quinta-feira, 30 de junho de 2016

PAS643. Um homem arrastado

Ed desceu à rua. Desprendeu o cavalo e caminhou em busca de uma pousada, sentindo sobre os ombros a ardente carícia do sol implacável.
E no coração uma opressão estranha.
Nelly...
Por ela cometera o acto mais ridículo da sua vida, ao pretender converter-se num homem honesto... Pobre Mel.
De súbito, aos ouvidos de Ed chegou uma algazarra. Gente que ria ruidosamente, enquanto um cavalo, galopando enlouquecido, arrastava uma estranha carga, irreconhecível devido ao pó que a cobria.
Era um homem.
Um homem arrastado por um cavalo.
Levantava densas nuvens de poeira.
Ed comprimiu os lábios. Não gostava daquilo. Con¬tudo, tinha coisas mais importantes com que preocupar¬-se, pelo que seguiu o seu caminho, enquanto o cavalo continuava a galopar, procurando livrar-se da sua carga.
— Senhor Harriman...
Ed tossiu.
Olhou para a sua esquerda. Era uma rapariga. E fazia-lhe sinais.
Com os olhos fixos naquele rosto juvenil, única parte do corpo da rapariga que estava visível, visto encontrar¬-se oculta numa porta, Ed aproximou-se lentamente dela.
— Senhor Harriman, sou a filha do xerife Gawky. Não posso suportar o que está a acontecer e...
Ed sorriu. Era muito bonita aquela rapariga. Tinha uns olhos enormes; muito negros. E a boca era perfeita sim; lábios rosados, lisos, juvenis.
— Que se passa, pequena? — interrompeu-a Ed.
— Es... estão arrastando o cadáver de seu irmão, mas...   

quarta-feira, 29 de junho de 2016

BUF115. Aqui vai a morte


(Coleção Búfalo, nº 115)


Mel ia casar e mandou recado ao seu irmão, Ed, para se dirigir a Everton, povoação a meio caminho entre Prescot e Phoenix, povoação dominada por pistoleiros e negócios sujos. Mel era detentor do único saloon e casa de jogo onde não se praticava batota e isso atraiu a ira e gula do cacique Hodges que o mandou matar para se apoderar do seu espaço.
À chegada a Everton, Ed deparou-se com o cadáver de Mel e com uma mulher, noiva deste, com quem já estivera relacionado. Compreendeu então a razão do chamamento a que fora submetido e rejeitou a reaproximação que aquela mulher pretendia. Depois, abateu pistoleiro a pistoleiro até vingar a morte de Mel.
Apesar de algum interesse, este livro de Mortimer Cody torna-se enfadonho talvez pelo estilo literário que o mesmo usou. Lido parte dele, compreendeu-se como se iria desenrolar e qual a menina com quem Ed haveria de ser feliz.

domingo, 26 de junho de 2016

PAS642. E nem o quinto condenado escapou

O xerife de Deadwood Gulch guardou silêncio, após ouvir as palavras que acabava de proferir o seu ajudante. Percorreu várias vezes e a grandes passadas o pequeno espaço do seu escritório, enquanto o outro permanecia imóvel, junto da secretária, a observá-lo.
— De modo que esse tipo repta-me para um duelo? — disse, de súbito, parando a meio do aponto.
— É verdade, xerife. Anda de taberna em taberna, bebendo e golfando insultos contra o senhor. Diz que se não o enfrenta como um homem, virá aqui arrancar-lhe as orelhas com a sua navalha.
— Maldito assassino!... — bramou o da estrela, começando a passear de novo, como um leão enjaulado. — Devia ter-lhe dado um tiro naquele dia em que matou Duke o «Suavp». Agora...
Calou-se e cuspiu para o chão.
— Tem medo de enfrentá-lo, não é verdade?
— De facto... Com todos os diabos! Como posso eu medir-me com esse pistoleiro profissional, mestre no manejo dos revólveres? Seria um suicídio!
— Está a beber mais do que a conta. Poderíamos esperar que se emborrachasse de todo e prendê-lo — insinuou o ajudante.
— Não adiantaríamos nada. Esse «Colorado», ou «Ne¬vada», ou lá como se chama, dispara tão bem com cinco litros de álcool no estômago como se apenas tivesse bebido água mineral.
— Então, o melhor que pode fazer é sair da terra e voltar depois de lhe passar a mania.
— E fazer figura de cobarde diante de todos?... Não! Que seria da nossa reputação como representantes da Lei? Ninguém nos respeitaria; passariam a rir-se de nós... E esta-terra converter-se-ia num covil de feras.
— De qualquer modo, já o é... Esses pesquisadores de ouro e os bandidos que infestam o distrito estão a tornar a terra em qualquer coisa muito pior.
Naquele momento ouviram-se na rua vários disparos de revólver, acompanhados de gritos estridentes. Depois, uma voz gritou:
— Sai do covil, «Cara de Abutre»! Não sejas cobarde e porta-te como um homem!
O ajudante do xerife correu para a janela e espreitou através dos vidros.
— Aí o tem — murmurou. — Não lhe sai da cabeça a ideia de matá-lo.
O representante da Lei mexeu-se, inquieto. Depois, tomando uma repentina decisão, puxou dos dois revól¬veres, verificou as suas cargas e tornou a metê-los suavemente nos coldres.
Hei-de cumprir o meu dever — disse com voz calma. — Não saias daqui, rapaz, nem intervenhas em nada, aconteça o que acontecer. Até logo.
— Boa sorte — desejou-lhe o outro.
Até que enfim apareces; «Cara de Abutre»! — exclamou o homem que se encontrava na rua. — Chegas a tempo de beber um trago — e agitou a garrafa. — A inda resta algum para te levantar o moral...
— Que desejas de mim?
— Temos tempo de falar nisso, «Cara de Abutre» — disse alegremente. — Não queres beber? Aproxima-te, homem, o «whisky» é do bom...
— Perguntei-te o que desejas de mim — replicou-lhe o xerife, com voz firme.
— Que cara mais comprida trazes, autoridade! — zom¬bou «Nevada». — Qualquer diria que vais assistir a um funeral...
Guardou a arma que tinha na mão e bebeu outro golo, sem olhar para o da estrela. Depois, acrescentou:
— Claro que, para dizer a verdade, em breve haverá um enterro: o teu ou o meu...
Por que queres lutar comigo? Para que voltaste a Deadwood?
— Já não se pode ter saudades das caras conhecidas?
replicou «Nevada». — Verás. Primeiro pensei entre¬gar-me à Lei, pela morte de Duke o «Suave»... Porque Duke o «Suave» não tinha consigo nenhuma navalha, nem coisa parecida, quando o mandei para o inferno. Já sabias, não é verdade?
Riu-se cinicamente. Como o xerife permanecia mudo, continuou:
— Também pensei entregar-me por outro delito que, estou certo, ignoras por quem foi cometido. Recordas-te da diligência que assaltaram há dois anos, perto de Cheycnne? Pois bem: eu era um dos homens do bando.
— Referes-te àquela em que assassinaram quantos levava, para roubarem o ouro?
Exactamente. O teu amigo «Suave» era outro dos assassinos.
— Disseste vir entregar-te por esses delitos?
— Mais devagar, autoridade. Ainda não acabei de falar... Como a dizendo, ao princípio, pensei entregar-me à Lei. Disse para comigo: «E quem melhor do que o amigo «Cara de Abutre», para me prender?» Por isso vim até cá. Mas...
Deteve-se, a fim de beber um novo trago de «whisky», porém o líquido acabara-se. Deitou a garrafa para longe
e disse:
— Que pena! Terei de comprar outra assim que acabar... Depois mudei de opinião — continuou, sorri¬dente. — Disse para comigo: «O teu amigo «Cara de Abutre» enforcar-te-á, se te entregares. Por que não o matas tu a ele por vingança? Tanto mais que, apesar dos teus vinte e dois anos, ainda não liquidaste nenhum xerife! Por que não experimentas com esse, que, ao fim e ao cabo, quer despachar-te a ti para o outro mundo?». Soltou uma gargalhada e terminou:
— Pura lógica, não é verdade?
O representante da Lei cuspiu com desprezo.
— És um miserável! — gritou. — Nunca julguei que um homem pudesse cair tão baixo... •
Houve um silêncio. «Nevada» Jim permaneceu imóvel
e sorridente. Nas uas pupilas notava-se um brilho estranho, que o da estrela não foi capaz de decifrar.
Vamos a isto, autoridade? — perguntou o jovem. — Tenho pressa: preciso de beber outro trago...
O representante da Lei sentiu a boca amarga. Sabia que era uma loucura o que ia fazer. Aquele homem era demasiado rápido... não obstante, acabou de descer os degraus e avançou lentamente ao encontro do rapaz. Por fim parou a dez passos dele, debaixo do ardente sol do meio-dia.
— Podes puxar quando quiseres, «Cara de Abutre» — disse Nevada. — Dou-te vantagem.
Decorreram lentos vários segundos.
De súbito, na mão direita de «Nevada» apareceu, como que por artes magicas, um «Colt» que vomitou chumbo contra o da estrela. O chapéu deste voou pelo ar e da garganta do agressor brotou uma ofensiva garga¬lhada.
Então, não to decides? — gritou-lhe, guardando outra vez a arma. — Contarei ate três, e se entretanto não tirares as armas, dispararei eu. Mas desta vez não será contra o chapéu... Um... — começou a contar «Nevada».
O xerife de Deadwood Gulch disse para consigo que chegara o momento. não esperaria que o seu rival continuasse a contar.
Velozmente, aproximou a mão do quadril, agarrou na coronha do revólver, sacou-o e puxou para tris o percutor. Uma fração de segundo mais tarde, apertava o gatilho, após apontar ao corpo de «Nevada». Soou a detonação e o rapaz levou as mãos ao peito e caiu de joelhos sobre o p6 da calçada.
O xerife abriu os olhos assombrado. não queria dar crédito ao que presenciara. Porque «Nevada» Jim não movera nem um só músculo para defender-se!
Com o «Colt» na mão direita, aproximou-se a grandes passadas do corpo tombado. Mas antes de chegar junto dele, parou. «Nevada» Jim soerguera-se e olhava-o fixamente através do esgar de dor que lhe arrepanhava o rosto.
— Ainda não me... mataste... de todo murmurou. — Por que esperas?
Mas o representante da Lei não lhe ligou importância. Guardou a arma que empunhava e tornou a fazer menção de aproximar-se. Então, na mão do jovem apareceu um revolver, que lhe apontou ao peito.
Dispara outra vez... «Cara de Abutre»...! — exclamou. — Dispara... ou disparo eu...
—.Que tencionavas conseguir com esta comedia, rapaz?
A voz do representante da Lei suavizara-se um pouco.
— Dispara... xerife! — gritou de novo, com raiva.
— Acaba... de uma vez!
— Nunca farei isso — respondeu-lhe o outro. — não sou um assassino.
— Fá-lo-ei eu... então — gaguejou «Nevada», com os olhos brilhantes.
Levantou a arma a altura do peito do xerife, ao mesmo tempo que o percutor saltava para trás. O da estrela, inconscientemente, voltou a tirar o revólver e dirigiu o seu negro orifício para o corpo do caído. Os dois homens olharam-se fixamente, procurando adivinhar os seus pensamentos.
— Larga esse «Colt», «Nevada». não terei outro remedio senão matar-te, se não me obedeceres...
Foi então que apareceram no extremo da praça dois cavalos a galope, que avançaram para o grupo formado por «Nevada» e pelo representante da Lei. Ao chegar perto de ambos, um dos cavaleiros saltou para o solo velozmente e correu direito ao ferido.
O xerife ficou surpreendido por tão estranha aparição. Porque a pessoa que acabava de desmontar era uma rapariga, e o seu companheiro um pele-vermelha de forte musculatura e de aspeto arrogante.
A jovem inclinou-se para o solo, junto do corpo de «Nevada», e abraçou-o convulsivamente.
— Jim! Oh, Jim! — exclamou, com os olhos brilhantes de lágrimas.
— Maria!
— Oh, Jim! Por que fizeste isto? Porquê?
Era... era o meu dever — respondeu-lhe, num fio de voz. — Tinha de fazê-lo... porque... estava condenado...
Uma brusca contração de dor agitou-lhe o corpo. Fechou os olhos e a cabeça pendeu-lhe para trás, exangue.
Maria Nielsen abraçou-o com força e soluçou desesperadamente:
— Jim!... Jim!...
 
 
 
PS: O desespero de Maria Nielsen era total. Teria Jim, o quinto condenado, sido abatido? Para o saber, leia na totalidade «O quinto condenado» que disponibilizamos em Novelas do Oeste Distante

sábado, 25 de junho de 2016

PAS641. Um filho que regressa

Contexto da passagem: na sua aproximação à família Nielsen, «Colorado» Jim descobre que eles anseiam por encontrar um filho da sua idade raptado pelo chefe índio «Pluma Negra» quando era criança. Partiu à sua procura, depois de um conjunto de peripécias, trouxe-o à família de sangue, mas o grande chefe não se deu por vencido e atacou o rancho dos Nielsen.

 
 
Foi tudo tão rápido que «Nevada» Jim nem teve tempo de reagir.
No mesmo instante em que Alex Nielsen caiu atravessado pela lança de «Pluma Negra», vários peles-vermelhas entraram sorrateiramente em casa, pelas traseiras, e dominaram com as suas armas quantos se encontravam no salão principal, junto à porta.
«Nevada» sentiu nas costas a forte pressão de uma lança que se lhe cravava na carne e desistiu da ideia de puxar do revólver.
Após o trágico silêncio que se seguiu à morte do dono do «Três Cruzes», rebentou uma espantosa algaraviada de uivos e gritos, por todos os lados, em sinal de vitória.
«Pluma Negra» permaneceu imóvel, apesar disso, de olhos postos em «Falcão Vermelho», também quieto no seu lugar, diante dele, em atitude orgulhosa.
De súbito, o chefe índio ergueu o braço e o silêncio restabeleceu-se. Alguém voltou a colocar-lhe outra lança na mão, que ele apertou com força, ao mesmo tempo que se aproximava mais do grupo.
«Nevada» Jim, que estava agora junto de «Falcão Vermelho», retesou os músculos, à espera do desenlace. Sentiu-se, porém, surpreendido quando «Pluma Negra» se lhe dirigiu, em vez de ao outro rapaz.
— Quero ver de perto o teu rosto, homem branco — disse, iracundo. — Quer ver bem a cara do homem que vai morrer às minhas mãos dentro de momentos...
— Porquê, «Pluma Negra»? Por que motivo hei-de morrer? — murmurou com voz serena. — A minha missão consistiu apenas em restituir «Falcão Vermelho» aos seus verdadeiros pais.
— Esse homem — e o pele-vermelha apontou com a mão o cadáver de Alex Nielsen — foi um estúpido ao meter-se no caminho da minha lança. Porque o traidor do «Falcão Vermelho» morrerá também, e o seu sacrifício foi inútil.
— De acordo, grande chefe — admitiu «Nevada», com um cínico sorriso nos lábios. — Creio que de nada valeria tentar convencer-te. De qualquer modo, «Falcão Vermelho» e eu já nos considerávamos mortos, quando nos perseguiste na pradaria. Tivemos uns dias de indulto, e mais nada.
— Que tens a ver com esse homem? Quem te meteu na cabeça ires procurar o meu... «Falcão Vermelho»?
— Não pertenço ao «Três Cruzes», nem tenho nada a ver com nenhum dos seus habitantes — e a voz de «Nevada» tornou-se amarga, ao recordar-se de Maria. — Ajudei-os por... simples prazer. É possível que tivesse sede de aventuras.
— Vejo que és valente, homem branco. Não tens medo da morte?
«Nevada» Jim sorriu.
— Não. Podes matar-me agora mesmo.
Fez uma pausa e acrescentou:
— Se lamento tudo isto, é por ele — e apontou com um gesto «Falcão Vermelho». — Por mim, pouco me importa. Sou um assassino e um salteador de diligências que só merece a morte.
— Tens o coração maior do que a cabeça, não achas?
«Nevada» Jim encolheu os ombros e voltou a sorrir com cinismo.
— Por que não acabas com isto de uma vez?
«Pluma Negra» fitou o jovem atentamente. A lança ergueu-se na sua mão direita e ficou no ar, imóvel. «Nevada» Jim esperou, impassível, o golpe que não tardaria muito a fazê-lo passar deste mundo para o outro. Pensou na mãe e na senhora Nielsen. Que parecidas eram ambas a seus olhos!
«Pluma Negra» continuou imóvel. Durante vários segundos, permaneceu nesta atitude. Depois, baixou um pouco a arma que empunhava.
— Admiro-te, homem branco, pelo teu sangue-frio. És o primeiro que encontro diante da minha lança que não treme nem suplica.
«Nevada» Jim permaneceu com os olhos cravados no semblante do chefe índio, e disse, devagar:
— Quero dizer-te uma coisa, «Pluma Negra». Ouve a voz de um homem que vai morrer dentro de instantes. Se matas também «Falcão Vermelho», arrepender-te-ás toda a vida.
O índio acabou de baixar a lança.
— Julgas que o deixarei vivo no meio dos rostos--pálidos?! — gritou. — Queres que se sintam orgulhosos dele, da sua força, do seu poder...? Não! «Falcão Vermelho» é obra minha; fui eu que lhe dei tudo o que possui!...
— Tudo, menos o sangue.
— E que importa isso? Que é o sangue? Dei-lhe dezoito anos de existência a meu lado. Dei-lhe coragem, vigor, inteligência... Dei-lhe o principal num homem...
— E agora queres tirar-lhe tudo com uma lançada no peito...
— É um traidor!
— Nesse caso, mata-o de uma vez! — gritou-lhe «Nevada», enfurecido. — Mata-o e com ele morrerá também metade da tua vida! Mas ouve bem, «Pluma Negra»: «Falcão Vermelho» não é um traidor! Nunca renegou a tua raça. Veio aqui para conhecer apenas a verdade da sua vida. E, contudo, vocês perseguiram-no como a uma fera...
Fez uma pausa e acrescentou:
— «Falcão Vermelho» não procurou nunca defender a sua vida quando nos atacaram, «Pluma Negra». Inclusivamente, impediu-me de disparar contra os teus, antes de cair ferido por uma das suas flechas.
— É verdade isso, «Falcão Vermelho»? É verdade que jamais te viraste contra o meu povo, que nunca o renegaste?
O interpelado não respondeu. Mas fitou com mais altivez ainda o homem que até ali considerara seu pai.
— Não se defenderá, «Pluma Negra» — interveio «Nevada». Herdou o teu orgulho. O orgulho da raça índia. Porém eu não minto: não se virou contra o teu povo nem se portou como um traidor... E quando voltar à Grande Pradaria continuará a ser um mais entre os teus...
— Que dizes? — perguntou o índio, cujo tom de voz se adoçara. — Dizes que voltará para os meus, outra vez... por sua própria vontade?
— «Falcão Vermelho» é nobre, valente e fiel, como tu o fizeste. Estou certo de que, de vez em quando, montará a cavalo e partirá para a pradaria, a fim de visitar o seu pai. Não está muito longe. E «Falcão Vermelho» sentar-se-á junto de «Pluma Negra», à roda do fogo, como sempre fez.
— Dizes tudo isso — perguntou — para salvares a tua vida?
— Primeiro disse-te que não me importava de morrer. Agora disse a verdade, para salvar «Falcão Vermelho». Se quiseres, podes acabar comigo. Não posso opor a menor resistência.
Naquele momento, um dos índios aproximou-se a cavalo, velozmente, passou pelo meio dos companheiros que formavam círculo e deteve-se junto do chefe.
— Soldados! — exclamou. — Aproximam-se muito do rio!
— Vamos! — gritou «Pluma Negra» aos seus homens.
Cravou depois a lança em terra e aproximou-se de «Nevada» com a mão direita estendida, enquanto os índios se preparavam para a retirada.
— Desejo apertar-te a mão como fazem os homens brancos — disse. — Encontrei quem me fez ver claro e me impediu de cometer uma vil ação. Que o Grande Espírito te guarde.
«Nevada» Jim correspondeu à saudação, comovido.
— Vai com Ele — respondeu.
Depois «Pluma Negra» aproximou-se de «Falcão Vermelho», devagar, e fitou-o intensamente. Era de novo o olhar de um pai para o seu filho.
— Até à vista, «Falcão Vermelho» — murmurou.
— Até breve... pai — respondeu, por fim, o interpelado.
O pele-vermelha girou então sobre os calcanhares e montou de um salto o seu cavalo. Depois, soltou um grito estridente e partiu veloz em direção oposta à que traziam os soldados. Os homens da sua tribo abriram-lhe caminho e seguiram-no depois, a galope.
 

sexta-feira, 24 de junho de 2016

PAS640. Coração de mãe nunca se engana

Não havia nada visível à roda da casa. «Nevada Jim deu de beber à sua montada num tanque alimentado pela água que saía pelo extremo de uma comprida oxidada tubagem. Prendeu depois o animal a um dos ganchos da parede e sacudiu o pó do fato.
A seguir dirigiu-se para a cozinha, situado numa das pontas do edifício.
Ao aproximar-se da porta, distinguiu as costas de uma mulher que, a julgar pela sua esbelta e graciosa figura, devia ser muito nova. Uma cascata de compridos e negrís­simos cabelos caía-lhe pelos ombros, convertida numa grande trança.
— Há de comer? — perguntou.
A rapariga virou-se, sobressaltada. Uns belos olhos de um azul intenso, que contrastavam agradavelmente com a sua tez morena, fitaram o intruso, assustados por um segundo. Mas um momento depois, a jovem já se tinha refeito.
Coube a vez a «Nevada» Jim de sobressaltar-se, ao contemplar o maravilhoso rosto dela. Por Deus, que bonita e formosa mulher!
Convertendo o seu pensamento em palavras, disse:
— De que parte do céu caíste, minha jóia?
Ela, ao contrário do que Nevada esperava, sorriu satisfeita.
— Descasque essas batatas — ordenou, pondo-se séria de repente; e apontou com um gesto um balde cheio a deitar por fora de grandes tubérculos. — Depois comerá.
«Nevada» Jim entrou com ar displicente e tomou lugar numa cadeira, às cavaleiras, perto da rapariga. Contemplou-a fixamente, como que extasiado, e sorrindo por sua vez, enquanto ela continuava a trabalhar junto das tachos.
— Se quer comer, descasque essas batatas — repetiu a jovem.
— Fugiu-me o apetite, riqueza... — murmurou ele — A propósito, como te chamas?
Ela virou-se e olhou-o no rosto.
— Procura trabalho, não é verdade? — perguntou, sem fazer caso do que ele dissera. — Pois bem: o capataz não está e meu pai também não. Portanto, terá de esperar que regressem. Agora vou chamar a...
— Um momento, jóia. Como te chamas... por favor? — pediu «Nevada», desta vez em tom menos cínico.
A rapariga guardou silêncio durante um momento. Por fim, disse:
— Maria.
— Maria — repetiu ele, parecendo acariciar o nome ao pronunciá-lo.
De súbito, dando ouvidos a um repentino pressenti­mento, acrescentou:
— Maria, quê?
— Nielsen — disse ela.
«Nevada» Jim pestanejou, dececionado.
— Nesse caso, és filha de... do dono de tudo isto, não é verdade?
Ela assentiu, um pouco divertida, no íntimo, ante a súbita confusão do rapaz.
— Agora — falou a jovem, de novo — permite-me que lhe pergunte o seu nome? Creio que o seu dever era apresentar-se primeiro...
— Chamam-me muitas coisas — replicou ele, voltando a ser o homem cínico que entrara na cozinha. — Por exemplo, agora há uma temporada que me chamam «Nevada». Em diversas ocasiões dei pelo nome de «Texas». Outras vezes pelos de «Risonho», «Kid», «Arizona»... E, após um segundo de pausa, acrescentou, com um brilho estranho nos seus frios olhos azuis: — Em certa ocasião chamaram-me «Colorado»...
A jovem voltou-se, com um prato cheio de comida, e depositou-o numa mesa, ao lado do rapaz.
— E como deseja que o chamem?
— «Nevada» — replicou ele, sorrindo. — Gosto mais deste nome do que de qualquer outro. Ainda que, dos teus lábios, prefira ouvir o meu verdadeiro nome: Jim.
Pegou numa colher e começou a comer com verdadeiro apetite. Ela observava-o com curiosidade.
— Quando vem o teu pai? — perguntou ele, com a boca cheia, olhando para o prato.
— Não sei. Foi a Dodge City com uma manada de reses para vender. Pode demorar-se ainda uma semana ou um mês. Depende.
Fez-se um silêncio. Maria Nielsen permaneceu de pé, diante de «Nevada», observando-o detidamente. Por fim disse:
— Qual é o seu apelido? Porque não creio que se chame Jim, apenas, sem mais nada...
«Nevada» olhou-a por cima do prato e acabou de comer o que tinha na boca. Uma ideia súbita atravessou­-lhe a mente, e dispôs-se a pô-la em prática sem pensar mais. Pousou a colher junto do prato e limpou a boca com um guardanapo. Depois, disse:
— O meu apelido? Não tenho nenhum. Nasci com o nome de Jim, somente.
— Mas você... Você tem que... — a rapariga interrompeu-se, temendo haver começado a tocar num ponto desagradável ao seu interlocutor.
— Queres dizer, jóia — continuou ele — que devo ter vindo ao mundo com um pai e uma mãe, não é verdade? Pois bem: não foi assim. Nasci de uns coiotes, lá longe, na Grande Pradaria dos «sioux».
— Está a brincar comigo?
— Oh! Não! Deus me livre de fazer tal coisa com uma rapariga tão bonita como tu...
Calou-se durante um segundo e acrescentou, dando forma mais verosímil às suas explicações:
— A verdade é que as minhas primeiras recordações da infância datam do tempo em que vivi com os índios. Creio que a minha meninice foi demasiado triste para que te aborreça com a sua história. O certo é que não me lembro de haver nunca tido pai e mãe. Os meus amigos e companheiros de brincadeiras daquela época foram os cães que pululavam em torno das tendas dos «sioux»...
— Mas você não é índio...
— Também acho... — replicou ele, sorrindo.
Calou-se e começou a fazer um cigarro, tranquila­mente.
— Quer continuar a contar-me a sua vida? — pediu ela, com voz ansiosa. — Não tem ideia de como caiu nas mãos dos selvagens?
«Nevada» Jim acabou de acender o cigarro e fitou-a nos olhos através do fumo. Adivinhou no mesmo instante o que Maria Nielsen pensava, isto é, precisamente o que desejara lhe ocorresse. Mas ao ver as suas límpidas pupilas brilhantes de ansiedade e de incredulidade, arrepen­deu-se de ter introduzido naquela cândida alma a esperança de haver encontrado o irmão perdido.
Contudo, era tarde para voltar atrás. Esforçou-se por dar ao diálogo novo rumo e, com o seu sempiterno ar de indiferença, disse:
— Não te parece que já falámos bastante de mim? Por outro lado, desagrada-me recordar tempos passados. Falemos agora de ti. Sempre viveste neste rancho tão belo?
— Não, dantes não era assim — replicou ela enfadada pela brusca mudança de conversa. — O paizinho encontrou um grande jazigo aurífero nas Montanhas Negras e  explorou-o até ao último grão de pó. Pudemos ampliar o nosso antigo rancho, até convertê-lo no que é hoje...
Deteve-se um instante e dirigiu-se precipitadamente para a porta da cozinha:
— Volto já — disse. — Espere um minuto, por favor. Não se vá embora.
«Nevada» Jim viu a rapariga desaparecer, veloz. Onde demónio iria? Começaria a crer que aparecera o irmão perdido? Agitou-se, inquieto, na sua cadeira e olhou para a porta pela qual acabava de desaparecer Maria.
— Em bom sarilho meti esta pobre rapariga! — exclamou.
Depois sorriu e, após encolher os ombros, recostou-se no assento, cujo espaldar encostou à parede. Deitando o chapéu sobre os olhos, dispôs-se a esperar que ela regressasse.
Vinte minutos mais tarde, Maria Nielsen voltou à cozinha.
— Venha. Venha comigo — pediu-lhe, mal entrou. «Nevada» Jim mexeu-se na cadeira.
— Aonde? — perguntou-lhe tranquilamente.
— Não veio à procura de trabalho? — notou-lhe ela, com voz agitada. — Pois bem: na ausência de meu pai, pode tratar do assunto com a mãezinha. Acabo de falar­lhe de si e quero que vá vê-la... Temos falta de homens no rancho, agora, compreende?
— Perfeitamente.
«Nevada» Jim seguiu a rapariga. Num pátio interior do edifício principal, adornado em estilo mexicano, Maria Nielsen deteve-se e virou-se para o jovem.
— A mãezinha está paralítica desde há tempo, sabe? Além disso, não goza de boa saúde... Gostaria... gostaria que você fosse com ela... um pouco... cortês.
— Compreendo. Falarei o menos possível, para não dizer asneiras. Não é isto que quer?
— Mais ou menos — sorriu ela. — Desejo que se não mostre tão... pouco amável como comigo.
Sem esperar resposta, Maria aproximou-se lentamente de uma porta do pátio. «Nevada» Jim seguiu-a. Ela abriu e entrou.
— Passe, Jim — disse; e, dirigindo-se a alguém de dentro, acrescentou: — Mãezinha, este é o rapaz de que te falei.
Quando os olhos de «Nevada» se acostumaram à penumbra do local, viram uma mulher que jazia numa cadeira de inválidos. A seu lado, de pé, estava já Maria, que lhe sorriu, animando-o a aproximar-se.
O jovem avançou alguns passos, contrariado de estar ali. Começava a repugnar-lhe o que estava a fazer. Naquele momento, teria preferido encontrar-se a muitas centenas de milhas daquela sala. Custava-lhe ímprobo trabalho continuar aquela comédia.
— Como está, minha senhora? — perguntou com dez.
Quis prosseguir, adotando o mesmo ar de indiferença que sempre o havia caracterizado, mas não pôde. Começou a tremer. Os olhos da senhora Nielsen eram iguais aos da rapariga: azuis, luminosos, tão límpidos e cristalinos que «Nevada» conseguiu ver através deles a alma da mulher. O seu cabelo era também negro, como o da filha. No rosto da inválida notavam-se claramente os traços da sua ascendência mexicana.
— Vens então à procura de trabalho? — falou, com voz suave, a senhora Nielsen.
— Exactamente, minha senhora.
«Nevada» Jim sentia pesar-lhe agora o par de revólveres que tinha à cintura. Parecia-lhe uma espécie de sacrilégio ter entrado naquela sala com eles à vista. Começou a sentir uma inexplicável devoção pela mulher que tinha na sua frente. Estaria a apiedar-se dela pelo muito que devia ter sofrido desde que lhe roubaram o filho? Ou seria, talvez, por já estar vendo no seu pensamento a terrível deceção que receberia quando se descobrisse a verdade?
— Chamas-te Jim, não é verdade?
«Nevada» assentiu.
— Quantos anos tens?
— Vinte e dois.
— Suponho que conhecerás o ofício de vaqueiro. O meu marido está ausente e levou consigo a maior parte dos rapazes. Agora temos falta deles e...
A senhora Nielsen, enquanto falava, observou com doçura o corpo esbelto que se erguia diante de si. Deteve os seus olhos no lenço vermelho que o jovem tinha ao pescoço. «Nevada» Jim voltou a estremecer ante o invisível contacto daquele olhar.
— Aproxima-te mais, Jim, se não te importas — murmurou a inválida. •
Ele avançou dois passos e ficou a poucas polegadas ao corpo da senhora Nielsen.
A mulher ergueu a mão direita, pálida e transparente, e aproximou-a do lenço. Devagar, foi descobrindo o pescoço do rapaz. A branca cicatriz em forma de estrela que lhe ficara desde a noite do assalto à diligência tornou--se visível. A mão que pegava no pano estremeceu quase impercetivelmente. «Nevada» Jim permaneceu imóvel, com todos os seus músculos tensos, incapaz já de prosseguir por mais tempo aquela repugnante farsa.
Houve um curto silêncio, durante o qual os mais desencontrados pensamentos desfilaram pela mente dos três reunidos. Por fim, rompeu-o a voz da senhora Nielsen:
— Podes ficar, Jim disse, — com voz que procurou tornar serena. — Maria apresentar-te-á ao resto dos vaqueiros.
Sem acrescentar palavra, «Nevada» girou sobre os calcanhares e transpôs a porta a grandes passadas, .a caminho do pátio. Já nele, parou indeciso, olhando à sua volta. Grossas gotas de suor começaram a cair-lhe pelo rosto.
— Raios!... — praguejou entre dentes. — Nunca pensei que...
Em breve ouviu atrás de si, procedente da sala que acabava de abandonar, a voz da senhora Nielsen, que exclamava:
— É ele, Maria, não há dúvida! É ele!... Bendito. seja Deus!
Não procurou continuar a escutar. Saiu velozmente do pátio, sem saber para onde dirigir-se. Estava a achar-se ridículo no meio de tudo aquilo. Ele, um homem duro, de alma curtida pelo constante contacto de seres sem sentimentos, chegara ao «Três Cruzes» disposto a matar um homem; e agora encontrava-se com o terrível problema da sua consciência, que lhe gritava como jamais fizera.
Que diabos lhe acontecera? Porquê tais escrúpulos na sua mente?
Aproximou-se do tanque dos cavalos e submergiu a cabeça nele, a fim de serenar o seu confuso cérebro. Enquanto a água lhe refrescava a fronte, tomou uma decisão: sairia do rancho logo que selasse o cavalo. E nunca mais voltaria a pisar aquele sítio. Depois procuraria outra solução para acabar de cumprir a sua vingança.
Mas quando se endireitou viu diante de si o rosto de Maria Nielsen, que lhe sorria. Havia tanta doçura e tanto amor oculto nas profundezas dos seus belos e límpidos olhos, que Nevada Jim compreendeu então que jamais poderia deixar de vê-los, ainda que fugisse para os confins do mundo.

quinta-feira, 23 de junho de 2016

PAS639. O juramento do quinto condenado

Com um amargo sabor na boca, «Nevada» Jim recor­dou aquela noite de dois anos antes, em que se juntara a Nielsen e a três dos seus compinchas, para assaltar a diligência de Cheyenne.
Por aquela data, não era conhecido por «Nevada» Jim nem pelo «Risonho», mas sim por «Colorado» Jim... Escolheram-no porque era mister disparar através da escuridão e em determinado momento contra um pequeno cartucho de dinamite colocado sobre uma caixa de explo­sivos. E não havia ninguém, muitas milhas em redor, que fosse capaz de tal façanha com segurança absoluta.
Não se quis desculpar a si mesmo quando pensou que não sabia que aqueles quatro homens projetavam assassinar à traição os ocupantes da diligência. Não, não se quis desculpar: era tão culpado como os demais, embora agora se amaldiçoasse por ter acedido a praticar tão vil Acão.
Tão-pouco sabia, ao ser contratado, que a diligência levaria uma escolta de soldados que também estavam sentenciados de antemão pelos assaltantes.
E menos ainda que uma das pessoas que viajavam no interior do veículo, e que também se encontrava conde­nada à morte, fosse... a sua própria mãe!
«Nevada» Jim apertou os punhos até fazer sangue nas palmas das mãos, ao recordar as palavras de Duke o «Suave», quando se aproximou da caixa da diligência e disse: «É uma velha, chefe!», e a atroz ação que se seguiu depois.
Foi então que se aproximou do veículo, com uma desculpa vulgar, para reconhecer a viajante. Porque aquele gemido que a mulher proferira mal se desfizeram os ecos da explosão, ou talvez a sua vaga silhueta depois, asso­mando pela portinhola entreaberta, fez-lhe vislumbrar a tragédia da sua vida. «Contribuíra para matar a sua própria mãe!».
A primeira coisa que os seus olhos viram, assim que se acercou do veículo virado, foi a cruz de ouro, tão sua conhecida de tempos atrás, quando ela vivia no Oeste. Depois o rosto da anciã, espantosamente destroçado pelas balas do «Suave»...
Ficou imóvel, como que petrificado, com todo o seu ser cheio de horrível angústia. Tinha-a assassinado!...
Não se moveu sequer, tão hipnotizado se achava, quando aquele passageiro que a acompanhava e que permanecera caído em grotesca posição, ergueu lentamente o revólver e lho apontou.
Teria podido antecipar-se-lhe e impedir-lhe o ato, mas nem o seu cérebro nem os músculos do seu corpo obedeceram à débil chamada do seu subconsciente. E o tiro foi desfechado quase à queima-roupa; sentiu o calor da pólvora no rosto e uma forte pontada de dor na garganta. Depois, perdeu os sentidos.
Recordava agora que estivera a um passo da morte. Os seus companheiros de aventura deviam tê-lo dado por morto, visto que, ao voltar a si, se encontrou só no mesmo lugar da tragédia e sangrando ainda. Amanhecia e à luz incerta da aurora divisou melhor os corpos sem vida amontoados em torno da diligência.
O seu instinto por um lado e o terror de ver-se próximo das suas próprias vítimas por outro, levaram-no a fugir daquele local sinistro. Apertando a ferida com o lenço e quase arrastando-se entre as rochas, afastou-se em busca da povoação que existia nas montanhas.
Chegou lá cerca do meio-dia, exausto e desfalecido, e foi tratado pelo médico da terra. Não lhe fizeram perguntas, pois ainda não chegara a notícia do assalto à diligência.
Duas horas mais tarde, «Nevada» Jim já saíra do distrito em direção às montanhas, onde ficou até encontrar-se totalmente curado da sua ferida.
Jurara solenemente então fazer justiça. Haviam sido cinco os homens que mataram a sua mãe: cinco vidas , pagariam por isso, incluindo a sua própria.
Durante o tempo que vagueou pelas montanhas, com a sua recente ferida de alma, muito mais dolorosa do que a que trazia no corpo, cinco homens foram condenados à morte. Ele, «Nevada» Jim, se encarregaria de fazer cumprir a sentença dos quatro primeiros. O quinto... morreria também.
Pouco tempo depois dedicou-se a procurar os assassinos.
 Porém a quadrilha tinha-se dissolvido e foi-lhe difícil dar com eles. Não obstante, após pacientes averiguações, acabou por encontrá-los, um atrás de outro.
Max Lowe, o primeiro condenado, fazia a corte, em Nevada, à jovem proprietária de um belo rancho, decerto disposto a casar com ela e de apoderar-se da sua fortuna.
Apesar de se considerar o mais rápido dos quatro, a «Nevada» Jim não lhe foi nada difícil enviá-lo para o outro mundo com duas onças de chumbo cravadas no coração.
Quando caiu morto a seus pés, a feroz gargalhada que brotou da sua garganta pôs os cabelos em pé a todos os que presenciaram o duelo.
A Ted Muldok encontrou-o a caminho da Califórnia, fugindo dos guardas rurais, que o perseguiam por ter degolado uma mulher. Ted e «Nevada» encontraram-se numa povoação fronteiriça e no meio da rua principal se realizou o duelo.
Mas este foi à navalha, que Muldok manejava muito bem e que escolheu para o efeito. «Nevada» Jim saiu da luta com uma profunda ferida nas costas, porém na poeira da rua ficou sem vida o segundo condenado, com a arma espetada no coração até ao cabo.
Perto de Deadwood Gulch, tivera lugar a tragédia que ensombrou a alma do rapaz. E foi na própria Deadwood que encontrou o «Suave», o autor material da morte que se empenhara em vingar.
Duke era perito no manejo das cartas e nenhum sítio melhor existia para si do que aquela terra onde chegava ouro em grandes quantidades, procedentes dos jazigos aurífero Montanhas Negras.
Quando «Nevada» Jim apareceu diante dele, o assassino negou-se a pés juntos a lutar. Conhecia demasiado bem a rapidez do jovem a puxar das armas e não se atrevia a enfrentá-lo. «Nevada», cego de ira, dominando a repugnância que lhe produzia uma morte a sangue frio, e sempre com o pensamento posto na sua vingança, disparou as seis balas do seu revólver contra o corpo do terceiro condenado.
Perto também de Deadwood Gulch, num pequeno outeiro rodeado de altas e frondosas árvores, tinham enterrado a sua mãe. Junto daquela campa, «Nevada» Jim abrira cinco sepulturas mais, da primeira vez que a visitara.
E para ali foi levando, um após outro, os assassinos que cumpriram a sua condenação. Jamais se importou que o lugar ficasse demasiado longe do sítio onde executara a sentença; infatigavelmente, galopava dia e noite, transportando o cadáver, até chegar ao ponto escolhido.
Quando deitou sobre o corpo de Duke o «Suave» a última pazada de terra e se afastou para Deadwood, apenas duas sepulturas restavam abertas: a de Alex Nielsen e a sua própria. A vingança chegava ao fim...
Agora, enquanto descia lentamente a encosta do monte, a caminho do edifício principal do «Três Cruzes», «Nevada» Jim saboreava o triunfo. Sabia que lá em baixo, atrás das paredes da casa, Alex Nielsen, o chefe dos bandidos, ignorava que a bala que lhe segaria a vida se aproximava inexoravelmente.
Aqueles dois tratantes, Grant e Sidney, ignoravam que, sem querer, lhe tinham indicado a pista do homem que lhe faltava descobrir.
Uma vez cumprida a sua vingança, o que pensassem de si ou o que fizessem não lhe dava cuidado.
Então, teria chegado a sua própria vez.

quarta-feira, 22 de junho de 2016

PAS638. Diligência destroçada por cinco facínoras

Um relâmpago iluminou todo o vale, fazendo ressaltar, nos seus mais pequenos pormenores, os contornos das montanhas, como se fossem desenhados a prata.
A mesma luz perfilou a silhueta de uma figura humana a cavalo, imóvel sobre um pequeno promontório, que no conjunto se assemelhava a uma rocha mais entre as que a rodeavam.
Não chovia. Mas os relâmpagos e os trovões sucediam-se ininterruptamente e carregavam a atmosfera de uma estranha opressão.
Passavam, lentos, os minutos. De súbito, a figura fez girar a montada e desapareceu, veloz, por uma das encostas do montículo. Em baixo, quatro homens aguardavam nas sombras, perto dos seus cavalos.
— Que há, «Colorado»? — interrogou um deles.
— Vem aí — replicou, um tanto nervoso, o que observara a paisagem.
— Em marcha, pois — prosseguiu a voz anterior. — E não se esqueçam das minhas instruções. Se as seguirem à letra, tudo sairá a nosso contento — e olhou significativamente o chamado «Colorado», como se a advertência fosse para ele só.
A uma indicação do que parecia o chefe, «Colorado» desmontou e prendeu a sua montada junto dos outros animais. Depois, os cinco homens, armados de carabina, puseram-se a caminho da curva da estrada.
Uma vez ali, afastaram um espesso matagal e puseram a descoberto uma pesada caixa, que arrastaram até ao centro do caminho.
— Pronto! — exclamou o chefe.
Segundos mais tarde, os cinco homens afastaram-se do lugar, onde deixaram o misterioso volume, e entrincheiraram-se atrás das rochas, de ambos os lados do caminho.
Silêncio.
O reboar de um longínquo trovão, na obscuridade da noite, misturou-se de repente com o tropel de passos de cavalos e o chiar das rodas de um veículo que entrava no vale procedente da planície.
O condutor gritou e fez estalar o comprido chicote sobre as orelhas dos seis animais que puxavam a bamboleante diligência. Atrás dela, vinham quatro soldados de escolta.
O condutor pareceu soltar um suspiro de satisfação quando o veículo entrou a grande velocidade na passagem entre as montanhas. Milha e meia mais e a cidade de Cheyenne estaria à vista.
— Maldito dia! — exclamou o homem, cuspindo sobre a cabeça do animal que tinha mais próximo um bocado de tabaco.
A bola mastigada deu na orelha do cavalo com precisão matemática e o condutor sorriu satisfeito. Apesar disso, voltou a exclamar, fazendo silvar o chicote no ar:
— Maldito dia!
Porque, com efeito, a jornada fora catastrófica para a diligência. Primeiro, haviam sido os índios, que durante várias horas perseguiram o veículo infatigavelmente, embora, graças à escolta que levavam, os malditos «sioux» não tivessem conseguido assaltá-los, como decerto era seu desejo; depois, sobreviera outro desastre: o eixo da roda partira-se e tivera de perder algumas horas a arranjá-lo. E a todo o momento com a constante preocupação do ouro que transportava, vindo do Banco provisional que se instalara em Deadwood Gulch, nas Montanhas Negras, e que todas as semanas transferia para Cheyenne, a fim de estar mais seguro.
Por outro lado, havia as duas mulheres que levava. A mais velha; parecia vir de muito longe, de Nova Iorque talvez, do «doce e tranquilo Este», como lhe chamava, com certo tom de desprezo.
A terceira pessoa do veículo apenas proferiu três palavras durante toda a viagem, e limitou-se a extrair o seu revólver de debaixo do seu impecável trajo, quando os índios perseguiram a diligência. Depois, com uma cortês desculpa dirigida às duas mulheres, meteu-o no coldre assim que deixou de ser preciso.
— Puf! Também do Este! — zombou o da boleia.
Pôs termo aos seus pensamentos mal lhe surgiu pela frente a curva da estrada. Com mão destra, pela muita prática, fez a diligência entrar nela sem abrandar a velocidade da marcha.
Foi então que viu muito perto, quase rente aos cascos dos dois primeiros cavalos, um volume que parecia uma rocha que se tivesse desprendido, ou qualquer coisa parecida.
Procurou conduzir os animais de forma que o obstáculo passasse entre as rodas.
Nessa altura, soou o primeiro tiro.
As paredes do estreito vale repercutiram surdamente, ao misturar-se o ruído de um potente estrondo com o horripilante estalido que se produziu debaixo das patas dos cavalos. Os animais, soltando relinchos de dor, caíram em confuso montão e arrastaram consigo a diligência, que ficou materialmente destroçada no breve espaço de pou­cos segundos.
A seguir ao estrondo, quatro carabinas dispararam em uníssono, e os quatro soldados da escolta caíram ao solo como se fossem fulminados por um raio, sem proferirem um só gemido.
Das sombras saíram precipitadamente os cinco emboscados, cujo cabecilha deteve por um braço o chamado «Colorado».
— Quieto! — gritou, puxando do revólver e indicando com um gesto a destroçada caixa da diligência. — Ainda respira alguém ali debaixo.
Efetivamente, uma figura negra debatia-se no interior, entre gemidos de dor, e procurava sair daquele caos. Um dos assaltantes, que assomou pela porta oposta àquela a que se encontrava «Colorado», soltou uma gargalhada ao observar o que se passava.
— É uma velha, chefe! — gritou; e fez três disparos consecutivos contra a cabeça da mulher.
Depois, os cinco bandidos atiraram-se velozes, como aves de rapina, sobre a diligência, e abriram as caixas que levava na parte superior, até encontrarem os saquitos de ouro, que passaram rapidamente para as suas montadas.
— Vamos! — ordenou o cabecilha.
— Um segundo! — exclamou «Colorado». — Talvez aí dentro haja também alguma coisa de valor que se não deva desperdiçar.
Abriu com dificuldade a portinhola e entrou, sem esperar o consentimento do chefe, rebuscou entre os três corpos sangrentos e arrancou da garganta da anciã um crucifixo de ouro preso a uma corrente.
Ia já a sair com a joia na mão, quando ficou imóvel, como que hipnotizado. A cruz caiu-lhe da mão e a alma pareceu fugir-lhe do corpo. O coração parou-lhe, sob o efeito do estupor que o dominou.
— Que demónio fazes aí há tanto tempo? — berrou­-lhe o chefe, aproximando-se do veículo.
Então, de dentro do carro saiu um estampido e o corpo de «Colorado» saltou violentamente para trás, com um grito horripilante. O cabecilha afastou-se com rapidez para um lado, a fim de «Colorado» não lhe cair em cima, e puxou do revólver.
No interior da diligência viu um tipo elegantemente vestido, com um «Colt» fumegante na mão direita, que acabava de disparar contra «Colorado». Rápido, o bandido fez fogo, e três balas raivosas cravaram-se no corpo do homem, uma das quais o alcançou na cabeça, que converteu numa massa sanguinolenta.
— Maldito! — rugiu com raiva surda.
Depois, aproximou-se do corpo de «Colorado» e virou-o de rosto para o céu.
— Não há nada a fazer a este — disse aos seus homens. — A bala atravessou-lhe a garganta. Está agonizante.
—Vamo-nos embora daqui — grunhiu um deles, inquieto. — «Colorado» era novato entre nós e escusamos de carregar com o seu cadáver. Não nos comprometerá quando o encontrarem.
O cabecilha concordou com um gesto.
— Levaremos a sua montada e acreditarão que era um viajante mais da diligência — disse. — Vamos!
Os quatro homens afastaram-se, levando consigo o cavalo de «Colorado» e cinquenta mil dólares de ouro em pó. Dirigiram-se para o Norte, na direção do Platte.
Assim que o transpusessem, a imensa pradaria engoli-los-ia e poderiam, assim, considerar-se libertos do peso mortal da Lei.

terça-feira, 21 de junho de 2016

BUF112. O quinto condenado

(Coleção Búfalo, nº 112)


«Colorado» Jim, também chamado «Nevada» Jim ou «Risonho» Jim condenou cinco homens à morte, porque na sequência do assalto a uma diligência onde viajava a sua mãe esta foi abatida. Próximo do local do ataque abriu 5 sepulturas e aí foi depositando os corpos daqueles de quem se foi vingando.
Acontece que «Colorado» era o quinto homem que participara no assalto sem saber que a mãe viajava na diligência. Ele próprio que levou um tiro dos viajantes, ficou ferido no próprio local, sendo tomado por um dos que foram atacados e foi tratado como um sobrevivente.
A procura do quarto condenado iria entroncar na estranha história de um jovem raptado pelos índios e criado por estes durante quase uma vintena de anos a quem o pai continuava a procurar. «Colorado» foi abordado por dois indivíduos sem escrúpulos para se fazer passar por esse jovem dadas as semelhanças entre ambos. Ao aceitar participar nessa farsa, acabou por encontrar o quarto homem e uma jovem que lhe fez mudar as intenções.
Dave Turner tem aqui um livro com uma história de desenrolar muito facilitado, mas com certa piada. Vale a pena lê-la para saber como «Colorado» se vingou de si próprio.

domingo, 19 de junho de 2016

PAS637. Encontro no panteão

Contexto da passagem: Amos, o velho vaqueiro que servia Rosemary e tinha assassinado a mãe desta, assassina o banqueiro Sutton e o rancheiro Stag, procurando ficar com o tesouro guardado no panteão. Mas após o seu vil ato, tem uma surpresa


Amos riu de maneira horripilante, ao ver os dois cadáveres estendidos no solo. Empurrou-os com os pés, verificando a sua definitiva Imobilidade. Meneou a cabeça.
— Tenho tempo — disse. — O narcótico que que lhes pus na ceia fá-los-á dormir doze horas a fio. Amanhã por estas horas estarei muito longe daqui, com meio milhão na bolsa.
Tirou do colete a chave do panteão e introduziu-a na fechadura, fazendo-a depois rodar. Ato contínuo, empurrou com as duas mãos os batentes da grade.
Permaneceu uns momentos imóvel sob o umbral da entrada. No interior do jazigo havia um túmulo de pedra, destinado evidentemente a conter o ataúde com os restos mortais da mãe de Rosemary.

sábado, 18 de junho de 2016

PAS636. Por vezes, a ajuda chega exageradamente cedo

A fazenda de Sage estava a umas vinte milhas, de modo que chegariam lá ao anoitecer, pelo que deveriam pernoitar ali antes de regressarem.
Mal tinham começado a caminhada, Henry viu, com não pouca surpresa, que a rapariga, vestindo roupas masculinas, se lhes juntava.
-- Pensei que talvez possam necessitar de ajuda — disse Rosemary.
Henry não fez o menor comentário, facto que pareceu dececioná-la. Todavia, também ela nada disse.
Era já cerca de meio-dia quando, de repente, ocorreu algo inesperado.
Cutts e Amos cavalgavam atrás da manada. Subitamente, duas reses espantaram-se e afastaram-se correndo.
— Vou alcançá-las — gritou Rosemary, picando esporas ao cavalo.
Henry separou-se uns metros das reses e logo se deteve. Contemplou a cavalgada de Rosemary atrás dos animais tresmalhados.
Os outros dois iam à cabeça da manada, um de cada lado. Continuaram o caminho, sem se preocuparem demasiado. Incidentes como aquele eram frequentes numa condução de tal natureza.
De repente, Henry viu que as duas vacas fugitivas se separavam, tomando direcç5es divergentes. Rosemary hesitou, decidindo-se enfim pela da direita.

sexta-feira, 17 de junho de 2016

PAS635. Ataque ao rancho

O tiro soou para os lados das traseiras da casa. Ambos voltaram, simultaneamente, o rosto naquela direção.
Repentinamente, um clarão vermelho penetrou pela janela desse lado.
— Estão a arder os telheiros! — gritou a rapariga, correndo para a janela.
Henry saltou para a frente. Por sobre as suas cabeças voltou a soar outro tiro.
Em baixo, dos currais, elevou-se subitamente um coro de mugidos.
— As vacas! — gritou o rapaz. — Vão ficar queimadas! Vou soltá-las!
E desatou a correr.
Saiu de casa, movendo as pernas com toda a velocidade possível. Mais dois disparos soaram por sobre o tumulto das reses.
Desceu a vertente a toda a velocidade. Um dos alpendres ardia já do chão ao telhado, iluminando a casa fantasmagoricamente.
Subitamente surgiu diante dele um cavaleiro. Os dois contemplaram-se alguns instantes, com maior surpresa por parte do homem montado que por parte do rapaz.
O cavaleiro levava na mão uma tocha, com a qual tencionava incendiar os outros edifícios adjacentes ao rancho.
Ao ver Henry lançou-lhe o archote à cara, tirando depois um revólver do coldre.

quinta-feira, 16 de junho de 2016

PAS634. Um fantasma visita o panteão

A claridade do luar permitia vê-lo em todos os detalhes. A uns quarenta ou cinquenta metros de distância, uma sombra branca passeava em frente do edifício.
Henry passou a mão por diante dos olhos. No primeiro momento julgou tratar-se duma ilusão de ótica, porém, uma nova observação, convenceu-o de que a silhueta branca era algo positivo e real.
— Pois bem — murmurou — o que é necessário determinar é se se trata de um espectro ou de uma pessoa em carne e osso.
Observou a silhueta uns segundos, vendo-a afastar-se em direção ao panteão. Caminhava lentamente, como se quisesse fazer uma demonstração da sua presença naquele lugar.
— Será a alma de Rosemary Jullien? —perguntou a si próprio, estremecendo de horror, mau grado seu.
Não se demorou mais. Procurou a porta de saída e, iluminando-se com fósforos, chegou à cozinha, saindo depois.
Olhou para o panteão. O fantasma continuava a andar, mas era evidente que o alcançaria em poucos minutos.

quarta-feira, 15 de junho de 2016

PAS633. O primeiro dia de um vaqueiro no rancho panteão

Henry olhou em redor. O teto, inclinado, era interrompido de vez em quando pelas saliências de três ou quatro janelas do tipo das de águas furtadas. Assomou a urna delas e distinguiu ao longe, destacando-se obscuramente à luz da Lua na lívida brancura da planície, a sombria massa do panteão.
Acudiu-lhe imediatamente uma pergunta aos lábios, mas, por prudência, absteve-se de formulá-la. Estava cansado e desejava dormir, de modo que, escolhendo um catre, despiu-se e deixou-se cair pesadamente, adormecendo no mesmo instante.
Despertaram-no quando o sol não tinha ainda nascido. A um canto, havia um lavatório com um jarro e uma bacia. Lavou a cara, passou o pente pelo cabelo revolto, descendo em seguida à cozinha para tornar o pequeno almoço.
Quando terminaram, Amos conduziu-o á cavalariça, onde selaram os cavalos, O velhote, para a idade e defeito que possuía era bastante ágil, o que demonstrou ao montar sem ajuda. Saíram do rancho a passo rápido. Amos indicou a rota e durante meia hora cavalgaram em silêncio. Ao fim desse tempo, depararam com urna manada de reses, cujo número o rapaz calculou em cerca de trezentas. Estava no fundo de uma ribanceira, pastando em ambas as margens dum riacho que corria entre frondosas árvores.
— São estas -- disse Amos, detendo o cavalo.
— Para onde as temos de levar?
— Para o rancho. Quando lá chegarmos, dir-nos-ão o que temos a fazer.

terça-feira, 14 de junho de 2016

CLF070. Rancho Panteão

 
(Coleção Califórnia, nº 70)


Será humor negro atribuir a designação de Panteão a um rancho? Neste caso, há razões imediatas, atendíveis, já que os anteriores proprietários tinham sofrido uma morte trágica e foram sepultados num local no seu interior que muito apreciavam.
Clark Carrados inicia mais uma vez uma obra a partir de um acontecimento que terá desencadeado a terminação de uma era ou geração e entretém-se em procurar as causas com as novas personagens.
A capa, não assinada, mostra o encontro destas com uma fera. E que assombro se revela em todas as expressões! Estará ali a chave do mistério?

quinta-feira, 9 de junho de 2016

PAS632. Terra para o meu filho trabalhar

A quatro milhas do acampamento, a vanguarda do «Run» continuava como um gigantesco rolo, galgando pela pradaria levantando uma enorme nuvem de pó.
As parcelas imediatas à linha de partida, pela sua proximidade da futura cidade que ali se levantaria, foram as mais cobiçadas e aquelas que causaram maior número de contendas. Os cavaleiros mais rápidos foram os primeiros a reclamar essas terras.
Levando vantagem aos carros e mais ainda aos homens que corriam a pé, os cavaleiros foram avançando e tomando as estacas brancas à medida que estas iam aparecendo. Detrás dos cavaleiros, os carros davam tombos sobre as desigualdades do terreno, chocando por vezes, voltando-se outras, mas seguindo em frente a maioria deles.
A fila de cavaleiros que Ed Parker levava na sua frente ia perdendo terreno à medida que a corrida se prolongava. Parker levava um bom cavalo e o seu carro ligeiro estava condicionado com molas muito flexíveis.
Quase de repente, a nuvem de pó desapareceu à frente do seu cavalo e Ed Parker viu-se isolado na vanguarda daquela tromba humana com todo o caminho livre à sua frente.
Parker não percebia nada de terras. Nunca tinha empunhado um arado, e tudo o que percebia do campo era que este produzia trigo, milho e muitos outros cereais e legumes que ele consumia diariamente. Mas tinha tido a preocupação de se informar. Tinham-lhe dito que as melhores terras eram as contíguas ao rio, donde devido à ação do tempo se tinha formado uma grossa camada de terra mole.
Parker voltou a cabeça. O competidor mais próximo era um cavaleiro que galopava um quarto de milha atrás dele. Parker conduziu a sua carruagem em direção do rio.
Não tardou em ver um pitoresco panorama onde as colinas, em suave declive, desciam até ao rio. Parker sabia que as terras um pouco altas eram preferíveis às que ficavam próximo do rio, pois em caso de cheia, estaria a salvo de possíveis e ruinosas inundações. O local era muito agradável, com algumas árvores o que facilitaria o trabalho de construir ali uma casa de madeira. Parker tomou resolutamente aquele caminho.
Quando Ed Parker passava junto das pedras com cal que marcavam o limite da parcela, apareceu um cavaleiro por entre as árvores e correu atalhando caminho em direção da estaca central.
Ed ficou surpreendido, por que a direção em que o cavaleiro vinha era contrária à que tinham tomado os participantes do «Run».
Naturalmente, Parker compreendeu que aquele indivíduo era um dos madrugadores que segundo as referências e conversas escutadas no seu «saloon», se tinham adiantado ao sinal de partida correndo a ocupar as terras indo assim contra as regras do «Run».
Ed Parker que como jogador profissional tinha orgulho em jogar honestamente, ficou indignado perante a audácia daquele sujeito. A parcela, ao fim e ao cabo, não lhe importava muito. Talvez houvesse outras tão boas como aquela em direção do rio, mas não estava disposto a que um malandrim como aquele lhe arrebatasse aquela terra que ele tinha conquistado lutando lealmente.
O homem, um jovem alto e loiro que levava pistola e um «rifle» na mão, gritou-lhe qualquer coisa que Ed não conseguiu entender. Os dois iam direitos à estaca e Ed chegou primeiro. O seu cavalo chocou com o do outro.
O cavalo do jovem caiu arrastando na sua queda o cavaleiro. Ed tinha ganho a corrida e saltou da carruagem para o chão correndo em direção da estaca. Mas quando chegou junto desta viu com raiva que já tinha uma tabuleta atada com um cordel. Era uma tabuleta com as letras gravadas a fogo e na qual se lia:

«PERTENCE A HARRIS DOOLIN»

Parker, com a sua tabuleta na mão, voltou-se furioso para o homem que nesse momento se levantava.
— Que significa isto? — gritou. — Estou certo de que você não tomou parte na corrida.
— Desapareça, estúpido! – gritou Doolin. — Esta terra é minha. Encontrará outras parcelas livres mais para a frente. Desapareça.
Voltando a cabeça para trás, Parker conseguiu ver o cavaleiro perseguidor que vinha seguido de um tropel de carros correndo ao longo do rio.
A vantagem que Parker tinha conseguido estava a ponto de se perder quando de novo subia para a carruagem e ia recomeçar a correr. Por quê havia de ser ele? Pelo menos legalmente tinha sido ele o primeiro a chegar.
Voltou-se para Doolin.
— Também há oportunidades para você, mais para a frente disse-lhe. Eu parti quando os outros e fui, o primeiro do «Run» a chegar aqui.
— Maldito, desapareça! – rugiu Doolin.
— Não.
Harris Doolin deitou mão à pistola. Ed Parker que, levava a sua na funda sovaqueira, introduziu a mão no casaco.
O tiro disparado por Doolin atingiu-o antes de que pudesse fazer uso da pistola.
Hiram Dugan que tinha vindo a seguir Ed Parker, durante umas quatro milhas, intrigado e curioso para ver o que fazia o seu inimigo, viu Doolin sacar a sua pistola e derrubar o jogador de um tiro quando ele chegava a um canto da parcela marcada por uma pedra coberta de cal.
Atravessando a parcela a galope Dugan chegou junto da carruagem de Ed Parker e desmontou com um salto.
Frente a ele, com os olhos injetados de sangue, estava Harris Doolin. Na mão, empunhava ainda a pistola homicida. Aquela teria sido uma boa ocasião para Doolin matar o polícia, se naquele momento não estivessem a atravessar a curta distância os carros dos colonos que iam em busca das suas terras.
— Está preso, Doolin — disse Dugan, friamente. — Sei que faltaste às regras do «Run» e apanhei-te a disparar contra Ed Parker.
— Maldito sejas, agentezinho — rugiu Doolin, entre dentes. – Para ti seria uma boa solução afastar-me mandando-me uns anos para a cadeia acusado de homicídio, mas isso jamais o conseguirás. Tu mesmo vieste colocar-te no lugar onde eu queria ver-te. Espero que sejas o suficientemente rápido para sacar teu revólver antes de cair morto...
Hiram Dugan advertiu o brilho homicida do olhar do seu inimigo e saltou de lado para a esquerda atirando-se ao chão.
Caiu suavemente sobre a relva alta e o tiro de Doolin levantou pó mesmo à frente da sua cara. Dugan tinha empunhado o revólver enquanto saltava e não concedeu ao seu inimigo uma nova oportunidade para melhorar a sua pontaria.
Dugan disparou do chão e Harris Doolin girou sobre si mesmo soltando a pistola para procurar apoio na estaca.
A estaca cedeu ao peso de Doolin, o qual rolou pelo chão.
Com grande estrondo de rodas um carro passou junto a Hiram deitando fumo pelos eixos. O carro afastou-se e Dugan ficou de novo só com os dois homens estendidos aos seus pés.
Primeiro inclinou-se sobre Harris, estava morto. Endireitando-se aproximou-se de Ed Parker.
O jogador abriu os olhos e cravou nele o seu olhar turvo.
Hiram enfundou o seu revólver, ajoelhou junto do ferido inclinando-se sobre ele. Sobre o colete de cetim branco, Ed Parker tinha uma mancha vermelha sangrenta que se ia alargando lentamente.
— És tu, Dugan — perguntou o ferido.
— Sim, Ed. Sou eu, Dugan. Vim a seguir-te desde a hora de partida. Queres dizer-me porque encontras aqui?
Parker tateou com a mão procurando algo que devia estar no chão perto dali.. Hiram viu uma daquela-, tabuletas, sobre a relva e apanhou-a. Era igual às que os colonos levavam presas ao pescoço.
-- «PERTENCE A ED LANGSTON PARKER» - leu Dugan, em voz alta.
Mostrou-a ao ferido. Será isto o que procuras, Ed? Como demónios te passou pela cabeça vir conquistar um terreno para ti? Não imaginava que tivesses tendência para colono.
— Podes troçar quanto quiseres. Não foi por mim que conquistei estas terras, mas sim por Bird.
— Por Bird?
O ferido fez uma pausa, na qual só se escutava a sua respiração ofegante.
— Na minha movimentada vida de jogador nunca senti a necessidade de ter uma casa própria —disse Ed. — Para mim era o suficiente um tecto, às vezes mesmo uma simples lona, debaixo da qual descansava umas horas sem me preocupar pelo dia de amanhã. Só agora que me sinto velho reconheço a instância da minha vida anterior. Um homem necessita de algo mais do que viver o presente. Um homem necessita possuir algo exclusivamente seu... Algo que o faça sentir-se seguro de si mesmo e lhe permita afrontar com segurança o futuro. Na minha vida de jogador nunca possuí nada que pudesse legar a um filho. Por isso decidi hoje aproveitar esta oportunidade de reclamar estas terras como minhas. Bird é demasiado jovem para as reclamar por si só. Soube, porém, que segundo a lei, eu posso reclamar uma destas parcelas e doá-la a meu filho...
Um ataque de tosse interrompeu Ed Parker. Dugan passou-lhe um braço por trás da cabeça e susteve-o.
— Obrigado, Dugan — murmurou o jogador, fazendo uma careta de dor. — Como vês, esse maldito colono libertou-te da tarefa de me matares. Dugan admitiu que a julgar pela freida de Parker era natural que isso acontecesse. «O mundo, pensou Dugan, dá voltas sem parar e conduz os homens às situações mais estranhas. Ali estava, por exemplo, Ed Langston, mori-bundo sobre a terra que nunca até umas horas antes tinha desejado possuir». Dugan, achas que se eu morrer sem ter feito testamento, Bird poderá ser meu herdeiro no posse desta terra? — perguntou o ferido.
Silenciosamente, Hiram Dugan, depositou a cabeça de Ed na relva, agarrou a tabuleta onde figurava o nome completo de Parker e afastou-se com ela. Hiram arrancou da estaca a tabuleta com a marca de Doolin e utilizando o mesmo cordel pôs no seu lugar a de Ed Langston. Desde o local onde se encontrava, Ed seguiu com os olhos a operação, sentindo um profundo reconhecimento.
— Agora, sim, Langston —disse Hiram. — Esta terra será para Bird.
 

quarta-feira, 8 de junho de 2016

PAS631. A grande corrida

Doze horas em ponto. O capitão levantou o braço e disparou.
Como se fosse o eco do disparo do capitão uma série de disparos crepitou ao longo da linha de partida. Ouviu-se um só e formidável alarido: o de mil gargantas que ao mesmo tempo gritavam aos seus cavalos pari os animar a empreender o galope.
A corrida começou.
– Avante! gritou Hiram Dugan, esporeando o seu cavalo.
Toda a linha de cavalos se pôs em movimento ao mesmo tempo. Ouviu-se um troar ensurdecedor. O terreno tremia sob os cascos dos cavalos e as rodas dos carros lançados em furiosa corrida. Cavalos, homens e carros quase desapareceram no meio da enorme nuvem de pó que avançava em forma de onda através da pradaria, abrindo-se em leque. O «Run» tinha começado.
No meio desta espantosa confusão viu-se um cavalo cair e arrastar na queda o seu cavaleiro. Dois carros engataram as rodas e voltaram-se com grande estrondo. À direita de Hiram Dugan, um carro puxado por quatro cavalos ia dando tombos sobre os lombos do terreno, fazendo balançar os móveis e utensílios com endiabrado barulho.
Nenhuma manada de búfalos, nos tempos em que aquela pradaria fora atravessada pelas hordas destes animais, levantara tanto pó nem fizera tanto barulho como esta carga furiosa e selvagem de homens e cavalos. À sua esquerda, Hiram Dugan, o agente federal destacado para garantir a legalidade dos resultados, via avançar a vanguarda daquele exército desordenado e indisciplinado. As primeiras estacas surgiram perante os seus olhos. Os cavaleiros galoparam para lá.
Um homem a cavalo chegou ao mesmo tempo que um colono chegava com o carro. Os dois avançaram ao mesmo tempo para a estaca. Os dois saltaram em terra e encontraram-se frente a frente. Um deles correu para a estaca levando a tabuleta. O outro cortou-lhe o caminho derrubando-o com um formidável soco.
Entretanto, um dos carros que vinham atrás, chocou violentamente com o carro que estava parado junto da estaca... Hiram Dugan nunca chegou a saber como aqueles homens resolveram a contenda. O pó envolveu-os e ele continuou a galope.

terça-feira, 7 de junho de 2016

CLF065. Lutando pela terra

 
(Coleção Califórnia, nº 65)


Em Abril de 1889, procedeu-se em Oklahoma à grande corrida («Run»), processo através do qual o governo atribuiu um conjunto de novas terras aos colonos, chegados de todo o aluno. Paralelamente aos que pretendiam terras para explorar, chegaram jogadores, brigões e toda uma série de indivíduos sem escrúpulos que se dedicavam a viver à conta do rendimento que os outros criavam. Ao mesmo tempo, era reforçada a presença de militares que procuravam que tudo corresse legalmente, mas deixavam a disputa para os colunos.
É neste contexto que se desenha a ação desta novela de George H.White. Hiram Dugan, um agente federal, é destacado para acompanhar a «Run» em Oklahoma e conhece uma família de colonos com a qual trava o melhor relacionamento. Ele é portador do desejo de encontrar um indivíduo, Ed Langston (Parker) que arruinara a vida da sua irmã e isso acontece no gigantesco acampamento que precedeu Oklahoma City. O seu desejo era abatê-lo, mas uma aproximação entre o seu sobrinho (Bird) e o indivíduo em causa fez com que os seus projetos se gorassem.
O grande dia surgiu com todas as batotas próprias destes processos. A família de colonos com quem o agente federal se relacionara foi posta fora da corrida devido a um acidente do patriarca da família. O homem procurado pelo agente federal é baleado no momento de reivindicar a propriedade da terra onde chegara primeiro. E, neste momento, a ação do agente é fundamental para reconduzir esta novela para o campo da justiça.
Este livro, muito interessante pelo tema, é um tanto maçudo e cheio de quezílias que não contribuem muito para o tornar agradável. Dele extraímos duas passagens que ilustram o decorrer da grande corrida.

sexta-feira, 3 de junho de 2016

CLF061. A morte saiu de ronda

 
(Coleção Califórnia, nº 61)
 
Mais uma vez a Morte...
Desta, até vem no próprio título da novela.
A morte é como o FMI: mesmo sem ter chegado, já se anuncia e já tem os seus agentes.
Mas este livro pertence a um lote esquisito: eu classifiquei-o entre os INTRAGÁVEIS. Não consegui lê-lo há uns 50 anos quando o comprei e agora não consegui ultrapassar a aversão.
A culpa até pode nem ser do autor, Raf Segrram o qual nem abusa de tiroteio e violência. Li um ou mais livros interessantes do mesmo. Mas o título, o início... há coisas assim.
Quanto a este Raf, pode dizer-se que tem 35 livros registados em Portugal, repartidos pela APR e pela IBIS o que é natural por ser um autor ligado à Bruguera.
A capa, que nos parece assinada por António Bernal, representa uma cena em que a personagem principal esmurra um bandido sob os olhos atemorizados de uma menina.