quarta-feira, 8 de fevereiro de 2023

CLT017.15 Sem margem para recuar

Lee Carey andava pelos trinta e cinco anos e me, dia um metro e setenta e cinco de altura. Robusto de forte constituição, cabelos loiros e queixo pontiagudo.

— Como estás, querida? — disse, dirigindo-se Lídia.

A jovem estava mortalmente pálida. Tentou dizer alguma coisa, mas não conseguiu. Então, Lee Carey olhou para Tony Trevor e disse:

— Você é um tipo muito esperto, rapaz. Como deu com a verdade?

— Já lhe disse que foi à questão de uns minutos. Exatamente no momento em que apareceu Murray.

— Como?

 — Murray não tinha nada que vir aqui, se realmente ele e Jackson não o tivessem morto. Que motivos tinha para, vir a esta casa? Exatamente nenhum. O lógico era que os assassinos tratassem escapar, ou pelo menos esconderem-se na cidade para que não os encontrassem. E possível que o «sheriff» tenha resultado suspeito aos meus olhos, mas quando ouvi as primeiras palavras de Murray deixei de ter dúvidas. Todo o sucedido apareceu na minha mente, de uma maneira clara e precisa. E incrível como por vezes cometemos certos erros. As coisas às vezes sucedem de uma forma tão simples que nos custa a dar com elas. Preferimos embrulhá-las.

— E um bonito discurso— retorquiu Carey. — Mas ponha-lhe ponto final. Convém-lhe.

— Vou terminar em seguida. Você foi o honrado Lee Carey até que se cansou de o ser. Ia ter uma mulher bonita, mas não se conformava com o soldo que lhe pagava a companhia «Anaconda». Então fez cálculos. Podia ganhar num só golpe o que levaria normalmente, dez anos a conseguir. Claro que não se contentaria só com doze mil dólares... Em seguida daria outro golpe em qualquer lado. O mal é começar. Os seguintes surgem pelas próprias circunstâncias. Naturalmente teria de deixar passar algum tempo até levar Lídia para seu lado.

— Isso é verdade — admitiu Carey. — Mas as circunstâncias foram-me favoráveis e resulta que tive de esperar muito menos tempo do que calculava.

Já tenho aqui a minha mulherzinha, e isso devo a você, senhor Trevor. Obrigado pelo favor.

Os seus lábios voltaram a sorrir enquanto fixava os olhos na jovem.

— Não te alegra ver-me, querida?

— Não... Não estava preparada para isto— balbuciou ela.

— Bem, já te irás acostumando, riqueza. O importante para ti, é que Lee Carey está outra vez vivo. Tu e eu vamos começar uma vida nova.

A voz de Tony soou seca, autoritária.

— Não, não a leva consigo, Carey.

— Não? — perguntou Lee. — Isso, sim, é que é gracioso. Muito mais do que o palavreado anterior.

— Ela fica em Pau Verde.

— Vá, dê-me uma razão.

— Ela não o quer.

Lee desatou a rir.

— Palavra que você às vezes é um tipo estranho, Trevor.

Spencer Murray fechou a porta e apoiou-se na parede com os revólveres bem levantados, para dominar todos os presentes que intervinham na cena.

Lídia olhou para Tony e suplicou:

— Por favor, Tony, cala-te.

Tony respondeu sem desviar os olhos do rosto de Lee:

— Não tenhas medo, Lídia. Este homem só se interessa por ele. Se tivesse gostado verdadeiramente de ti, ter-te-ia informado do que ia fazer, mas não o fez...

— Será que temes a verdade, Carey?

— A verdade? Quem pode causar mal a uma coisa como essa?

— Então pede-lhe a sua opinião. Demonstra que o que dizes não é palavreado.

— Está bem. Vamos faze a vontade ao rapaz. Di-lo alto para que ele oiça. Diz-lhe que gostas de mim, que sempre gostaste, que nunca houve outro homem na tua vida e que só eu posso dar-te felicidade.

Fez-se silencio e depois Lídia disse:

— Não, Lee. Não te quero... Agora sei que nunca gostei de ti... Limitei-me a obedecer-te... Nunca me deixaste escolher... Sempre fiz a tua vontade e isso não pode ser amor. Nunca o foi.

— Não sabes o que dizes! — gritou Carey com as pupilas chamejantes.

— Sim, Lee. Agora sei-o perfeitamente.

— Só falta que me digas que gostas dele, desse maldito Trevor.

Lídia levantou altivamente o queixo e disse:

— E verdade. Gosto dele!

Os olhos de Carey moveram-se rápidos, carregados de ódio, para Trevor.

— Maldito intrigante! Aproveitaste-te da minha ausência. Embruxaste-a!

— Enganas-te, Lee— gritou Lídia — Ele não fez absolutamente nada.

— Cala-te!

Durante uns instantes não se ouviu qualquer ruído na sala. Lee não afastava o olhar de Trevor.

— Vou-te liquidar, Trevor!... E vai ser aqui mesmo!

— Não--exclamou Lídia.

— Não vais fazer nada disso.

— Afasta-te dele!

— Que classe de homem és tu? — gritou Lídia — É verdade que nunca gostei de ti, mas em troca sentia orgulho de ti... Sempre foste um homem de bem. Mil e uma vezes me disseste que odiavas o crime. Como é possível que tenhas mudado dessa forma, Lee? Que se meteu na tua cabeça para fazer urna coisa destas?... Roubaste a própria companhia que te contratou... Simulaste a tua morte e sabias que alguém iria pagar por ela. Mais do que isso, preparaste a morte de um desconhecido com a ajuda dos teus cúmplices. Oh, Lee! Fazes-me pena.

— Pena?... Ninguém deve ter pena de mim agora... É possível que a tenha tido muita gente antes, quando era o honrado Lee Carey, o homem mais rápido com a pistola, o homem de punhos de ferro, o homem que trabalhava nobremente por um ordenado miserável de cento e cinquenta dólares por mês. Então, sim, admito que houvesse muitas pessoas que tivessem pena de mim. É o que todos pensavam. Se eles possuíssem a minha habilidade com o revólver e a minha facilidade, onde teriam chegado? Jesse James seria um simples novato ao lado, dele!... E esse sou eu, Lee Carey, o homem que podia ser maior que Jesse James... Mas agora acabou-se, Lídia! Vou ser o herói que toda a gente julgou ver, em mim!

— Herói? Chamas herói a um homem que rouba e mata?

— Que importa isso!... A dor é algo que vai unida ao triunfo... A desgraça de uns é a ventura de outros. Anda, pequena. Porta-te bem... afasta--te dele.

Tony apertou o braço de Lídia, murmurando:

— Obedece.

Lídia olhou para um e depois para o outro, e por fim desviou-se. Ronald e Peter Morrow também recuaram até à varanda, mas o «sheriff» ficou quieto.

— Vais ouvir-me primeiro, Lee — disse Smilles.

— Que tem a dizer-me?

— Que ainda estás a tempo de parar. Só há a morte de um «pistoleiro», esse Jackson. Ainda não é tarde. Estou certo de que a «Anaconda» se considerará satisfeita com a devolução do dinheiro. Podes voltar a começar, rapaz.

Carey riu suavemente.

— Deixe-se de sermões, velho imbecil!

O «sheriff» estremeceu.

— Que estás dizendo, Carey? Jamais ouvi nos teus lábios essas palavras. Sempre me respeitaste.

— Não confunda as coisas. O único que fiz foi tolerá-lo, suportar os seus sermões, mas agora acabou-se. Você é somente um pobre «sheriff» sem nenhuma ambição e julga que todos temos de ser como você. Afaste-se também, senão quer apanhar um tiro.

Smilles, pálido, assombrado pelas palavras que acabava de ouvir, recuou lentamente. Lídia chegou-se a ele, e carinhosamente passou-lhe o braço pelas costas.

Murray estava presenciando a cena junto da porta e os seus lábios sorriam divertidos. No meio, ficaram somente Trevor e Lee Carey separados por uma distância de três jardas.

Tony conservava um revólver no coldre esquerdo Carey retrocedeu até que as suas pernas tocaram numa cadeira. Então, ante ele e Tony havia uma distância de seis jardas.

— Você fez ruir todo o meu plano, Trevor... Se Murray e Jackson tivessem encontrado outro tipo tudo teria corrido às mil maravilhas. Estava planeado com cabeça. Eu teria deixado passar umas semanas e no fim iria buscar Lídia para meu lado. A «Anaconda» nunca me perseguiria por doze mil dólares. Eu estaria morto para eles. Por isso vou fazê-lo pagar todas as dificuldades que colocou no meu caminho. Não só arruinou todo o meu plano como pretendeu roubar-me a minha mulher.

— Não era sua ainda, Carey.

— Mas todos a consideravam como minha propriedade.

— Porque temiam a sua rapidez com o revólver, tinham medo da sua pontaria.

— E você não tem?

— Não, Lee. Nunca temi ninguém.

— Talvez devido aos tipos que enfrentou.

— Não, Carey. Já me enfrentei com tipos tão rápidos como você! Com foragidos de todas as classes, e posso garantir-lhe que eram estupendos atiradores.

— E foi sempre o vencedor, eh?

— Sempre.

— Alegro-me por defrontá-lo. Talvez não tenha oportunidade de liquidar todos os dias tipos como você... Aqui tem, Trevor.

Carey fez um movimento rapidíssimo com a mão direita. Mas Tony Trevor foi mais rápido ainda. Dobrou um pouco as pernas e a sua mão esquerda saltou para a coronha do revólver e disparou sem sacar.

Soou um tiro e seguidamente outros dois.

O primeiro havia sido provocado pelo «Colt» de Tony e os outros pela arma que empunhava Peter Morrow.

Lee Carey recebeu um único tiro, que saíra do revólver de Tony, no meio dos olhos. Ficou de olhos muito abertos, a mão aferrada ao «Colt» que já empunhava, soltou um suspiro e caiu de bruços no chão.

Spencer Murray havia-se distraído demasiado com a cena, permitindo a Peter Morrow fazer justiça. Estava apoiado contra a porta com os dois revólveres apontados ao chão, observando o sangue que lhe saía dos dois buracos do peito. Deslizou suavemente, dobrou a cabeça e rolou pelo solo.

Um silêncio sepulcral reinou por um momento na sala onde pairava a morte.

De repente, Lídia começou a correr e lançou-se nos braços de Tony Trevor. Ela apertou o queixo contra o peito varonil, e ele beijou-a na testa.

— Oh, Tony... Isto é impossível.

— Esquece-o... Eu ajudar-te-ei a esquecê-lo.

Peter Morrow fez girar os seus revólveres na mão satisfeito e, quando os parou, disse ao «sheriff»:

— Que tem a dizer agora, «sheriff»? Sou ou não sou um bom colaborador da justiça?

Smilles coçou a nuca, olhou-o fixamente e disse:

— Por todos os infernos, rapazes! Palavra que te portaste muito bem!

Ronald começou a andar, e o «sheriff» perguntou-lhe:

— Eh, Ronald. Onde vais?

— Não tenho lugar ao pé de si — respondeu. — Enganei-me a respeito de Trevor e creio que o que ia fazer era pouco decente... A morte de Carey abriu-me os olhos, mas continuo a pensar que estou a mais como seu ajudante... Tenho algum dinheiro junto e vou ter com o meu tio Jonas à Califórnia. Tem um negociozinho e aplico o meu dinheiro nele. Adeus, «sheriff».

— Boa sorte— Smilles cruzou os braços enquanto Ronald saía e olhou para Peter Morrow. — Ouviste. Fico sem um dos meus ajudantes.

— Inferno!... Não julga que eu?...

— Tu?... Matem-me se o consentia!... Que diria as pessoas quando te vissem bêbado?

— Bem, isso podia arranjar-se com uma promessa.

— Que classe de promessa?

— Não beber mais, a não ser nos meus dias de folga e, naturalmente, sem escândalo.

O «sheriff» sorriu e disse:

— De acordo. Aceito a tua palavra. Começas amanhã.

Os dois homens apertaram as mãos. O «sheriff» dirigiu-se para o corredor. Ao fundo viu um grupo de pessoas que haviam acudido ao ruído dos tiros, mas ninguém se atrevia a aproximar-se.

Tony e Lídia beijavam-se.

De repente o «sheriff» lembrou-se de algo, e girou sobre os calcanhares, assomando a cabeça pela porta. Franziu a sobrancelha ao ver Morrow que estava bebendo um trago de uma pequena garrafa de «whisky» ...

— Infernos! — gritou Smilles. — Isso não está de acordo com a tua promessa!

Morrow tirou o gargalo da boca e sorriu dizendo:

— Você disse que -começo amanhã. Não se lembra? Hoje é o meu dia de folga. — E, tranquilamente, empinou outra vez a garrafa e continuou a beber.

 


FIM

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