quinta-feira, 19 de junho de 2014

PAS323. Procura de provas


A mulher olhou-o. Havia no seu olhar desespero, medo, ou quem sabe, escárnio. Reg não se preocupou em o averiguar, mas notou que não podia suportar a força obcecante do olhar de Irina.
— Porque solicitou um adiamento, senhor Sherman? — perguntou ela —. Não crê que eu esteja suficientemente culpada depois das declarações das primeiras testemunhas?
Reg passou uma mão pelos olhos. Parecia cansado, mas não estava. Mas sentia-se assombrado perante aquela situação diabólica e precisamente para a resolver é que ali estava.
— É verdade o que disseram as testemunhas, Irina?
— Sim.
— Ameaçou de morte o capitão Cyril Roberts?
— Efetivamente, ameacei-o.
— Odiava-o muito?
— Com toda a minha alma.
Reg voltou-se repentinamente. Com uma rapidez extraordinária, brusca, de tal modo que sobressaltou a mulher.
— Não obstante, houve uma época em que o amaste, não? Houve uma altura em que aceitaste os seus beijos, em que cerraste os teus braços em torno do seu pescoço, em que aceitaste comprazida as suas palavras de amor, não é verdade? Responde!
A pergunta de Reg tinha sido brutal. Mas mais brutal era ainda o seu olhar fixo e obcecante. Irina, surpreendida, nem sequer foi capaz de imaginar o que aquele homem estaria pensando.
Mas Reg sim, sabia o que pensava. E o que naquele momento se passava no seu cérebro, horrorizou-o. Porque o facto único de pensar que Irina podia ter pertencido a Roberts fazia-lhe mal, o pensar que aqueles lábios tinham sido tocados por outro homem crispava-lhe a pele. Mas que lhe importava, finalmente? Não tinha sido a causadora da morte de John? Não havia veneno no seu maldito olhar, nos seus malditos beijos?
Cerrou os lábios. Tinha que tomar uma decisão rápida e enérgica, sem vacilações. Não mais adiamentos de processo por muito estranhas que lhe parecessem as declarações das testemunhas. Quanto antes Trina estivesse morta, tanto melhor. Com ela desapareceria a inconfessável tentação que agora o convertia num miserável.
— Houve uma época em que amei Ciryl Roberts — murmurou Irina, baixando o olhar.
— Parece-me incrível, vendo o teu aspeto, que possas já ter uma filha. E que conheças já todos os lados agradáveis e desagradáveis da vida. Mas, enfim, esse não é o assunto que nos importa. Não vim para te falar disso. Porque é que o teu advogado não faz uma defesa mais enérgica? Por que não apresenta uma única testemunha?
— Porque não existem em El Paso. Não tenho ninguém que possa declarar a meu favor.
 — Nem os teus parentes?
— Eles nada testemunharam.
Houve um curto silêncio entre os dois. E repentinamente, Irina perguntou:
— Que lhe importa tudo isto, senhor Sherman? A acusação não se apresenta favoravelmente? Ainda não tem suficientes poderes na sua mão para me enviar para a forca?
Reg voltou a morder os lábios.
— Não importa o que eu possa fazer. O único que importa é que acima de tudo eu devo seguir o caminho da justiça.
Era certo. As palavras tinham brotado do próprio coração de Reginald Spencer. Por muito que desejasse a morte daquela mulher, por muito que ela merecesse a forca, ele ansiava seguir o caminho da justiça. E nem a atitude das testemunhas nem a posição adotada pelo defensor lhe pareciam justas.
— Antes que o julgamento recomece tenho que averiguar umas quantas coisas — disse —. Espero que te prejudiquem o suficiente para me livrar de escrúpulos. Boas-tardes, Irina.

(Coleção Califórnia, nº 1)

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