sábado, 19 de outubro de 2019

ARZ140.04 Assalto à diligência

A diligência atravessara a fronteira sem novidade e agora os seis cavalos que a puxavam galopavam ritmicamente em direção norte.
O maioral e o seu ajudante observavam o horizonte de modo maquinal, aborrecidamente, pois aquele trecho da estrada era o que menos perigos oferecia, apesar de estar muito perto da fronteira. Cinco milhas adiante encontrava-se a casa de posta, onde poderiam mudar de cavalos e beber um copo de uísque. Um pouco mais à frente dormiriam e na manhã seguinte voltariam a encontrar-se num trecho perigoso do caminho. Mas agora não tinham motivos para se preocupar. O ajudante até cabeceava, com a carabina atravessada nos joelhos.
— Eh, não adormeças!... — resmungou o maioral. —A companhia paga-te para que estejas com os olhos bem abertos...
O ajudante pouco se animou.
— Mas se aqui não há nada... Nem um desfiladeiro, nem uma árvore onde se possa esconder um assaltante... Demónio, para isso era preciso dares-me uma cotovelada? Não vês que neste sítio nunca nos acontecerá nada?
— Bom, pois então continua a dormir...
—É o que penso fazer, cabeça de mula!


O ajudante inclinou outra vez a cabeça para o peito e dispôs-se a readormecer. E dormiu bem. Tão bem que terminou a sua sesta no outro mundo. Uma bala de carabina disparada a menos de cinquenta jardas, estoirou-lhe a cabeça.
O maioral soltou um grito de surpresa e olhou à sua volta, mas no primeiro momento não viu ninguém, apesar de o terreno ser liso. Só pouco depois notou que as moitas se moviam. Cinco moitas, exatamente.
Os assaltantes tinham feito um trabalho de camuflagem digno de admiração, cobrindo-se com arbustos e espalhando-se aqui e ali, ao longo do caminho. Esta técnica era absolutamente nova naquela época e nem o maioral nem o seu ajudante haviam reparado naqueles arbustos, um pouco maiores do que os outros. Agora era demasiado tarde para corrigir o descuido. Estavam completamente encurralados.
O maioral tentou empunhar o revólver, mas foi abatido por uma bala no meio da testa. Caiu de lado e, no último espasmo, puxou as rédeas, procurando refrear os cavalos para que estes não tomassem o freio nos dentes.
Os pistoleiros também haviam tomado precaução semelhante, pois um deles saltou sobre os cavalos dianteiros e pendurou-se audaciosamente para os deter.
A diligência parou quase bruscamente, com um terrível chiar de rodas e molas. A porta da direita abriu-se de súbito e um homem armado de revólver fez fogo. Lá dentro soou uma voz:
— Não sejas imbecil! Será pior!
Um dos pistoleiros rolava já por terra, agarrado ao estômago atingido. Soltou dois gritos guturais e ficou quieto de repente, enquanto o homem que o matara se dispunha a disparar outra vez. Não chegou a tempo. Outro dos pistoleiros antecipou-se-lhe e apertou o gatilho duas vezes. O homem rolou da porta para o solo e deu uma cambalhota no pó antes de ficar imóvel.
Dentro da carruagem soaram gritos. Dois pistoleiros, um por cada porta, visaram o resto dos passageiros, três homens e uma mulher. Os homens tinham aspeto de negociantes já maduros, exceto um que era bastante mais novo, e a mulher parecia saída da gaiola de um papagaio. Não serviria para nada, salvo talvez para espantar pardais. Mas foi ela quem primeiro se pôs a gritar:
— Agora esses patifes tentarão violentar-me e gozar a minha beleza! Não me toquem, canalhas, não me toquem! Fiquem sabendo que nunca concedi os meus favores a nenhum homem!
O pistoleiro que estava mais perto resmungou:
— Compreende-se porquê, boneca.
Puxou-a e tirou-a da carruagem à força, mas a espanta-pardais por pouco não se lhe pendurou ao pescoço.
— Não me toque! Largue-me, patife!
— Mas se és tu que não me largas, maldita!
— Previno-o de que tenho as pernas mais bonitas de toda esta parte do território. Cuidado, não as veja!
O pistoleiro encolheu os ombros, agarrou-a pela cintura e acabou por a deixar no solo, onde a dama continuou a vociferar. Entretanto, os seus companheiros de viagem já haviam sido obrigados a descer da diligência. Os três estavam com as mãos levantadas, enquanto os pistoleiros, sem deixarem de os vigiar, tiravam os últimos ramos que lhes cobriam o corpo e os impediam de se mexer beira. O que parecia ser o chefe resmungou:
— Larguem as carteiras e os anéis. Mas só quero que utilizem os dedos. O que fizer um só gesto suspeito morrerá aqui mesmo.
Os homens obedeceram. Nenhum tentou a menor resistência. Entretanto, outro dos pistoleiros revistava as bagagens, segundo parecia sem resultado algum. Por fim encontrou um pesado baú, que abriu com um tiro. Lá dentro havia moedas de ouro recém-cunhadas. Belas e reluzentes moedas de cinquenta pesos mexicanos. Pelo menos, havia ali o valor de duzentos mil dólares, uma soberba fortuna.
— Já está, chefe. Sem dúvida nenhuma, era aquilo que procuravam.
O mais novo dos três homens, um tipo dos seus trinta e cinco anos, bem vestido, com o aspeto de um solene pagador de Banco, quase perdeu os sentidos.
— Não podem levar isso! Não é meu! Pertence ao Banco! Não é meu!...
Um dos pistoleiros deu-lhe um empurrão e atirou-o por terra, onde o homem continuou a gemer:
— Acusar-me-ão de me ter deixado roubar! Mandar-me-ão para a cadeia por isso! Todos se envergonharão de mim, incluindo a minha mulher!
O chefe dos pistoleiros abriu levemente a boca.
— A tua mulher chama-se Ingrid, não é verdade?
— Co... como sabe?
— É a mais bonita deste território. Toda a gente a conhece... e a deseja. Agora, fora daqui... Depressa!
Os assaltados não compreenderam ao princípio, mas quando um dos pistoleiros se pôs a disparar-lhes para os pés não se fizeram rogar mais; todos três desataram a correr como almas perseguidas pelo diabo.
Os pistoleiros também não perderam tempo. Espantaram os cavalos da diligência, montaram depois nos seus e desapareceram num instante. Como o vento na noite. Só a espanta-pardais ficou ali, no solo, a gritar que pobre do que se atrevesse a tocar-lhe… 

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