Lídia Howells enxugava com um lenço as lágrimas que brotavam dos seus olhos. Estava junto da varanda aberta contemplando as estrelas.
Tony Trevor havia descoberto a grande verdade da sua vida. Ela nunca amou Lee Carey. Foi Lee quem impôs a sua vontade e a dobrou habilmente.
Os acontecimentos haviam-se precipitado nos últimos dias e agora à jovem parecia-lhe um turbilhão. Pela sua mente passaram as cenas com uma rapidez meteórica, naquela selvagem intriga.
Fechou os olhos e apertou as fontes com as mãos. Então soltou um grito.
— Não!... Não posso resistir mais!... Não posso!...
Voltou-se e deixou-se cair de bruços sobre a cama, soluçando desconsoladamente. Assim permaneceu um bocado, dando rédea solta ao seu desespero. De repente bateram à porta. Lídia levantou-se sobressaltada voltando a cabeça
— Quem é? — perguntou.
Viu como a maçaneta da porta girava e esta se abria pouco a pouco. No umbral apareceu o «sheriff» de Pau Verde. Estava imóvel e os seus olhos eram como duas fendas quando se cravaram no rosto de Lídia.
— Smilles! gritou alvoroçada a jovem.
Levantou-se de um salto e correu para o «sheriff» quando este já havia entrado no quarto e fechado a porta nas suas costas. Ele acolheu-a nos seus braços e esta chorou no seu peito.
— Oh, Smilles... Quanto bem me faz a tua presença.
O «sheriff» passou-lhe uma mão pela cabeça acariciando-lha enquanto ela continuava a falar.
— Tens de evitá-lo, Smilles!
— Tenho de evitar o quê?
— Ronald levou Tony Trevor para Pau Verde...
— Se Ronald conseguiu caçá-lo, limitar-se-á cumprir o seu dever levando-o lá.
— Mas não compreendes, Smilles? Ronald nunca entregará Tony. Ele próprio o confessou. Matá-lo-á pelo caminho.
Smilles franziu o sobrolho.
— Porque vai ele fazer isso?
— Ronald quer fazer-me sua mulher. Odiou sempre Lee Carey, mas tinha medo e arranjou as coisas de forma a matá-lo. Foi Ronald quem contratou os dois «pistoleiros» que Tony Trevor encontrou antes de chegar a Pau Verde.
— Ronald confessou também isso?
— Oh, não! Somente o que se refere a mim.
— Compreendo— o «sheriff» deu uns passos até à cama e sentou-se na beira.
— Mas que fazer?...— perguntou Lídia, perplexa. --Tem de ir em seu auxílio.
Smilles sorriu dizendo:
— Aposto que o teu amigo Tony arranjará maneira de livrar-se de Ronald.
— Mas se ele não leva armas!... Não o conseguirá.
Houve uma pausa e depois o «sheriff» disse com voz pausada:
— Irei imediatamente, pequena, mas antes quero que me digas o que há entre ti e Tony Trevor. Ajudaste-o a escapar e vieste com ele para El Paso.
— Não quero falar nisso agora.
— Porque não? Ê um momento bom. Sempre te quis como a uma filha. Tu bem o sabes, Lídia. Não te recordas quando me contavas todos os teus segredos? Confiavas em mim... Porque não o fazes agora?
A jovem voltou as costas ao representante Lei.
— Está bem. Gosto desse homem. Fez uma larga pausa.
— Assim, pois, enamoraste-te dele?
— Sim.
— Tony sabe disso?
— Confessou-me que também me ama.
— Em tal caso, se Tony Trevor provar que na teve nada a ver com a morte de Lee Carey, casarás com ele?
— Sim.
— Estás convencida que esse homem te convém?
— Não tenho dúvidas a esse respeito.
— Porquê? Sabes por acaso algo dele? De onde vem? Qual a sua procedência? Que tem sido a sua vida? — a voz do «sheriff» soou áspera.
— Não me importa o seu passado.
— E se fosse um delinquente?... Um assassino?
Lídia voltou-se repentinamente fixando-o com os olhos chamejantes.
— Não é nada disso!
— Como o sabes? Confessou-te ele?
— Oh, por favor, Smilles... Não tivemos oportunidade para contarmos nada até agora. Só sei que o amo e que ele também me ama.
— Perdoa, filha. Nunca posso esquecer que apesar de tudo sou o «sheriff» de Pau Verde. Uma das obrigações na minha profissão é perguntar, sobretudo quando chega à nossa comunidade um homem que, de um modo ou de outro, se relaciona com a povoação.
— Agora que satisfiz a tua curiosidade, vais de unia vez procurá-lo?
— Não irei só. Tu vens comigo. Será muito melhor. Suponho que não terás pensado em permanecer aqui. A tua mãe precisa de ti... E melhor que empreendas a viagem agora mesmo... comigo— o «sheriff» levantou-se e aproximou-se da varanda.
Durante um momento ficou a ouvir os gritos que vinham das casas próximas.
— Esta não é uma cidade para ti, Lídia.
— Está bem. Irei contigo.
Smilles aproximou-se da jovem, agarrou-lhe numa mão e apertou-a entre as suas.
— Sempre desejei para ti, a maior das felicidades do mundo, Lídia. Sempre.
A jovem olhou para o «sheriff» e disse:
— Sei-o, Smilles. Tem sido muito bom para mim.
— Não consentirei que ninguém te faça mal. Palavra que sofri muito por ti.
— Smilles, agora me lembro que Ronald disse que tu havias desistido de vir a El Paso. Declarou que decidiu fazer a viagem sozinho.
— Ele disse isso?
— Sim. Recordo-o perfeitamente.
— Bem, isso prova que tu inclinaste a balança. Depois de Ronald se ter ido embora, pensei que não podia deixar-te aqui só entre esta gentalha. Vim só por tua causa, pequena. Para levar-te para a tua mãe.
Ela acercou-se dele e beijou-o na testa.
De repente a porta abriu-se e uma voz chamo de fora:
— Eh, Tony!
O «sheriff» e Lídia voltaram-se e viram no umbral quieto e perplexo, Peter Morrow.
— Inferno, «sheriff». Perdoe a interrupção. Passava por aqui e lembrei-me de saudar a senhora. Bom, já nos veremos outro dia. Até à vista e dê 'cumprimentos a Luke.
Peter Morrow começou a girar e de repente estalou a voz de Smilles:
— Quieto, Peter Morrow!
Peter voltou-se pondo uma cara compungida.
— Que deseja, «sheriff»?
— Ainda te atreves a perguntar?... Ajudaste Tony Trevor a escapar-se do cárcere!
— Eu? — Abriu os olhos. — Quem disse isso? Ninguém pode acusar-me disso. Já lhe disse que me encontro casualmente em El Paso. Um casal mexicano convidou-me para padrinho de batismo do seu filho e eu sou um tipo que, como você sabe, gosto de cumprir com as minhas obrigações sociais.
— Cala-te, se não queres agravar a tua situação!
Peter olhou a biqueira das suas botas.
— Está bem, calar-me-ei.
— Vais só responder às minhas perguntas. Que fazias realmente aqui, Peter? E por Deus que vais responder a verdade ou devolvo-te à cela de onde saíste! E juro-te que desta vez não vai ser por dez dias!
— A mim não pode acusar-me de nada. Eu cumpri a minha condenação. Vim aqui como um honrado cidadão.
— Acompanhando Tony e Lídia.
— Sim, senhor, mas viemos cumprir um dever de justiça.
— Que entendes tu por dever de justiça?
— Viemos à procura dos dois tipos que mataram Lee Carey. Já sabe, os fulanos que trocaram o cavalo e compraram o relógio a Trevor.
— Tu também acreditas nessa história?
— Não se trata de história nenhuma, «sheriff». Ê a pura verdade. Precisamente vim aqui para dizer a Trevor que já sei onde se esconde Murray.
— Murray?
— Sim, o companheiro de Jackson.
— Queres ser mais claro?
— Murray e Jackson são os tipos de que lhe falei antes. Mas acontece que somente um está vivo, pois Murray matou Jackson, quando falava com Tony. -Eu estava vigiando o hotel «Bom Samaritano», onde se hospedava Murray, e passadas umas horas acercou-se dali para recolher o cavalo. Segui-o até uma pousada mexicana. Aproximei-me de uma janela e consegui ouvir Murray pedir um quarto. Pensei que Trevor gostaria de ter uma conversa com Murray.
O «sheriff» fez um movimento afirmativo com a cabeça.
— Então também tu te converteste num representante da Lei.
Peter Morrow sorriu satisfeito.
— E parece que não vou mal, eh, «sheriff»?
Pela porta aberta apareceram nesse momento Ronald e Trevor. Este disse com voz jovial:
— Pelo contrário, Peter. Fazes muito bem.
— Tony! — exclamou Lídia e correu ao encontro do jovem.
Trevor, com o revólver na mão direita, passou pelas costas da jovem o braço livre e beijou-a suavemente nos lábios.
— Que espera para o deter, «sheriff»?
Smilles observou o revólver que Tony exibia.
— Tem um formoso «Colt» na mão e não sinto vontade de suicidar-me.
Peter Morrow falou atropeladamente:
— Sei onde está Murray, Tony. Segui-o até uma pousada -próxima de El Paso. Devemos ir já, embora esteja seguro de que estará lá toda a manhã.
— Dá conta do que está fazendo, Tony? — disse o «sheriff».
— Tem alguma coisa a dizer?
— Creio que está complicando demasiado as coisas.
— Complicaram-mas primeiro a mim. O que faço agora é achar o fio da meada. Você, o juiz, o fiscal e até o meu próprio advogado de defesa, julgaram que a minha história dos dois tipos era pura invenção. Já que você está em El Paso comprovará que os factos que eu relatei são verdadeiros.
— De acordo, Trevor. Vou-lhe conceder uma margem de confiança. Iremos à pousada e teremos uma conversa com esse Murray.
De repente soou uma gargalhada e uma voz disse:
— Não se incomodem, senhores. Eu sou Murray. Deixe cair esse revólver, Trevor, ou leva um tiro!
Tony deixou o revólver. Todos voltaram a cabeça para a porta. Trevor pôde ver, com efeito, Spencer Murray, apoiado numa perna e segurando um «Colt» em cada mão.
— Demónios! — exclamou o foragido. — Isto parece uma reunião familiar.
O «sheriff» humedeceu os lábios com a língua.
— Posso fazer-lhe uma pergunta, Murray?
— Claro que sim, avô. Pode fazê-la. Sempre respeitei os cabelos brancos.
— Conhece este homem? — Smilles indicou Tony.
— Sim, conheço— assentiu Murray.
— De… onde?
— Ed e um amigo meu encontrámo-lo próximo de Pau Verde. Trocámos-lhe o seu cavalo por outro que nós levávamos e além disso compramos-lhe por vinte dólares o seu relógio.
— Se tudo isso é verdade— disse o «sheriff» — não compreendo uma coisa.
— Pergunte, avô— disse outra vez Murray, sorrindo.
— Porque diabo veio você aqui? Porque ao dar conta de que Trevor andava atrás de si não fugiu para o México, por exemplo? Porque veio a esta casa, onde precisamente estão as pessoas a quem você mais interessa?
Houve um silêncio e Murray continuou sorrindo. Trevor disse com voz rouca:
— Eu posso dar-lhe a resposta, «sheriff». A mais assombrosa resposta que você pode ouvir. Acabo de compreender a verdade. Ali atrás, no corredor, está o homem chave de todo este assunto... O próprio Lee Carey.
Fez um pesado silêncio e pela abertura da porta apareceram umas botas. Em sua continuação urna pernas, um tronco e um rosto, uma cara de olho azuis e lábios grossos onde bailava um sorriso. O homem avançou silencioso até que todo o se corpo ficou na abertura, apoiando-se à parede.
Lídia Howells soltou uma exclamação:
— Lee!
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