quinta-feira, 5 de junho de 2014

PAS317. O apelo irresistível


— Hulda!... Por que te ocupas dessas coisas? Johnny tem os seus defeitos... Todos os temos...
Meteu-lhe medo a forma como ela o fitava.
— Papá! Tu nunca chegarias a semelhantes extremos!
Jeff não respondeu. Pôs-se a olhar para outro sítio. Ela continuou, inflexível:
— Papá... Disseste que se Lester se atreveu naquela noite a vir pedir-te contas, é porque conhecia alguns dos teus pecados... São desta natureza, papá? Tu também te comportaste como Johnny fez agora?
Fez-se um silêncio prolongado. Jeff levantara-se e pusera-se a passear.
— Hulda... Estas coisas não podem ser apreciadas assim à primeira vista e tendo presentes as nossas normas de proceder no mundo civilizado. Aqui, eramos, ao princípio, uns quantos homens, à mercê de todos os perigos... Esses índios não eram para nós outra coisa que um acidente mais, como foi o jaguar que vos saiu ao caminho... Pudestes vencê-lo e ficastes com a sua formosa pele. Se ele pudesse, faria o mesmo convosco…
Outro prolongado silêncio.
— Lester faz bem em querer esmagar-nos — opinou Hulda, com estranha entoação...
— Pode ser — respondeu Jeff. — Também nós não fazemos mal em procurar a sua eliminação. Sabes o que Johnny lhe prepara?
— Sei.
Jeff fixou-a com atenção.
— Lamentas?
— Julgo que já não é a hora de lamentar coisa nenhuma... Lembro-me que uma vez me disseste que os homens aqui não eram o mesmo que em Filadélfia. Nisso está a chave de tudo.
 — Exacto.
Hulda, lentamente, como se falasse sozinha, disse, enquanto se encaminhava para a porta:
— Mas as mulheres aqui também podem ser diferentes... A sua forma de obrar e de sentir pode diferir muito de como se comportariam numa cidade como Filadélfia...
Jeff teve um gesto de alarme.
— Hulda! Que queres dizer?
Voltou-se com lentidão, e sorrindo:
— Nada, papá... Maluquices... Boas noites...
Uma hora mais tarde, Jeff continuava mergulhado no seu trabalho. Apesar do profundo silêncio que reinava na casa, em alguns momentos a sua atenção dispersava-se. Em certos instantes julgou perceber sigilosos passos pela casa. Houve um momento em que esteve quase a levantar-se. Do seu cinto pendia um revólver, como nos seus primeiros tempos de colonizador. Mas não se mexeu. Tinha a certeza de que o «Jaguar» não teria a lembrança de aparecer pela terceira vez, e menos ainda naquela noite, em que coisas de maior importância o atraíam longe...
Johnny tinha-lhe preparado um bom engodo. Havia vários dias que uma caravana simulava vir do Sul com uma pesada carga. Fingiam que punham de parte as costumadas rotas da costa.
Os carros transportavam barris de cerveja e caixas de «whisky» e genebra. Com pouca gente a custodiar o comboio. Isto, pelo, menos, era o que parecia.
O plano era deixar arrebatar a mercadoria, oferecendo pouca resistência. O contra-ataque produzir-se-ia mais tarde, quando já o álcool tivesse provocado os seus efeitos.
Então, a um sinal que o próprio Johnny se encarregaria de dar, surgiriam homens armados de todos os lados.
A embriaguez dos índios seria inevitável. Lester não poderia impor-se aos que até então lhe haviam obedecido. Possivelmente, OS próprios índios se encarregariam da sua eliminação...
— É a sistema predileto de Johnny — murmurou Jeff.
De súbito ficou escutando, ao longe. Pareceu-lhe ouvir um rápido pisar de cavalo, próximo da casa. Mais ainda, no próprio jardim.
Mas nem mesmo assim se mexeu. Voltou a ocupar-se do seu trabalho e, de madrugada, fatigado, deixou-se cair no leito e mergulhar no sono.
Teve a sensação de que acabava de fechar os olhos quando ouviu fortes murros na porta. E, mal desperto, viu Janet na sua frente:
— A menina não está em casa, senhor!... Desapareceu!
(Coleção Bisonte, nº 62)

 

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