Koehler irrompeu pelo quarto onde se encontrava Hayden lendo «O Clarim de Watson City». O ganadeiro levantou o olhar do diário, e disse:
—Que se passa, Zacarias? Qualquer pessoa diria que acaba de ver um morto...
— Vi-o ontem à noite! —exclamou nervosamente o outro, deixando-se cair numa poltrona.
— Outra vez cheio de medo? — resmungou Clinton.
—Sei que não vai acreditar! Sei que parece fantástico, irreal e inaudito!... Mas juro que é verdade!... Sabe quem vi!
—O Presidente Lincoln.
— Deixe-se de brincadeiras, Hayden! E demasiado sério.
— Está bem, quem é esse fantasma?
—Keith Yerbi.
O rancheiro esteve uns segundos em suspenso, e soltou uma gargalhada.
—Agora compreendo porque deseja ir-se embora. Vai mudar de profissão. Quer ser actor. Vendo os seus olhos dir-se-ia que tudo o que diz é verdade.
—E é, Clinton! Tem que acreditá-lo! E preciso que acredite! Isto vale a sua vida e a minha e a de outros...
Fez-se uma pausa, e depois Hayden levantou-se gritando enfurecido:
—Estou farto dos seus medos
—Repito-lhe que vi Keith Yerbi.
—E também me diz que lhe falou!
—Sim.
—Muito engraçado. E que lhe disse?
—Que fizesse uma confissão de todos os delitos em que fui seu cúmplice, e que a enviasse em carta esta manhã ao Presidente do Tribunal de Apelação de Austin.
Hayden levantou-se, agarrou o advogado pelas bandas do casaco, levantou-o enquanto dizia:
— Repulsiva víbora!... Pretende fazer chantagem!... Quer mais dinheiro! E utilizou este método para consegui-lo. Agora irá dizer que Yerbi lhe pediu determinada quantia para desaparecer, para voltar para a sua sepultura... Tomou-me por idiota?...
— Engana-se, Clinton!... Não pediu dinheiro. Disse-me que se eu confessasse conseguiria uma pena leve, já que eu diria que o tinha feito espontaneamente, e ele não declararia em contrário. Ameaçou matar-me se não o fizesse. Disse que voltaria a ver-me esta noite à meia-noite.
— E quere-me fazer acreditar que se expôs a que o matem, negando-se a seguir as suas ordens?... Mas, que estou dizendo?... Se Yerbi morreu!... Conseguirá tornar-me louco também!
— Pensei que Yerbi não era inimigo para si e que se uma vez conseguiu escapar à morte não conseguirá duas vezes... Não quero passar dez anos da minha vida na cadeia... Quando saísse encontrar-me-ia velho e sem dinheiro. Isto é o que me deu coragem para vir contar-lhe tudo!... Sei que sou um cobarde, e por isso não me moverei de sua casa... Até que me diga que esse homem foi realmente enterrado!
— Você será o cadáver, se continua com essa conversa!...
—Não se dá conta, Clinton? Ê verdade que nós vimos como Yerbi era enforcado, mas recordo-me que nos fomos embora em seguida. Estava morto? Não o sabemos. É uma simples dedução que fazemos por ver o corpo enforcado numa árvore!...
As pupilas do ganadeiro cintilaram. Soltou Koehler, e ficou numa atitude pensativa. Pouco a pouco o seu rosto foi-se iluminando. Ao fim dum momento fez barulho com os dedos, exclamando:
— Isso explicaria tudo!
—Ê tão lógico que não compreendo como não o pensámos antes. Yerbi tinha amigos, não?
—Sim, e agora iremos visitar um deles.
—A quem?
— Ao sheriff Beerman. Vamos !
Quando entraram no escritório deste, encontraram-no escrevendo em cima duma pequena mesa. Depois de trocarem uma saudação, Beerman advertiu, olhando Hayden:
—Se vem pelo seu rapaz, já lhe digo a minha resposta. O defunto promotor também a conhecia...
Clinton sorriu, e começou a passear na reduzida habitação, enquanto murmurava:
—O defunto promotor e o defunto juiz. Soa bem, não é verdade, sheriff?
Beerman olhou o ganadeiro sem falar, e o outro continuou:
—Mas soará melhor quando puder dizer o defunto Koehler e o defunto senhor Hayden. — Clinton deteve-se interrogando com o seu olhar o representante da lei. — Acertei, sheriff
— Que se passa, Hayden? Caiu-lhe mal ontem à noite o jantar?
—Comi ligeiramente. Mas há certas coisas que fazem mal, como por exemplo uma indigestão de chumbo.
Beerman inquiriu serenamente:
—Está-me ameaçando?
—Quero que mostre o seu jogo.
—Pensei que já conhecia.
—Não me refiro agora ao meu cowboy. Que faz para capturar o assassino de Chandler e Greene?
— Dediquei muitas horas a interrogar mais de meia população, e ordenei aos meus ajudantes que vigiassem atentamente os suspeitos...
—Estupendo! Dá gosto ter um sheriff tão eficiente.
— Limito-me a cumprir o meu dever.
— Que modesto! —Clinton fez uma pausa e juntou: —E se você tivesse interesse em que o assassino não fosse encontrado?
Beerman pôs-se lívido. Passado meio minuto exclamou:
—Vá-se embora daqui, Hayden!
— Ainda não terminei! Estou-o acusando, sheriff
—Você acusa-me a mim? Não me esgote a paciência!...
—Onde se esconde Keith Yerbi?
Beerman semicerrou as pálpebras e enrugou o rosto, como se não tivesse ouvido bem.
—A quem se refere?
— Sabe-o perfeitamente! A Keith Yerbi!
— Agora estou certo de não ter perdido a cabeça, Hayden. O pobre Yerbi já está há bastante tempo debaixo da terra.
—O pobre Yerbi, hem? Era-lhe simpático, não é verdade?
—Não o nego, e dir-lhe-ei mais. Era inocente do crime de que o culparam.
—E por isso você representou a comédia do seu enforcamento e deixou-o vivo para que fosse matando um a um a quantos, com a ajuda da lei, tive-mos alguma relação com a sentença que o condenou.
Beerman replicou irónico:
—Não sabia que acreditava em fantasmas, Hayden.
O ganadeiro, ao ver a firmeza que manifestava o sheriff, vacilou, e então valeu em sua ajuda Koehler.
— Keith Yerbi não é um fantasma! Eu falei com ele!
Beerman respondeu:
— Dizem que os que não têm a consciência limpa, veem espectros, Koehler...
—Não vim aqui para ouvir os seus insultos, sheriff!
Clinton cortou a discussão, dizendo:
—Há um meio de saber a verdade, Beerman. Vamos ao cemitério, e comprovamos se Yerbi continua no seu caixão.
Ouve um silêncio enquanto o sheriff olhava com firmeza o rancheiro. Finalmente aquele disse:
—Somente tendo a autorização do Município.
Hayden e o advogado saíram do escritório, e meia hora mais tarde encontravam-se junto da sepultura de Keith Yerbi. Os acompanhantes eram dois homens providos de pás e picaretas. Examinaram as pedras, a cruz que tinha a placa gravada, e não notaram nada de anormal. Hayden perguntou a Koehler:
—Continua pensando que Yerbi tenha podido sair daqui?
O aludido dirigiu um olhar à sepultura, e respondeu com uma voz horrorosa:
—Sim.
—Está bem, terminemos quanto antes. Comecem, rapazes.
Afastaram-se para um lado, enquanto os dois cowboys realizavam o seu trabalho. Passados uns quinze minutos, o da pá disse:
— Podem aproximar-se.
Hayden engoliu saliva contemplando o caixão que estava à vista, e ordenou:
— Abram-na!...
Uma mão tremenda pegou nas argolas, e tirou a tampa para cima.
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