, sabendo que seria demasiado perigoso deixá-lo vivo e que, matando-o, tinha muitas possibilidades de escapar. Não é verdade, Jim?...
Jim recolheu o revólver, que apontou para Juan.
— Começo a estar farto de você, Tom! — rosnou. — Embora seja o pai de Carmen, não vou permitir que...
Juan Rode abriu a mão direita, mostrando um punhado de munições.
— Não sejas imbecil, rapaz! Essa arma está descarregada. Se queres que desapareça da tua vida, deixa a minha filha em paz! Enquanto ela for tão tola que aceite a tua companhia, estarei perto de ti. Não te esqueças...
Carmen afastou-se, para dar caminho ao pai, que se dirigia para a porta. Juan Rode sorriu aos dois jovens, antes de sair, acrescentando:
— E será melhor que não pensem no banqueiro! Passarei a vigiar-te bem, Galluro...
O homem que entrou na taberna era forte, um pouco gordo, até. Completamente calvo, a sua cabeça brilhava como se estivesse envernizada. Vestia uma velha samarra descolorida e usava dois revólveres, grandes e brilhantes, em coldres presos às coxas.
Depois de olhar para todos os lados, o desconhecido aproximou-se do balcão e trocou algumas palavras com o taberneiro, que lhe apontou uma mesa. Ao dirigir-se para lá, o recém-chegado observou o homem que ali se encontrava, de cotovelos apoiados no tampo da mesa.
— Você queria ver-me? — perguntou.
— Se você se chama Roger Modol, sim, quero falar consigo. Sente-se.
O desconhecido não se mexeu, dizendo, em tom receoso:
— Você sabe quem eu sou..., mas eu não sei quem você é.
— Chamo-me Jim Galluro.
Roger Modol sentou-se logo, comentando, secamente:
— Conheço o seu irmão. Que é feito dele? Já o enforcaram?
Jim fez um gesto de impaciência.
— Nada sei do meu irmão, há muito tempo. Mas não o mandei chamar para lhe falar dele.
— Com certeza. E o seu irmão não me interessa para nada. A sua cabeça não está a prémio e eu só me interesso por tipos importantes. Diga o que tem para dizer.
Jim Galluro olhou para Modol com certo respeito.
— Tenho a certeza de que este lhe interessará. Veja...
Retirou um papel do bolso e entregou-o ao interlocutor. Este grunhiu:
— Tenho um papel igual a este, na minha coleção. Que há com este homem?
— Diz-se que oferecem por ele a maior recompensa até hoje firmada, no Texas e no Arizona.
— É verdade. E depois?
Jim Galluro passou a língua pelos lábios ressequidos, antes de responder:
— Pode ser para si, Modol. Você tem fama de apanhar as maiores recompensas... Eu posso pôr-lhe nas mãos esse homem, Tom «El Toro». Está em Tucson.
Modol arregalou os olhos.
— Em Tucson?! Não tenho conhecimento de nenhum assalto importante, praticado aqui...
—Pois, temo-lo cá. A descansar, ou algo no género.
— Tem a certeza?
— Absoluta.
Roger Modol amarrotou o papel entre as mãos.
— O que ganha você com isto, Galluro? Deitar a mão a Tom «El Toro» é tarefa difícil. Muitos o tentaram e... Ele nunca esteve preso, sequer. Há muitas cidades do Texas em que seria determinado dia oficial de festejo, no dia em que enforcassem Tom «El Toro», mas...
Jim Galluro baixou a voz, até a converter num murmúrio:
— Senhor Modol, eu posso entregar-lho, pouco menos que atado de pés e mãos. Contacto com ele, com alguma frequência. Posso levá-lo aonde você disser e o resto é por sua conta...
Modol sorriu com desprezo.
— Entendo. Você quer dizer que pode atraiçoá-lo, vendê-lo. Por quanto?
Galluro respondeu, sem se ofender:
— Quero uma terça parte da recompensa. Creio que é justo. Por que não bebemos uma cerveja e falamos sobre este assunto?
Roger Modol replicou:
— A quarta parte, jovem. E só se você me for de alguma utilidade, realmente.
Jim Galluro suspirou. Interessava-lhe muito parte da recompensa oferecida pela captura de Tom «El Toro», mas, mais do que isso, queria ver-se livre do pai de Carmen. Jim estava verdadeiramente enamorado da jovem e sabia que jamais se poderia casar com ela, enquanto Juan Rode vivesse.
— Aceito a quarta parte, Modol — decidiu-se.
Roger Modol voltou-se e pediu a cerveja.
Jim estava recostado na porta fechada do quarto de Carmen. A jovem, olhando para a rua, pela janela, disse, de mau humor.
— Ali está ele, como sempre. Não cessa de nos vigiar. Que havemos de fazer, Jim?
Galluro respondeu:
— Em Tucson, nada. Tivemos um «trabalho» a realizar, aqui, e ele estragou tudo, como viste. Acabou por ser mal empregado todo o tempo que perdemos com o palerme do banqueiro. E, vá lá, ainda recuperámos os mil dólares... Agora, temos de sair de Tucson, quanto antes.
Carmen comentou, com desespero:
— Ele irá atrás de nós!
Jim Galluro sorriu, matreiro:
— Bem, não há dúvida de que o teu pai é um homem esperto, mas nós também não somos parvos... pensei em tudo, Carmen. No fim desta rua, há um estábulo, com duas saídas. Aposto que o teu pai não o sabe!
— E que ganhamos com isso?
— Vamos deixar aqui os nossos cavalos. Ficar sem eles, para nos vermos livres do teu pai... é um bom preço! Iremos até ao estábulo, como quem passeia. Como é natural, ele ficará cá fora, a vigiar-nos, aguardando a nossa saída. Mas nós fugiremos pela outra, em cavalos que compramos lá.
Carmen concordou:
— Parece-me boa ideia. Quando a poremos em prática ?
— Quando anoitecer. A pouca luz facilitar-nos-á a fuga.
Aproximou-se da janela e olhou para Juan Rode, no exterior. O pai de Carmen passeava, de um lado para o outro, sem deixar de observar o hotel.
— Repara — disse Galluro. — Não deixa de nos vigiar, por um só momento!
Com um sorriso maligno, pensou: «Mal sabes o que te espera, Tom! Roger Modol é um tigre, quando está em jogo uma boa recompensa!» Foi até ao «saloon» do hotel e ali esteve, bebendo e jogando uma partida de cartas, de apostas baixas, com alguns clientes. De vez em quando, Juan Rode entrava no hotel...
As oito horas, Jim subiu ao quarto de Carmen, para a ir buscar. Desceram, de braço dado. Sorrindo, contente, Carmen comentou:
— Como vai ser divertido enganá-lo, a ele, sempre tão seguro de si próprio! Só lamento uma coisa, Jim...
— O quê ?
— Não me despedir de Robert Joyce. Foi muito bom rapaz, para além de tudo.
— Ao diabo com ele! A que vem essa conversa ?
Quando chegaram ao estábulo, Jim procurou Roger Modol. Avistou-o, quase no mesmo instante. Estava recostado num dos pilares de madeira que sustinham o alpendre. Com o chapéu descaído para os olhos, fumava, com ar indiferente.
Ele e Jim trocaram um breve olhar de inteligência, antes de o último entrar no estábulo, na companhia de Carmen. Imóvel, Model aguardou. Pouco teve de esperar.
— É verdade! — murmurou, admirado. — E Tom «El Toro» quem aí vem!
Atirou a ponta do cigarro para o chão e pisou-a. Juan Rode avançava pela rua, com passo vivo. Ao chegar junto da porta do estábulo, parou, com um sorriso nos lábios. «São uns ingénuos...», pensou. «Sei muito bem que o estábulo tem outra saída». Ia a entrar no estábulo quando Roger Modol interveio, depois de se ter aproximado, silenciosamente, com cuidados que lhe tinham valido inúmeros êxitos . Em voz baixa, mas ríspida e incisiva, ordenou:
— Quieto, Tom! Estás sob a mira do meu revólver. Será melhor que não faças qualquer movimento estranho, porque eu não sou um curioso. O meu nome é Modol e sei bem o que faço. Já deves ter ouvido falar de mim... Se tentares tocar nas armas, mato-te! Vales o mesmo, morto ou vivo... com a diferença de que, sem vida, não darás tanto trabalho. Assim, garanto-te que só estou à espera de que dês um pretexto para te crivar de chumbo.
Juan não esboçou qualquer reação. Conhecia, de facto, a fama de Modol...
— Que faz você aqui? — perguntou. — Isto não é o Texas, você bem sabe. Neste território...
Roger interrompeu-o:
— Aqui, Tom «El Toro» não vale nada, mas no Texas representa uma boa maquia e eu vou levá-lo a El Paso, onde me pagarão a recompensa.
Aproximou-se mais de Juan, para lhe tirar as armas. O foragido não se moveu, sabendo que seria inútil tentar surpreender Modol, numa situação como aquela.
— É uma grande viagem... — comentou. — Acha que conseguiremos ir tão longe ?
Modol adiantou a mão esquerda, tirando-lhe o revólver daquele lado. Depois, com a mesma precisão de gestos, recolheu o da direita. Entretanto, tinham-se aproximado alguns curiosos. Ninguém fez qualquer pergunta. Um deles murmurou:
— Modol... Apanhou outra «peça de caça», ao que parece.
Juan continuava a olhar para o estábulo. Jim Galluro, incapaz de resistir à tentação de ver o que se passava, deixou Carmen no outro extremo do estabelecimento, e aproximou-se da porta por onde entrara.
— Parece-me que o grande Tom se encontra em apuros!... — murmurou.
Juan Rode sorriu-lhe, cansado.
— És um jovem cheio de recursos... Quanto vais receber, de recompensa?
Galluro respondeu, cinicamente:
— Muito pouco, mas resta-me a satisfação de o saber arrumado.
— Fraca consolação...
Galluro prosseguiu:
— E a certeza de que não voltará a dar-me cabo dos negócios!
Modol já guardara as armas tiradas ao famoso bandido. Agarrou nas algemas de aço que sempre levava, presas ao cinturão, e ordenou a Juan:
— Volte-se, mas com cuidado. Não se esqueça de que vale tanto morto como vivo.
Juan voltou-se para ele, devagar, e sorriu, trocista, ao ver as algemas que Modol segurava com a mão esquerda.
— Você não deixa escapar um único pormenor — comentou. —. Por que é que os tipos como você não se fazem policias, de uma vez?...
— Porque os policias ganham pouco e nós, os caçadores de recompensas, ganhamos muito. Estenda as mãos e junte-as. E não se esqueça...
— Já sei, já sei... Prefere levar-me morto. Descanse que tenho boa memória. Aqui tem as minhas mãos. Não lhe proporcionarei a satisfação de me dar um tiro... De resto, falta muito para chegarmos ao Texas e nunca se sabe o que pode acontecer!
Estendeu os braços, oferecendo os pulsos juntos. Modol adiantou as algemas, abertas. A prática permitia-lhe manejá-las perfeitamente com uma das mãos.
— Alegro-me de ver que é prudente, Tom — observou, com um sorriso. — Pessoalmente, nada tenho contra si. E, agora...
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