Susan correu para onde jazia Paul e ajoelhou-se a seu lado. Qual não foi a surpresa da rapariga ao ouvir a voz do jovem, que lhe falava em tom suave.
— Não se assuste, dissimule. Estou bem. Quem disparou?
— Branican — respondeu ela. — Obrigado. Parece-me que o ouço. Retire-se. Procure que não suspeitem de nada.
Hank sentara-se no solo ao ouvir o disparo, tal como Rude. Branican dirigiu-se lentamente, com o revólver na mão, para o lugar onde Paul estava caldo no solo.
— Branican! — gritou o gigante. — Que aconteceu?
— Myers, esse bastardo. Queria fugir e atirei contra ele.
Hank soltou uma praga. Ao ver que Branican se aproximava, Susan pôs-se em pé e afastou-se para um lado. O bandido ajoelhou-se junto de Paul. Então, o jovem, movendo velozmente o braço esquerdo, bateu-lhe em pleno rosto e derrubou-o de costas no solo.
Paul pôs-se em pé de um salto, no momento em que Branican se dispunha a disparar contra ele. A sua bota direita acertou no revólver do bandido e atirou-o a grande distância.
— E agora, maldito filho de uma cadela — resmungou, cheio de cólera —, vamos discutir qual dos dois é o traidor.
Agachou-se, antes de o surpreendido Branican conseguir defender-se, agarrou-o pela camisa e levantou-o com força. Depois, bateu-lhe com o punho em pleno rosto. Branican soltou um grito de dor, ao mesmo tempo que o sangue lhe brotava do nariz em abundância.
Paul estava bastante furioso, porque calculara que lhe disparariam um tiro de aviso, mas não a acertar, e a bala do bandido passara-lhe muito perto da orelha direita. Dois centímetros mais e estaria morto.
Castigou duramente o seu adversário, procurando deixá-lo bem marcado, mas ao mesmo tempo evitando que ele perdesse os, sentidos, a fim de aumentar a duração do castigo.
Golpeou-lhe os flancos até o deixar sem fôlego, e quando Branican baixou os braços para se defender, martelou-lhe o rosto sem piedade. Por fim, Branican recuou dois passos e levantou a mão direita.
— Basta, basta — arquejou lastimosamente.
— Devia matar-te — resmungou o jovem, e virou-se para Hank. — O grande canalha pensou que queria fugir. Mas que espécie de homens tens na quadrilha, Hank? Que estúpido, a não ser Branican, se lembraria de pensar que me ia embora, deixando as armas aqui abandonadas? — e indicou com o braço os dois revólveres que ainda estavam no solo, dentro dos coldres.
Hank olhou as armas, a seguir o jovem e depois Branican. Estava desconcertado e não sabia que fazer. Paul decidiu continuar a martelar o ferro enquanto estava quente.
— Quero que fiquem bem assentes as coisas de uma vez — disse. — Não fui eu quem avisou o xerife de Black Bear ou quem quer que fosse do lugar onde nos escondíamos. — Novamente afivelou o cinturão. — A partir deste momento não admitirei insinuações nesse sentido. O que mas quiser fazer que as faça depois de me dar um tiro, porque de outro modo, seja quem seja, matá-lo-ei como a um cão. Entendidos?
— Bom, bom — disse Hank, conciliador —, não te ponhas assim, rapaz.
— Vai para o inferno! — resmungou Paul, com mau modo. — Pensam que fui eu quem avisou os da lei. Nem sequer se lembraram de pensar que bem pode ter sido esse chefe oculto quem deu o «sopro».
Hank ficou pasmado.
— Paul, não digas isso.
— Digo-o e repito-o — resmungou o jovem. — E se te incomoda, tapa os ouvidos. Pertencem há muito tempo à quadrilha. Ele nunca se mostra, não é verdade? Isso significa que vive como uma pessoa decente. Já se cansou desta vida e quer suprimir-nos. Que coisa mais simples para ele, então, que denunciar-nos, anonimamente, claro, e dizer que estávamos na Cova dos Corvos? Vêm os da lei, suprimem-nos e o perigo de que o denunciemos um dia desaparece. E ele a gozar a vida, não é verdade, Hank?
— O chefe nunca faria uma coisa dessas, Paul! —exclamou o gigante.
—Tu não estás dentro da sua pele para o afirmar, Hank — respondeu o jovem. — De todos os modos, eu, pelo sim, pelo não, não me fiaria demasiado. São muitas casualidades.
Apanhou o chapéu, que ainda estava caído no solo, e sacudiu-lhe o pó. Depois retirou-se ostensivamente para um lado e voltou minutos mais tarde ao mesmo sítio.
Os três bandidos tinham regressado ao lugar onde haviam estado a dormir. Branican tapara quase todo o rosto com grandes nacos de carne de gamo, para tratar das feridas, pois nem sequer tinham água. Rude fumava tranquilamente um cigarro e Hank voltara a estender-se no solo.
Susan e Paul ficaram juntos. Calaram-se durante muito tempo, até que por fim ela disse:
— Parece que os convenceu, Paul.
— Pelo menos, Hank. Os outros já não me interessam tanto, acredite.
— No entanto, continuo a considerar que deve partir. Faça o que lhe digo, Paul.
— Não. Tenho de ir até ao fim, não compreende? Era uma quadrilha de nove homens, contando comigo. Só restam três e o chefe. Já falta pouco para cumprir a minha missão, e enquanto o não conseguir não posso falar de retirada.
— Que fará quando tudo estiver terminado?
— O seu primo encarregar-se-á de me reabilitar. Então voltarei a Big Creek.
—E casará?
— Naturalmente. Suponho que Linda me esperará.
— Sim — disse ela, com voz em que havia uma nota de desespero.
Paul desejaria confortar a rapariga, mas não encontrou palavras para isso. Era um problema tão difícil! Susan apaixonara-se por ele, mas ele continuava a amar Linda. Porque haviam de complicar tudo as mulheres? — interrogou-se, raivoso.
Linda empurrara-o para aquela vida, com as suas ideias intransigentes. Susan queria afastá-lo. Complicações e mais complicações, pensou amargamente. Ao chegar a noite, Hank disse:
— Vamos continuar o nosso caminho. Já perdemos demasiado tempo.
— Para onde vamos? — quis saber o jovem.
— Encontrar-nos com o chefe — respondeu o gigante, laconicamente.
Vários dias mais tarde, Hank deteve o cavalo num lugar do qual, muito ao longe, se divisava uma cidade. Os cinco dispunham de montadas e provisões, que haviam roubado de noite num rancho que encontraram de passagem. Com cavalos e carabinas, sentiam-se agora como novos.
Esperaram durante muito tempo, até que por fim divisaram um cavaleiro ao longe. Paul pensou o que lhe conviria fazer e disse para consigo que devia aguardar até dar o golpe definitivo. Se começasse de súbito aos tiros contra o chefe, os outros poderiam matá-lo e talvez também a rapariga; e a sua intenção era garantir o golpe de modo que não tivesse consequências funestas para ele. Quando o chefe chegou mais perto, Paul reparou que trazia o rosto tapado com um lenço. Em tom sarcástico, comentou:
— Isso é que o tipo confia em nós! E ainda por cima leva cinquenta por cento do que conseguimos...
— Cala-te! — redarguiu-lhe Hank, furioso.
O cabecilha desmontou a. poucos passos do quinteto. Aproximou-se deles e cumprimentou-os secamente:
— Olá.
— Como está, chefe? Aqui lhe trazemos o produto do assalto ao Banco de Black Bear.
— Onde estão os outros? — perguntou o bandido, secamente, sem ligar muita importância a Hank.
O rosto do gigante toldou-se.
— Chefe, os da lei assaltaram o local e mataram todos menos os que estamos aqui. Nós conseguimos fugir utilizando o túnel da mina abandonada. De contrário, não lhe estaria a falar agora, pode ter a certeza.
— Assaltaram o local? — repetiu o bandido, estupefacto.
— Exatamente, chefe. — Hank parecia diminuído perante o bandido. — Por estranho que lhe pareça, foi o que aconteceu.
O mascarado proferiu uma torrente de blasfémias Quando se lhe esgotou o repertório, disse:
—E quem foi o autor da denúncia?
Hank encolheu os ombros.
— Como quer que saiba, chefe? Bastante nos custou fugir e salvar a pele. Apesar disso, conseguimos salvar o roubo de Black Bear. Tenho-o aqui, na sela do meu cavalo. Quinze mil dólares para si...
A menção do dinheiro pareceu aplacar um tanto bandido. Este olhou para Paul, de repente.
— Vejo uma cara nova — disse. — Quem é?
Paul sentiu que o coração lhe pulsava aceleradamente. Procurou tomar um ar indiferente, mas manteve os músculos tensos, disposto a empunhar os revólveres ao menor gesto suspeito.
— Um bom amigo, chefe — respondeu Hank. — Encontrou-me em Stanton quando lá fui para receber as suas ordens. Um estúpido mineiro meteu-se comigo e se não fosse ele ter-me-iam liquidado. Garanto-lhe que tem uma pontaria magnífica e que se portou como os melhores.
O mascarado franziu o sobrolho.
— Como se chama?
Paul deu dois passos em frente.
— Escute, amigo — disse. — Quando se refira a mim, faça-me as perguntas diretamente, ouviu? Não sou um cão nem um cavalo, que não possa falar. Pergunte-me o nome, quer?
— Está bem — respondeu o chefe, surpreendido com a insólita atitude de Paul. — Considera feita a pergunta.
— Chamo-me Myers, Paul Myers. E você?
O mascarado sofreu uma espécie de sobressalto. Os seus olhos cintilaram.
— Parece-me que já ouvi esse nome noutra ocasião — observou com ar despreocupado.
— É possível — respondeu Paul, no mesmo tom. —Creio que anda por aí, em cartazes de recompensa. Matei dois tipos em Big Creek e tive de fugir, se é isso o que quer saber. Mas ainda não me disse o seu nome.
— Nem precisas de o saber. Para ti sou o chefe. Isso é mais do que suficiente.
Paul notou que o mascarado falava com voz forçada, como se quisesse disfarçar a verdadeira. Porquê? Pensou numa hipótese que, na sua opinião, tinha bastantes visos de verosimilhança. O mascarado era um homem que vivia de maneira respeitável e desempenhava um papel duplo: o de pessoa honesta e o de bandido. Graças ao primeiro, obtinha as informações que permitiam à quadrilha assestar os seus golpes de modo tão seguro como infalível.
Paul encolheu os ombros.
—Bom, de todas as formas, isso não é coisa que m tire o sono. Preocupa-me mais a forma como se reparte o roubo.
—Porquê? Que tens de objetar à divisão?
Paul decidiu que lhe convinha mostrar-se agressivo.
— Escute: você dá-nos as informações. Bom, isso merece uma boa recompensa. Mas, com mil demónios, nós é que corremos os riscos! Se os rapazes estivessem vivos, a mim caber-me-iam menos de dois mil dólares, ao passo que você, com as mãos limpas, leva quinze mil. E leva mesmo, porque Hank já separou a sua parte. Creio que devia pensar em fazer uma divisão um pouco mais equitativa, sem deixar de considerar, claro, que você continua a ser o chefe.
Pronunciou estas últimas palavras para suavizar um pouco as coisas e indicar que, apesar de tudo, continuava a ser subordinado, mas que fazia saber ao mesmo tempo o seu desacordo com a forma como se procedia à distribuição do roubo.
— Myers tem razão, chefe — interveio Hank. — Não nos importa que leve agora os seus quinze mil dólares, mas, de futuro, creio que deveríamos chegar a um acordo que beneficiasse um pouco mais os que efetuam os assaltos.
— Está bem — concedeu o mascarado, de má vontade — Convém-lhes trinta e cinco por cento para mim e o resto para vocês? É verdade que são vocês quem corre os riscos, mas não é menos verdade que se não fosse eu não teriam podido reunir uma fortunazinha.
— Aonde já vai o dinheiro! — queixou-se Hank. —Julga que dura muito nas nossas mãos? De vez em quando temos de nos divertir e isso não se podia fazer na Cova dos Corvos. As vezes íamos às cidades e então... E o que sobrava levavam-no as cartas, creia.
— Bom, bom — resmungou o mascarado —, isso já não é da minha conta. Que lhes parece o novo acordo?
Hank olhou para os companheiros. Branican e Rude encolheram os ombros. Paul resmungou qualquer coisa ininteligível, que se podia muito bem tomar por um assentimento às palavras do cabecilha.
— Está bem — declarou, por fim, o mascarado. — E agora prestem atenção. Temos de assaltar o Banco de Big Creek!
Paul estremeceu. Voltar a Big Creek! Como avisar Raymond?
— Assaltar um Banco?! — exclamou Hank. — Chefe, somos poucos, apenas três, não poderemos...
— Deixem isso por minha conta — respondeu o mascarado. — Esperarão exatamente uma semana. Conheço lá três ou quatro indivíduos que lhes darão uma ajuda por quinhentos dólares cada um.
—E como os reconheceremos nós?
—Não será perigoso. Eles cobrir-lhes-ão a retirada. São tipos ansiosos de ganhar alguns dólares, quanto mais quinhentos. Vocês assaltarão o Banco da forma costumada; do resto encarrego-me eu.
—O chefe estará lá?
— Claro. Mas vocês não me reconhecerão, evidentemente.
Hank consultou os companheiros com a vista.
— Quanto há no Banco? — quis saber Rude.
— Sessenta mil. Os meus trinta e cinco por cento representam uns vinte e um mil, de modo que a vocês caberão à roda de dez mil.
— Assim já está melhor — resmungou Branican. —Pela minha parte, e desde que tenha alguém que me cubra as costas, não tenho inconveniente em assaltar o Banco. Hank, que dizes?
— De acordo — resmungou o gigante.
— Suponho que não levarão a pequena — observou o mascarado, num tom que revelou a Paul que já conhecia a existência de Susan na quadrilha.
— Claro. Isso nem se pergunta, chefe — respondeu Hank.
— Bem, então vamos a combinar os pormenores do assalto.
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