segunda-feira, 31 de agosto de 2015

CLT050. O maldito Ianque

 
(Coleção Colt, nº 50)
 

Este livro baseia-se num facto passado durante a Guerra da Secessão, em que um coronel do exército Sulista contatou com um prisioneiro nortista, médico de formação, que foi enviado para um campo de concentração de prisioneiros em momento em que não abandonou um camarada de armas ferido. O oficial ficou impressionado com a dedicação do prisioneiro e, após a guerra, acabou por lhe oferecer condições para se instalar na sua terra, financiando um hospital para acesso em termos igualitários.

Assim, um dia, Mark Keeping chegou ao Sul para pôr em prática os desejos do oficial, sendo que um deles passava por despojar a sua bela filha. A presença de um ianque naquela região, passados, três anos sobre o conflito, não foi bem vista e, como é de calcular, algumas dificuldades surgiram ao brioso médico.

Este livro de Tex Taylor tem alguma graça, mas a edição terá sido muito descuidada por falta de revisão ou má tradução. Por exemplo, o autor começa a narrativa na terceira pessoa, poucas páginas à frente apresenta algumas linhas na primeira pessoa e depois volta ao tipo de discurso inicial. Passagens há que não se percebem por puro descuido ou falta de palavras…

Quanta à capa já mostrava uma evidente falta de qualidade que nesta altura se apoderou destes livros.


quarta-feira, 26 de agosto de 2015

CLT045. Fumo de pólvora

 
(Coleção Colt, nº 45)
 
Um homem atravessa o Arizona, com o objetivo de fugir para o México. Trata-se de Jim Mc Coy acusado de ter abatido vários homens e de ter assaltado os caminhos de ferro, levando consigo 50000 dólares. Durante a viagem é abordado por um agente dos rurais que lhe promete um indulto caso colabore com aquele corpo de polícia na resolução de um caso na fronteira.
Mc Coy aceita e a sua fama que lhe abre a porta no mundo dos bandidos acaba por o conduzir à regeneração.
Este é um livro de Tex Taylor muito interessante. A tradução, de Raul Correia, é cuidada e deixa apreciar toda uma série de bons momentos. A capa já evidencia enorme falta de qualidade.

domingo, 23 de agosto de 2015

PAS523. Uma mulher no combate decisivo

Puxou o chapéu para os olhos a fim de os proteger. Sentia que o sangue lhe corria pelo corpo até à cintura, mas mal lhe prestou atenção. Enquanto carregava os revólveres, as suas pupilas olhavam tudo em volta, sem que pudesse ver nada. E de repente, a voz de Eula soou em baixo, no saloon, cheia de angústia.
— Deixem-me sair. Sou uma mulher e estou desarmada. Deixem-me sair. Não quero que me matem aqui dentro.
Uma voz disse:
— De acordo, preciosa. Sai com as mãos levantadas e afasta-te o mais possível do comissário. É um tipo que traz azar.
Poucos segundos depois, Rurt viu a frágil figura de Eula correr rua abaixo, ao que parecia, muito assustada. Ao fim e ao cabo, pensou, Eula Jones sempre tinha pensado muito no futuro do seu filho. Podia reprovar-lhe alguma coisa?
Manteve-se imóvel, esperando que algum dos seus inimigos se denunciasse. Decorreram vários minutos de tensa espera. E de repente, um rifle troou em frente de Rurt, um grito de dor encheu a rua enquanto um, homem caía detrás de uma chaminé com as mãos no peito. Durante uns momentos lutou por manter o equilíbrio e acabou por resvalar pelo telhado e cair sobre o pó da calçada. Ao mesmo tempo, a voz inconfundível de Eula, gritou:
— Levantem os braços. Tenho-lhes apontada a arma aos três!
Rurt sentiu que o céu se lhe abria. Compreendeu a magistral jogada da jovem, rogando que a deixassem sair do saloon, foi buscar a sua «Winchester» e ajudá-lo. E qualquer coisa dentro do seu peito começou a bater com força, repercutindo-se na ferida do ombro.
Três homens levantaram-se juntos, no terraço de um edifício que ficava à sua esquerda. Levavam as mãos bem levantadas sobre a cabeça. Sem deixar-se ver, Rurt perguntou:
— Fica mais algum de vocês?
— Não — respondeu um deles.
— Não há mais nenhum — disse Bula. Desça tranquilo, Rurt.
Fazendo um esforço — porque a ferida começava a doer-lhe de verdade —Rurt desceu do telhado e entrou no saloon. Lottie continuava no mesmo canto, mas empunhava um revólver «45». Ao vê-lo, deitou a arma para cima da mesa e correu para ele. –
— Rurt, tens a camisa cheia de sangue.
— Não tem importância.
Eula entrava de rifle em riste, com os três foragidos na sua frente. Acudia gente de todos os lados, ávidos de saberem em primeiro lugar o que se tinha passado. Em escassos minutos o saloon encheu-se de pessoas. Um dos clientes prontificou-se a ir meter nas celas os três ban-didos, e a ajudarem-no. Rurt entregou-lhes as chaves, consciente da honradez daqueles homens. Todos tinham cara de satisfação, e o alcaide Lionel Holman abriu caminho à cotovelada até ficar junto de Rurt.
— Felicito-o, comissário.
Estendia-lhe a mão com o mais hipócrita sorriso, o texano limitou-se a olhá-lo. Depois tirou do bolso a sua credencial de agente dos rurais, e colocou-lha debaixo do nariz.
— Pedi-lhe ajuda como autoridade de Hill City, e você negou-ma, Holman. Darei conta na minha informação da sua atitude, porque você tinha obrigação de fazer o que estivesse à sua mão para ajudar um xerife interino, ainda que o seu passado não fosse muito limpo.
Holman primeiro ficou branco e depois corou, e acabou por ficar verde-garrafa. Com um gesto brusco, deu meia volta e seguiu, dando empurrões a toda a gente.
Rurt viu-o partir e sorriu. Dentro de pouco tempo haveria outro alcaide em Hill City. Sentiu que alguém lhe pegava no braço, e viu muito próximo o rosto de Lottie.
— Vem. Vou tratar-te desse ombro.
Quase como em sonhos deixou-se levar até à alcova, sem mais mobiliário que uma cama, uma mesinha e um pequeno maple forrado de veludo azul. Docilmente estendeu-se sobre a cama e deixou que o tratassem. Depois, Lottie inclinou-se e beijou-o na testa. Aquele beijo teve o carácter de uma despedida.
— Eula quer falar-te. Está esperando no corredor.
—Diz-lhe que entre, por favor.
Eula, mal entrou, correu, e arrojou-se nos braços do jovem, soluçando.
— Perdoa-me. Lottie contou-me que não quiseste receber o dinheiro de Hereford. Julguei-te mal, Rurt !
Com um sorriso, Rurt manteve-a apertada contra si, enquanto olhava por cima do ombro da jovem. No umbral da porta, Lottie sorriu-lhe também, ainda que tivesse os olhos cheios de lágrimas. Depois fechou a porta e deixou-os sós.
— Lottie é uma grande rapariga, apesar de tudo — disse Rurt com suavidade.
Eula levantou o rosto e olhou-o. E não havia no seu olhar outra coisa senão gratidão e amor.
— Sim. Rurt. Eternamente lhe estarei agradecida por ter-me aberto os olhos: Fui uma estúpida.
— Foste só uma mulher que lutava contra todos — disse ele gravemente. — Mas tudo isso já acabou. Levar-te-ei comigo para o Texas e começaremos ali uma nova vida. E senão queres renunciar às tuas terras, serei eu que renunciarei à minha profissão e estabeleço-me aqui.
— Não, não. Quero partir daqui para fora, para longe onde nada me lembre o passado. Mas tão-pouco desejo vender o rancho. Pensei... se não vês inconveniente... pensei que o podíamos oferecer a Lottie por tudo o que fez por ti.
Rurt sentiu-se emocionado.
— Sim, oferecemo-lo a Lottie. Espero cobrar uma boa recompensa pelo assunto de Hereford e com isso compraremos novas terras no Texas. Lottie no fundo é boa rapariga, e ainda pode ser feliz. Poderá deixar este antro e não se rebaixar a nenhuma humilhação para viver — olhou-a nos olhos intensamente. — Eula. Nunca te disse que te amo com toda a minha alma?
— Com palavras, não. Mas os teus olhos disseram-mo muitas vezes; E sabes uma coisa? Também eu te amo com toda a minha alma.
Pela primeira vez os seus lábios uniram-se num beijo. Mas os dois sabiam que não seria o último, porque diante deles abria-se um horizonte ilimitado de felicidade.
É que, como dizia Lottie em certa ocasião os «homens maus» podem não ser tão maus como as pessoas imaginam.
 

PAS522. Recordar uma hora triste

Para Rurt foi um dia esplêndido. Theron amenizou o almoço com o seu incessante e balbuciante palrar, e Eula esforçou-se por se mostrar simpática, amável e sorrir continuamente. No fundo dos seus olhos ainda não tinha desaparecido aquela chamazinha de ódio, quando olhava para Rurt, mas o texano sabia que não se esquecia um ódio profundo em duas horas. A jovem já não o olhava como a um inimigo. Sabia que podia confiar nele. Rurt disse-lhe o motivo da sua oportuna chegada ao rancho, e ela respirou aliviada.
--- Ao menos, sei que já não estou só —E olhando-o fixamente: — Ao que parece sucederam muitas coisas nestes últimos três anos!
— Muitas mais do que às vezes queremos, Eula.
— Refiro-me à sua mudança de ser. Agora já não é um pistoleiro.
— A si o devo. Foi a nossa, última entrevista que me fez mudar. Lembra-se? Então compreendi o alcance que verdadeiramente podia ter para os outros a minha profissão de pistoleiro. Decidi naquele momento mudar de vida.
Eula não respondeu. Era notório que desejava mudar de conversa.
 

sábado, 22 de agosto de 2015

PAS521. Voltei para te salvar

Tinha necessidade de a ver. De repente, sentiu que manter incógnita a sua verdadeira personalidade, era uma asneira. Ela odiava-o de qualquer maneira, mas podia sentir-se um pouco mais segura ao saber que o agente esperado já tinha chegado.
Lançou o cavalo a galope impaciente. Ao longe, o rancho da jovem desenhava-se já, envolvido em jorros de luz.
Pouco depois desmontava diante do alpendre. Não se via ninguém. Mas de repente, uma pequena figura surgiu correndo por uma das esquinas, assustada e chorosa. Soube logo que era o filho de Eula.
— Salva a minha mamã. Salva a minha mamã.
Ao mesmo tempo, no interior de casal ouviu-se um grito agudo de mulher.
Rurt deu um salto, e sem sequer pensar que podia ser uma emboscada, atirou-se contra a porta e ficou parado no umbral enquanto com o olhar percorria toda a sala.
O que viu, fez-lhe dar um salto e gritar de raiva:
- Hereford!
O rancheiro que quase tinha dominado a mulher, voltou-se rígido, e empurrou para o lado Eula. Ela, com a blusa feita em pedaços, os cabelos em desalinho e os braços cheios de vergões, perdeu o equilíbrio e caiu para trás, até que chocou contra a parede, cravando os olhos na figura salvadora.
Erguido no meio da sala, Rurt curvado, com as mãos muito próximas dos seus terríveis revólveres. Debaixo das abas do chapéu, os seus olhos parecia que tinham fogo.
— Cobarde, vil réptil rastejante... «Saca». Vou matar-te.
Hereford levantou as mãos, enquanto as suas pupilas se dilatavam ao reconhecer o homem que tinha na sua frente.
— Hasley.
— Claro que sou Hasley. Mas não pense que me fará, mudar de opinião nem por dez mil dólares. Vim matá-lo, Hereford. E fá-lo-ei tarde ou cedo. Apesar da sua equipa de pistoleiros e a sua perfeita fachada de rancheiro honrado. Vamos, decida-se a «sacar», valente.
O rancheiro não respondeu ao desafio que o texano lhe lançava em cara, e tentou falar:
— Tudo isso não são mais que acusações sem fundamento. E enquanto se arma em defensor de... dessa, lembro-lhe que é uma índia mexicana e tem um filho de certo pistoleiro que morreu às suas mãos.
Rurt rangeu os dentes.
— Naquele momento devia era tê-lo morto a si. Mas fá-lo-ei da próxima vez que o encontre. Embora. Antes que me arrependa e comece a dar ao gatilho.
Sem deixar de olhá-lo, Hereford saiu do rancho. Pouco depois, os cascos do seu cavalo perdiam-se ao longe.
Rurt voltou-se então para Eula, que acabava de deitar sobre a esfarrapada blusa uma jaqueta.
— Fez-lhe algum mal?
— Não— murmurou em voz tremente. — Obrigada por me ter defendido, Hasley. Nunca julguei que chegasse a tempo.
— Porque sou um pistoleiro?
— Porque depois do que lhe disse no gabinete de McCohen... Suponho que o terá feito por puro instinto.
— Talvez por alguma coisa mais.
Ela desviou o olhar e corou vivamente. Theron entrou naquele momento.
— Mamã, o homem mau foi-se embora — e a Rurt: — mandaste-o tu?
O pistoleiro abaixou-se, até que o seu rosto ficou ao nível do pequeno. Mostrou um daqueles sorrisos que tão bem lhe ficavam.
— Claro.
— Ouve, tu és esse papá que a mamã diz que virá qualquer dia? A minha mamã diz que estavas muito longe daqui e que não podias vir.
As mãos fortes do texano agarraram os/ ombros infantis. E Rurt Hasley fez o que na sua comprida carreira de pistoleiro nunca tinha feito: beijou as faces ternas do pequeno e disse:
— O teu papá não pôde vir e mandou-me a mim.
O pequeno saiu a correr e voltou a ir brincar com os seus montes de areia. Rurt levantou-se e o seu olhar cruzou-se com o de Eula. Não houve palavras entre eles. Mas os olhos femininos estavam cheios de lágrimas, e o seu sorriso— cálido e espontâneo chegou até ao fundo do coração do homem.
Durante uns segundos, Eula lutou contra um acesso de choro. Por fim, pôde balbuciar:
— Fique para comer, Rurt. Não aceito nenhuma negativa.
E saiu a correr para a sala contígua. Rurt atirou o chapéu para cima de uma cadeira e foi até ao alpendre. Meia hora depois, ele e Theron eram os melhores amigos do mundo.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

PAS520. Assédio a uma mulher com pelo na venta

Passaram três anos…
 

Hereford gostava das mulheres bravas, e aquela era um exemplar digno. Olhou-a descaradamente e pensou que estava só e à sua mercê. Não se via ninguém nos arredores e o pequeno Theron ainda mal se podia ter nas pernas. Deu dois passos em frente.
— Pensei que podíamos pôr termo a esta guerra. Não lhe parece que já chega de sangue e de mortes?
— Isso teria, que perguntá-lo a si, Hereford. Que eu saiba, ainda nenhum pistoleiro da sua equipa de assassinos foi morto... pelo menos oficialmente. Ainda que mais do que um dos seus assaltantes ao roubar o meu gado tenha levado uma boa ração de chumbo.
— Isso é uma acusação velada, Eula.
— Se prefere digo-lhe cara a cara. Você está tentando deixar-me sem nada, e recorre a certos truques para que o xerife McCohen não o meta entre grades. Mas algum dia arranjarei a prova que o condene. E quando esse dia chegar, despeça-se da sua doirada liberdade e pode ser que também da vida. Aqui costumamos enforcar os ladrões de gado, para ensinamento dos demais foragidos.
— Estou há muito mais tempo nesta terra que você.
— Mas vê as coisas do ponto de vista do banditismo. Há diferença, como pode verificar.
Hereford deu outros dois passos, sem que Bula se mexesse do sítio do alto do alpendre. Só dois degraus o separavam dela, e mediu com a vista a distância. De um salto podia, alcançá-la.
— Convém-lhe não desprezar a minha oferta de paz, Eula Jones. O futuro depende do que, você decida agora.
— Já decidi há três anos atrás. E não costumo mudar de opinião com tanta facilidade.
O pé de Hereford estava já sobre o primeiro degrau.
— Nem sequer pelo seu filho, Eula?
Tinha que ganhar tempo fosse como fosse.
Ela apertou os lábios.
— Nem sequer pelo meu filho. Sei muito bem o que tenho a fazer, Hereford. E agora, parta.
Mas Hereford não pensava ir-se embora. De repente deu um salto de pantera, saltou os dois degraus que faltavam e apanhou a mulher pela cintura, atraindo-a a si.
— Claro que irei, pombinha. Mas não sem antes cobrar os desprezos que me fizeste. Já que não queres' ser minha de livre vontade, sê-lo-ás pela força.
Eula debatia-se naquele abraço, que parecia de ferro, mas não conseguiu libertar-se. E sentiu-se empurrada com violência para dentro de casa, enquanto lhe chegava a voz assustada do seu filho.
— Mamã. Que quer esse homem?
O pequeno Theron apenas acertava as meias palavras e abria muito os olhos. Foi a última imagem que Eula teve dele, antes que Hereford a metesse dentro de casa e fechasse a porta.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

PAS519. Partir de coração destroçado

— Pode-se entrar, Hereford?
— Entre, Hasley.
O Rurt que entrou no gabinete não parecia nada o que tinha saído pouco tempo antes do rancho de Hereford para ver Eula. Parecia ter envelhecido. Estava pálido.
E nos seus olhos não havia nenhuma expressão. As suas pupilas pareciam dois pedaços de aço sem vida.
— Alegro-me que tenha vindo, Hasley. Tenho aqui preparado o dinheiro prometido, junto com uma soma como gratificação extraordinária pelo seu comportamento de ontem à noite. Você fez ontem à noite o que eu não esperava, arriscar a pele por minha causa. Torne.
E estendeu-lhe o envelope. Mas Rurt não fez nenhum gesto para lhe pegar.
— Vim despedir-me, Hereford. Vou-me embora agora mesmo.
— Muito bem, mas tome o dinheiro.
— Não
O rancheiro deixou cair a mão que segurava o envelope e olhou-o assombrado.
— Como diz?
— Que não quero nem um cêntimo pelo meu trabalho.
Robert Hereford abriu uma gaveta da secretária, tirou uma garrafa de whisky e bebeu um trago.
- Caramba, Hasley, juro que me deixou sem respiração. Porque não quer o meu dinheiro?
— Não acha que isso são assuntos meus?
Hereford não conseguia sair do seu assombro. Bebeu novo trago.
— Vamos a ver se nos entendemos, Hasley. Não quer a gratificação extraordinária. Se é assim, pago-lhe somente os dez mil dólares estipulados.
— Creio ter sido bem claro, Hereford. Nem um cêntimo.
— Será que o meu dinheiro não é bom?
— Muito bom. Mas não o quero. Adeus.
Levou a mão ao chapéu e saiu lentamente.

PAS518. Matei o pai do teu filho, estás contente?

Amanheceu por fim.
Uma paisagem desolada era a única coisa que restava do rancho de Hayes. Ruínas calcinadas, pastos desertos e os cadáveres dos vaqueiros que tentaram resistir ao ataque.
E em sítio de honra, o cadáver de Theron Grey.
Rurt sentia-se cansado, como se naquela noite tivesse vivido dez anos da sua existência. Arrastando os pés como um sonâmbulo, aproximou-se de Hereford que contemplava com visível satisfação o cenário da sua vitória.
— Se não precisa de mim, dá-me licença que vá visitar determinada pessoa, chefe.
Hereford olhou-o.
— Ontem à noite portou-se como um verdadeiro pistoleiro, Hasley. Vá fazer essa visita. Depois falaremos da gratificação.
Rurt sacudiu o chapéu, montou o seu cavalo e afastou-se.
O rancho de Eula Jones parecia ainda adormecido debaixo dos primeiros raios de sol. Mas não dormia. De unia chaminé surgiu uma leve coluna de fumo, e Rurt desmontou no alpendre, atou o seu cavalo a uma barra horizontal, subiu as escadas a três e três e parou um momento junto da porta.
«Talvez ela me receba de maus modos. Mas por nada deste mundo, quero que seja outro a dar-lhe a notícia de que Hayes e os seus pistoleiros não a incomodarão mais.»
Empurrou a porta e entrou. Eula estava no vestíbulo, empunhando o rifle. Vestia umas calças masculinas, e em volta da cintura um cinturão repleto de balas e um volt 45. Devido à jovem ser muito magra, já se notavam nela as linhas da sua próxima maternidade.
— Bom dia, Eula.
Ela voltou-se como um raio.
— Que faz aqui?
— Vim dar-lhe uma boa notícia. Hayes e os seus pistoleiros não voltarão a incomodá-la mais.
Contra tudo o que esperava, viu-a empalidecer como se aquilo fosse alguma coisa de terrível para ela.
— Que se passou? — perguntou a medo.
— Fizemos uma boa partida no rancho de Hayes. Tiveram que se render. Foi pena é que tivesse sido obrigado a matar num duelo Theron Grey, o pistoleiro californiano. Não queria tê-lo feito.
Eula estava já tão branca que o seu rosto se confundia com a parede.
— Matou Theron Grey?
— Sim, mas não creio que isso...
— Disse há pouco que começava a apaixonar-se por mim ? — perguntou em voz estranha.
— Não creio que...
— Disse?
— Sim, disse. E era verdade, ainda que seja doloroso confessá-lo. Tinha começado a apaixonar-me por você como um idiota.
— Mentira! — gritou ela com força.
Nas negríssimas pupilas femininas brilhava uma luz selvagem.
— Você não é mais que um pistoleiro sanguinário, matador de homens, incapaz de amar alguém. Você não tem alma, nem coração e só pode sentir afeto pelos seus revólveres! Sabe quem era Theron Grey ? O pai do meu filho! O meu amante, se é que quer dizer de maneira crua. E você... você matou-o. Ia casar-se comigo, e você matou-o! ASSASSINO!
Rurt tinha ficado completamente sem fala. Pareceu--lhe que um ferro em brasa lhe queimava o rosto. Theron e Eula ! E o seu filho !
Avançou um passo para ela.
— Oiça, eu não sabia...
A negra boca da «Winchester» olhava-o ameaçadoramente.
— Fora daqui. Saia, maldito pistoleiro. Toda a minha vida o amaldiçoarei pelo que fez. Fora! Como um sonâmbulo, Rurt deu meia volta e saiu, montou o seu cavalo e foi-se.

quarta-feira, 19 de agosto de 2015

PAS517. Creio que verei o teu rosto por toda a parte

O primeiro contacto que teve com os pistoleiros do bando contrário foi naquele mesmo sábado ao anoitecer.
Quase toda a povoação de Hill City se tinha juntado na rua, aproveitando a véspera, de festa para fazer algumas compras e passear. Viam-se muitos vaqueiros que tinham vindo com a autorização de Hayes e Hereford, e ainda que se olhassem uns aos outros cmn receio, todos se comportavam de maneira a nao provocar sarilho. Não eram homens de armas, mas sim tratadores de vacas. A habilidade com o revólver nao era precisamente o seu forte.
Sem dúvida, os pistoleiros já eram outra coisa. Pavoneavam-se de um extremo ao outro da povoação, e adivinhava-se que de um momento para o outro os tiros começariam pelo mais fácil pretexto.
Rurt nao viu Theron em nenhum sitio. Meteu-se no saloon de Mac, e aproximando-se do balcão onde Lottie ria das graças de dais ou três elegantes, pôs uma moeda sabre o balcão.
— Cerveja. E ri-te um pouco comigo, querida, que venho muito triste.
Ela serviu-lhe o que tinha pedido e dedicou-lhe um perturbador sorriso.

terça-feira, 18 de agosto de 2015

CLT042. Um punhado de dólares

 
(Coleção Colt, nº 42)
 

Este livro divide-se em duas partes. Na primeira, Rurt Hasley, um pistoleiro, é contratado por Hereford, um ganadeiro, para liderar os seus homens contra um vizinho. Hereford pretende apoderar-se de enorme extensão de terras e o mesmo desejo acomete o seu vizinho, pelo que os atritos entre ambos são constantes. Rurt conhece Eula, possuidora de um pequeno rancho encravado entre ambos, e apaixona-se por ela, mas esta tem um romance com um pistoleiro a soldo do rival de Herford e um confronto entre ambos, inevitável, conduziu à morte desse homem. O desfecho da luta entre ganadeiros terminou com a vitória de Hereford e Rurt partiu com o coração desolado pela recusa de Eula e sem receber o dinheiro que Hereford prometera pagar-lhe.

A segunda parte do livro é marcada pelo regresso de Rurt. Agora, Eula é assediada por Hereford e Rurt combate-o, procurando conquistar a sua amada.

Deste livro, engraçado, um tanto confuso, extraímos algumas passagens, retratando a relação de Rurt com Eula, que os vão acompanhar nos próximos dias.

sexta-feira, 14 de agosto de 2015

PAS516. Um anjo e um pistoleiro apanhados em flagrante

Quando terminou a sua refeição, deixou a importância da despesa em cima da mesa e fez um cigarro antes de se levantar para sair. Acendia-o quando viu através da janela uma coisa que lhe chamou a atenção.
Sem pensar duas vezes, levantou-se e saiu do local para ir atrás da esbelta figura de Marion.
Pôs-se ao seu lado e disse:
— Não esperava encontrá-la aqui.
Ela abrandou o passo.
— Oh, você... — olhava-o com expressão de dúvida. —Pensei que era algum aborrecido.
-- Que faz você em Dell City?
-- A mesma coisa poderia perguntar-lhe eu — replicou Marion, que acrescentou: —Como sempre, acompanhando o meu marido.
Pete segurou-a pelo cotovelo e parou frente a ela, olhando-a na cara. Lamento ter que o dizer, mas o seu marido é um canalha.
Marion corou.
— Não lhe consinto...
Ele não fez caso e olhou para as marcas do rosto feminino.
— Por que suporta essa vida? Você não lhe deve consentir...
Deteve-se. Marion chorava desconsolada e via-se que estava atemorizada.
Tendo analisado a situação pegou-lhe pelo braço e ajudou-a a caminhar.
— Vamos.
Caminharam com certa pressa e saíram da cidade. Em todo o caminho não tinham dito uma só palavra. Marion que tinha lutado para conter as lágrimas, uma vez a sós deu largas à sua dor.
— Não posso suportá-lo mais.
— Por que não o abandona?
— Nunca tive suficiente coragem...
— Ama-o?
— Não! — a resposta parecia uma explosão. — Creio que nunca o amei. Quando me casei era demasiado jovem e não sabia o que fazia. O meu pai tinha morrido pouco tempo antes e casei-me para ter um refúgio. Não tardei em dar conta do meu erro, e... — mordeu os lábios. — Não devo continuar. Devo conservar a minha dignidade.
— Pode confiar em mim.
Vacilou, mas acabou por ceder, impelida pela angústia que a embargava.
— Ele tão pouco me ama... Há muito que somos dois estranhos... sem a menor intimidade... mas ele gosta de me ter perto para descarregar a sua cólera.
Pete segurou-a pelos ombros, sentindo-se ferver de indignação.
— Miserável... –
— Intimamente os seus maus tratos têm aumentado e decidi fugir do seu lado, mas não sei como.
— Eu posso ajudá-la. Acariciou-a suavemente e ela apoiou-se no seu peito viril. Pete roçou-lhe os cabelos com os lábios e ao senti-lo ela recuou vivamente.
— Não! Isso não! — protestou. — Desculpe-me mas devo regressar para junto do meu marido.
— Marion! Você não pode fazer isso — disse, retendo-a pela mão enquanto ela tentava escapar-se. Kelly acabou por soltá-la. — Entendido. Você continua a pensar que eu sou um foragido.
— Eu...
— Sim; acredita que é verdade tudo quanto se diz de mim. Eu poderia justificar-me, mas ainda não chegou o momento. Não cometa uma loucura irreparável, Marion, eu posso ofe-recer-lhe a felicidade se tiver um pouco de paciência... Amo-te, Marion — sussurrou com íntima entoação. — Entraste-me no meu coração... — Agarrou-a entre os seus braços e ela de olhos fechados, admitiu mansamente a aproximação masculina. Desde o dia em que nos encontrámos na meseta sabias que seriamos um do outro e...
Beijou-a nos lábios, numa carícia cheia de carinho e amor.
Foi então que soou perto deles aquela maldição seguida de um rugido ameaçador:
—'Malditos sejam. Vim atrás de vós...
O capitão Frank Dixon estava atrás deles, empunhando o seu «'Colt» militar.
Marion retocedeu dando um grito e Pete apertou os lábios.
— Tinha desejos de o encontrar para lhe cuspir na cara todo o meu nojo pelo trato que tem dado a Marion...
O militar fez uma careta.
— Converteu-se em confidente dela, eh? Uma situação bonita para ambos. Eu sempre disse, Marion que eras uma...
Kelly saltou para a frente, cego pela cólera, sem pensar no perigo que corria. Só deu conta disso quando ouviu o estampido e o zumbir da bala muito perto da sua cabeça. Dixon, assustado pela acometida inesperada do rapaz, tinha desviado ligeiramente o braço, o suficiente porém para falhar o tiro.
Pete bateu-lhe na cara com brutalidade e depois no estômago sem lhe dar um segundo de repouso. Dixon tombou e Pete continuou a bater com ódio até que Marion acudiu para o conter.
— Basta, Pete, já basta! Vais matá-lo...
Conseguiu afastá-lo do capitão, que bufava e gemia no chão. A violenta cena não tinha tido testemunhas, afortunadamente para Pete Kelly por que de outra maneira ter-se-ia arriscado a ser julgado por um tribunal militar. Dixon foi a primeira coisa de que se lembrou, mas na realidade não podia mandar o rapaz a um Tribunal Militar.
— Matá-lo-ei, do mesmo modo. Matá-lo-ei — ameaçou sangrando abundantemente da boca.
Keli deixou cair as mãos ao longo do corpo.
— Estou à sua disposição agora mesmo, se quiser, cobarde — insultou.
— Não me enfrentarei com um pistoleiro como você... Mandarei alguém muito melhor para que não tenha possibi-lidade de escapar...
Cobardemente voltou as costas e desapareceu por detrás das primeiras casas do povoado.
Pete agarrou o braço de Marion e disse:
— Não voltarás para o lado dessa ruína humana. Procuraremos a maneira de anular esse casamento. Até então ficarás alojada no hotel.

quinta-feira, 13 de agosto de 2015

PAS515. Um anjo em perigo

Ao pisar o último degrau da escada que conduzia aos quartos para viajantes do hotel anexo ao «Inferno Saloon», viu uma figura que lhe era familiar. A especial configuração das costas femininas e os cabelos loiros serviram-lhe para identificar Marion.
Decidido, foi até à porta pela qual ela tinha desaparecido chamou suavemente com o n6 dos dedos.
Não havia ninguém no corredor e se fosse surpreendido sempre poderia dizer que se tinha enganado, pois ele habitava a outra ao lado.
A porta abriu-se.
O rosto de Marion expressava surpresa e inquietação ao mesmo tempo.
— Você?
— Está só?
— Que deseja?
— Esperei por si algum tempo na elevação, mas você não apareceu. Desejava agradecer-lhe.
Ela olhou para fora, receosa e depois retrocedeu:
— Entre rápido.
Ele não se fez rogar e entrou no quarto habitado pela formosa mulher. O seu perfume muito pessoal tinha-se entranhado nas roupas e nos móveis.
Notou-a perturbada e tratou de acalmá-la.
— Fez por mim uma coisa que eu não esperava de ninguém.
— Não fale disso. Está melhor?
— Sim.
— Ainda bem. E agora...
Ele fez um gesto de surpresa.
— Manda-me embora?
Marion entrelaçou os dedos.
-- Não gostaria que pensasse aquilo que não deve.
— Tem medo.
Não era uma pergunta e ela assentiu.
— Para quê? Há umas semanas...
— Você estava ferido; era um acto de humanidade. E não podia ser perigoso.
— Hoje, no entanto, sim.
A mulher não respondeu, o que equivalia a uma afirmação.
— Ouvi umas coisas a seu respeito disse, depois de uns momentos de hesitação.
Estavam ambos em pé, frente a frente, muito perto da porta. A entrevista não podia ser mais forçada e, no entanto, Pete sabia que ela não estava segura, como se temesse deixar uma fresta na sua cerrada defesa. Aquela posição era, portanto, premeditada.
— Que coisas?
Ela levantou a cabeça, suplicante.
— Por favor...
— Disseram-lhe talvez que sou um pistoleiro, não? E também um mulherengo? Talvez lhe tenham dito também que vivo pendente das armas? Ou inclusivamente que não conheço outro código que o meu capricho?
Marion estava pálida e aquela rápida conversação masculina ainda a tinha posto mais nervosa.
— Entendido: você pensa que não sou uma pessoa recomendável.
— Suplico-lhe...
— E até me considera capaz de querer abusar da minha força.
O olhar de Kelly era rude, estava zangado e não desejava ocultá-lo.
Voltou-lhe as costas bruscamente.
— Foi um erro voltar; lamento — disse ele, pondo a mão no puxador da porta. De repente ouviram-se passos no corredor e um som metálico, como o de um sabre ao roçar com as anilhas na bainha.
Quase no mesmo momento bateram na porta.
— Marion! Estás aí?
A rapariga vacilou e esteve a ponto de cair no chão. Uma palidez cadavérica nublou o seu rosto e Pete, dando conta da gravidade da situação, correu para a janela na intenção de saltar por ela ainda que com risco da própria vida, mas compreendeu que era impossível fazê-lo. Em baixo, frente à porta do hotel, estava parte da companhia que era comandada pelo capitão Dixon.
—Marion! Não me ouves? — chamou imperiosamente o marido.
Por fim, a rapariga recobrou o domínio sobre si mesma.
— Meta-se no armário-roupeiro. Frank não deve saber que está aqui. Seria terrível!...
Empurrou-o para um grande armário que ocupava toda uma parede e obrigou-o a entrar rapidamente para em seguida fechá-lo à chave. Nos primeiros segundos, Kelly sentiu-se asfixiado pelos inúmeros vestidos que estavam pendurados nos cabides, todos eles cheirando fortemente ao perfume de Marion.
Finalmente, Marion foi abrir a porta.
— Que acontecia, que não podias abrir a porta? — perguntou Dixon asperamente, ao mesmo tempo que entrava no quarto.
— Estava a descansar...
— E precisaste de tanto tempo para te levantares e vi abrir? — Os passos pesados do militar ressoavam no quarto
— Desculpa.
Bruscamente, Dixon resmungou:
— Bem, deixemos isso. Vou sair com os meus homens para dar uma batida por aí. Não abandones o teu quarto
— Mas...
— Há alguma coisa que chame a tua atenção fora daqui?
— Oh, Frank, és...
— Que sou? Vamos, diz, que sou? Estou farto de te ver coquetear com todos, isso é tudo! Não tenho o mínimo desejo de que se divirtam à minha custa.
— Frank! Como te atreves?...
Ela protestava o seu orgulho ferido.
— Sou o teu marido, Marion, não te esqueças. E usas meu apelido.
— Será que pensas que não sou digna de o usar? — Ela tinha perdido o controle sobre si mesma e gritava, enfur cida. — És um miserável, falando-me nesse tom!
— Não percas o controle dos nervos.
— És ruim e miserável! Vivo toda a minha vida fechada como que sequestrada e ainda és capaz de cometer a impor doável grosseria de... Deveria ser verdade aquilo que temes
Zás!
A bofetada soou fortemente, cortando a explosão colérica da rapariga. A voz de Frank fez-se ouvir, fria:
— Se isso acontece, mato-te.
Saiu e deu uma violenta pancada com a porta. Pete Kelly, encolhido no armário, estava furioso e notava que o sangue lhe circulava raivosamente nas veias, pela vilania que tinha presenciado.
Durante uns minutos não deu sinais da sua presença, sabendo a humilhação que sofria Marion por ter sido testemunha, no seu esconderijo, do infamante trato.
Por fim, ela meteu a chave na fechadura e abriu o armário. Já não chorava e tinha posto pó de arroz sobre o sinal deixado pela bofetada.
Saiu em silêncio e de cabeça baixa, para não ferir com o seu olhar a sua amiga, e dirigiu-se para a porta.
-- Lamento de verdade — disse ele, de costas voltadas, num sussurro. — E apesar do que tenha ouvido dizer de mim, sei compreender os sentimentos de uma verdadeira senhora. Desculpe-me.
Ouviu o soluço feminino e voltou-se. Marion não tinha podido conter-se e mostrava uma expressão desconsolada. Pete avançou uns passos e, suavemente, acariciou os cabe-los femininos.
— Se eu puder fazer qualquer coisa... Tirou-lhe as mãos que ela tinha posto a tapar a cara e olhou-a de frente.
 — Porque suporta estas humilhações? — insistiu.
-- Que outra coisa posso fazer? — tentou acalmar-se. — Além disso, é o meu marido...
— Não tem o direito...
 — Não posso discutir isso com um estranho.

quarta-feira, 12 de agosto de 2015

PAS514. Encontro com o anjo da colina

Notou uma sensação de alívio na testa e uma agradável frescura nos seus ardentes lábios. Viu-a muito perto. Era tão bela que mais parecia uma alucinação. Mas era real. Levantou a mão para tocar-lhe e a imagem não se desvaneceu quando as pontas dos seus dedos roçaram levemente aquele rosto de pele acetinada.
— Sente-se melhor?
Era loira, de grandes olhos verdes e boca vermelha, carnuda. Inclinada como estava, o seu busto adquiria um relevo tentador. Vestia trajo de amazona, mas bastante elegante, e se bem que bastante jovem, Pete observou uma expressão resoluta no olhar feminino. Ao trocar a compressa de água fria que tinha posto, a aliança de ouro brilhou. O rapaz cerrou os olhos. Era casada.
— Que lhe aconteceu? — perguntou a desconhecida. — Feriram-me. Estavam entre umas rochas, ao ar livre. O sol declinava e deduziu que tinham passado várias horas depois que fora ferido.
— Quem é você? — perguntou à formosa mulher.
— O meu nome é Marion Dixon, creio que isso nada lho dirá.
— Que faz... aqui?
— Não fale tanto. Acabo de encontrá-lo e tenho que tratar essas feridas.
Um agudo toque de clarim ecoou no tranquilo ar da tarde. Pete retesou-se ao ouvi-lo, e em seus olhos apareceu uma expressão de homem perseguido.
— Que é isto?
— A terceira companhia do Forte Hanckock.
— Como o sabe você? Que estão aqui a fazer esses soldados?
— Pelo que compreendi procuram uns traficantes de armas. Segundo se crê, há um cabecilha mexicano que quer recuperar o Texas e está armando um exército invasor com rifles fabricados na União e que alguém se encarrega de trazer pago por bom ouro.
Um suor frio resvalou pela testa do rapaz. Marion levantou-se.
— Vou pedir ajuda para si. Na companhia há um sargento que tem conhecimentos médicos.
— Não! — Kelly estendeu o braço e agarrou a roupa feminina. — Não o faça. Ninguém deve saber que estou aqui.
- Mas você está bastante ferido. Os olhos verdes da rapariga tinham um brilho extraordinário como se qualquer coisa a tivesse excitado.
-- Não tem importância. Se quer completar a sua obra humanitária, não me denuncie.
A formosa mulher duvidou durante uns instantes, mas acabou por se ajoelhar junto do ferido. Os dedos hábeis abriram a camisa para examinar a ferida do peito. Com o cantil que tinha ao seu lado deitou um pouco de água na ferida, que depois limpou com um lenço que ela levava ao pescoço. Depressa ficou ensopado em sangue e teve que o atirar para um lado pois já não tinha utilidade.
— É uma loucura, mas mesmo assim não o denunciarei — disse por fim.
Pelo caminho que ascendia até àquela elevação devia subir alguém a julgar pelo barulho de passos que se ouvia. Marion prestou atenção, alarmada, e pouco depois ouvia-se uma voz:
— Senhora Dixon! Não me ouve, senhora Dixon?
Marion explicou:
— É o sargento Brenan.
Levantou-se rapidamente e acudiu ao local donde vinha a voz, detendo-se no meio do caminho obstruindo-o assim.
— Que se passa, sargento? — a sua voz tinha deixado de ser doce para ser autoritária. A pessoa que subia parou.
— O capitão deu ordens muito severas para que a senhora não se afastasse do nosso lado, este terreno é muito perigoso.
— Será que me tenho que converter em prisioneira dos soldados do meu marido, sargento?
-- Senhora Dixon... Eu... só cumpro ordens. A minha responsabilidade é muita e...
— Não quero ouvir nem mais uma palavra a esse respeito.
— Mas...
— Essas são as minhas ordens, sargento. A quem vai obedecer?
Breman adoptou um tom suplicante:
— Pense na minha responsabilidade, no que dirá o capitão.
— O capitão só diz o que eu desejo, sargento. É a vantagem de ser a esposa de um capitão, não acha?
— Evidentemente — o sargento tinha esgotado todos os seus argumentos.
-- Vão acampar aqui, não é verdade?
— O capitão ainda não regressou, e não sabemos quais serão as suas ordens, mas pela hora que é, é de supor que mandará levantar o acampamento aqui mesmo.
— Nesse caso quer trazer-me qualquer coisa que comer dentro de uma cesta? Desde esta elevação descortina-se um panorama belíssimo e não quero perder o pôr-do-sol para descer a jantar.
— Mas...
— Não me terei explicado bem, sargento?
— Oh, sim, sim... votarei já.
Ouviram-se os passos do sargento que descia e Marion continuou ainda no mesmo lugar durante um bocado até que não considerou arriscado voltar para junto do ferido. Pete olhou-a com admiração.
— Você... fez isso tudo... por mim? '
— Não mo pediu?
— Mas você é a mulher de um militar...
— E então?
— Certamente que neste momento o seu marido anda à sua procura.
Ela olhou-o. Por qualquer motivo, Kelly pensou que ela não era feliz no seu matrimónio; mais ainda que ela não sentia o menor amor pelo seu marido. Quando a viu inclinar-se para lhe tratar a ferida, pensou que Marion parecia uma mulher insatisfeita, que não tinha encontrado no matrimónio aquilo a que tinha direito. Os dedos trataram habilmente a ferida. A bala estava dentro e Marion não tardou em sabe-lo.
— Não vou poder fazer grande coisa pelo senhor. Não tenho nenhum instrumento... Sabe o que isso significa?
— A gangrena...
— Sim, a menos que um médico o trate.
— E isso não é possível — Pete sorriu, fazendo quase uma careta. — Não importa, porém. Pode-lhe parecer palermice, mas a sua presença compensa-me de certo modo.
Ela olhou-o profundamente nos olhos, com uma interrogação nas pupilas. Pete susteve o olhar. Marion formulava perguntas, muitas perguntas às quais ele poderia responder.
— Não fale — pediu ela.
Novamente os passos do sargento fizeram ranger a areia do caminho, e Marion correu ao encontro dele, tomando a cesta que ela trazia.
— Não havia grande coisa para escolher, senhora Dixon.
— Vejo, não obstante esmerou-se. Até me trouxe um pouco de «whisky».
— Pois... Pensei que poderia querer...
— Sou uma senhora, sargento, e as senhoras não costumam tomar «whisky». Mesmo assim obrigada pela sua atenção.
 -- Deseja mais alguma coisa?
—Não; excepto estar só.
- Compreendi, senhora. Ninguém virá a este lugar.
-- Obrigada.
Mas Breman ainda vacilava.
— Que devo dizer... se o capitão chegar antes de que a senhora tenha regressado?
— Isso não sucederá; do sítio onde me encontro vê-lo-ei vir... e descerei.
— Se necessitar de mais alguma coisa, não tem mais que pedir...
Os pesados passos do militar foram deixando de se ouvir e logo Marion regressou para junto do ferido.
Deixou a cesta no chão depois de ter tirado um alvo guardanapo e uma afiada faca.
— Quer arriscar-se a ser operado por mim?
Parecia brincar, mas via-se que estava firmemente decidida a tentá-lo.
Pete procurou-lhe a mão e apertou-a. Sentiu-a fresca e suavíssima em contraste com a sua que ardia em febre.
— Por que faz isto? Está-se comprometendo demasiado.
— Você não entende.
O rapaz procurou ler naqueles olhos tão expressivos.
— Você merece muito mais do que tem. Ë pena que não esteja em minhas mãos...
Calou-se e ela pediu, suavemente:
— Que ia a dizer?
— Nada; é melhor que se apresse, se realmente quer ir tão longe.
Voltou o rosto para não vê-la. Aquela mulher estava-se metendo no seu sangue sem quase dar por isso, e compreendia que era muito perigoso.
Marion movia-se com rapidez. Destapou a garrafa de «whisky» e com ele desinfetou a lâmina da faca. Deu a beber uma boa porção a Pete, oferecendo-lhe um lenço.
— Morda-o para não gritar.
Pete colocou-o entre os lábios, e um momento antes de começar a rústica operação ela voltou-se de costas, levantou a saia e rasgou a combinação de modo a conseguir uma ligadura. 
Por fim inclinou-se sobre o peito masculino e introduziu a ponta da faca na ferida. Uma dor agudíssima, como um dardo de fogo, percorreu o corpo de Pete Kelly, cegando-o.

terça-feira, 11 de agosto de 2015

PAS513. Balas contra o homem do carregamento de armas

A fila de mulas caminhava atrás dele. Tinha mudado as caixas com os rifles dos lombos dos fatigados animais conduzidos por Maxey e tinha-as posto sobre as mulas que ele levara até ao pico de Guadalupe. Aquelas armas tinham que chegar ao seu destino, a Dell City, no Texas desde onde tomariam a direcção do México. Mas aquela não era missão que correspondesse a ele.
A sua missão terminaria quando deixasse as caixas com os rifles no rancho do coronel Charlie Williams, em Dell City. Trabalhava para o coronel, e qualquer coisa lhe fazia pensar que por sua vez o coronel obedecia a ordens de alguém. Cuspiu. Tinha a boca seca com aquele maldito calor e além disso sentia o estômago flácido e vazio pelo prolongado jejum.
Era mais de meio-dia e, até ao anoitecer pelo menos, não se encontraria em frente de pratos repletos de suculenta comida. Porque antes, esconderia o carregamento nas Grutas de Carlsbad. Assegurou-se mais uma vez de que as mulas levavam o carregamento em condições e adiantou-se um pouco, deixando a fila a fim de subir a um desnível rochoso e comprovar que não havia perigo por aquele lado.
Passou por entre rochas, algumas das quais tinham mais de dois metros de altura. Foi nessa altura que começaram a soar tiros. Deviam aguardar a sua chegada porque o fogo se concentrou todo sobre ele, partindo de vários pontos em semicírculo. Sentiu uma pancada no peito e depois outra na anca. Não sentiu dor alguma, mas Pete compreendeu que tinha sido ferido e que lhe restavam poucos minutos de lucidez.
Deixou-se cair sobre o pescoço do alazão enquanto ouvia o troar dos disparos ao seu redor e fez pressão com as esporas nos flancos do nobre animal. Este pareceu compreender e deu um grande esticão, lançando-se a galope ondulado, aprendido tempos atrás e que servia para se esquivar das balas e dificultar a pontaria.
O inteligente animal não se lançou em louca correria recta, mas procurou imediatamente a proteção das numerosas rochas que encontrava no seu caminho. Pete Kelly sorriu, apesar da dor que começava a invadir o seu corpo.
Por entre a neblina dos seus olhos viu que o alazão tinha conseguido iludir rapidamente a emboscada, e também compreendeu que algo se passava: aqueles que lhe tinham preparado a cilada interessavam-se mais pelo carregamento das mulas do que pela Sua vida. Sentiu-se satisfeito, apesar de tudo, e procurou energias para se segurar com mais força ao pescoço do cavalo. Este continuava correndo em busca de salvação para seu amo. Pete compreendeu que deveria dirigir-se para um lugar habitado, longe de White City, mas não podia transmitir aquela ideia ao seu cavalo, e, por outro lado pressentia que ia desmaiar de um momento para outro. Apertou os dentes e entrelaçou fortemente os dedos, abraçando o seu fiel amigo.

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

KNS048. Morte com data marcada



(Coleção Kansas, nº 48)
 
Pete Kelly era um agente federal infiltrado num bando que vendia armas a um grupelho mexicano que pretendia iniciar uma guerra para retomar o Texas. A sua aproximação a esse grupo fez com que em determinados momentos tivesse cometido actos menos recomendáveis.
Ao iniciar a leitura deste livro, a descrição leva-nos a um Pete quase bandido, inclusivamente violento com as mulheres. Depois, essa sensação muda até que o vemos convertido na personagem central deste livro. Deste é de destacar o ataque de que foi alvo na entrega do carregamento de armas e os três encontros com a bela Marion.
O livro desenvolve-se com algumas surpresas relativamente à natureza das principais figuras, como é o caso de Pete e da bela cantora de «saloon»
Aqui ficam algumas passagens deste texto de MIkki Roberts ilustrada por uma capa que retrata o momento do assalto ao carregamento de armas

sábado, 8 de agosto de 2015

KNS045. Barreira verde


(Coleção Kansas, nº 45)
 
 
Os livros de A. Rolcest são, para mim, quase sempre desagradáveis. Não é essa a opinião de outros comentadores deste tipo de livros como pulpnivoria ou bolsilibros onde o autor é julgado como alguém que dava sempre um papel importante à mulher ou era detentor de outros meritórios atributos.
Este é decerto um caso que, mais uma vez, não corresponde a essa visão. O senhor Rolcest elabora um argumento em que uma rapariga, em estilo de engate, chega a uma cidade com o objetivo pago por um magnate de estragar o casamento a um filho deste. No final, ela acaba por aproveitar o filão...
A capa, de Cortiela, envolvida nas cores da Coleção Kansas, é bem engraçada e é motivo suficiente para manter a posse do livro.


terça-feira, 4 de agosto de 2015

PAS512. Nunca vires as costas a uma gata assanhada

Levantou-se então e correu para um ponto onde o mato era mais espesso. Parecia que ia também buscar a montada. Mas não era esta a sua intenção. Jayne, louca de fúria, encaminhou-se na direção duma cabana situada umas quinhentas jardas arroio acima. Uma cabana que O'Hara poderia ter visto se não fosse completamente absorvido pelo pensamento de Noemi, pois que tinha sido este o obstáculo que se tinha interposto entre ela e ele.
A jovem chegou à cabana sem se deter na sua correria e mal recobrou o alento pegou numa «Winchester» que pendia dum prego cravado na parede. Com a arma empunhada, dirigiu-se para a janela.
O'Hara, sobre a cela, começava a subir um pronunciado declive ainda dentro do pequeno bosque. Jayne apontou e premiu o gatilho.
O chumbo passou sinistramente a pouca distância da cabeça do cavaleiro que imediatamente se debruçou sobre o pescoço do cavalo, soltando uma imprecação e cravando simultaneamente as esporas.
Ouviram-se ainda duas detonações de efeitos nulos, talvez devido à magnífica arrancada do animal. O'Hara volveu seus olhos na direção da cabana e entendeu que aquele gato-montês chamado Jayne Sinclair, tinha a luminosa ideia de lhe transformar a pele num passador.

segunda-feira, 3 de agosto de 2015

PAS511. Quem era aquela diabólica formosura que gritava?

O cavalo pisava agora o verde tapete de erva. Seus cascos sobre ela não produziam qualquer ruído. E estacou quando o arroio surgiu junto dele. O animal baixou a cabeça para beber e, O'Hara, sobre a cela, permaneceu na mesma atitude pensativa. Um grito, procedente das águas, obrigou-o a erguer subitamente a cabeça, enquanto seus pensamentos se esfumavam.
Porque ali, na sua frente, estava uma visão maravilhosa. O'Hara viu primeiro a ondulação duma cabeleira brilhando ao sol como oiro, depois um rosto de deusa... e o sangue converteu-se em fogo.
«Quem era aquela diabólica beleza feminina que ele não conhecia? Acaso seria a deusa do pequeno bosque, ou talvez das águas?»
E justamente quando o jovem fazia a si mesmo a última pergunta, ela gritou novamente:
— Saia daí. Desapareça... seu rufião... Que pretende?
Por instantes, O'Hara franziu o sobrolho. Depois ergueu a cabeça e voltou a fitar as águas. A mulher, nadando ~tente com a cabeça fora de água, acercava-se da margem.
O'Hara estava esperando que ela chegasse. O seu primeiro impulso fora retirar-se dali, mas o insulto que ela proferira obrigou-o a mudar de ideias.
A mulher, que mais não teria do que uns vinte anos, estava agora junto da margem. O'Hara admirou o seu rosto, agora crispado pela mais diabólica fúria, aqueles olhos belos, rasgados, verdes como uma pedra de jade, de longas e desenhadas pestanas ruivas, seu rosto maravilhoso de faces rosadas como um fruto maduro, o nariz fino e recto de deusa pagã.
Os lábios... O'Hara pensou por instantes que nunca tinha visto nada semelhante, e num estranho contraste com os seus anteriores pensamentos, também naquele momento recordou Noemi, a mulher que tinha fingido ser cega para cumprir uma vingança e que fora sua mulher durante três anos; três anos que para ele mais lhe pareciam ter sido três dias.
O jovem fitou-os de uma maneira insistente. Carnudos e vermelhos como uma cereja madura. Incitantes, convidando ao beijo, húmidos pela água e de si mesmos, trémulos agora pela fúria que também se refletia na sua boca, um tanto grande, seu pequeno queixo com uma covinha ao centro, e seus diminutos e brancos dentes, quais pérolas brilhando ao sol.
O'Hara prosseguiu, olhando a garganta branca com brilho de nácar, levemente rosada, a brancura imaculada de um dos seus ombros, enquanto a água cobria o outro. Olhou mais ainda e desviou o rosto para encarar aquelas duas fúrias verdes que, por seu turno, o fitavam refletindo o desejo de matar.
— Quer afastar-se ou não, vaqueiro?
— Antes disso temos ainda outra coisa, menina. Se não retira o que disse, receio bem que o seu banho se vai prolongar por muito tempo.
— Patife! Canalha! Saia daqui... por favor.
E O'Hara sorriu levemente, fitando as águas e pensando no duro contraste que havia entre os insultos que ela tinha proferido com a sua petição final. Vou sair:
— Quer afastar-se, ou não? Se o fizer, prometo que esqueço isto! Se não...
— Diga...
— Vai pagar muito caro, seu ordinário! Meto-lhe no corpo tanto chumbo que não poderá digeri-lo.
— Por mim, não há problema. Pode sair, quando entender que não sou eu quem a vai impedir. O rosto da jovem refletiu por instantes toda a fúria que sentia. Depois empalideceu, pensando que estava metida num verdadeiro apuro. Aquele homem não safa dali. Afinal, que pretendia ele? E pensando nisto suas faces ficaram extremamente ruborizadas. Em seguida, fitou-o com temor e O'Hara percebeu isso. Finalmente, veio a pergunta:
— O que... quer de mim?
— Nada. Quero simplesmente contemplar algo maravilhoso que até hoje jamais tinha visto.
— Maldito seja. Terá notícias de Jayne Sinclair.
Pela primeira vez na sua vida, O'Hara sentia-se divertido perante a fúria de uma mulher, apesar de lhe dar toda a razão. Estava verdadeiramente encantado com aqueles olhos e o brilho quase satânico deles, assim como com a sua boca. Fitou seguidamente a sua garganta e as águas e então o jovem concluiu que era melhor deixá-la em paz. Voltou-se, ficando de costas, e a sua voz soou enrouquecida quando disse:
— Pode sair quando quiser. Não me volto..., mas quero vê-la depois. Um rosto como o seu, deve ter um complemento adequado.
Ela permaneceu uns segundos hesitante, inquieta e plena de fúria que lhe fazia ferver o sangue nas veias como se fosse um vulcão.
Depois, muito lentamente, saiu da água com o rosto voltado para as costas de O'Hara, que se tinha apeado. Caminhando descalça, Jayne alcançou o espesso tufo de artemisa onde tinha deixado ficar a roupa, sem afastar os olhos do jovem.
Nem se preocupou em limpar-se. O'Hara mantinha-se impassível, de costas, até que escutou o rápido deslisar de seus pés sobre a almofada de erva.
Voltou-se para encarar aquela rapariga que avançava na sua direção, lamentando-se de não ter consigo um «Colt», no preciso instante de a apanhar nos seus braços que a cingiram pela cintura, aprisionando-lhe os dela, evitando que as suas mãos, como duas garras, o atingissem , no rosto.
Jayne Sinclair debateu-se como uma serpente, ou pelo menos era isso que ele estava pensando ao sentir contra o seu corpo o calor da jovem que continuava vociferando surdamente:
— Canalha! Bandido! Patife!... Largue-me; está a magoar-me! Porco!...
O'Hara não fazia caso. Pelo contrário. Lentamente começou a apertar e Jayne sentiu que pouco a pouco a respiração lhe fugia do corpo. Ainda assim, por uns minutos debateu-se, até que ficou exausta.
A jovem permaneceu vacilante e respirando entrecortadamente; O'Hara fitou-a, não no rosto, claro.
E ficou sem saber o que fazer perante a selvática beleza que emanava daquele corpo maravilhoso e felino como um gato ou um tigre.
Suas pernas, embora cobertas, eram bem traçadas, altas e proporcionadas. O'Hara parecia adivinhar, assim como concluiu, que não podiam ter comparação possível com as de qualquer estrela dos diversos «saloons» que tinha encontrado no seu caminho, embora fossem inúmeros.
Mas a ele só lhe restava apreciar o que estava mesmo vendo. Que a blusa era decotada e, depois... bem, tudo quanto se seguia. Ainda que quisesse continuar na sua observação, não teve outro remédio senão fitá-la no rosto atendendo a que ela já tinha recobrado o fôlego e exclamava já:
— Vai pagar muito caro tudo isto, se pensa ficar nesta terra, vaqueiro. E não esqueço facilmente. O senhor...— e O'Hara pensou que ela morreria sufocada se tivesse outro ataque de fúria. — Viu-me de cima e desceu — e o jovem olhou fascinado o bem torneado braço que, erguido agora, apontava o cume do monte por onde ele tinha descido. — Isso ninguém o faria... a não ser um indivíduo da sua espécie.
Jayne calou-se por instantes e com os olhos plenos de fogo acercou-se dele até quase lhe tocar. O'Hara preparou-se, mas a jovem limitou-se a perguntar:
— Que foi que viu... seu rufião? Gos...?
Bob O'Hara ficou sem saber o que ela ia para dizer. Subitamente, ela levantou a mão e levada pela cólera que cada vez mais sentia, agrediu-o por duas vezes.
O jovem nada pôde fazer para evitar a agressão e os estalos soaram como duas detonações. Jayne voltou a tomar posição, mas desta vez O'Hara foi mais rápido do que ela. Moveu-se para o lado e quando a jovem perdeu o equilíbrio, ao falhar a agressão, para seguidamente se voltar como um fogoso felino, O'Hara agarrou-a pelas mãos.
Durante uns segundos teve-a à sua mercê contra o seu peito, enquanto ela procurava a todo o custo agredi-lo com os seus pés descalços, fitando aqueles lábios maravilhosos, o belo rosto erguido para ele onde os olhos verdes ressaltavam poderosamente, cheio ainda de gotas de água que, como pérolas, emprestavam a este um encanto ainda maior.
E subitamente O'Hara sentiu-se arrebatado. Acima de tudo por aquela boca que se movia trémula, como se quisesse murmurar qualquer coisa.
Então, sentindo uma estranha sensação por todo o seu corpo, o jovem colou os seus lábios aos dela, sentindo no mesmo instante o suave odor a sálvia e artemisa que se desprendia dela.
E quando Jayne sentiu os lábios masculinos nos seus, deixou de se debater. Ficou extremamente calma entre os braços de O'Hara, tanto que a sua mente se transformou num caos.
E quando uma ideia começou surgindo, dando-lhe a entender o que estava sucedendo, o jovem afastou-a de si mantendo-a ainda presa pelas mãos.
Jayne sentiu-se incapacitada de pensar, ao vê-lo agora com as suas feições alteradas, como se estivesse horrorizado. Depois...
E com um violento empurrão, lançou-a sobre a erva. Logo de seguida afastou-se, voltando-lhe as costas.
A jovem ficou ali mesmo, feita num novelo, com a mão junto da boca e uma estranha indefinível expressão no rosto, enquanto O'Hara montava no seu cavalo, desaparecendo pouco depois por entre o arvoredo.

domingo, 2 de agosto de 2015

PAS510. A figura varonil dum cavaleiro

A figura varonil do cavaleiro perfilou-se por instantes em contraluz, segundos antes de fazer cavalgar a sua montada em direção ao fundo do vale que tinha a seus pés, passando por um pequeno pinhal que crescia junto dum profundo arroio de águas límpidas e cristalinas. Era um lugar que ele conhecia perfeitamente. E quando recordou a quem pertencia, seu rosto duro crispou-se desaparecendo por momentos aquele ricto de amargura que desde há um ano permanecia inalterável na sua boca.
Depois, o cavaleiro recordou também a carta, escrita pelo proprietário das terras que começava agora a pisar. Era o antigo juiz de Belem, em pleno território do Novo México, Joe Kelly, o alto e maciço Joe Kelly.
Bob O'Hara recordava-se bem dele. Com a sua eterna sobrecasaca e a sua inseparável parelha de «Colt 45», pendurados baixo e presos às coxas, por finas e entrançadas correias de coiro.
Era ainda novo, pois agora deveria ter uns trinta e dois ou trinta e três anos, cabelo preto, nariz recto e olhos pardos, boca um tanto grande e o queixo tão quadrado como o seu próprio.
A seguir... o xerife Jim Madigan. Tão alto e atlético como o próprio juiz. Ruivo e de olhos extremamente azuis. Testa ampla, nariz aquilino e queixo ligeiramente pontiagudo. O'Hara pensou que agora deveria ter pouco mais ou menos a sua própria idade: trinta anos.
Ambos tinham sido, respetivamente, juiz e xerife, quando, cinco anos atrás, fora obrigado a sair de Belem, alegando todos que ele tinha por hábito fazer justiça por suas próprias mãos. E agora ele regressava, sabendo desde já que a sua volta ia provocar um verdadeiro cataclismo.
Pensando deste modo, O'Hara crispou ainda
mais o rosto quando o curso dos seus pensamentos se fixaram no rancheiro Kennedy e na sua ruiva, formosa e incitante filha Sílvia. Ambos tinham más recordações dele. Sobretudo ela, atendendo ao facto do seu noivo já há tempo estar criando flores no cemitério de Belem por suas próprias mãos.
Não. Sílvia Kennedy não poderia esquecer facilmente o homem que matou o seu noivo e que depois, graças à atuação de um xerife e de um juiz imparcial, tinha sido liberto de um julgamento que nunca chegou a realizar-se apesar da pressão nesse sentido. Limitaram-se, simplesmente, a dizer-lhe que partisse e ele limitou-se a cumprir a ordem.
E era por este facto, precisamente, que ele voltava: porque tanto o juiz como o xerife tinham perdido o cargo por isto. Joe Kelly assim o afirmava na carta que tinha no bolso.
Havia algo mais, e o jovem afastou essas ideias, pois que sentia na sua mente uma perturbação infernal. Esta luta que travara consigo próprio, refletia-se bem no seu rosto.
E isto aconteceu quando seus pensamentos se voltaram para a dama do poncho (') mexicano. Então, seu rosto dulcificou-se, enquanto um sorriso surgia nos seus lábios.
Ela não voltaria mais a cavalgar com a máscara vermelha, para lhe sair ao encontro um coiote com o fora Gary Mac Donald, ou Cliff Graham, como na verdade se chamava, conhecido em toda a Califórnia pela «Hiena da Califórnia».
Não, nunca mais Noemi Carter O'Hara pelo seu casamento com ele —, voltaria a cavalgar na noite, provocando estampidos e desafiando as feras. Porque ela estava morta!
E sem o poder evitar, O'Hara vacilou como se toda a sua inteireza se tivesse derrubado subitamente. Sua altiva cabeça, já com alguns cabelos brancos, apesar dos seus trinta anos, pendeu sobre o peito enquanto seus pensamentos mantinham viva aquela história do passado que para sempre ficara gravada a fogo na sua alma.

sábado, 1 de agosto de 2015

KNS041. O regresso de Bob ÓHara


(Coleção Kansas, nº 41)
Este é mais um livro de Joe Mogar, cheio de acção. Acção em que a figura do herói é determinante, mas onde a mulher tem um papel importante.
Neste caso, há três mulheres: a que vivia com O'Hara e morreu, lançando-o, desperado, numa vida de pistoleiro; a que, no seu regressou, encontrou tomando banho no rio; e aquela a quem matou o noivo e um dia acabou por salvá-lo da morte porque sentiu o apelo do amor.
A capa, excelente, com assinatura mas não legível, retrata o desenvolvimeto de uma deliciosa cena em que O'Hara encontra a jovem que se banha nas águas do rio a qual se sente ofendida com a sua presença...
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