A pequena caravana avançava lentamente sob o sol brilhante pela margem duma pequena corrente de água que se encaminhava para o sul e pela parte oriental de um largo vale, entre colinas arborizadas dum lado e lombas de vegetação luxuriante do outro.
Eram dez da manhã do décimo dia de marcha. Isabel cavalgava entre Torres é Rand, uns cem metros adiante do carro e do resto da escolta. A jovem ia falando:
— Chegaremos a casa amanhã ao meio-dia. Este é o rio Navasota. Valle Hermoso fica do outro lado, dessas colinas. Há-de gostar de Valle Hermoso, senhor Allen. Quatrocentos e cinquenta quilómetros quadrados da melhor terra do Texas, oito mil reses e vinte mil ovelhas. Tudo é nosso.
— Têm muita gente ao vosso serviço?
— Sessenta vaqueiros, oitenta pastores de ovelhas e quarenta camponeses. Valle Hermoso é uma verdadeira povoação, de quase quinhentos habitantes. Além disso estamos em relativas boas relações com os peles-vermelhas, pois não esquecem que meu pai foi sempre seu amigo.
— Compreendo. Onde fica o rancho de Seth Markham?
Isabel e Torres trocaram um olhar rápido. A jovem cerrou os lábios e indicou o norte com o indicador.
— Setenta quilómetros ao norte, entre as colinas, num vale aberto.
— Muita gente com ele?
— Uns cinquenta ou sessenta homens, segundo as nossas últimas informações. Além disso pode contar com os habitantes duma nova povoação junto ao rio Braços, chamada Waco. Deve haver ali uns duzentos americanos de ambos os sexos.
— Essa povoação fica muito longe de Valia Hermoso? — A umas cinquentas milhas, rio acima. — Compreendo. Então esses que se estão a aproximar não podem ser viajantes de passagem para a povoação. Também não são índios.
A jovem e o mexicano olharam na direção que lhes indicava. Uma dezena de cavaleiros aparecia por entre as árvores no limite do bosque próximo, à direita da caravana, e a uns seiscentos metros de distância.
Isabel e Torres olharam-se. A voz da jovem soou seca, sem se alterar:
— Voltemos para junto do carro, depressa.
Assim fizeram. Barclay e os sete vaqueiros tinham já visto os homens que se aproximavam. O primeiro adiantou-se ao encontro de Isabel e interpelou-a com as sobrancelhas franzidas:
— Não gosto nada disto.
— Nem eu. Preparemos as armas. Vá para dentro do carro, menina Isabel. Nós nos encarregaremos dessa gente.
— Não vou ficar fora da luta, Manuel.
— Vá para o carro, menina Cortés — disse Rand num tom cortante enquanto preparava a sua espingarda, sem tirar os olhos dos que se aproximavam abrindo-se cada vez mais. — Por muito habituada que esteja a estas lutas, bater-se é coisa pari homens.
Isabel olhou para o grupo, voltou depois o olhar para Rand e depois seguiu o seu conselho sem gracejar, alcançando o carro, saltando do cavalo com agilidade e metendo-se no veículo.
Os três homens seguiram-na, colocaram-se diante do carro mas voltados para os que se aproximavam. Os vaqueiros já, estavam preparados também.
Mas os cavaleiros não pareciam ter pressa de começar aos tiros. Aproximaram-se até uns duzentos metros de distância e então adotaram a tática índia de cavalga em fila ao lado da pequena caravana. Rand franziu as sobrancelhas. Podia contar perfeitamente doze homens e eles eram apenas onze, contando com a rapariga. Porque não atacavam duma vez?
Torres aproximou-se de Rand.
— Não gosto nada disto, senhor Allen. Preferia que começassem a fazer fogo.
— Também eu. Acha que nos estão a levar para uma armadilha?
— É isso que eu penso.
— O senhor conhece o terreno. Onde poderiam prepará-la?
— A pouco mais de uma milha, temos de passar entre o rio e o bosque, se continuarmos como vamos. Poderia haver ali alguém à nossa espera e estes limitar-se-iam então a empurrar-nos.
— Mas porque surgiriam à nossa vista antes?
—Para nos cortarem a retirada. Tal como vão, bastar-lhes-á atrasarem-se um pouco quando nos tiverem na armadilha, para o conseguirem. Se não tivessem aparecido, nós poderíamos ter vadeado o rio antes de chegar-mos àquele sítio, tomando por um terreno mais descoberto e melhor para o carro.
— Compreendo, Torres, vamos atacá-los imediatamente.
O mexicano olhou-o fixamente. Iam a boa velocidade. pelo terreno plano onde a erva alta amarelecera e os inimigos se mantinham a distância sem fazerem qualquer demonstração de agressividade.
— Quer dizer que nos vamos dirigir para eles? Fá-lo-ia com gosto se não viesse a menina Isabel...
— É por ela que o vamos fazer. Suspeito que se trata de gente de Markham e sabem que se encontra entre nós. Onde poderemos atacar com melhores probabilidades a nosso favor?
Barclay havia-se aproximado deles entretanto, ao ver a atitude dos outros. Respondeu ele:
— A trezentas jardas daqui é uni bom sítio. Podemos chegar ao rio, vadeá-lo e sair por terreno conveniente.
— Bem, vou dizer à menina Cortés. Torres, avise os vaqueiros para abrirem fogo quando ouvirem o meu disparo. Que atirem, de preferência aos cavalos.
— Sim, senhor Allen. Lã vou.
Isabel encontrava-se junto do condutor, com a sua espingarda preparada. Dirigiu-lhe um olhar claramente interrogativo.
— Porque não nos atacarão? Põem-me nervosa.
— Torres e Barclay suspeitam que nos estão a empurrar para uma emboscada. Mas nós vamos atacar, passando através da sua linha. Creio que são homens de Markham.
Ela sustentou o seu olhar. Depois disse com simplicidade:
— Adiante. O senhor tem agora o comando.
— Bem.
Fez voltar o cavalo e colocou-se junto dos seus homens mais adiantados. Barclay pôs-se do lado oposto. Torres aproximou-se dele.
— Preparados. Já estão avisados.
— Diga-me qual é o sítio próprio.
— Aí, ao passar o algodoeiro grande. O rio corre por um leito de areia e é fácil de atravessar.
Os inimigos estavam agora entre o rio e eles, mantendo a distância. Rand fez, mentalmente, um cálculo e depois adiantou o seu cavalo alguns metros. Ao chegarem ao ponto combinado fez voltar o cavalo na direção da linha contrária e esporeou violentamente o animal, ao mesmo tempo que preparava a espingarda e emitia um longo grito de guerra.
Torres respondeu-lhe, Barclay e o condutor do carro também e todos o imitaram no mesmo instante. A sua decisão colheu os outros de surpresa, desconcertando-os durante alguns minutos. Depois viu-os lançar mão das espingardas e levantá-las e soaram os estampidos no ar quieto da manhã.
Rand sentiu uivar uma bala muito perto de si. Cerrando os lábios, escolheu um alvo, apertou o gatilho e um cavalo sarapintado, atingido na cabeça, relinchou, erguendo-se subitamente sobre as patas traseiras e derrubando o cavaleiro quando se dispunha a disparar. No mesmo instante os seus companheiros abriram fogo contra a linha inimiga e outros dois cavaleiros foram desmontados, enquanto um quarto era atingido diretamente pelo chumbo. Os outros estavam agora desconcertados e sem saber o que fazer.
Rand lançou-se na direção do rio, fazendo fogo sem cessar. Derrubou outro inimigo metendo-lhe outra bala no flanco e atingiu um pouco depois o que primeiro desmontara e que, meio aturdido pela queda, se levantava.
Era um tipo corpulento com cabelos e barba ruivos. Levou a mão ao revólver e tirou-o, levantando-o e disparando contra Rand. Este obrigou o seu cavalo a dar um salto brusco, de lado e o projétil arrancou uma tira de pele e carne da anca, fazendo-o relinchar.
Endireitando-o com mão de ferro e utilizando a espingarda como uma maça, Rand atirou-se para cima do outro e, antes que ele pudesse fazer alguma coisa para o impedir ou pudesse voltar a disparar, bateu-lhe duramente na cabeça com o cano da arma.
Com um bramido, o ruivo caiu. Um minuto mais tarde os cavalos dianteiros que puxavam o carro alcançavam outro dos inimigos desmontados que estava a apontar para o condutor do carro, de joelho em terra e disparou com má pontaria, ao ver o carro quase em cima de si. Não o conseguiu evitar,
Apesar dos seus esforços, foi atropelado e as rodas direitas do veículo passaram-lhe por cima. O seu grito de agonia atravessou os ares pontilhados de detonações, interrompendo-se bruscamente...
Depois, carro e cavaleiros chegaram à margem baixa do rio, metendo-se na água azul e correndo velozmente para a outra margem. Apenas um dos vaqueiros havia sido atingido por uma bala e cavalgava inclinado sobre o pescoço do animal, agarrando-se ao cabeção da sela. Dos inimigos, cinco disparavam agora contra eles, raivosamente, ainda montados. Outros três disparavam do chão.
Rand reduziu a marcha do seu cavalo e tanto Torres como Barclay o imitaram enquanto o carro e os vaqueiros continuavam. Os três homens começaram a disparar o mais rapidamente que podiam contra os seus inimigos, desmontaram outros dois e atingiram em cheio um terceiro. Os restantes procuraram afastar-se...
Voltando os cavalos, o trio voltou para junto dos outros. Barclay tinha uma expressão de dor no rosto e estava pálido. Meteu a espingarda no coldre da sela e apalpou o flanco direito. Rand perguntou:
— Acertaram-lhe?
— Sim. Mas não parece coisa séria.
O carro e os vaqueiros haviam parado na outra margem e estavam a tratar do vaqueiro ferido. Isabel chamou-os com voz serena, um tanto vibrante:
— Seguem-nos?
— Parece-me que não. Demos-lhes um bom desgosto. Mas vamos continuar a correr. Ê grave o ferimento desse vaqueiro?
— Creio que sim. Também o feriram, Kent?
— Não tem importância; posso esperar.
Ela meteu-se no carro para atender o vaqueiro e retomaram a marcha. Por aquele lado o vale era mais descoberto e ia a direito às colinas. Torres colocou-se a par de Rand, à retaguarda, enquanto Barclay ia junto do carro. O mexicano não parecia tranquilo.
— Se havia outros à nossa espera, devem ter ouvido os tiros e perseguir-nos-ão.
— Também acho. Perto daqui há algum lugar onde nos possamos abrigar para lhes resistirmos?
— A umas sete milhas.
— Ainda é bastante. Vão fazer-nos suar. Que lugar é?
— São algumas rochas e algumas árvores e uma pequena nascente. Se lá conseguirmos chegar, seremos nós a fazê-los suar se tentarem atacar-nos.
— Então comecemos a correr. Vá e diga isso ao condutor do carro.
Durante os seguintes quinze minutos nada apareceu que confirmasse as apreensões de Rand. Depois, os seus olhos perspicazes notaram a nuvem de pó erguendo-se junto do rio. Aí estavam eles.
Eles tinham de se manter por força ao passo das mulas, jovens, resistentes e velozes, mas que, de modo algum se podiam comparar a cavalos de sela. Outros quinze minutos o demonstraram, permitindo-lhes ver bem o numeroso grupo de cavaleiros que lhes dava caça.
Durante outra meia hora mais a perseguição manteve-se com as mesmas características, mas com os perseguidores a ganharem terreno a olhos vistos.
E chegou um momento em que uns só estavam separados dos outros por duzentos metros. Agora, Rand quase os podia contar. Pelo menos dúzia e meia...
Começaram a silvar projéteis sobre a sua cabeça, ainda inofensivos por causa da dificuldade em apontar. Ele e Torres cavalgavam a uns vinte metros do carro que Barclay e os vaqueiros escoltavam. Deitaram novamente mão às espingardas e dispararam contra os perseguidores, com a única esperança de desmontarem algum e reduzirem assim o número quando chegasse a altura do combate final. Mas não tiveram sorte, embora os outros também a não tivessem.
— Falta muito para chegarmos a esse sítio?
— Coisas de setecentas jardas! Já adivinharam as nossas intenções e estão a procurar impedir-nos de as concretizarmos!
Com efeito, pelas duas alas estavam a surgir dois ou três cavaleiros lançados num galope doido com a intenção clara de os ultrapassarem e chegarem à nascente antes deles. Rapidamente, Rand tomou a sua decisão.
— Você para o outro lado! Atire sobre os cavalos!
Velozmente, desviou o seu e lançou-o em diagonal contra os inimigos daquele lado. Os outros compreenderam os seus movimentos e abriram fogo nutrido contra ele, embora bastante ineficaz, como era lógico. Rand, por sua vez, calculou mentalmente a distância e velocidade do seu cavalo e dos outros...
O seu primeiro tiro devia, ter atravessado o corpo do cavalo que ia à frente dos seus inimigos. O animal empinou-se e derrubou o cavaleiro, caindo-lhe em cima. Quase no mesmo instante uma bala levou-lhe o chapéu para longe, aturdindo-o e provocando-lhe a desagradável sensação de uma ligeira queimadura.
Sacudiu a cabeça com energia para recuperar a clareza de pensamento e de visão. Os inimigos cavalgavam o mais depressa que lhes era possível, estavam a seu lado e a umas escassas cento e cinquenta jardas de distância, aproximando-se deles pouco a pouco.
Do outro lado acontecia o mesmo, sem dúvida. Atrás de si, pôde ver com uma rápida olhadela que o grosso dos seus perseguidores, uma dúzia ou mais, avança mais rapidamente e estava a umas cento e vinte jardas de distância.
As balas silvavam e zuniam como moscardos furiosos por todos os lados, fazendo estremecer o ar com os seus estampidos.
Apontou com cuidado e, desta vez, adiantou-se uma fração de segundo ao indivíduo que pretendia desmontá-lo. Viu-o largar a espingarda e levar as mãos à cabeça, tombando depois para o lado e ficando preso ao estribo por uma espora, enquanto o cavalo continuava a correr.
O seu próprio cavalo deu um relincho de dor e ergueu-se sobre as patas e esteve prestes a cuspi-lo por sobre a cabeça, e empreendeu imediatamente um galope desenfreado. Dominou-o com dificuldade e, quando o conseguiu, divisou as rochas e as árvores mais adiante, a umas cem jardas de distância. Mais ou menos a mesma que, naquela altura, os separava dos seus inimigos, cujos gritos eram já muito audíveis.
De momento, não podia perder mais tempo a disparar. O carro estava já a chegar às rochas. Uns minutos mais e estariam a salvo. Colou-se ao pescoço do animal que soprava freneticamente e olhou com avidez aquele espaço de terreno aberto, cada vez mais curto. Oitenta, setenta, sessenta, cinquenta, trinta, vinte jardas...
E então, com outro relincho, agora de agonia, o cavalo estremeceu, pareceu tropeçar e fraquejou das patas dianteiras. Rand pôs em ação o seu singular mecanismo de reflexos; tirou os pés dos estribos e saltou por sua vez, caindo sobre as mãos e joelhos, embora quase tivesse beijado o solo literalmente e arranhou-se numa planta espinhosa.
Um segundo mais tarde estava sobre uma das mãos e um joelho, dispondo-se a saltar e correr para as rochas próximas. O carro já ali havia chegado e os vaqueiros também. Mas tinha os inimigos quase sobre si e as balas feriam o solo à sua volta como granizo...
A distância não era muito superior a umas quinze jardas até às rochas. Percorreu as dez primeiras em cinco segundos ouvindo o zunir dos projéteis que o procuravam raivosamente e também os gritos de ânimo dos seus companheiros de luta. Depois sentiu o doloroso impacto de um projétil na coxa esquerda, a perna intumesceu-lhe subitamente e fraquejou...
Soltando maldições por entre os dentes voltou a levantar-se e a atirar-se para diante, sabendo que a sua vida dependia de poder ou não percorrer aquelas cinco jardas. Conseguiu.
No mesmo instante em que se atirava de cabeça por cima de um grande pedregulho com um metro de altura acima do terreno uma bala atingiu a pedra a menos de três centímetros do seu corpo, outras duas bateram um pouco mais longe e uma quarta arrancou-lhe uma espora num ricochete.
Caiu de cabeça e não se preocupou com a dor que lhe torturava os nervos. Revolveu-se como um puma enfurecido, preparando a espingarda, sacudiu a cabeça, ajoelhou-se apoiando todo o seu peso sobre a perna direita e procurou os inimigos com o olhar. Uivavam, lançando-se à carga, convencidos de poderem conseguir a vitória. Dois deles estavam a menos de trinta jardas de distância e vinham na direção dele..
Atingiu o mais próximo metendo-lhe uma bala no ombro direito. O homem gritou e cambaleou, caindo depois para um lado, ao mesmo tempo que levava uma das mãos à ferida.
O outro disparou uma bala que lhe passou a roçar a orelha. Desviou rapidamente a espingarda' e disparou por sua vez atingindo o cavalo em pleno peito. O animal estava a umas dez ou doze jardas de distância. Fraquejou, relinchou e caiu. O seu cavaleiro saltou com facilidade, deixou cair a espingarda e levou a mão ao revólver.
Rand ouviu o ruído do percutor da sua própria espingarda bater em vão. Atirou com ela rapidamente e puxou pelo revólver, engatilhando-o e levantando-o. O seu inimigo já tinha a arma na mão e pareceu que os dois revólveres disparavam ao mesmo tempo. Mas, enquanto a outra bala atingiu a pedra, fazendo saltar lascas, uma das quais cortou dolorosamente a face esquerda de Rand Allen, este cravou a sua em cheio no coração do seu adversário. O assalto fracassou. Foi tão fulminante como inesperado pelos atacados.
Em menos de três minutos quinze homens haviam-se lançado uivando e disparando contra os abrigados no carro e nas pedras. Agora, oito voltavam as garupas dos seus cavalos e afastavam-se tão depressa quanto possível enquanto outros três procuravam imitá-los a pé. Nenhum dos últimos conseguiu os seus intentos...
Depois tudo ficou tranquilo, tremendamente tranquilo, sob o sol quente da pradaria. Entre as ervas, lá adiante, alguém se queixava debilmente. Mais ao longe, outro pedia auxílio em espanhol...
Rand deixou ir os fugitivos. Ao fim e ao cabo haviam conseguido a vitória por um triz, estava seriamente ferido e o mais importante era pôr-se em condições de prosseguir caminho quanto antes. Oxalá não tivessem ferido Isabel. Viu-a vir ao seu encontro com passo rápido e expressão apreensiva. O facto de a ver aliviou-o. Isabel parou junto dele, olhou-lhe a coxa ferida, o sangue da cara e cabeça, a sua posição... E Rand viu nos seus olhos qualquer coisa que lhe fez bater o Coração mais depressa.
— Como se sente, senhor Allen? Onde o atingiram?
— Na coxa. O resto são arranhões sem importância. A menina está bem?
— Sim. Tivemos muita sorte. Se estas pedras estivessem um pouco mais longe teriam acabado connosco. Mataram Torres, Juan Rublo e Mauro Perales. Todos os outros estão feridos. Não me atingiram por verdadeiro milagre. Vou curar-lhe essa ferida da coxa. Desaperte o cinturão.
A sua voz soava normalmente excitada, mas, na sua atitude, não havia sinal de nervos.
— Posso curar-me eu próprio, sem ajuda...
Ela ajoelhou e estendeu as mãos para o cinturão mirando-o nos olhos.
— Ouça, senhor Allen. Sou uma rapariga, mas nasci e criei-me no Texas. Desde os dez anos que ajudo a curar feridas a homens e não vou assustar-me com a sua.
—Ah! Bem, a verdade é... Eu...
Ela pareceu corar levemente. Mas, embora pestanejasse, não desviou o olhar.
— Compreendo — disse noutro tom. — Bem, pois também não me assustarei por lhe ver as pernas nuas, senhor Allen. E agora deixe-me tirar-lhe essas calças; não podemos perder tempo.
Eram dez da manhã do décimo dia de marcha. Isabel cavalgava entre Torres é Rand, uns cem metros adiante do carro e do resto da escolta. A jovem ia falando:
— Chegaremos a casa amanhã ao meio-dia. Este é o rio Navasota. Valle Hermoso fica do outro lado, dessas colinas. Há-de gostar de Valle Hermoso, senhor Allen. Quatrocentos e cinquenta quilómetros quadrados da melhor terra do Texas, oito mil reses e vinte mil ovelhas. Tudo é nosso.
— Têm muita gente ao vosso serviço?
— Sessenta vaqueiros, oitenta pastores de ovelhas e quarenta camponeses. Valle Hermoso é uma verdadeira povoação, de quase quinhentos habitantes. Além disso estamos em relativas boas relações com os peles-vermelhas, pois não esquecem que meu pai foi sempre seu amigo.
— Compreendo. Onde fica o rancho de Seth Markham?
Isabel e Torres trocaram um olhar rápido. A jovem cerrou os lábios e indicou o norte com o indicador.
— Setenta quilómetros ao norte, entre as colinas, num vale aberto.
— Muita gente com ele?
— Uns cinquenta ou sessenta homens, segundo as nossas últimas informações. Além disso pode contar com os habitantes duma nova povoação junto ao rio Braços, chamada Waco. Deve haver ali uns duzentos americanos de ambos os sexos.
— Essa povoação fica muito longe de Valia Hermoso? — A umas cinquentas milhas, rio acima. — Compreendo. Então esses que se estão a aproximar não podem ser viajantes de passagem para a povoação. Também não são índios.
A jovem e o mexicano olharam na direção que lhes indicava. Uma dezena de cavaleiros aparecia por entre as árvores no limite do bosque próximo, à direita da caravana, e a uns seiscentos metros de distância.
Isabel e Torres olharam-se. A voz da jovem soou seca, sem se alterar:
— Voltemos para junto do carro, depressa.
Assim fizeram. Barclay e os sete vaqueiros tinham já visto os homens que se aproximavam. O primeiro adiantou-se ao encontro de Isabel e interpelou-a com as sobrancelhas franzidas:
— Não gosto nada disto.
— Nem eu. Preparemos as armas. Vá para dentro do carro, menina Isabel. Nós nos encarregaremos dessa gente.
— Não vou ficar fora da luta, Manuel.
— Vá para o carro, menina Cortés — disse Rand num tom cortante enquanto preparava a sua espingarda, sem tirar os olhos dos que se aproximavam abrindo-se cada vez mais. — Por muito habituada que esteja a estas lutas, bater-se é coisa pari homens.
Isabel olhou para o grupo, voltou depois o olhar para Rand e depois seguiu o seu conselho sem gracejar, alcançando o carro, saltando do cavalo com agilidade e metendo-se no veículo.
Os três homens seguiram-na, colocaram-se diante do carro mas voltados para os que se aproximavam. Os vaqueiros já, estavam preparados também.
Mas os cavaleiros não pareciam ter pressa de começar aos tiros. Aproximaram-se até uns duzentos metros de distância e então adotaram a tática índia de cavalga em fila ao lado da pequena caravana. Rand franziu as sobrancelhas. Podia contar perfeitamente doze homens e eles eram apenas onze, contando com a rapariga. Porque não atacavam duma vez?
Torres aproximou-se de Rand.
— Não gosto nada disto, senhor Allen. Preferia que começassem a fazer fogo.
— Também eu. Acha que nos estão a levar para uma armadilha?
— É isso que eu penso.
— O senhor conhece o terreno. Onde poderiam prepará-la?
— A pouco mais de uma milha, temos de passar entre o rio e o bosque, se continuarmos como vamos. Poderia haver ali alguém à nossa espera e estes limitar-se-iam então a empurrar-nos.
— Mas porque surgiriam à nossa vista antes?
—Para nos cortarem a retirada. Tal como vão, bastar-lhes-á atrasarem-se um pouco quando nos tiverem na armadilha, para o conseguirem. Se não tivessem aparecido, nós poderíamos ter vadeado o rio antes de chegar-mos àquele sítio, tomando por um terreno mais descoberto e melhor para o carro.
— Compreendo, Torres, vamos atacá-los imediatamente.
O mexicano olhou-o fixamente. Iam a boa velocidade. pelo terreno plano onde a erva alta amarelecera e os inimigos se mantinham a distância sem fazerem qualquer demonstração de agressividade.
— Quer dizer que nos vamos dirigir para eles? Fá-lo-ia com gosto se não viesse a menina Isabel...
— É por ela que o vamos fazer. Suspeito que se trata de gente de Markham e sabem que se encontra entre nós. Onde poderemos atacar com melhores probabilidades a nosso favor?
Barclay havia-se aproximado deles entretanto, ao ver a atitude dos outros. Respondeu ele:
— A trezentas jardas daqui é uni bom sítio. Podemos chegar ao rio, vadeá-lo e sair por terreno conveniente.
— Bem, vou dizer à menina Cortés. Torres, avise os vaqueiros para abrirem fogo quando ouvirem o meu disparo. Que atirem, de preferência aos cavalos.
— Sim, senhor Allen. Lã vou.
Isabel encontrava-se junto do condutor, com a sua espingarda preparada. Dirigiu-lhe um olhar claramente interrogativo.
— Porque não nos atacarão? Põem-me nervosa.
— Torres e Barclay suspeitam que nos estão a empurrar para uma emboscada. Mas nós vamos atacar, passando através da sua linha. Creio que são homens de Markham.
Ela sustentou o seu olhar. Depois disse com simplicidade:
— Adiante. O senhor tem agora o comando.
— Bem.
Fez voltar o cavalo e colocou-se junto dos seus homens mais adiantados. Barclay pôs-se do lado oposto. Torres aproximou-se dele.
— Preparados. Já estão avisados.
— Diga-me qual é o sítio próprio.
— Aí, ao passar o algodoeiro grande. O rio corre por um leito de areia e é fácil de atravessar.
Os inimigos estavam agora entre o rio e eles, mantendo a distância. Rand fez, mentalmente, um cálculo e depois adiantou o seu cavalo alguns metros. Ao chegarem ao ponto combinado fez voltar o cavalo na direção da linha contrária e esporeou violentamente o animal, ao mesmo tempo que preparava a espingarda e emitia um longo grito de guerra.
Torres respondeu-lhe, Barclay e o condutor do carro também e todos o imitaram no mesmo instante. A sua decisão colheu os outros de surpresa, desconcertando-os durante alguns minutos. Depois viu-os lançar mão das espingardas e levantá-las e soaram os estampidos no ar quieto da manhã.
Rand sentiu uivar uma bala muito perto de si. Cerrando os lábios, escolheu um alvo, apertou o gatilho e um cavalo sarapintado, atingido na cabeça, relinchou, erguendo-se subitamente sobre as patas traseiras e derrubando o cavaleiro quando se dispunha a disparar. No mesmo instante os seus companheiros abriram fogo contra a linha inimiga e outros dois cavaleiros foram desmontados, enquanto um quarto era atingido diretamente pelo chumbo. Os outros estavam agora desconcertados e sem saber o que fazer.
Rand lançou-se na direção do rio, fazendo fogo sem cessar. Derrubou outro inimigo metendo-lhe outra bala no flanco e atingiu um pouco depois o que primeiro desmontara e que, meio aturdido pela queda, se levantava.
Era um tipo corpulento com cabelos e barba ruivos. Levou a mão ao revólver e tirou-o, levantando-o e disparando contra Rand. Este obrigou o seu cavalo a dar um salto brusco, de lado e o projétil arrancou uma tira de pele e carne da anca, fazendo-o relinchar.
Endireitando-o com mão de ferro e utilizando a espingarda como uma maça, Rand atirou-se para cima do outro e, antes que ele pudesse fazer alguma coisa para o impedir ou pudesse voltar a disparar, bateu-lhe duramente na cabeça com o cano da arma.
Com um bramido, o ruivo caiu. Um minuto mais tarde os cavalos dianteiros que puxavam o carro alcançavam outro dos inimigos desmontados que estava a apontar para o condutor do carro, de joelho em terra e disparou com má pontaria, ao ver o carro quase em cima de si. Não o conseguiu evitar,
Apesar dos seus esforços, foi atropelado e as rodas direitas do veículo passaram-lhe por cima. O seu grito de agonia atravessou os ares pontilhados de detonações, interrompendo-se bruscamente...
Depois, carro e cavaleiros chegaram à margem baixa do rio, metendo-se na água azul e correndo velozmente para a outra margem. Apenas um dos vaqueiros havia sido atingido por uma bala e cavalgava inclinado sobre o pescoço do animal, agarrando-se ao cabeção da sela. Dos inimigos, cinco disparavam agora contra eles, raivosamente, ainda montados. Outros três disparavam do chão.
Rand reduziu a marcha do seu cavalo e tanto Torres como Barclay o imitaram enquanto o carro e os vaqueiros continuavam. Os três homens começaram a disparar o mais rapidamente que podiam contra os seus inimigos, desmontaram outros dois e atingiram em cheio um terceiro. Os restantes procuraram afastar-se...
Voltando os cavalos, o trio voltou para junto dos outros. Barclay tinha uma expressão de dor no rosto e estava pálido. Meteu a espingarda no coldre da sela e apalpou o flanco direito. Rand perguntou:
— Acertaram-lhe?
— Sim. Mas não parece coisa séria.
O carro e os vaqueiros haviam parado na outra margem e estavam a tratar do vaqueiro ferido. Isabel chamou-os com voz serena, um tanto vibrante:
— Seguem-nos?
— Parece-me que não. Demos-lhes um bom desgosto. Mas vamos continuar a correr. Ê grave o ferimento desse vaqueiro?
— Creio que sim. Também o feriram, Kent?
— Não tem importância; posso esperar.
Ela meteu-se no carro para atender o vaqueiro e retomaram a marcha. Por aquele lado o vale era mais descoberto e ia a direito às colinas. Torres colocou-se a par de Rand, à retaguarda, enquanto Barclay ia junto do carro. O mexicano não parecia tranquilo.
— Se havia outros à nossa espera, devem ter ouvido os tiros e perseguir-nos-ão.
— Também acho. Perto daqui há algum lugar onde nos possamos abrigar para lhes resistirmos?
— A umas sete milhas.
— Ainda é bastante. Vão fazer-nos suar. Que lugar é?
— São algumas rochas e algumas árvores e uma pequena nascente. Se lá conseguirmos chegar, seremos nós a fazê-los suar se tentarem atacar-nos.
— Então comecemos a correr. Vá e diga isso ao condutor do carro.
Durante os seguintes quinze minutos nada apareceu que confirmasse as apreensões de Rand. Depois, os seus olhos perspicazes notaram a nuvem de pó erguendo-se junto do rio. Aí estavam eles.
Eles tinham de se manter por força ao passo das mulas, jovens, resistentes e velozes, mas que, de modo algum se podiam comparar a cavalos de sela. Outros quinze minutos o demonstraram, permitindo-lhes ver bem o numeroso grupo de cavaleiros que lhes dava caça.
Durante outra meia hora mais a perseguição manteve-se com as mesmas características, mas com os perseguidores a ganharem terreno a olhos vistos.
E chegou um momento em que uns só estavam separados dos outros por duzentos metros. Agora, Rand quase os podia contar. Pelo menos dúzia e meia...
Começaram a silvar projéteis sobre a sua cabeça, ainda inofensivos por causa da dificuldade em apontar. Ele e Torres cavalgavam a uns vinte metros do carro que Barclay e os vaqueiros escoltavam. Deitaram novamente mão às espingardas e dispararam contra os perseguidores, com a única esperança de desmontarem algum e reduzirem assim o número quando chegasse a altura do combate final. Mas não tiveram sorte, embora os outros também a não tivessem.
— Falta muito para chegarmos a esse sítio?
— Coisas de setecentas jardas! Já adivinharam as nossas intenções e estão a procurar impedir-nos de as concretizarmos!
Com efeito, pelas duas alas estavam a surgir dois ou três cavaleiros lançados num galope doido com a intenção clara de os ultrapassarem e chegarem à nascente antes deles. Rapidamente, Rand tomou a sua decisão.
— Você para o outro lado! Atire sobre os cavalos!
Velozmente, desviou o seu e lançou-o em diagonal contra os inimigos daquele lado. Os outros compreenderam os seus movimentos e abriram fogo nutrido contra ele, embora bastante ineficaz, como era lógico. Rand, por sua vez, calculou mentalmente a distância e velocidade do seu cavalo e dos outros...
O seu primeiro tiro devia, ter atravessado o corpo do cavalo que ia à frente dos seus inimigos. O animal empinou-se e derrubou o cavaleiro, caindo-lhe em cima. Quase no mesmo instante uma bala levou-lhe o chapéu para longe, aturdindo-o e provocando-lhe a desagradável sensação de uma ligeira queimadura.
Sacudiu a cabeça com energia para recuperar a clareza de pensamento e de visão. Os inimigos cavalgavam o mais depressa que lhes era possível, estavam a seu lado e a umas escassas cento e cinquenta jardas de distância, aproximando-se deles pouco a pouco.
Do outro lado acontecia o mesmo, sem dúvida. Atrás de si, pôde ver com uma rápida olhadela que o grosso dos seus perseguidores, uma dúzia ou mais, avança mais rapidamente e estava a umas cento e vinte jardas de distância.
As balas silvavam e zuniam como moscardos furiosos por todos os lados, fazendo estremecer o ar com os seus estampidos.
Apontou com cuidado e, desta vez, adiantou-se uma fração de segundo ao indivíduo que pretendia desmontá-lo. Viu-o largar a espingarda e levar as mãos à cabeça, tombando depois para o lado e ficando preso ao estribo por uma espora, enquanto o cavalo continuava a correr.
O seu próprio cavalo deu um relincho de dor e ergueu-se sobre as patas e esteve prestes a cuspi-lo por sobre a cabeça, e empreendeu imediatamente um galope desenfreado. Dominou-o com dificuldade e, quando o conseguiu, divisou as rochas e as árvores mais adiante, a umas cem jardas de distância. Mais ou menos a mesma que, naquela altura, os separava dos seus inimigos, cujos gritos eram já muito audíveis.
De momento, não podia perder mais tempo a disparar. O carro estava já a chegar às rochas. Uns minutos mais e estariam a salvo. Colou-se ao pescoço do animal que soprava freneticamente e olhou com avidez aquele espaço de terreno aberto, cada vez mais curto. Oitenta, setenta, sessenta, cinquenta, trinta, vinte jardas...
E então, com outro relincho, agora de agonia, o cavalo estremeceu, pareceu tropeçar e fraquejou das patas dianteiras. Rand pôs em ação o seu singular mecanismo de reflexos; tirou os pés dos estribos e saltou por sua vez, caindo sobre as mãos e joelhos, embora quase tivesse beijado o solo literalmente e arranhou-se numa planta espinhosa.
Um segundo mais tarde estava sobre uma das mãos e um joelho, dispondo-se a saltar e correr para as rochas próximas. O carro já ali havia chegado e os vaqueiros também. Mas tinha os inimigos quase sobre si e as balas feriam o solo à sua volta como granizo...
A distância não era muito superior a umas quinze jardas até às rochas. Percorreu as dez primeiras em cinco segundos ouvindo o zunir dos projéteis que o procuravam raivosamente e também os gritos de ânimo dos seus companheiros de luta. Depois sentiu o doloroso impacto de um projétil na coxa esquerda, a perna intumesceu-lhe subitamente e fraquejou...
Soltando maldições por entre os dentes voltou a levantar-se e a atirar-se para diante, sabendo que a sua vida dependia de poder ou não percorrer aquelas cinco jardas. Conseguiu.
No mesmo instante em que se atirava de cabeça por cima de um grande pedregulho com um metro de altura acima do terreno uma bala atingiu a pedra a menos de três centímetros do seu corpo, outras duas bateram um pouco mais longe e uma quarta arrancou-lhe uma espora num ricochete.
Caiu de cabeça e não se preocupou com a dor que lhe torturava os nervos. Revolveu-se como um puma enfurecido, preparando a espingarda, sacudiu a cabeça, ajoelhou-se apoiando todo o seu peso sobre a perna direita e procurou os inimigos com o olhar. Uivavam, lançando-se à carga, convencidos de poderem conseguir a vitória. Dois deles estavam a menos de trinta jardas de distância e vinham na direção dele..
Atingiu o mais próximo metendo-lhe uma bala no ombro direito. O homem gritou e cambaleou, caindo depois para um lado, ao mesmo tempo que levava uma das mãos à ferida.
O outro disparou uma bala que lhe passou a roçar a orelha. Desviou rapidamente a espingarda' e disparou por sua vez atingindo o cavalo em pleno peito. O animal estava a umas dez ou doze jardas de distância. Fraquejou, relinchou e caiu. O seu cavaleiro saltou com facilidade, deixou cair a espingarda e levou a mão ao revólver.
Rand ouviu o ruído do percutor da sua própria espingarda bater em vão. Atirou com ela rapidamente e puxou pelo revólver, engatilhando-o e levantando-o. O seu inimigo já tinha a arma na mão e pareceu que os dois revólveres disparavam ao mesmo tempo. Mas, enquanto a outra bala atingiu a pedra, fazendo saltar lascas, uma das quais cortou dolorosamente a face esquerda de Rand Allen, este cravou a sua em cheio no coração do seu adversário. O assalto fracassou. Foi tão fulminante como inesperado pelos atacados.
Em menos de três minutos quinze homens haviam-se lançado uivando e disparando contra os abrigados no carro e nas pedras. Agora, oito voltavam as garupas dos seus cavalos e afastavam-se tão depressa quanto possível enquanto outros três procuravam imitá-los a pé. Nenhum dos últimos conseguiu os seus intentos...
Depois tudo ficou tranquilo, tremendamente tranquilo, sob o sol quente da pradaria. Entre as ervas, lá adiante, alguém se queixava debilmente. Mais ao longe, outro pedia auxílio em espanhol...
Rand deixou ir os fugitivos. Ao fim e ao cabo haviam conseguido a vitória por um triz, estava seriamente ferido e o mais importante era pôr-se em condições de prosseguir caminho quanto antes. Oxalá não tivessem ferido Isabel. Viu-a vir ao seu encontro com passo rápido e expressão apreensiva. O facto de a ver aliviou-o. Isabel parou junto dele, olhou-lhe a coxa ferida, o sangue da cara e cabeça, a sua posição... E Rand viu nos seus olhos qualquer coisa que lhe fez bater o Coração mais depressa.
— Como se sente, senhor Allen? Onde o atingiram?
— Na coxa. O resto são arranhões sem importância. A menina está bem?
— Sim. Tivemos muita sorte. Se estas pedras estivessem um pouco mais longe teriam acabado connosco. Mataram Torres, Juan Rublo e Mauro Perales. Todos os outros estão feridos. Não me atingiram por verdadeiro milagre. Vou curar-lhe essa ferida da coxa. Desaperte o cinturão.
A sua voz soava normalmente excitada, mas, na sua atitude, não havia sinal de nervos.
— Posso curar-me eu próprio, sem ajuda...
Ela ajoelhou e estendeu as mãos para o cinturão mirando-o nos olhos.
— Ouça, senhor Allen. Sou uma rapariga, mas nasci e criei-me no Texas. Desde os dez anos que ajudo a curar feridas a homens e não vou assustar-me com a sua.
—Ah! Bem, a verdade é... Eu...
Ela pareceu corar levemente. Mas, embora pestanejasse, não desviou o olhar.
— Compreendo — disse noutro tom. — Bem, pois também não me assustarei por lhe ver as pernas nuas, senhor Allen. E agora deixe-me tirar-lhe essas calças; não podemos perder tempo.
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