«Procura Sarilhos» Jimmy chegou ao balcão, sempre no mais completo silêncio, quando ela lhe saltou sobre as suas costas.
Para todos os que contemplavam a cena, Aurora San Roman pareceu um formoso e perigoso puma, e Jimmy sentiu como as pernas dela se lhe enroscavam à cintura.
E todos viram como duas felinas e ferozes serpentes que apertavam cada vez mais a cintura daquele colosso que nem se tinha movido do local onde o surpreendera a inesperada a agressão.
Jimmy estava verdadeiramente surpreendido ante o desejo de guerra daquela mulher fascinadora. Todos os que viam o espetáculo afastaram os olhos dela para se fixarem nele.
A jovem fez algo mais: uma vez sobre as costas dele, as mãos voaram para a cara.
Jimmy compreendeu ao vê-las passar diante do rosto, e conseguiu agarrar a esquerda pelo pulso, mas não conseguiu agarrar a direita e então Aurora, com uma raiva infinita, cravou as afiadas unhas no queixo do jovem.
Por detrás do balcão, o «barman» assustou-se ao ver a expressão de Jimmy, que ela não podia ver.
E então Jimmy deu meia volta, com a mulher sempre às costas, e ficou de costas para o balcão.
Durante uns segundos, Jimmy sentiu uns desejos assassinos que reprimiu imediatamente.
No entanto, deu um passo atrás, até que sentiu a cintura dela bater no balcão.
Então apertou-a, ao mesmo tempo que lhe torcia o pulso esquerdo.
Aurora tentou resistir, mas em vão. Segundos depois, sentindo que o pulso se partia, e que aquele selvagem continuava a apertar, o rosto de Aurora ficou lívido.
Então, como se adivinhasse o que se passava atrás de si, o jovem afastou-se do balcão. Aurora estendeu as pernas e caiu para trás. Jimmy voltou-se, olhando os três gorilas estavam atentos, olhando também. Mas Aurora San Roman tinha os olhos fixos naquele jovem.
— Quem é o único galo que luta aqui, menina?
E Aurora nada respondeu. Pôs-se em pé, cambaleante. Os olhos brilharam felinos.
Jimmy afastou os olhos, para que não lhe desse volta à cabeça. Mas depois, num estranho contraste, olhou-a lançando uma maldição. E foi então que avançou para ela, agarrou-a pela cintura e beijou-a.
Como da vez anterior, conseguido o seu propósito, Jimmy largou-a bruscamente. Depois olhou-a, e ela, como se desejasse ser domada, caiu-lhe em cima como um ciclone.
Jimmy não teve mais que fechar os braços em torno da sua linda cintura, e voltou a erguê-la do chão. Mas desta vez percorreu o local com ela, como se fosse um fardo, até chegar a um banco. Sentou-se nele, enquanto ela se debatia, e Jimmy ria, juntamente com todos os presentes, menos aqueles três gorilas.
A mulher não o insultava, lutava no mais completo silêncio, apesar de já ter consciência do seu fracasso com aquele gigante. E Jimmy cansou-se daquele estúpido jogo, pelo que a voltou de costas e a estendeu sobre os joelhos.
Segundos depois, Aurora guinchou, ao compreender a sua intenção.
Mas nem os insultos nem os guinchos que ressoavam por toda a sala ante a estupefação dos assistentes e ainda mais dos guarda-costas, Marisa e Lorna, lhe serviram de nada.
Sem fazer caso, Jimmy começou a bater no traseiro de Aurora, que quase desmaiava ante a vergonha da tareia que recebia diante de todos, e daquela forma cruel e ignominiosa.
Jimmy continuou a golpear, até que os gritos e insultos da mulher se converteram num gemido, primeiro, e em soluços, depois. Então, largou-a.
Durante mais de um minuto, Aurora ficou atravessada nos seus joelhos, sem se mover, sem chorar, com o semblante lívido e os olhos mortiços.
Depois levantou-se, sem olhar para ninguém, muito vermelha, e encaminhou-se para a escada.
O silêncio era profundo e sinistro. Os guarda-costas tinham as mãos junto às armas, mas não ousavam movê-las sem autorização prévia.
Jimmy levantou-se muito tranquilo, e viu-a partir. Mas quando Aurora chegou à escada, chamou-a.
Ela deteve-se, com um pé no primeiro degrau. Os seus formosos ombros estremeceram. Não se voltou, mas ouviu o tinir das esporas do jovem.
Jimmy agarrou-a por um braço e obrigou-a a voltar-se. Olhou-a nos olhos, que brilhavam outra vez num estranho desafio.
— Pagarás isto, cão — disse baixinho.
E Jimmy riu-se.
Lentamente, muito lentamente, o jovem levantou-lhe a cabeça pelo queixo. Os olhos de Aurora apagaram-se subitamente.
— Quem é o galito que luta aqui, rapariga?
Aurora não replicou, e Jimmy obrigou-a a levantar a cabeça, até que os seus lábios entreabertos estiveram ao seu alcance. Então beijou-a.
A mulher não fez um só gesto. Não correspondeu à carícia, mas Jimmy compreendeu que estava a pontos de chorar. Mas nem por isso a largou. Limitou-se a beijá-la de novo e perguntar:
— Quem, rapariga?
— Tu...
E foi como um sussurro que só ele captou. Largou-a, dando imediatamente meia volta para se encaminhar para o balcão, ante o mais completo silêncio dos que agora o olharam com uma mistura de espanto e admiração.
Aurora subiu a escada à pressa. No primeiro patamar, uma força mais poderosa do que ela fê-la virar a cabeça para olhar para o «saloon». Quis gritar, mas não pôde, já que o que queria evitar, começara.
Foi precisamente quando Jimmy chegou ao balcão.
Os três guarda-costas avançaram até ao centro do local, e os clientes apressaram-se a encostar-se às paredes. Jimmy viu-os vir e compreendeu que desejavam dar-lhe uma tareia antes de levar as mãos às armas.
Kirby pegara num pesado banco e avançava para ele, enquanto os outros dois se afastavam, tentando cercá-lo.
Jimmy preparou-se para fazer frente aos três homens. Viu que Aurora descia as escadas, desejosa de evitar aquele combate.
Tinha compreendido que os seus homens, apesar do sinal que lhes fizera para não se meterem no assunto, tinham considerado a humilhação sofrida por ela, como sua.
Mas Aurora agia demasiado tarde. Callender, que tinha chegado primeiro que os outros junto do jovem, e lançava a mão esquerda contra o queixo de Jimmy.
Mas «Procura Sarilhos» aparou o enorme punho com o braço esquerdo, e disparou o direito com a força de um obus.
Callender era pesado como um búfalo, mas apesar disso, saiu disparado para trás, e quando caiu no chão ouviu-se em toda a sala o som de ossos partidos. Jimmy mal teve tempo de se pôr em guarda, pois Kirby, de banco ao alto, juntamente com Davison, estavam em cima dele.
Kirby deixou cair o banco e Jimmy saltou de costas. O banco bateu no balcão.
Mas não conseguiu o jovem evitar o bárbaro soco de Davison, que o alcançou a meio da cara.
E agora foi Jimmy quem saiu disparado para trás, enquanto Davison, vítima do balanço que dera ao braço para aumentar a potência do soco, cambaleava, praguejando, e Kirby se levantava, pois, ao falhar o golpe com o banco, caíra no chão.
Jimmy deixou de retroceder, precisamente no momento em que Kirby, com movimentos felinos, e como se aquela lição não tivesse sido suficiente, se aproximava lentamente, e Davison corria a apanhar um bocado do destroçado banco e o levantava ameaçador.
Marisa e Lorna mordiam as unhas, e o coração de Aurora trabalhava descompassadamente.
Agora, a dona do «saloon» não queria que acontecesse mal ao gigante, e isso era pura lógica feminina.
Jimmy, vendo que estava em desvantagem perante os seus agressores, pegou numa mesa e, lançando um grito que faria inveja a um «apache», lançou-a contra os dois «pistoleiros».
Os dois «cavalheiros» estatelaram-se, empurrados pela mesa, contra o balcão. Jimmy esfregou as mãos e sorriu. Depois passou os olhos pela assistência, até que reparou nas três mulheres. Dirigiu-se a Lorna.
— Obrigado — disse. — Creio que aquele homem não te incomodará mais, nem terás de procurar outro estúpido que faça o teu jogo.
— Escute, Jimmy, eu...
Mas o jovem cortou-lhe a palavra com um gesto, e encarou Aurora.
— Adeus, galito.
E foi-se. A saída de Jimmy coincidiu com a saída dos curiosos, que o olharam. Jimmy compreendeu que eles tinham vontade de falar-lhe, mas não se atreviam. Sentia curiosidade por aquela mulher chamada Aurora, e por fim decidiu saber qualquer coisa. Encarou-se com o vaqueiro mais próximo e comentou:
— Diabo de mulher! Tem o demónio dentro dela!
O vaqueiro sorriu, replicando:
— Tinha-o, forasteiro. Mas agora...
Jimmy sentiu-se intrigado por aquela estranha reticência do vaqueiro.
— Que quer dizer?...
— Mas se é tão simples. Aurora San Roman estava à espera disto há tempos, e agora ficará mais dócil do que uma luva!
Jimmy avançou pela rua, ao lado do vaqueiro. Aventurou a sua própria opinião.
— Talvez você tenha razão, mas aposto uma garrafa de «whisky» contra trinta centavos, em como ela está desejando vingar-se.
Havia mais três homens que caminhavam juntos e alcançaram-nos antes que o vaqueiro respondesse. E quando ia a fazê-lo, um destes últimos disse:
— Eu sou da opinião de Peck. Esse maldito vaqueiro conhece as mulheres. Aurora já sabe quem é o seu dono em Dumas.
Jimmy pestanejou, assombrado pelo que ouvia. Riu, para dissimular. O gorducho Peck replicou:
— Faça a prova e verá, forasteiro. Aurora foi sempre uma rapariga difícil, a quem nunca ninguém conseguiu dominar em Dumas. Sempre nos causou medo e respeito a todos. Diz-se que tem um passado muito turbulento e deve ser verdade. Primeiro, pela maneira de se comportar, vestir, jogar, falar, e por último, pela maneira como sempre tratou os homens, se bem que se tenha equivocado com você. Vá vê-la, forasteiro. Sou eu quem aposta o cavalo e a pistola contra um simples copo de «whisky», em como não me equivoco. Aurora merecia-o. Digo-lhe eu, que entendo bastante de mulheres.
Jimmy não gostou daquela maneira de falar, mas calou-se, para segundos depois largar uma franca gargalhada. Nenhum se assombrou por aquilo, julgando que o forasteiro, a quem tinham ouvido chamar Jimmy, regozijava-se de antemão com aquela ideia. E nenhum deles soube que Jimmy ria precisamente pela ideia que lhe acabava de ocorrer; a de que aquela mulher fosse a que o chamou, e o «bonito negócio», o «saloon» de que era dona.
Jimmy parou de rir tão bruscamente como começara e imediatamente, sem dizer uma palavra, retrocedeu, despedindo-se dos vaqueiros com um aceno de mão.
Estes olharam-se entre si e sorriram, julgando saber o motivo da pressa de Jimmy. E não se equivocaram, ainda que só fosse em parte. O jovem ia ao «saloon», mas não pelo que eles julgavam. Ia, simplesmente, certificar-se se realmente Aurora, era a mulher que escrevera a carta que tinha em seu poder e, pelo qual, se encontrava em Dumas.
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