Já no escritório, olharam-se. Sem dizer palavra, e sem fazer um gesto agressivo, Lorrigan sentou-se na mesa. Jimmy permaneceu de pé, em frente dele, pensando que aquele homem era demasiado perigoso.
Bastante alto, de modos elegantes, tanto como o seu bem cortado trajo.
De cabelos negros e olhos cinzentos, cintura estranha e amplos ombros, tinha umas pernas compridas e firmes.
Jimmy viu tudo isto num simples olhar, e compreendia que estava a ser observado.
Permaneceu em silencio, à espera que este começasse, apesar de ser quem dissera que lhe queria falar. Lorrigan falou, por fim.
— Disse que queria falar-me, Jimmy. Sobre quê? Suponho que não será para dizer-me que em menos de vinte e quatro horas matou quatro dos meus homens, pois nao?
Jimmy sorriu geladamente.
— Simplesmente três, Lorrigan. Black Galento somente perdeu os sentidos.
— Só isso?
— Não. Ainda há mais. Vim dizer-lhe que deixe de mandar pistoleiros ao a saloon» de Aurora San Roman. A mexicana é negócio meu.
— Paga muito, por isso?
A pergunta era um tanto cínica, e Jimmy replicou imediatamente:
— Por algo parecido golpeei Galento, Lorrigan. Tenha isso em conta.
— De acordo, Jimmy. Mas hei-de defender-me. Essa mulher quer este «saloon».
— Também o senhor quer o dela. Com a particularidade que ela não se defende com assassinos como Galento e os seus comparsas.
—Que me diz de Callender, Kirby e Davison?
— São um pouco mais honrados. Você sabe-o. Terá de deixar isto.
— Não espere que eu faca isso. Não creia que tenho medo, apesar de você estar aqui com dois «Colt» na mão.
Jimmy olhou-os com a expressão de quem os via pela primeira vez. Mal tinha reparado que ainda estava com as armas de Morgan e Duncan nas mãos. Deitou-as para um canto, com um gesto de desprezo.
— Isto não quer dizer nada, Lorrigan. Portanto vamos ao que interessa. Uma só bala que vier na minha direção, um só pistoleiro da sus quadrilha que atravesse os batentes do «saloon» de Aurora, será suficiente para que eu o venha procurar. Então, transformá-lo-ei num passador. Lembre-se bem disso.
O jogador pôs-se de pe. Jimmy deu um passo para trás, arqueando um pouco o braço esquerdo. Mas a intenção de Lorrigan não era procurar a luta, naquele momento. Sem querer notar a vigilância do jovem, Lorrigan passou a seu lado, e abrindo a porta, disse.
— Saia, Jimmy!
O jovem sorriu ainda mais ao sair. Junto a Lorrigan, parou, olhando-o nos olhos:
— Há muitos galitos de luta em Dumas. Eu já domei outro, Lorrigan. Quanto a este, senão estiver quieto, matá-lo-ei. Deixe Aurora em paz.
— E espero pacientemente que ela me tire isto, Jimmy?
— Nao, Lorrigan. Ela não se moverá se você não o fizer antes. Esteja quieto e Aurora limitar-se-á a continuar a frente do «saloon» dela. Senão, você terá de sair de Dumas. É a minha ultima palavra.
Lorrigan deu uma gargalhada e Jimmy compreendeu que era forçada.
— Não espere que eu acredite nisso, Jimmy.
O jovem estava já no corredor e virou um pouco a cabeça, replicando ao mesmo tempo:
—Terá de partir de Dumas, Lorrigan. Porque em caso contrario... Não me agradam os jogadores. E muito menos os vantagistas. Você tem muito disso, Lorrigan. Procure outro lugar, antes de se meter de novo com Aurora.
— Vá para o diabo!— disse o jogador.
Mas o jovem não o ouvia já. Com as suas grandes passadas, acabava de alcançar o começo da escada. Estava preocupado. Não esperava nada de bom da parte de Lorrigan como também sabia que este não faria nada contra Aurora, mas não estaria Aurora quieta. Não a convenceria à primeira.
É certo que podia ter morto Lorrigan no seu escritório, que podia ter-lhe ordenado que saísse de Dumas no espaço de vinte e quatro horas. Mas tudo isso lhe repugnava.
Que diria Aurora quando soubesse que ele não o tinha morto, apesar de ter tido todas as possibilidades? Jimmy não o sabia, nem se preocupava com isso. Havia muito a que a sua consciência o aconselhava naquele momento. Agora a palavra tê-la-ia Lorrigan. Dependia dele a iniciativa.
Sempre pensativo, Jimmy começou a descer a escada. Duncan e Morgan, mais Galento, que já tinha recuperado os sentidos, estavam junto do cadáver de Sinclair.
Os três levantaram a cabeça ao ouvir as suas passadas. Jimmy passou junto a eles sem os olhar, e saiu. Nesse momento, descia Lorrigan. Desceu calmamente, e mal chegou ao piso inferior, Galento aproximou-se dele.
— Conheciam-se antes? — perguntou Lon.
— Como o sabe?
— Julguei que assim era. Como foi, Galento?
0 ladrão explicou em poucas palavras. Lorrigan riu.
— Por isso deduzi que se conheciam de antes. Só assim o pôde surpreender. Você confiava que ele iria às armas, em vez de lhe bater.
Galento assentiu e disse:
— Não espere que a morte de três dos meus melhores amigos fique assim, Lorrigan. Jimmy não vera o dia de amanha.
— Disso queria eu falar-lhe, Galento. Jimmy dorme no «saloon» da rapariga e... são duas pessoas bastante incomodativas. Portanto, esta noite, quando o local fechar, vão lá e
deitem-lhe fogo. Nas cavalariças há petróleo.
Galento olhou-o, admirado, ante aquela ordem.
— Não disse que queria o local?
— Sim, e continuo a quere-lo. Simplesmente, esse Jimmy está lá agora e não quero correr mais riscos. Desaparecido este, com um pouco de dinheiro, pode-se reconstruir. Claro que isso significa uma perda, mas vale a pena.
E Lorrigan acabou com um sorriso. Deu mais algumas ordens e voltou ao seu escritório, enquanto Jimmy ia a procura do seu cavalo, que deixara na véspera no ferrador. Pagou ao ferreiro, e saiu com o animal.
Jimmy tinha desejos de cavalgar e saiu para fora da cidade.
Mas o seu motivo não era o mesmo de Aurora, ainda que o principal objeto dos seus pensamentos fosse o mesmo. Tão embebido ia neles, que não reparou na presença de Kirby e Davison, que o seguiram, primeiro, com o olhar, depois a cavalo.
Regressou a Dumas, era já noite cerrada. Levava o cavalo a passo, e entrou na cavalariça do «saloon», sem deixar de perscrutar a rua, a procura de algo suspeito.
Pôs um bom molho de palha ao animal, e entrou no «saloon» pelas traseiras.
Estava tudo em silencio. Enão porque houvesse alguma luta la dentro. É que Aurora estava a cantar. Estava mais formosa do que nunca.
Jimmy olhou para os clientes.
Depois procurou uma mesa vazia e sentou-se. Lorna aproximou-se e Jimmy sorriu ao vê-la.
— Whisky, encanto — pediu.
A morena afastou-se, muito seria, e Jimmy riu, ao pensar nas palavras de Aurora aquele respeito. Era certo que as duas raparigas não queriam desgostar a fera.
Aurora já o tinha descoberto. Sem deixar de cantar, desceu do tablado e os homens abriram-lhe passagem. Jimmy viu-a, com os olhos revirados, bamboleando-se ao cantar, ir direita
onde ele estava. Deteve-se a seu lado, movendo-se ao compasso da música.
Depois girou em redor da mesa dedicando-lhe um verso da canção que entoava.
E então Jimmy fez uma coisa que desconcertou todos os clientes. A voz de Aurora cortou-se em seco quando ele a sujeitou por um pulso. Os dois olhavam-se agora com uma expressão nada tranquilizadora.
Ela tentou falar, mas Jimmy interrompeu-a antes que ela falasse.
— Vai para cima, rapariga.
— Mas, Jimmy...
— Vai para cima, ou eu parto imediatamente de Dumas.
Aurora não o entendeu bem, mas ao olha-lo nos olhos viu a sua determinação e pela primeira vez na sua vida, baixou a cabeça diante de um homem.
Sem replicar, a jovem abriu passagem entre os atónitos espectadores. Dez minutos depois, Jimmy foi atras dela. Encontrou-a no seu quarto. Parado em frente dela, Jimmy olhou-a uns segundos em silencio.
— Essa era outra das condições que me esqueci de te dizer. Não quero que voltes a cantar no saloon e muito menos que te vistas dessa maneira.
E ela ergueu a orgulhosa cabecita, enquanto os seus olhos brilhavam de desafio, ante o olhar insultante de Jimmy. E muito a seu pesar, Aurora não esteve conforme com aquilo. Desafiou-o.
— Isso não pode ser, Jimmy. Sou a dona desta casa e habitantes de Dumas, estão acostumados a ver-me assim.
Rocava-o já, queimando-o com o alento. Jimmy pôs o rosto de lado, evitando-a.
— Tens de compreender, Aurora. Agora vais ser mulher casada. Basta de uma vez, que cantes nesse maldito «saloon»!
Ela olhou-o, perscrutando-o, tentando saber o que ocultava aquele desejo.
— Queres então que o feche, Jimmy?
— Nao, mas porta-te de outra forma.
A mexicana deitou-lhe os braços ao pescoço.
—Mas, querido...
— Podes fazer o que quiseres, Aurora. Tens tempo até amanha ao meio dia. Agora, se queres, desce e continua a divertir essa chusma.
E Jimmy afastou-a firmemente, enquanto Aurora o continuava a olhar com aquela expressão estranha que tanto o desassossegava. E quando a jovem julgava que ele ia continuar a discutir, Aurora fez uma pergunta que ele não esperava:
—Que foste fazer ao «saloon» de Lorrigan, Jimmy?
O jovem olhou-a atentamente antes de replicar:
— Fui vê-lo, Aurora. Creio que já to disse. Quem te informou tao bem?
Ela captou a ironia da pergunta, e replicou rapidamente:
—Kirby e Davison, querido. Pu-los atrás de ti... podia acontecer-te algo. E diz-me, Jimmy, para quando deixas o ajuste de contas com Lorrigan?
Olharam-se por uns instantes, antes que o jovem dissesse:
— Tens pressa, Aurora?
—Não mais do que tu, Jimmy. Mas senão o fazes amanhã mesmo, todo o compromisso entre nos ficara sem efeito.
Jimmy riu alegremente e respondeu em tom seco:
— Vai para o diabo, Aurora! Fiz um pacto com ele, e não moverei uma só mão para o quebrar. Se ele estiver quieto, eu também estarei. Os dois «saloons» cabem muito bem em Dumas.
Por uns segundos, o rosto de Aurora transfigurou-se.
Já não pensava no estranho de tudo aquilo, em como era feliz tendo Jimmy a seu lado, em nada que não fosse as palavras deste. Com os olhos cintilantes, a boca crispada numa careta: desdenhosa e colérica, as mãos como garras, Aurora avançou para ele.
— Esse não foi o pacto, «Procura Sarilhos» Jimmy. Mata-o, ou vai-te. Não julgues que por eu ter sido uma estúpida e ter-me enamorado de ti, em tão poucas horas, o serei também, ao consentir que deixes escapar este negocio. Para isso não me incomodaria tanto em escrever-te, e esperar dia após dia, que aparecesse esse... que és tu, tu Jimmy!
— De acordo, Aurora. Eu dou por findo este pacto, que me prejudica e me tira a liberdade. Fico sem mulher e sem oiro. Lamento-o, querida. Ao oiro, é claro. Mulheres como tu, há muitas.
Aurora lançou-se-lhe em cima, e as suas mãos esbofetearam Jimmy duas vezes. Um sorriso na boca dele acentuou-se, e ela, mais furiosa ainda, voltou a bater, desejando matar aquela careta irónica.
Por fim o homem agarrou-a pelos pulsos, Aurora gemeu de dor e ele apertou-a contra o peito, tentando beija-la. Ela virou a cabeça e o beijo perdeu-se no pescoço. Jimmy voltou a pô-la na posição normal e alcançou-a em plena boca. Depois, com um brusco empurrão, fê-la cair em cima, da cama e voltou a rir.
— Estranho amor o teu, Aurora San Roman. Tão estranho como o teu endiabrado caracter, que te faz pensar a cada minuto uma coisa diferente. Escuta, rapariga. Não me irei de Dumas, enquanto não vir como Lorrigan acaba contigo, e mal ele saiba que nos discutimos, atacar-te-á. E fá-lo-á pelo mesmo que tu. Porque aos dois cega uma maldita ambição. Depois, quando já não tiveres nada, matá-lo-ei. Fá-lo-ei diante dos teus olhos. E mais nada, Aurora.
Jimmy deu mesa volta e ela levantou-se, com o mesmo gesto desafiante.
— Maldito sejas, Jimmy! Podes it para o diabo, com as tuas pistolas. Não necessito de ti para nada nem necessitarei nunca. Parte quanto antes de Dumas, e assim nos ficaremos tranquilos!
Jimmy continuou a andar sem virar a cabeça. Com a mão no puxador da porta, virou-se.
— Não voltes a lançar um repto a um homem, amor. Essa carta dizia que eu não seria capaz de te enamorar de mim, e consegui-o. Mas pode mais a tua ambição do que o teu amor. Se pudesses dizer alguma vez uma verdade, dar-me-ias os dólares que me correspondem como prémio disto. Ou acaso estou a mentir?
E Jimmy abaixou-se de repente, evitando o jarrão que Aurora lhe atirara. Jimmy fechou a porta e riu-se. Mas aquele riso era falso. O assunto interessara-o desde o principio, por mais que não fosse, pelo tom da carta. E por isso estava ali, para conhecer a mulher que escrevera a carta. E agora, em frente dela, não sabia o que sentia. Mas o certo era que Aurora San Roman parecia formar uma parte, ainda que pequena, do seu próprio ser.
Com passos medidos, Jimmy desceu ao «saloon», e instantes depois estava ao balcão, frente a um copo de «whisky».
Bastante alto, de modos elegantes, tanto como o seu bem cortado trajo.
De cabelos negros e olhos cinzentos, cintura estranha e amplos ombros, tinha umas pernas compridas e firmes.
Jimmy viu tudo isto num simples olhar, e compreendia que estava a ser observado.
Permaneceu em silencio, à espera que este começasse, apesar de ser quem dissera que lhe queria falar. Lorrigan falou, por fim.
— Disse que queria falar-me, Jimmy. Sobre quê? Suponho que não será para dizer-me que em menos de vinte e quatro horas matou quatro dos meus homens, pois nao?
Jimmy sorriu geladamente.
— Simplesmente três, Lorrigan. Black Galento somente perdeu os sentidos.
— Só isso?
— Não. Ainda há mais. Vim dizer-lhe que deixe de mandar pistoleiros ao a saloon» de Aurora San Roman. A mexicana é negócio meu.
— Paga muito, por isso?
A pergunta era um tanto cínica, e Jimmy replicou imediatamente:
— Por algo parecido golpeei Galento, Lorrigan. Tenha isso em conta.
— De acordo, Jimmy. Mas hei-de defender-me. Essa mulher quer este «saloon».
— Também o senhor quer o dela. Com a particularidade que ela não se defende com assassinos como Galento e os seus comparsas.
—Que me diz de Callender, Kirby e Davison?
— São um pouco mais honrados. Você sabe-o. Terá de deixar isto.
— Não espere que eu faca isso. Não creia que tenho medo, apesar de você estar aqui com dois «Colt» na mão.
Jimmy olhou-os com a expressão de quem os via pela primeira vez. Mal tinha reparado que ainda estava com as armas de Morgan e Duncan nas mãos. Deitou-as para um canto, com um gesto de desprezo.
— Isto não quer dizer nada, Lorrigan. Portanto vamos ao que interessa. Uma só bala que vier na minha direção, um só pistoleiro da sus quadrilha que atravesse os batentes do «saloon» de Aurora, será suficiente para que eu o venha procurar. Então, transformá-lo-ei num passador. Lembre-se bem disso.
O jogador pôs-se de pe. Jimmy deu um passo para trás, arqueando um pouco o braço esquerdo. Mas a intenção de Lorrigan não era procurar a luta, naquele momento. Sem querer notar a vigilância do jovem, Lorrigan passou a seu lado, e abrindo a porta, disse.
— Saia, Jimmy!
O jovem sorriu ainda mais ao sair. Junto a Lorrigan, parou, olhando-o nos olhos:
— Há muitos galitos de luta em Dumas. Eu já domei outro, Lorrigan. Quanto a este, senão estiver quieto, matá-lo-ei. Deixe Aurora em paz.
— E espero pacientemente que ela me tire isto, Jimmy?
— Nao, Lorrigan. Ela não se moverá se você não o fizer antes. Esteja quieto e Aurora limitar-se-á a continuar a frente do «saloon» dela. Senão, você terá de sair de Dumas. É a minha ultima palavra.
Lorrigan deu uma gargalhada e Jimmy compreendeu que era forçada.
— Não espere que eu acredite nisso, Jimmy.
O jovem estava já no corredor e virou um pouco a cabeça, replicando ao mesmo tempo:
—Terá de partir de Dumas, Lorrigan. Porque em caso contrario... Não me agradam os jogadores. E muito menos os vantagistas. Você tem muito disso, Lorrigan. Procure outro lugar, antes de se meter de novo com Aurora.
— Vá para o diabo!— disse o jogador.
Mas o jovem não o ouvia já. Com as suas grandes passadas, acabava de alcançar o começo da escada. Estava preocupado. Não esperava nada de bom da parte de Lorrigan como também sabia que este não faria nada contra Aurora, mas não estaria Aurora quieta. Não a convenceria à primeira.
É certo que podia ter morto Lorrigan no seu escritório, que podia ter-lhe ordenado que saísse de Dumas no espaço de vinte e quatro horas. Mas tudo isso lhe repugnava.
Que diria Aurora quando soubesse que ele não o tinha morto, apesar de ter tido todas as possibilidades? Jimmy não o sabia, nem se preocupava com isso. Havia muito a que a sua consciência o aconselhava naquele momento. Agora a palavra tê-la-ia Lorrigan. Dependia dele a iniciativa.
Sempre pensativo, Jimmy começou a descer a escada. Duncan e Morgan, mais Galento, que já tinha recuperado os sentidos, estavam junto do cadáver de Sinclair.
Os três levantaram a cabeça ao ouvir as suas passadas. Jimmy passou junto a eles sem os olhar, e saiu. Nesse momento, descia Lorrigan. Desceu calmamente, e mal chegou ao piso inferior, Galento aproximou-se dele.
— Conheciam-se antes? — perguntou Lon.
— Como o sabe?
— Julguei que assim era. Como foi, Galento?
0 ladrão explicou em poucas palavras. Lorrigan riu.
— Por isso deduzi que se conheciam de antes. Só assim o pôde surpreender. Você confiava que ele iria às armas, em vez de lhe bater.
Galento assentiu e disse:
— Não espere que a morte de três dos meus melhores amigos fique assim, Lorrigan. Jimmy não vera o dia de amanha.
— Disso queria eu falar-lhe, Galento. Jimmy dorme no «saloon» da rapariga e... são duas pessoas bastante incomodativas. Portanto, esta noite, quando o local fechar, vão lá e
deitem-lhe fogo. Nas cavalariças há petróleo.
Galento olhou-o, admirado, ante aquela ordem.
— Não disse que queria o local?
— Sim, e continuo a quere-lo. Simplesmente, esse Jimmy está lá agora e não quero correr mais riscos. Desaparecido este, com um pouco de dinheiro, pode-se reconstruir. Claro que isso significa uma perda, mas vale a pena.
E Lorrigan acabou com um sorriso. Deu mais algumas ordens e voltou ao seu escritório, enquanto Jimmy ia a procura do seu cavalo, que deixara na véspera no ferrador. Pagou ao ferreiro, e saiu com o animal.
Jimmy tinha desejos de cavalgar e saiu para fora da cidade.
Mas o seu motivo não era o mesmo de Aurora, ainda que o principal objeto dos seus pensamentos fosse o mesmo. Tão embebido ia neles, que não reparou na presença de Kirby e Davison, que o seguiram, primeiro, com o olhar, depois a cavalo.
Regressou a Dumas, era já noite cerrada. Levava o cavalo a passo, e entrou na cavalariça do «saloon», sem deixar de perscrutar a rua, a procura de algo suspeito.
Pôs um bom molho de palha ao animal, e entrou no «saloon» pelas traseiras.
Estava tudo em silencio. Enão porque houvesse alguma luta la dentro. É que Aurora estava a cantar. Estava mais formosa do que nunca.
Jimmy olhou para os clientes.
Depois procurou uma mesa vazia e sentou-se. Lorna aproximou-se e Jimmy sorriu ao vê-la.
— Whisky, encanto — pediu.
A morena afastou-se, muito seria, e Jimmy riu, ao pensar nas palavras de Aurora aquele respeito. Era certo que as duas raparigas não queriam desgostar a fera.
Aurora já o tinha descoberto. Sem deixar de cantar, desceu do tablado e os homens abriram-lhe passagem. Jimmy viu-a, com os olhos revirados, bamboleando-se ao cantar, ir direita
onde ele estava. Deteve-se a seu lado, movendo-se ao compasso da música.
Depois girou em redor da mesa dedicando-lhe um verso da canção que entoava.
E então Jimmy fez uma coisa que desconcertou todos os clientes. A voz de Aurora cortou-se em seco quando ele a sujeitou por um pulso. Os dois olhavam-se agora com uma expressão nada tranquilizadora.
Ela tentou falar, mas Jimmy interrompeu-a antes que ela falasse.
— Vai para cima, rapariga.
— Mas, Jimmy...
— Vai para cima, ou eu parto imediatamente de Dumas.
Aurora não o entendeu bem, mas ao olha-lo nos olhos viu a sua determinação e pela primeira vez na sua vida, baixou a cabeça diante de um homem.
Sem replicar, a jovem abriu passagem entre os atónitos espectadores. Dez minutos depois, Jimmy foi atras dela. Encontrou-a no seu quarto. Parado em frente dela, Jimmy olhou-a uns segundos em silencio.
— Essa era outra das condições que me esqueci de te dizer. Não quero que voltes a cantar no saloon e muito menos que te vistas dessa maneira.
E ela ergueu a orgulhosa cabecita, enquanto os seus olhos brilhavam de desafio, ante o olhar insultante de Jimmy. E muito a seu pesar, Aurora não esteve conforme com aquilo. Desafiou-o.
— Isso não pode ser, Jimmy. Sou a dona desta casa e habitantes de Dumas, estão acostumados a ver-me assim.
Rocava-o já, queimando-o com o alento. Jimmy pôs o rosto de lado, evitando-a.
— Tens de compreender, Aurora. Agora vais ser mulher casada. Basta de uma vez, que cantes nesse maldito «saloon»!
Ela olhou-o, perscrutando-o, tentando saber o que ocultava aquele desejo.
— Queres então que o feche, Jimmy?
— Nao, mas porta-te de outra forma.
A mexicana deitou-lhe os braços ao pescoço.
—Mas, querido...
— Podes fazer o que quiseres, Aurora. Tens tempo até amanha ao meio dia. Agora, se queres, desce e continua a divertir essa chusma.
E Jimmy afastou-a firmemente, enquanto Aurora o continuava a olhar com aquela expressão estranha que tanto o desassossegava. E quando a jovem julgava que ele ia continuar a discutir, Aurora fez uma pergunta que ele não esperava:
—Que foste fazer ao «saloon» de Lorrigan, Jimmy?
O jovem olhou-a atentamente antes de replicar:
— Fui vê-lo, Aurora. Creio que já to disse. Quem te informou tao bem?
Ela captou a ironia da pergunta, e replicou rapidamente:
—Kirby e Davison, querido. Pu-los atrás de ti... podia acontecer-te algo. E diz-me, Jimmy, para quando deixas o ajuste de contas com Lorrigan?
Olharam-se por uns instantes, antes que o jovem dissesse:
— Tens pressa, Aurora?
—Não mais do que tu, Jimmy. Mas senão o fazes amanhã mesmo, todo o compromisso entre nos ficara sem efeito.
Jimmy riu alegremente e respondeu em tom seco:
— Vai para o diabo, Aurora! Fiz um pacto com ele, e não moverei uma só mão para o quebrar. Se ele estiver quieto, eu também estarei. Os dois «saloons» cabem muito bem em Dumas.
Por uns segundos, o rosto de Aurora transfigurou-se.
Já não pensava no estranho de tudo aquilo, em como era feliz tendo Jimmy a seu lado, em nada que não fosse as palavras deste. Com os olhos cintilantes, a boca crispada numa careta: desdenhosa e colérica, as mãos como garras, Aurora avançou para ele.
— Esse não foi o pacto, «Procura Sarilhos» Jimmy. Mata-o, ou vai-te. Não julgues que por eu ter sido uma estúpida e ter-me enamorado de ti, em tão poucas horas, o serei também, ao consentir que deixes escapar este negocio. Para isso não me incomodaria tanto em escrever-te, e esperar dia após dia, que aparecesse esse... que és tu, tu Jimmy!
— De acordo, Aurora. Eu dou por findo este pacto, que me prejudica e me tira a liberdade. Fico sem mulher e sem oiro. Lamento-o, querida. Ao oiro, é claro. Mulheres como tu, há muitas.
Aurora lançou-se-lhe em cima, e as suas mãos esbofetearam Jimmy duas vezes. Um sorriso na boca dele acentuou-se, e ela, mais furiosa ainda, voltou a bater, desejando matar aquela careta irónica.
Por fim o homem agarrou-a pelos pulsos, Aurora gemeu de dor e ele apertou-a contra o peito, tentando beija-la. Ela virou a cabeça e o beijo perdeu-se no pescoço. Jimmy voltou a pô-la na posição normal e alcançou-a em plena boca. Depois, com um brusco empurrão, fê-la cair em cima, da cama e voltou a rir.
— Estranho amor o teu, Aurora San Roman. Tão estranho como o teu endiabrado caracter, que te faz pensar a cada minuto uma coisa diferente. Escuta, rapariga. Não me irei de Dumas, enquanto não vir como Lorrigan acaba contigo, e mal ele saiba que nos discutimos, atacar-te-á. E fá-lo-á pelo mesmo que tu. Porque aos dois cega uma maldita ambição. Depois, quando já não tiveres nada, matá-lo-ei. Fá-lo-ei diante dos teus olhos. E mais nada, Aurora.
Jimmy deu mesa volta e ela levantou-se, com o mesmo gesto desafiante.
— Maldito sejas, Jimmy! Podes it para o diabo, com as tuas pistolas. Não necessito de ti para nada nem necessitarei nunca. Parte quanto antes de Dumas, e assim nos ficaremos tranquilos!
Jimmy continuou a andar sem virar a cabeça. Com a mão no puxador da porta, virou-se.
— Não voltes a lançar um repto a um homem, amor. Essa carta dizia que eu não seria capaz de te enamorar de mim, e consegui-o. Mas pode mais a tua ambição do que o teu amor. Se pudesses dizer alguma vez uma verdade, dar-me-ias os dólares que me correspondem como prémio disto. Ou acaso estou a mentir?
E Jimmy abaixou-se de repente, evitando o jarrão que Aurora lhe atirara. Jimmy fechou a porta e riu-se. Mas aquele riso era falso. O assunto interessara-o desde o principio, por mais que não fosse, pelo tom da carta. E por isso estava ali, para conhecer a mulher que escrevera a carta. E agora, em frente dela, não sabia o que sentia. Mas o certo era que Aurora San Roman parecia formar uma parte, ainda que pequena, do seu próprio ser.
Com passos medidos, Jimmy desceu ao «saloon», e instantes depois estava ao balcão, frente a um copo de «whisky».
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