terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

CLT017.14 E o morto reaparece em quarto do «Bom Samaritano»

Lídia Howells enxugava com um lenço as lágrimas que brotavam dos seus olhos. Estava junto da varanda aberta contemplando as estrelas.

Tony Trevor havia descoberto a grande verdade da sua vida. Ela nunca amou Lee Carey. Foi Lee quem impôs a sua vontade e a dobrou habilmente.

Os acontecimentos haviam-se precipitado nos últimos dias e agora à jovem parecia-lhe um turbilhão. Pela sua mente passaram as cenas com uma rapidez meteórica, naquela selvagem intriga.

Fechou os olhos e apertou as fontes com as mãos. Então soltou um grito.

— Não!... Não posso resistir mais!... Não posso!...

Voltou-se e deixou-se cair de bruços sobre a cama, soluçando desconsoladamente. Assim permaneceu um bocado, dando rédea solta ao seu desespero. De repente bateram à porta. Lídia levantou-se sobressaltada voltando a cabeça

— Quem é? — perguntou.

Viu como a maçaneta da porta girava e esta se abria pouco a pouco. No umbral apareceu o «sheriff» de Pau Verde. Estava imóvel e os seus olhos eram como duas fendas quando se cravaram no rosto de Lídia.

— Smilles! gritou alvoroçada a jovem.

Levantou-se de um salto e correu para o «sheriff» quando este já havia entrado no quarto e fechado a porta nas suas costas. Ele acolheu-a nos seus braços e esta chorou no seu peito.

— Oh, Smilles... Quanto bem me faz a tua presença.

O «sheriff» passou-lhe uma mão pela cabeça acariciando-lha enquanto ela continuava a falar.

— Tens de evitá-lo, Smilles!

— Tenho de evitar o quê?

— Ronald levou Tony Trevor para Pau Verde...

— Se Ronald conseguiu caçá-lo, limitar-se-á cumprir o seu dever levando-o lá.

— Mas não compreendes, Smilles? Ronald nunca entregará Tony. Ele próprio o confessou. Matá-lo-á pelo caminho.

Smilles franziu o sobrolho.

— Porque vai ele fazer isso?

— Ronald quer fazer-me sua mulher. Odiou sempre Lee Carey, mas tinha medo e arranjou as coisas de forma a matá-lo. Foi Ronald quem contratou os dois «pistoleiros» que Tony Trevor encontrou antes de chegar a Pau Verde.

— Ronald confessou também isso?

— Oh, não! Somente o que se refere a mim.

— Compreendo— o «sheriff» deu uns passos até à cama e sentou-se na beira.

— Mas que fazer?...— perguntou Lídia, perplexa. --Tem de ir em seu auxílio.

Smilles sorriu dizendo:

— Aposto que o teu amigo Tony arranjará maneira de livrar-se de Ronald.

— Mas se ele não leva armas!... Não o conseguirá.

Houve uma pausa e depois o «sheriff» disse com voz pausada:

— Irei imediatamente, pequena, mas antes quero que me digas o que há entre ti e Tony Trevor. Ajudaste-o a escapar e vieste com ele para El Paso.

— Não quero falar nisso agora.

— Porque não? Ê um momento bom. Sempre te quis como a uma filha. Tu bem o sabes, Lídia. Não te recordas quando me contavas todos os teus segredos? Confiavas em mim... Porque não o fazes agora?

A jovem voltou as costas ao representante Lei.

— Está bem. Gosto desse homem. Fez uma larga pausa.

— Assim, pois, enamoraste-te dele?

— Sim.

— Tony sabe disso?

— Confessou-me que também me ama.

— Em tal caso, se Tony Trevor provar que na teve nada a ver com a morte de Lee Carey, casarás com ele?

— Sim.

— Estás convencida que esse homem te convém?

— Não tenho dúvidas a esse respeito.

— Porquê? Sabes por acaso algo dele? De onde vem? Qual a sua procedência? Que tem sido a sua vida? — a voz do «sheriff» soou áspera.

— Não me importa o seu passado.

— E se fosse um delinquente?... Um assassino?

Lídia voltou-se repentinamente fixando-o com os olhos chamejantes.

— Não é nada disso!

— Como o sabes? Confessou-te ele?

— Oh, por favor, Smilles... Não tivemos oportunidade para contarmos nada até agora. Só sei que o amo e que ele também me ama.

— Perdoa, filha. Nunca posso esquecer que apesar de tudo sou o «sheriff» de Pau Verde. Uma das obrigações na minha profissão é perguntar, sobretudo quando chega à nossa comunidade um homem que, de um modo ou de outro, se relaciona com a povoação.

— Agora que satisfiz a tua curiosidade, vais de unia vez procurá-lo?

— Não irei só. Tu vens comigo. Será muito melhor. Suponho que não terás pensado em permanecer aqui. A tua mãe precisa de ti... E melhor que empreendas a viagem agora mesmo... comigo— o «sheriff» levantou-se e aproximou-se da varanda.

Durante um momento ficou a ouvir os gritos que vinham das casas próximas.

— Esta não é uma cidade para ti, Lídia.

— Está bem. Irei contigo.

Smilles aproximou-se da jovem, agarrou-lhe numa mão e apertou-a entre as suas.

— Sempre desejei para ti, a maior das felicidades do mundo, Lídia. Sempre.

A jovem olhou para o «sheriff» e disse:

— Sei-o, Smilles. Tem sido muito bom para mim.

— Não consentirei que ninguém te faça mal. Palavra que sofri muito por ti.

— Smilles, agora me lembro que Ronald disse que tu havias desistido de vir a El Paso. Declarou que decidiu fazer a viagem sozinho.

— Ele disse isso?

— Sim. Recordo-o perfeitamente.

— Bem, isso prova que tu inclinaste a balança. Depois de Ronald se ter ido embora, pensei que não podia deixar-te aqui só entre esta gentalha. Vim só por tua causa, pequena. Para levar-te para a tua mãe.

Ela acercou-se dele e beijou-o na testa.

De repente a porta abriu-se e uma voz chamo de fora:

— Eh, Tony!

O «sheriff» e Lídia voltaram-se e viram no umbral quieto e perplexo, Peter Morrow.

— Inferno, «sheriff». Perdoe a interrupção. Passava por aqui e lembrei-me de saudar a senhora. Bom, já nos veremos outro dia. Até à vista e dê 'cumprimentos a Luke.

Peter Morrow começou a girar e de repente estalou a voz de Smilles:

— Quieto, Peter Morrow!

Peter voltou-se pondo uma cara compungida.

— Que deseja, «sheriff»?

— Ainda te atreves a perguntar?... Ajudaste Tony Trevor a escapar-se do cárcere!

— Eu? — Abriu os olhos. — Quem disse isso? Ninguém pode acusar-me disso. Já lhe disse que me encontro casualmente em El Paso. Um casal mexicano convidou-me para padrinho de batismo do seu filho e eu sou um tipo que, como você sabe, gosto de cumprir com as minhas obrigações sociais.

— Cala-te, se não queres agravar a tua situação!

Peter olhou a biqueira das suas botas.

— Está bem, calar-me-ei.

— Vais só responder às minhas perguntas. Que fazias realmente aqui, Peter? E por Deus que vais responder a verdade ou devolvo-te à cela de onde saíste! E juro-te que desta vez não vai ser por dez dias!

— A mim não pode acusar-me de nada. Eu cumpri a minha condenação. Vim aqui como um honrado cidadão.

— Acompanhando Tony e Lídia.

— Sim, senhor, mas viemos cumprir um dever de justiça.

— Que entendes tu por dever de justiça?

— Viemos à procura dos dois tipos que mataram Lee Carey. Já sabe, os fulanos que trocaram o cavalo e compraram o relógio a Trevor.

— Tu também acreditas nessa história?

— Não se trata de história nenhuma, «sheriff». Ê a pura verdade. Precisamente vim aqui para dizer a Trevor que já sei onde se esconde Murray.

— Murray?

— Sim, o companheiro de Jackson.

— Queres ser mais claro?

— Murray e Jackson são os tipos de que lhe falei antes. Mas acontece que somente um está vivo, pois Murray matou Jackson, quando falava com Tony. -Eu estava vigiando o hotel «Bom Samaritano», onde se hospedava Murray, e passadas umas horas acercou-se dali para recolher o cavalo. Segui-o até uma pousada mexicana. Aproximei-me de uma janela e consegui ouvir Murray pedir um quarto. Pensei que Trevor gostaria de ter uma conversa com Murray.

O «sheriff» fez um movimento afirmativo com a cabeça.

— Então também tu te converteste num representante da Lei.

Peter Morrow sorriu satisfeito.

— E parece que não vou mal, eh, «sheriff»?

Pela porta aberta apareceram nesse momento Ronald e Trevor. Este disse com voz jovial:

— Pelo contrário, Peter. Fazes muito bem.

— Tony! — exclamou Lídia e correu ao encontro do jovem.

Trevor, com o revólver na mão direita, passou pelas costas da jovem o braço livre e beijou-a suavemente nos lábios.

— Que espera para o deter, «sheriff»?

Smilles observou o revólver que Tony exibia.

— Tem um formoso «Colt» na mão e não sinto vontade de suicidar-me.

Peter Morrow falou atropeladamente:

— Sei onde está Murray, Tony. Segui-o até uma pousada -próxima de El Paso. Devemos ir já, embora esteja seguro de que estará lá toda a manhã.

— Dá conta do que está fazendo, Tony? — disse o «sheriff».

— Tem alguma coisa a dizer?

— Creio que está complicando demasiado as coisas.

— Complicaram-mas primeiro a mim. O que faço agora é achar o fio da meada. Você, o juiz, o fiscal e até o meu próprio advogado de defesa, julgaram que a minha história dos dois tipos era pura invenção. Já que você está em El Paso comprovará que os factos que eu relatei são verdadeiros.

— De acordo, Trevor. Vou-lhe conceder uma margem de confiança. Iremos à pousada e teremos uma conversa com esse Murray.

De repente soou uma gargalhada e uma voz disse:

— Não se incomodem, senhores. Eu sou Murray. Deixe cair esse revólver, Trevor, ou leva um tiro!

Tony deixou o revólver. Todos voltaram a cabeça para a porta. Trevor pôde ver, com efeito, Spencer Murray, apoiado numa perna e segurando um «Colt» em cada mão.

— Demónios! — exclamou o foragido. — Isto parece uma reunião familiar.

O «sheriff» humedeceu os lábios com a língua.

— Posso fazer-lhe uma pergunta, Murray?

— Claro que sim, avô. Pode fazê-la. Sempre respeitei os cabelos brancos.

— Conhece este homem? — Smilles indicou Tony.

— Sim, conheço— assentiu Murray.

— De… onde?

— Ed e um amigo meu encontrámo-lo próximo de Pau Verde. Trocámos-lhe o seu cavalo por outro que nós levávamos e além disso compramos-lhe por vinte dólares o seu relógio.

— Se tudo isso é verdade— disse o «sheriff» — não compreendo uma coisa.

— Pergunte, avô— disse outra vez Murray, sorrindo.

— Porque diabo veio você aqui? Porque ao dar conta de que Trevor andava atrás de si não fugiu para o México, por exemplo? Porque veio a esta casa, onde precisamente estão as pessoas a quem você mais interessa?

Houve um silêncio e Murray continuou sorrindo. Trevor disse com voz rouca:

— Eu posso dar-lhe a resposta, «sheriff». A mais assombrosa resposta que você pode ouvir. Acabo de compreender a verdade. Ali atrás, no corredor, está o homem chave de todo este assunto... O próprio Lee Carey.

Fez um pesado silêncio e pela abertura da porta apareceram umas botas. Em sua continuação urna pernas, um tronco e um rosto, uma cara de olho azuis e lábios grossos onde bailava um sorriso. O homem avançou silencioso até que todo o se corpo ficou na abertura, apoiando-se à parede.

Lídia Howells soltou uma exclamação:

— Lee!

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