sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

CLT017.10. A testemunha perdida

 — Olhe quais são os meus procedimentos, senhor Trevor — os olhos de Jackson eram tão brilhantes como os de uma raposa. — Não tive nenhum ataque de tosse. Os meus pulmões são ótimos. Só o queria surpreender.

— E conseguiu. 

O rosto de Jackson endureceu.

— Porque veio a El Paso?

— Escapei de uma cela quatro horas antes de ser enforcado.

— E possível? — disse Jackson com a cara mais ingénua.

— Sim, Jackson.

— Que foi que fez em Pau Verde? Roubou o banco? Ou raptou a filha de algum rico cidadão? Ou levou a coleta da igreja episcopal?

Ninguém parecia ter dado por nada do que se passava, mas naquele momento, um mexicano voltou a cabeça e disse:

— Não gastes chumbo, irmão, que está muito caro. Espeta-o com isto—. e lançou uma navalha, que foi cair entre os dois homens que se enfrentavam.

— Ouviu-o, Trevor? Pancho é da opinião que muitos homens não valem o chumbo que se gasta com eles.

Tony olhou para a ponta das suas botas e em seguida volta a olhar para Jackson.

— Oiça, Ray. Só quero saber o nome da pessoa que lhe pagou para realizarem o vosso trabalho.

— Oh, você refere-se ao tipo que nos pagou para apanhar-lhe as batatas a semana passada em Santa Cecília... Ou talvez do fulano que nos deu cama e comida durante três dias por lhe termos arranjado o telhado? Qual deles, senhor Trevor?...

— Interessa-me somente o nome de quem vos pagou para matarem Lee Carey.

— Lee Carey? Quem é Lee Carey?

— Sabe-o muito bem. O homem que levava o dinheiro da «Anaconda» desde Santa Fé até Pau Verde. Era o dono do cavalo que vocês me entregaram em troca do meu.

— E possível? Há verdadeiras casualidades na vida. Não é verdade, senhor Trevor?

— Chama casualidade ao facto de que os vinte dólares que me deram pelo meu relógio fazerem parte da remessa que Lee Carey devia entregar uns dias antes ao representante da «Anaconda» em Pau Verde?

— Santo Deus. Está falando a sério?

— Vocês prepararam tudo muito bem. Quando eu os vi no caminho estavam à espera de encontrar um idiota. Você e Murray sabiam que o vosso plano teria por força de dar resultado. O cavalo de Carey era muito bom. Ninguém teria resistido a aceitá-lo em troca do que montasse. E vinte dólares pelo relógio era um preço mais que razoável tendo em conta que havia custado sete.

— Aonde quer ir parar, Trevor'?... Ao inferno, talvez?

— Quero o nome e vim aqui buscá-lo.

— Você está louco! E os loucos terminam muito mal sempre, senhor Trevor. Sabe que posso dar-lhe um tirito e pôr-me ao fresco? Aqui cada um faz o que quer. E uma cidade sem Lei, senhor Trevor. Devia ter em conta isso quando resolveu pôr os pés em El Paso.

— Sabia para onde vinha.

— Pois então vou dizer-lhe o que tem a fazer. Sabe rezar?

— Ainda me recordo de algo.

— Pois reze, porque será a última coisa que fará. Depois... — Jackson fez uma pausa e deu um estalo com os dedos — irá para o outro mundo.

Tony apontou para o copo de «whisky» que estava sobre o balcão.

— Posso beber antes?

— Pois não. Demais eu convidei-o.

Tony estendeu o braço para agarrar o copo. De repente, arrojou o «whisky» aos olhos de Jackson. Entretanto a sua mão esquerda não ficou quieta. Golpeou o punho armado do seu inimigo. Jackson lançou um grito e baixou o braço sem largar a arma. Então o punho direito de Tony voou em direção da Mandíbula com uma força terrível.

Os clientes voltaram a cabeça ao ouvir o estrondo que Jackson fazia ao cair sobre um monte de barris pequenos que estavam apinhados a um canto. O revólver tinha ficado longe dele, no chão.

Tony deu conta de que tinha de haver-se com um inimigo perigoso. Jackson, apesar do golpe recebido levantou-se como um raio, agarrou num barril e lançou-o contra Tony. Este abaixou-se e o barril foi embater contra uma das mesas que se desfez em estilhaços. O dono do bar levou as mãos à cabeça.

— Pela Virgem de Guadalupe. Não comece outra vez, senhor Jackson.

O foragido ficou imóvel, com os braços longe do corpo, olhando com olhos chamejantes Tony.

— Porque não dispara, Trevor? Será que não vê? Estou desarmado.

— Já sei que está desarmado, Jackson, mas a, mim não me interessa matá-lo. Quero-o vivo. Morto não me serve de nada.

— Então é isso? Quere-me vivo para levar-me a Pau Verde. Quer que alguém ocupe o seu lugar na forca, eh?

— Acertou, Jackson. Você e o seu amigo serão quem dançarão debaixo da árvore, e não eu.

— Você é bastante ingénuo. Não conseguirá nunca isso.

Naquele momento, apareceram na por os três amigos de Jackson. Os três detiveram-se umbral da porta observando a cena. Jackson desatou a rir.

— Eh, rapazes... Este tipo quere-me fazer cócegas. Apanhou-me descuidado e tirou-me o revólver. Mostrem-lhe como se converte um tipo num passador.

Os três «pistoleiros» levaram as mãos às armas ao mesmo tempo, mas antes de terem sacado, o «Colt» de Trevor cantou a sua canção mortífera.

Um dos tipos que se encontrava mais próximo de Ray recebeu uma onça de chumbo entre os olhos. Soltou um uivo como uma rês ferida e caiu lentamente, inclinando o queixo sobre o peito. O que estava ao meio ficou de boca aberta e isso foi-lhe fatal, pois uma bala entrou-lhe por ela dentro zumbindo como uma locomotiva ao entrar num túnel. Chocou contra o umbral, e a cabeça estalou como um foguete no 4 de Julho (Independência dos EUA nota do T.)

. Depois embateu de costas contra a porta e foi estatelar-se na rua. O terceiro ficou assombrado ao ver o pequeno orifício que tinha um pouco acima do coração, pequeno, insignificante, e que nesse momento começava a sangrar; e morreu sem saber se de susto se da bala que tinha apanhado. Jackson deu três passos em frente, aproximando--se de Tony.

— O nome, Jackson.

Ray tirou um lenço do bolso e limpou o suor que lhe caía pela cara.

— Está bem, amigo, você ganhou.

De repente soou um estampido por detrás de Tony e uma bala roçou-lhe a orelha. Deu um salto para um dos lados ao mesmo tempo que se encolhia.

Antes de cair no chão viu uma chama que brotava de um revólver que assomava por uma janela e também viu o rosto do homem que esgrimia a arma. Era o companheiro de Jackson, Spencer Murray.

Tony apertou o gatilho, mas sabia de antemão que o seu tiro não acertara no alvo, devido à sua má posição. Nesse momento, caiu no chão. Quando se endireitou, na janela não havia ninguém. Ray Jackson contemplou os três 'cadáveres e olhou para Tony com os olhos desorbitados.

— Quê?... Que fez? — balbuciou.

— E o meu cartão de visita.

Jackson engoliu a saliva.

— Que lhe parece se lhe der duzentos dólares e me deixar em paz?

— Não, Ray. O dinheiro desta vez não serve de nada. Você já sabe o que quero e que me vai dizer, ainda que para isso tenha de arrancar-lhe a pele aos bocados... Aproxime-se!

Havia-se feito um impressionante silêncio na sala.

O mexicano que havia lançado antes a navalha a Jackson para espetar Tony, estava encolhido na cadeira e tapava o rosto com o grande sombrero, temendo que o jovem americano exigisse contas da sua oferta. Levantou-se com rapidez e correu até à porta, mas do pátio partiram dois tiros e teve de parar. Então recordou-se de Ray Jackson. Voltou a cabeça e viu-o cambalear estendendo os braços como tentando agarrar-se para não cair. Tony soube então que o segundo disparo tinha sido dirigido ao foragido. Jackson deu meia-volta sobre os calcanhares e Tony pôde observar a mancha que tinha no estômago.

— O nome, Ray! — pediu ansioso.

Ray deteve-se, encolhendo-se enquanto no seu rosto aparecia a máscara da dor. Olhou fixamente para Trevor, abriu os lábios para dizer algo, mas saiu-lhe uma golfada de sangue. Emitiu um suspiro e caiu no chão, onde ficou imóvel. Tony avançou para ele e deu a volta.

— Jackson!... Jackson!

Não teve resposta, tinha os olhos fechados. Pondo-lhe uma mão no coração verificou que tinha deixado de existir. Então pôs-se de pé e interrompeu o impenetrável silêncio dirigindo-se ao dono do hotel.

— Onde posso encontrar Spencer Murray?

O interrogado balbuciou palavras sem nexo e por fim encolheu os ombros.

— Não sei... Garanto-lhe que não sei. Dormiam aqui ambos, mas agora não tenho ideia onde Murray se possa dirigir.

Tony Trevor fez uma careta de raiva e, com o revolver na mão, deu meia-volta e abandonou o lugar. No pátio não havia ninguém. Saiu para a rua e olhou para baixo e para cima. Por ali andava muita gente, mas sabia que não adiantava perguntar nada. Spencer Murray tinha desaparecido e talvez fosse dar um pouco de trabalho a encontrá-lo.

Começou a andar em direção do «saloon» «A Estrela de Prata». Nos seus lábios notava-se um traço de amargura.

 

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