domingo, 18 de novembro de 2018

BIS168.08 Traidor executado

— Passo!
— E tu?
— Fico!
A noite tinha caído há já duas horas. Russel estava de posto e os outros quatro, incluindo Franck, jogavam às cartas. Os três vaqueiros olharam fascinados para as mãos de McGinnis que, com uma mestria surpreendente, baralhava as cartas. Isso vinha provar que, além de bom atirador, era hábil ao jogo.
— Três pedras! — disse Grant.
— Lembra-te do limite — observou McGinnis.
— Qual limite?
— Duas pedras, o máximo.
— Hoje estabelecemos qualquer limite?
— Não. Mas a combinação já vem das outras noites.
— Está bem. Seja. Duas pedras! Vocês viram logo que eu tinha bom jogo e não me querem deixar enriquecer.
Os companheiros riram. Jogavam a pequenas pedrinhas que ali faziam a vez de dinheiro. McGinnis não permitira que se jogasse a dinheiro, o que, aliás, não tirava interesse às jogadas.
— Então, Richard? Decide-te, homem — dizia Grant. — Por mais que olhes para as tuas cartas não consegues valorizar o teu jogo e, já sabes que o meu é bom...
— Passo!
— Passo! — repetiu Franck.
Green ficou indeciso. Olhou para Grant tentando adivinhar a verdade das suas palavras. Estava convencido que o jogo dele não era tão bom como apregoava. Já tinha perdido muitas pedras naquela noite. Desistiu.
— Ganhaste! — e atirou as suas cartas para o baralho, sem as mostrar.
Grant soltou uma gargalhada e mostrou o seu jogo, baixíssimo, enquanto recolhia as pedras da mesa.
— Charlatão! — grunhiu Green.
Richard apanhou as cartas e começou a baralhar.
— Eh, Grant! — chamou uma voz de fora.
Era o aviso de Russel de que chegara o momento de ser rendido pelo companheiro. O avisado levantou-se, foi à cama dele buscar um cobertor que colocou sobre as costas, pegou na arma e saiu. Ouviram-se as vozes dos dois homens lá fora.
— Apresenta-se o soldado Grant, meu comandante — era Grant.
— Estás apresentado e agora aguenta aqui duas horas...
McGinnis levantou-se da mesa, aproveitando a altura em que o jogo estava interrompido.
— Se vocês não se importam, vou dar uma volta — disse.
Apanhou o cinturão de cima da cama e afivelou-o à cinta. Cruzou com Russel à porta.
— Aonde vai, McGinnis?
— Dar uma volta para aquecer.
A noite estava escura. A Lua ocultava-se por detrás de umas nuvens que podiam prometer chuva. Soprava uma aragem fria. Grant estava no seu posto, movendo os pés para não arrefecer.
— Está uma noite dos diabos, McGinnis.
— É verdade. Vou dar uma volta por aí.
— Quando regressar, não se esqueça de se identificar. Não costumo ser nervoso, mas...
— Está bem.
Diz-se que os românticos precisam de uma noite estrelada para pensar nos seus amores, mas Franck McGinnis devia ser um caso à parte porque, mesmo numa noite escura como breu e ventosa, como era o caso, ele pensou na graciosa mulatinha que tinha por nome de batismo Helena Finley Estapoole...
Recordou as suas palavras de despedida, o beijo, tudo enfim... «Mas porquê — monologava — tanto silêncio?!»
Na primeira oportunidade deslocar-se-ia ao rancho para saber novidades e, quando mais não fosse, para ver a sua amada.
Entregue aos seus pensamentos, McGinnis afastou-se consideravelmente da cabana, sem disso dar conta. Seguia a pé rente à vedação que delimitava as duas propriedades. Súbito, estacou. Parecia ter ouvido o tropel de um cavalo. O som não era muito audível, mas era sem dúvida um cavalo que se aproximava dali. Ora, os cascos de um solípede a baterem naquele terreno duro produziria certamente um ruído mais forte; a não ser que os tivessem embrulhado em pano. O som abrandou e o preto deixou-se ficar imóvel. Não esperou muito tempo até um cavaleiro, que não reconheceu, passar a uns vinte metros do local onde se encontrava.
A montada saltou a vedação e o vulto continuou o seu caminho, sem muitas pressas, pelo terreno de Hook fora.
McGinnis não ficou muito tempo indeciso e transpondo a cerca lançou-se numa corrida estafante atrás do cavaleiro. Felizmente para si, aquele não foi muito longe. Franck viu-o desmontar à porta de uma cabana iluminada, prender o cavalo e entrar. Ao abrir a porta, um jorro de luz inundou-o mas, nem assim McGinnis logrou reconhecê-lo. Quase rastejando, abeirou-se da janela iluminada.
O que viu deixou-o estático. Lá dentro encontrava-se o próprio Graham Hook, dois homens que não conhecia e o recém-chegado era um tal Joachin, do posto de Allan. As vozes chegavam debilmente aos ouvidos de Franck.
— Que novidades trazes? — perguntava Hook.
— Nenhumas, Graham. Tudo continua na mesma.
— Eles ainda não se foram embora?
— Não.
— E não sabes quando irão?
— Nem sequer falam nisso. O velho mandou carabinas para todos os homens.
— Oh! Isso complica as coisas. Quem é o chefe do teu posto?
— O filho do velho.
— E nos outros?
— Mac Donald e McGinnis.
— Esse preto do diabo!
Franck retesou os músculos. Mas Hook continuava:
— Ainda hei-de dar cabo dele. Não me esqueci de Lily. Temos um plano, Joachin... Senta-te. O vaqueiro tomou lugar à mesa.
Franck receou que eles fossem falar mais baixo, o que o impossibilitaria de ouvir, mas a conversa decorreu no mesmo tom de voz.
— Vamos continuar quietos por mais uma semana. Todavia, esta imobilidade desgosta-me. Entretanto, vou mandar mais um ultimato ao velho. Ele é esperto. Sabe que, se me vendesse as terras, não ia longe com o dinheiro — soltou uma risada abafada. — Por isso resiste. Mas não é um bruto daqueles que me fará recuar! Hei-de tornar-me senhor das terras dele, custe o que custar. Só espero mais uma semana. Se tudo continuar como até aqui, agiremos em massa! Formaremos um bando de encapuçados que, para despistar, não atacará só as terras do Estapoole. Semearemos o pânico por toda a parte, quer com incêndios, quer com destruições... Eu mesmo, pegarei em armas contra esse bando — repetiu o riso abafado. — Entretanto, estou à espera de mais homens que virão de Santa Fé.
— Estou do seu lado — afirmou Joachin.
— Gosto disso — Hook meteu a mão ao bolso e deu--lhe algum dinheiro. — Logo que saibas de qualquer coisa, aparece.
— Okay!
A entrevista tinha terminado. McGinnis fez uma corrida rápida, para não ser descoberto. Viu Joachin sair só, montar e retornar pelo mesmo caminho. Franck regressou ao posto. Grant tinha sido substituído por Richard.
— A noite não está para passeios, McGinnis — disse aquele, batendo com os pés no chão. — Dizes bem, Richard. Até amanhã.
— Até amanhã!
Richard seria rendido por Green e este pelo McGinnis.
Na manhã seguinte, Franck disse para Russel:
— Precisava de alguém que fosse levar um recado a Allan.
— Posso ser eu mesmo, McGinnis.
— Então vai lá e diz-lhe apenas isto: «Joachin é um traidor. Avistou-se ontem com Graham Hook!».
— Isso é verdade, Franck?! — exclamou Russel verdadeiramente atónito. Via-se que a novidade tinha surpreendido ao máximo todos os presentes.
— Joachin, hem! — monologou Grant. — Quem diria!
Russel montou o cavalo de McGinnis e partiu.
— Regressa logo que possas — ordenou-lhe o preto.
O vaqueiro demorou aproximadamente oito horas a regressar. Contou como os homens de Allan tinham espancado brutalmente Joachin e depois, quando este já não se segurava em pé, amarraram-no ao seu cavalo, que impeliram na direção do rancho de Hook.
Russel contou isto com muitos pormenores, desde o momento em que Joachin, verdadeiramente lívido, negou a acusação, até ao instante em que confessou tudo, dizendo ser um homem de Hook porque este lhe pagava generosamente e prometera-lhe uma boa colocação quando fosse dono da região de Hayman, começando a ser sovado até cair, sem forças, mal podendo gritar com o sangue a sair--lhe pela boca, inanimado.
— Acho que ele não ia chegar lá com vida! — rematou Russel.
Efetivamente, mais tarde saber-se-ia que Joachin chegara morto ao rancho de Graham Hook...

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