quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

CLT017.09. Uma cantora providencial

Tony Trevor e Peter Morrow penetraram em «A Estrela de Prata», em El Paso. Era o décimo estabelecimento que visitavam naquela manhã. Até agora não tinham obtido o mínimo resultado. Tony havia perguntado a umas vinte pessoas, mas nenhuma delas lhe soube dizer nada dos dois indivíduos por quem se interessavam.

Havia deixado Lídia Howells descansando no quarto do Hotel República.

Pediram dois copos de «whisky». Depois de beber um trago, Tony comentou, enquanto deitava o chapéu para trás:

— Este assunto põe-se feio... Julgava que esses tipos se encontrariam aqui.

— Bem, será questão de termos paciência. Roma não se conquistou num dia.

A sala estava a abarrotar de público. Um pianista deixou correr os dedos pelo teclado e uma voz começou a cantar uma canção. Abriu-se o pano e apareceu um pequeno cenário e encostada a um dos lados do palco uma loura. A sua voz não tinha nada de particular, mas instantaneamente o público prestou-lhe a maior atenção.

Possuía um corpo formoso e de sugestivas curvas, que ressaltavam dentro do vestido muito cingido e onerosamente decotado. A forma de olhar com os seus grandes olhos verdes, rasgados, e os gestos com que acompanhava a canção, contribuíam grandemente para o seu êxito.

— Infernos — exclamou Peter Morrow. — Mas é Claudette... Uma boa amiga minha.

Tony bebeu um trago de «whisky» e comentou:

— Deve ser o filão desta casa..., mas também pode ser o nosso se está há muito tempo por aqui.

— Ë verdade, não havia pensado nisso. Há mais de um ano que está aqui. Se os tipos que procuramos estão em El Paso, de certeza que ela nos poderá dar alguma indicação.

Morrow perguntou quanto deviam pelo consumo e quando lhe disseram que era um dólar soltou uma maldição.

— Ouve, rapaz. Somente nos ficam três dólares. Se não encontramos depressa um desses tipos vamo-nos ver negros.

A loura desceu uma pequena escada para o «saloon» e serpenteou por entre as mesas, lentamente, fazendo ouvir a sua canção.

Peter Morrow levantou uma mão e fez um sinal. A. jovem respondeu-lhe com um sorriso. Os seus olhos detiveram-se por uns instantes na figura de Tony Trevor. Terminou a sua atuação no meio de uma salva de palmas.

Uns quantos clientes estenderam os braços convidando-a a sentar-se na sua mesa. Mas ela negou todas as ofertas e aproximou-se do lugar onde se encontravam Morrow e Tony. Peter agarrou-a pelos braços nus e, sorrindo, disse-lhe:

— Não tens frio, pequena?

Ela sorriu.

— Sempre com as tuas brincadeiras, eh, Peter? Como vão este ano as celas em Pau Verde?  

Morrow soltou uma gargalhada e a jovem imitou-o. Quando ambos acabaram de rir, Peter indicou Tony e disse:

— Apresento-te um amigo meu, Tony. Um grande amigo.

— Muito gosto, Tony— disse ela, estendendo uma mão ao jovem.

— Felicito-a pela sua atuação, que foi muito boa.

Morrow murmurou:

— Tony está em apuros. Veio à procura de dois tipos a El Paso que lhe devem algum dinheiro. Mas não conhece ninguém aqui e, bem, tu sabes que eu também não sou muito bom fisionomista... Pensamos que nos poderias dar uma ajuda.

A loura olhou para Tony.

— Sabe os seus nomes?

— Não. Mas posso-lhe dar a sua descrição — e Tony deu os sinais dos dois sujeitos com quem tinha feito o negócio que mais tarde em Pau Verde o tinha levado à ruína.

Quando acabou, Claudette ficou um momento pensativa, mordendo o lábio inferior. Por fim disse:

— Creio que os conheço. Esses tipos não podem outros senão Ray Jackson e Spencer Murray. Kay é o da cicatriz no queixo. Pelo que tenho ouvido dizer, são reclamados num montão de sítios.

Peter sorriu, dizendo a Tony:

— Eu não te dizia que ela seria útil?

Tony humedeceu os lábios com a língua.

— Viu-os ultimamente, Claudette?

— Ontem à noite estiveram aqui. Mas, sinceramente, não lhe posso dizer onde estão hospedados. Terá de esperar que voltem aqui esta noite.

— Ê uma pena. Estou interessado em liquidar meu assunto com eles o mais rápido possível.

— Espere um momento— disse Claudette. — Vou perguntar a um amigo.

A loura separou-se deles e encaminhou-se para uma mesa onde um homem conversava amigavelmente com uma jovem ruiva. Claudette demorou três minutos a regressar junto de Tony e Peter.

— Bom, creio que as coisas se vão tornando claras — declarou, cruzando os braços. — Jackson e Murray estão no Hotel «Bom Samaritano». Só têm de sair à rua e voltarem à direita. É a penúltima porta antes de chegar à praça.

— Obrigado, Cdaudette. Queres beber alguma coisa?

A loura olhou-o fixamente e disse:

— Agora não, mas, se esta noite tiver um momento livre, aceitaria algo... de beber.

— Julgo que tenho esse momento livre. Até logo.

Peter foi atrás dele, mas Tony deteve-o junto à porta.

— Espera aqui os resultados. Não vens comigo. Já fizeste bastante por mim.

— Está bem, como queiras.

Tony dirigiu-lhe um sorriso e dando-lhe uma palmada nas costas, saiu do estabelecimento. Minutos mais tarde o jovem penetrava no «Bom Samaritano». Cruzava um pátio com um repuxo ao meio quando viu ao fundo Ray Jackson, o da cicatriz no queixo sentado a uma mesa. Jackson não estava só: acompanhavam-no três homens com quem jogava uma partida de cartas.

Tony começou a andar na sua direção. Fixou os três indivíduos, mas nenhum deles era Spencer Murray. Continuou avançando até que a sua sombra se projetou sobre a mesa e então ficou imóvel Um dos desconhecidos levantou a cabeça ao mesmo tempo que fazia uma careta e dizia:

— Eh, você! Não vê que nos está a tirar a luz?

Naquele momento, Ray Jackson levantou o olho e, ao ver Tony, os seus olhos semicerraram-se.

— Perdoem, amigos — disse Trevor. — Aproximei-me só para perguntar se algum dos senhores estava interessado em fazer comigo a troca de um cavalo.

— Que está para aí a dizer? — retorquiu o que primeiro havia falado. — Não nos interessa nenhuma troca de cavalo. Procure noutro lugar.

Tony olhou fixamente para Ray Jackson.

— E a você? Não lhe interessa essa troca?

As pupilas de Jackson cintilaram.

— Talvez me interessem as condições— murmurou e pôs-se de pé.

— Eh, Ray! — protestou o que não queria trocar cavalo. — Agora que nos estás a ganhar trinta dólares é que vais embora?

Jackson abriu e fechou o punho e de repente descarregou um murro na cara do companheiro. O agredido caiu para trás juntamente com a cadeira e bateu contra a coluna que havia próximo. Ficou imóvel, sem sentidos. Ray abriu e fechou novamente a mão e sorriu para Tony.

— Há tipos que se julgam espertos, amigo. Com esses é preciso ter mão dura.

— É um bom sistema— assentiu Tony.

— Agora falemos dessa troca que propõe... Ou perdeu a vontade já?

Tony meneou a cabeça em sentido negativo.

— Não, continuo a pensar que você e eu podemos chegar a um acordo.

Jackson esfregou uma mão na outra.

— Está bem. Vamos para o bar.

Começou a andar e Trevor foi atrás dele. Chegaram a uma sala onde à esquerda se via um balcão. Na sala havia quinze a vinte homens, quase todos mexicanos e meia dúzia de mulheres. Ouviam-se vozes de bêbados, maldições e gritos. Ray Jackson encostou-se ao balcão e passou a mão pela barba crescida enquanto fixava Tony.

— Não gostou do potro?

--Era um bom animal — disse Tony. — Mas tinha um pequeno defeito.

— Sim?

— O seu legítimo dono tinha sido morto recentemente.

Ray Jackson desatou a rir, fazendo a cicatriz maior.

— Essa é boa, amigo— declarou. — De modo que o pescaram.

— Você e Murray sabiam perfeitamente que me iam pescar. Por isso me propuseram a troca do cavalo.

— Que história é essa? Isso para mim é chinês.

Jackson fez sinal ao homem que estava atrás do balcão para encher dois copos de «whisky».

— Eu não falo chinês, Jackson — disse Tony. — Falo inglês como você. E quando não me entendem também tenho meio de me fazer perceber.

Jackson franziu as sobrancelhas sem deixar de sorrir, pegou no copo que lhe pertencia e bebeu conteúdo de um trago. Em seguida começou a tossir, deu meia-volta e recuou dois ou três passos. Quando se voltou outra vez, enfrentando Tony, tinha um sorriso nos lábios e um revólver na mão esquerda.

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