sábado, 21 de agosto de 2021

RB007.16 Reencontro precedido de emboscada sangrenta

 —Fica muito longe?

A pergunta foi feita pela rapariga pela décima quinta vez em poucos segundos.

Durgan desviou os olhos para a olhar. Um par de tranças ruivas, umas pestanas grandes sombreando os olhos intensamente negros, e um corpo que denotava a sua repugnância debaixo das roupas vaqueiras com que vinha trajada. Era tal qual sua mãe. Sadie Farrow.

Replicou imediatamente, quando este pensamento lhe veio à mente.

—Estamos a chegar, Nora. Agora é uma curva. Depois verás umas árvores. Estas estão situadas nos terre-nos de tua mãe.

A rapariga sorriu tenuemente.

— Como é ela? É tão bela como dizes?

Durgan descreveu-lha pela décima milionésima vez desde que empreenderam a viagem.

—Disse-me que tinha morrido, sabes? Alegro-me de que não fosse o meu pai. Sempre me tratou mal e... Bem, não gostava muito dele, mas senti pena. Cheguei a pensar que era uma má filha. Compreendes?

Durgan não podia compreender. E não lhe faltava razão. Não há ninguém que consiga compreender a lógica das crianças.

— Sim, filha. Compreendo perfeitamente—replicou, no entanto.

Cavalgaram em silêncio, seguido sempre o curso do Arkansas. Passaram a curva do rio e, ante os olhos de Nora, apareceram as altas rochas de granito e basalto, com toda a sua grandiosa selvajaria.

— É belo — sussurrou ela. — Gosto. Hoje, —expressou-se sem qualquer transição — tenho uma vontade enorme de abraçar a minha mãe, sabes? Parece-me mentira que seja verdade, que viva, que eu tenha mãe, que a vá conhecer.

Durgan não respondeu. As palavras sensatas da rapariga tinham posto um estranho nó na sua garganta. Limitou-se a sorrir e a cravar novamente os olhos em frente.

Continuaram a cavalgar em silêncio. Estavam quase a chegar às árvores, quando tudo começou.

Primeiro, foi um estranho e agudo silvo, e outro quase a seguir. Depois ouviram-se as detonações. Quase juntas.

Durgan fez um movimento de defesa instintivo, e este salvou-lhe a vida, uma vez que o chumbo, dirigido ao seu coração, o alcançou no ombro esquerdo, fazendo-o voltar na sela.

Quando caiu, com uma maldição seca, viu confusa mente o salto que Nora dava sobre a sela, e como depois, com a testa sangrenta, deslizava lentamente até ao solo. Al Holland; mil vezes maldito! Que diria Sadie? E tão perto dela!

Maldisse roucamente quando deu duas voltas no solo, e depois permaneceu imóvel, com a perna dobrada debaixo do corpo, notando como o sangue lhe empapava a camisa e a dor do ombro se tornava quase irresistível.

Pelo canto do olho, à sua esquerda, ao lado de uns arbustos, viu o corpo inerte de Nora. Completamente imóvel.

O nó da garganta tornou-se maior. Sentiu-se incapaz de engolir a saliva. Depois teve a reação.

A angústia que sentia foi deixando lugar a uma calma gelada, aterradora. O brilho homicida tornou a surgir nos seus olhos, mas, mediante um poderoso esforço que o obrigava a pôr-se de pé e a disparar como louco, conseguiu conter-se.

Continuou ali, imóvel, com toda a aparência de um cadáver, esperando. Se não se enganava, o agressor ou os agressores sairiam mais cedo ou mais tarde dos seus esconderijos e viriam ver se ele estava morto ou não.

Os minutos seguintes passaram com uma lentidão desesperante. Mas não foram muitos. Apenas dez, que pareceram anos a Durgan.

Repentinamente, qualquer coisa se moveu à sua frente. Perto dos penhascos. Durgan continuou sem se mover. Nem sequer o fez, quando a silhueta de um homem se recortou nitidamente nas rochas, nem quando se reuniu com outra e começaram a avançar -para eles, empunhando os colts. Permaneceu como morto, contendo a respiração, com a mão direita agarrando o percutor do colt.

Detiveram-se a poucos metros das árvores. Durgan viu como falavam entre si, mas sem conseguir perceber qualquer palavra. Depois, continuaram a avançar levando na sua frente os canos dos colts.

Por momentos notou o receio que o invadia. O receio de começarem a disparar antes de se aproximarem, e então a situação tornar-se-ia desesperada. Mas não o fizeram. Satisfeito notou à medida que avançavam se tornavam mais confiantes, quando deviam proceder precisamente ao contrário.

Finalmente, estavam a menos de dez metros. Então moveu-se levantando o colt. Os dois pistoleiros detiveram-se abrindo desmedidamente os olhos, vítimas do medo. Começaram a disparar e a rogar pragas. Mas já o fizeram quando as balas do colt de Durgan despedaçavam as suas cabeças. Portanto, os seus disparos careciam de eficácia e perderam-se atrás dele, entre as águas do Arkansas.

Caíram como bonecos e Durgan pôs-se de pé. Avançou até às rochas, cambaleando de um lado para o outro. Quase na mesma altura um outro projétil zumbiu perto dele. Baixou-se como para tentar descobrir o seu novo agressor.

Viu-o quase na mesma altura.

Al Holland, sem deixar de disparar, retrocedia entre as rochas, à procura do cavalo, pelo menos assim o calculou. Durgan retrocedeu a correr à procura do seu, ziguezagueando e tropeçando de um modo alarmante. Mas chegou a ele, e com um esforço poderoso subiu para a sela.

Uns cem metros à sua frente, viu Holland que esporeava a montada em direção ao canyon. Esporeou novamente mordendo os lábios, porque a cada salto do cavalo o ombro ferido doía-lhe horrorosamente, parecendo-lhe até que o cérebro tinha sido atravessado por uma bala.

Mas Durgan não caiu. Tal como uma bala, chegou ao caminho sem reduzir a marcha do nobre cavalo, expondo-se a que o animal tropeçasse, que na melhor das hipóteses o lançaria, pelo abismo.

A distância, à medida que subiam, foi-se encurtando, até que finalmente, reduziu a distância para trinta metros. Depois para vinte, e então, Holland voltou-se na sela e começou a disparar.

As balas avizinharam-se perigosamente de Durgan. Mas não disparou até que a distância se reduziu a quinze metros. Então acionou o gatilho uma e outra vez até que a carga do colt se esgotou completamente.

Na sua frente, Holland vacilou sobre a sela. Depois caiu no solo, ficando com a cara voltada para o azul do céu. De cara voltada para o sol impiedoso.

Durgan deteve o cavalo e tornou a carregar a arma. Desmontou num esforço titânico e caminhou ao longo da parede rochosa, sem deixar de apontar para ele. Não queria surpresas de espécie nenhuma. Não as houve. Não as podia haver. Holland ainda vivia, mas não tardaria a morrer.

Iniciou um sorriso cínico, quando o viu aproximar-se, e depois sussurrou cravando os olhos no ombro de Durgan manchado de sangue.

—Vejo que lhe deram. E pena que não o tivessem morto, Durgan — aspirou fortemente e acrescentou: — Atingiu-me, amigo. Estou... pronto. Mona agradecer-lhe-á isto, Durgan... Eu... Eu mandei matá-la quase da mesma forma como arruinei Sadie. Não... podia suportar a ideia de que me desprezasse... pa... ra casar-se... consigo... Não podia... verdade que tem uma confi...ssão assi... nada por Wood? Sim? Por isso lhe saí ao... cami...nho. Estivemos dias... inteir...os à espera na estrada. Vimo-lo e... tivemos pouca sor...

Uma golfada estranha surgiu repentinamente da sua garganta. Depois volteou os olhos de um lado para o outro, como se se quisesse despedir daquela terra onde tinha feito tanto mal.

Acabou por olhar novamente para Durgan, e ficou com os olhos espantosamente quietos, fixos nele. Este afastou-se segundos depois, compreendendo que tinha morrido.

Olhou para o alto dos penhascos onde os corvos começavam a formar círculos. Lamentou não poder transportar o cadáver, porque mais abaixo, junto ao rio, havia o de uma criança. Uma bonita criança cuja morte ia transformar completamente a sua existência e a de Sadie.

De cabeça baixa, sem olhar agora para o cadáver de Holland, Durgan retrocedeu à procura do seu cavalo. Minutos depois descia a encosta, e mais tarde avistava o vulto de Nora, caído junto à espessa mata.

Desmontou calmamente. Tremia, quando se aproximou dela. Porém, ao chegar junto da rapariga ficou sem respiração, espantado. O pequeno seio subia e baixava suavemente ao compasso da respiração. Durgan soltou um grito e deixou-se cair de joelhos junto dela.

Nora vivia!

Olhou para a sua linda cabeça e compreendeu. A bala de um daqueles pistoleiros tinha-lhe roçado pela cabeça, junto à testa, de tal forma que a fez perder os sentidos.

Durgan sentou-se no chão olhando para ela. Afastou os olhos olhando para a ferida do seu ombro, depois de ter rasgado a camisa. Tinha um aspeto feio e não deixava de deitar sangue.

Com tiras da mesma tentou atá-la, e depois tapou-a como pôde. Então pôs-se de pé e começou a arrastar Nora para a beira do rio.

Deitou-a sobre a erva macia e aproximou-se da água molhando o lenço que trazia ao pescoço. Regressou para o pé da rapariga para lavar e refrescar a sua testa. Assim uma e outra vez, até que os olhos negros brilharam assustados, fixos no seu rosto.

Durgan, sem denunciar a dor que sentia no ombro, sorriu para a tranquilizar. Até que ela, no mais completo mutismo, se sentou no chão sem o deixar de olhar. Passaram alguns minutos antes de perguntar:

— Que se passou? — levou a mão à testa. — Dói-me muito —depois olhou em volta e, pela expressão dos seus lindos olhos, Durgan compreendeu que começava a recordar tudo. —Dispararam contra nós, não é verdade? Onde estão? Que?...

—Tranquiliza-te pequena. Sim, dispararam contra nós uns homens que estavam escondidos entre as rochas. Devia suspeitar de qualquer coisa no género, mas a verdade é que sou estúpido. Acalma-te, que já se foram embora — mentiu em parte. — Estamos a salvo.

Olhou-a e tentou sorrir. Depois ele pôs-se muito séria quando percebeu que ele estava sem camisa, que tinha o braço mal atado e o peito sujo de sangue. Empalideceu. Tremia.

—Estás... ferido. Fe...ri...ram-te I

Durgan, com um sorriso tranquilizador, pôs-se de pé.

— Não é nada, filha — disse. — Um arranhão sem importância. Espera-me aqui, vou buscar os cavalos.

Afastou-se, lutando contra a debilidade das suas pernas que ameaçavam atraiçoá-lo a cada instante, com receio que a rapariga percebesse que tremiam. Finalmente, ambos começaram a cavalgar para o rancho.

Ao avistar a vivenda, Durgan olhou-a. Nora parecia respirar fatigada, e os seus lindos olhos negros brilhavam cheios de excitação.

Alcançaram o edifício sem que ninguém desse conta da sua presença. Durgan desmontou, e Nora imitou-o no gesto. Avançavam agora para as escadas, quando a figura de uma mulher se recortou no umbral da porta. Olhou para Durgan com os olhos abertos perguntando a si mesma se seria verdade ele regressar, se seria verdade ele estar de novo no rancho, junto dela e de sua filha Lina.

Avançou um passo. Foi então que Sadie viu a pequena figura que, vestida de vaqueiro com roupas que lhe ficavam um pouco grandes, a olhava por sua vez com os seus imensos e rasgados olhos fixos e brilhantes como as estrelas.

Mesmo assim, demorou algum tempo a compreender que aquilo que tinha na sua frente era uma criança de dez anos apenas. Então empalideceu de uma maneira horrível, levou a mão ao peito e gritou. Grito em que se misturavam a alegria e a dor em partes iguais. Um grito que, mais que humano, semelhou o de uma fera ferida de morte.

Depois correu. Correu com a longa cabeleira ruiva ondulando ao vento, enquanto por seu lado, Nora se lançava ao seu encontro.

Durgan, com o rosto franzido por uma careta um tanto dolorosa, viu como, soluçando as duas, se cobriam de beijos e lágrimas. Beijos e lágrimas que pareciam não ter fim. Já estavam juntas. Para sempre.

Tornou a olhá-la. Sadie não reparara nele. Não pensava que ele era o Seu marido, quem lhe tinha trazido a sua filha. Sorriu ironicamente e deu meia-volta avançando para o cavalo.

Então, toda a sua falsa resistência caiu de vez. Sentiu uma tontura súbita, vacilou sobre as mal equilibradas pernas e caiu como um saco. Perdeu o conhecimento muito antes do seu corpanzil de gigante golpear duramente o solo. Por isso não ouviu o grito lancinante de Sadie, que, naquele momento, se voltava para ele. Nem sequer soube do susto que o sheriff Morley apanhou durante muito tempo.

Sadie estava sentada à cabeceira da cama, quando despertou, três dias mais tarde, com a mente completamente lúcida. Naquele momento ela olhava-o, pelo que os olhos de ambos ficaram fixos um no outro durante momentos. Foi ele quem falou primeiro, depois de um longo silêncio, e fê-lo sem afastar o olhar:

—Quero dizer-te uma coisa, Sadie.

—Sim? Pois é a melhor que esperes até estares bom de todo. O médico disse para não falares.

— É necessário que o faça agora, rapariga.

—Não, Jack — e fez um gesto para se pôr de pé. —Se continuas a falar, deixo-te sozinho.

—Vai, e perderás a única oportunidade de eu ser sincero para contigo, Sadie. Compreende, tenho necessidade de o fazer, e depois... Depois pode ser que não sinta esse desejo.

Sadie olhou-o fixamente.

— Está bem, Jack — concordou de má vontade. — Fala.

—Eu não ia com aqueles homens. Compreendes?

Ante a sua surpresa, ela respondeu:

— Eu sei.

—O meu pai também não, Sadie.

Agora ela não respondeu.

—Queria que me acreditasses—acrescentou Durgan vendo que a rapariga ficara calada. —O meu pai era muito amigo de um tal Jess Dreyer. Um bicho venenoso, mas o meu pai não soube até que já não houve remédio. Olha, rapariga; as coisas passaram-se assim: nós tínhamos um belo rancho situado num ponto chave para passar gado do Arizona para a Califórnia. Jess tornou-se amigo do meu pai por isso. Como é lógico, começaram a vê-los juntos por todo o lado, até que um dia, preparado por Jess Dreyer e outros dois, deu-se um grande roubo no Banco local. Não sei como se arranjaram, mas todas as provas estavam contra meu pai. Jess ameaçou denunciá-lo se não acedesse às suas exigências. Homem débil, acedeu, e desde então os roubos de gado começaram na região. Gado esse que ia parar à Califórnia passando pelo nosso rancho. Enfim, Sadie; não sei como, mas os federais descobriram aquilo e tivemos que fugir. A partir de então, andámos de um lado para o outro, sempre à margem da lei, ainda que eu não tivesse parte integrante em nenhum daqueles assaltos, por estar a estudar para engenheiro. Finalmente, o meu pai mandou-me chamar, por se encontrar ferido na montanha, em virtude de uma luta travada com o sheriff e os seus ajudantes. Foi então que aconteceu o caso do teu rancho. Por isso não intervim nisso nem no que se passou depois. Ele também nunca teve a rapariga em seu poder, Sadie. Esta é a verdade. O meu pai morreu e confessou-me tudo. Um homem à porta da morte não sabe mentir.

Ela permaneceu silenciosa. Depois voltou o rosto para o olhar.

—Recebi uma carta, quando raptaram Nora, pedindo-me um resgate e quinze mil dólares. Era assinada por teu pai. Que me dizes a isso?

— Foi Dreyer, Sadie. Dessa forma afastava as suspeitas que coincidissem com ele, para atirá-las, como sempre, para cima de meu pai. Depois ele morreu, e creio que foi este o motivo por que não ta devolveram. Dreyer estava bem instalado e não queria correr riscos. Por outro lado, suspeito que estava muito só e começava a pensar que depois desta há outra vida no Além, na qual não têm entrada os indivíduos como ele. Talvez por isso a tivesse continuado a reter.

— Esperas que acredite em tudo isso?

— O caso de meu pai? Não, Sadie, não espero. Não. Só espero ainda que seja esta a verdade. Eu também não sabia onde estava a rapariga. Só o soube há pouco tempo.

Agora Sadie voltou-se para o olhar francamente.

—Isso não é verdade, Jack! Sei que não é verdade. Então, por que?...

— Por que deixei que acreditasses? Para responder de qualquer forma ao ódio que eu, sem saber, tinha despertado em ti. Sei que procuraste intervir contra mim, mais ou menos diretamente, na Escola de Engenharia, muito antes de terminar a minha carreira. Sei que procuraste fazer-me todo o mal que pudesses, Sadie. Compreendo o teu ódio contra todos, compreendo todo o teu orgulho que, como disse uma vez, era apenas fictício, um temor que ocultava os teus verdadeiros sentimentos. O medo que tinhas de tudo e de todos. Compreendo tudo, menos que tivesses tentado averiguar se era ou não verdade o que se dizia dos Durgan. Se era verdade que foi um Durgan que escreveu aquela carta pedindo um resgate por Nora.

— Então, se é verdade o que dizes, por que?...

— Eu também estive na cabana aqueles dias, Sadie. Vi-te. Vi-te chorar muitas vezes, compreendes? Depois perdi a tua pista, e quando a encontrei, foi para ser vítima propícia do teu ódio. E viste o pouco que me defendi no tribunal que me julgou. Quase nada. Apenas o indispensável para que a pena não fosse muito grande.

— Mas, por que... por que... o fizeste?

— Já te disse que intervim algumas vezes em negócios que não me agradavam muito, empurrado pela força das circunstâncias. Tinha que pagar a minha dívida perante a Humanidade. Por outro lado, sabia que um da antiga quadrilha estava na prisão, condenado a trinta anos. Era a mesma prisão onde eu iria pagar. Ele tinha forçosamente de saber onde estava a tua filha. Travei amizade com ele e disse-me muitas coisas. Quando saí, procurei os três que restavam e agora... agora... já não resta nenhum. Acabei com Dreyer que me levou à rapariga. Isso é tudo, além de querer fazer o teu jogo, para dobrar o teu maldito orgulho, para acabar com o teu ódio por tudo e contra todos.

Calou-se, fechando os olhos. Sadie olhou-o em silêncio durante muito tempo. Por fim, levantou-se e saiu silenciosamente do quarto. Estas foram as últimas palavras que trocaram entre eles durante muito tempo, até que um dia, quase um mês depois, Durgan disse a Sadie que se ia embora.

Ela não fez o menor comentário. Mas no dia seguinte de manhã, data da partida, Sadie e as duas raparigas estavam no limiar da porta, quando Durgan se aproximou com o rosto tenso.

—Bem, Sadie— disse friamente—, chegou a hora. Não tenho nada que fazer aqui.

— Ficam as raparigas — replicou ela.

—Têm a mãe.

— Também fica a recordação de tudo isto e o levantamento do dique.

— Para isso encontrarás outro engenheiro.

Não respondeu. Deu meia-volta e aproximou-se do cavalo. Nora lançou um grito afogado.

—Pai! — não compreendia nada, mas tinha o pressentimento de que ia acontecer qualquer coisa de mau. —Não te vás embora, pai.

Durgan, sem se voltar, pôs um pé no estribo. Então, a pequena Nora voltou-se, encarando Sadie.

—Mãe... —sussurrou baixinho. — Não o deixes. Diz--lhe qualquer coisa. Será que não compreendes que és tu a única pessoa capaz de o deter?

Sadie olhou para a filha com um rubor nas faces. Desceu as escadas do alpendre e agarrou-o por um braço. Durgan pôs o pé no chão e voltou-se lentamente, olhando-a.

—Que queres agora, Sadie?

— Maldito vagabundo! — fez urna pausa e murmurou calmamente: —Quero dizer que eu também fico a precisar de ti, Jack.

— Isso é verdade?

—Jack! Eu... Oh! Por que não o dizes tu? Nunca pensei que uma mulher casada tivesse que dizer ao seu marido que está apaixonada por ele.

Durgan n ã o respondeu. Olhava-a nos olhos, fixamente, tentando que eles lhe dissessem ao certo o que se passava na alma da sua mulher. Deve ter visto qualquer coisa, uma, vez que, sem aviso prévio, a agarrou pela cintura, atraindo-o contra si.

—Jack...

Nenhum dos dois falou durante alguns minutos.

 

 

 

FIM

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