sábado, 25 de fevereiro de 2023

ARZ116.08 Emboscada no próprio gabinete do xerife

Quando Mike regressou a Lenox, as ruas encontravam-se absolutamente desertas e silenciosas. O ruído dos cascos dos cavalos ressoava fortemente na solidão da noite.

Não se via luz em qualquer janela e apenas na extremidade da rua principal se distinguia a débil claridade que saía de dentro de uma das tabernas. Seguido do preso e do seu ajudante, depressa atingiram a porta da repartição.

Encontraram tudo fechado, e Chuck não apareceu para os receber. Aquilo causou uma certa surpresa ao mancebo, pensando, entretanto, que era natural que o carcereiro se tivesse deixado adormecer.

Entraram no edifício, obrigando o ferido a instalar--se num recanto onde se encontrava uma espécie de tarimba. O ferimento do ombro tinha sangrado com abundância e a fraqueza do prisioneiro era bem patente. A bala tinha-o atravessado sem atingir qualquer osso, pelo que se limitou a fazer-lhe uma desinfeção e a colocar-lhe novamente as ligaduras.

— Amanhã virá ver-te o médico, se já lhe tiver passado a borracheira — disse o mancebo. — Mas primeiro que tudo, vais explicar-me quais eram os vossos objetivos ao atacar o rancho de Davies.

— Eu só fiz aquilo que me ordenaram — replicou o ferido.

— Quem deu essas ordens?

— Mills.

— Quem é esse Mills?

— E o que nos recrutou em Graham. Paga-nos vinte dólares por cada trabalho. Disse que não corríamos qualquer perigo. Tratava-se, simplesmente, de assustar um pobre velho e a sua filha.

— E Blitte?

— Só conheço esse tipo de nome. Nunca lhe pus a vista em cima.

—E de Long, também não ouviste falar?

O preso encolheu os ombros.

— Conheço muitas pessoas com esse apelido.

— Deves saber que, por teres sido apanhado a disparar contra um rancheiro indefeso, tenho o direito de te enforcar.

Um lampejo de terror fez brilhar os olhos do prisioneiro.

— Eu não disparei contra o rancho. As ordens que tínhamos era de disparar para o ar, apenas para intimidar.

— Davies foi atingido numa das pernas.

— Não fui eu que disparei.

— Talvez; mas foste surpreendido com armas na mão. A lei é inflexível nestes casos.

— Mesmo sem ter havido vítimas?

— Pune-se não só o crime propriamente dito, mas também o acto em si mesmo. A intenção é tudo. Amanhã serás submetido a julgamento e da sentença que vier a ser proferida não haverá apelação. O outro parecia vacilar.

— E se eu disser o que sei?

— Se contribuíres para a descoberta dos responsáveis, a tua condenação pode ser bastante suave.

O homem calou-se. Era evidente que o prisioneiro hesitava entre confessar a verdade e o receio das represálias de que pudesse vir a ser vítima.

— Entra ali para o meu gabinete — disse Mike, indicando-lhe a porta do fundo.

Naquele entrementes, Manuel dava-se à tarefa de preparar o café. Fez um pequeno sinal a Manuel, a que ele correspondeu com outro. O prisioneiro ergueu-se e encaminhou-se para a porta de acesso ao gabinete do xerife. Mike empurrou os batentes e fez passar o prisioneiro adiante de si.

Mal acabara de transpor a porta, quando um enorme estampido se repercutiu dentro das quatro paredes do compartimento.

Levado pelo próprio instinto, Mike deu um salto para o lado enquanto levava velozmente a mão ao seu revólver. Viu o prisioneiro vacilar e levar ambas as mãos ao peito, caindo seguidamente, desamparado, a todo o comprimento. Manuel, que não tinha conseguido ainda entrar na cozinha, voltara-se instantaneamente, já com o revólver empunhado.

— Vigia essa porta e atira contra o primeiro que tente sair daí — gritou Mike.

Saiu imediatamente para a rua e deu uma volta completa ao edifício enquanto aos seus ouvidos ressoava o ruído dos cascos de um cavalo que se afastava, conseguindo distinguir ainda um vulto que se esgueirava por entre as sombras da noite.

Resultaria completamente inútil pensar em perseguir o fugitivo em meio da escuridão, visto que, muito antes de conseguir montar a cavalo, já ele se teria perdido na distância.

Aproximou-se então da janela que dava para o gabinete, reparando que esta se achava escancarada e que a luz do candeeiro permanecia acesa. O compartimento estava vazio. Apenas o corpo do prisioneiro, já sem vida, continuava estendido no mesmo lugar onde fora surpreendido pela bala que o vitimara.

Voltou a entrar em casa e, ajudado por Manuel, retirou da sala o corpo do assassinado.

— Que te parece tudo isto? — perguntou ao seu ajudante. — Parece-me que a pessoa que disparou o fez porque não queria que este tipo desse com a língua nos dentes.

— Não é de acreditar que alguém soubesse que tínhamos trazido o prisioneiro connosco.

— Então...

Mike acenou afirmativamente, adivinhando o que o seu ajudante estava pensando.

—E isso, esse tipo estava à espera que eu entrasse no gabinete para me assassinar. Ainda a porta não acabava de ser aberta quando o tiro foi disparado, sem haver tempo para averiguar qual era a pessoa que ia a entrar.

— E Chuck?

— Pensei nele logo que aqui entrámos.

— Queres dizer que...

— Não é natural que se tenha ausentado sem aguardar o nosso regresso.

Manuel cerrou os punhos.

— O grande safado! Se chego a deitar-lhe as mãos...

— Nada de fazer juízos temerários. Amanhã saberemos ao certo se ele desapareceu. Porque, no caso de ter sido ele, não é de admitir que se atreva a voltar aqui.

— A não ser que se convença que não foi visto por ninguém.

— Isso é óbvio. E sendo assim, não tardará dez minutos que ele não apareça por aqui. Nada me admiraria que ele se lembre de dizer que saiu a dar uma volta e que ficou surpreendido ao ouvir a detonação.

Mike encaminhou-se para a janela e pôs-se à escuta. O silêncio mais completo envolvia toda a povoação. Manuel, postado por detrás do xerife, prestava também a maior atenção ao mínimo ruído que revelasse a aproximação de alguém. Subitamente, Mike endireitou-se.

— Que há?

— Não ouviste?

— Não — respondeu o mexicano. — Absolutamente nada.

— Ouvi uma espécie de gemido muito próximo daqui.

Saíram de casa e detiveram-se no pátio durante alguns momentos. Foi então que aos seus ouvidos chegou, agora mais percetivelmente, um vago ruído muito parecido com um lamento.

Dirigiram a sua atenção para um amontoado de troncos. Mike acendeu um fósforo e, à frouxa claridade da chama, viram um corpo estendido por detrás dos toros da lenha.

Era o pobre carcereiro, solidamente amarrado com cordas e sangrando abundantemente da cabeça. Transportaram-no para a residência, estendendo-o sobre a tarimba. Alguns golos de uísque conseguiram reanimá-lo. Tinha recebido uma violenta pancada e encontrava-se completamente atordoado. O sangue escorria-lhe ainda de um golpe aberto na testa.

— Fui atacado pelas costas — balbuciou a custo. —Dei conta de que andava alguém atrás da casa e quando fui averiguar o que se passava, fui cobardemente agredido sem que pudesse ver quem me atacou.

Era por demais evidente que o homem dizia a verdade e que nada sabia acerca do que se passara. Não havia, pois, qualquer dúvida de que se tratava de um piano para o eliminarem. Quando, daí por momentos, Chuck pôde levantar-se, conduziram-no junto do cadáver.

— Sabes quem seja este figurão? — perguntou Mike.

Chuck examinou-o com a maior atenção.

— Não é tipo cá da região. Esta classe de gente costuma ser recrutada, ou no Passo ou em Benson. Os cabecilhas não gostam de se servir de gente cá da região, para não serem facilmente reconhecidos.

Mike e Manuel resolveram então estabelecer um serviço de vigilância por turnos, a fim de prevenir qualquer surpresa. Chuck daria a sua colaboração quando estivesse restabelecido do abalo sofrido. À noite, porém, decorreu com a maior normalidade e um novo dia surgiu, radioso, sobre Lenox.

Quando, nessa mesma manhã, saiu para a rua, pareceu-lhe ver estampado no rosto de diversas pessoas uma espécie de admiração por verem que ainda ali se encontrava e esse facto dava a todos uma espécie de confiança a que, há muito, não estavam habituados.

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