quinta-feira, 12 de agosto de 2021

RB007.07 A chegada dos federais

Sadie cortou a frase que estava a dizer logo que o viu chegar com o cavalo pela rédea. Desceu as escadas e foi recebê-lo. Com um estranho sorriso nos lábios aproximou-se até parar colada a ele.

— Olá, querido — disse.

Esticou-se sobre a ponta dos sapatos de salto alto, levando as mãos ao seu pescoço.

—Oh, Jack...

Foi a última coisa que disse antes de lhe tapar a boca com os lábios ardentes como fogo. Durante uns segundos, Durgan vacilou, mas depois enlaçou-a pela cintura e correspondeu à carícia.

Separaram-se cansados, ante os sorrisos irónicos dos vaqueiros. Depois de se olharem durante uns instantes em silêncio, Durgan disse um pouco surpreendido.

— Quero falar contigo, Sadie.

— Sim?... Fica para depois, querido. Ou seja, amanhã —apontou para os vaqueiros. — Estão à minha espera, Jack. Temos que transladar uma certa quantidade de gado para uns pastos melhores. Passarei a noite na cabana que está na margem do riacho.

Durgan sabia onde era a cabana. Quando nela, nos primeiros dias de ali estar, inspecionou os postos e os arredores do rancho, tinha-a a visto e passado lá algumas horas.

— De acordo—replicou friamente. —Seja!

Afastou-se dela levando o cavalo à rédea, e foi para o curral. Encostado ao umbral da porta, permanece em silêncio vendo como os cavaleiros se afastavam. Depois atirou fora o cigarro e aproximou-se do edifício principal.

Entrou lentamente, pensando agora que era muito melhor partir, ir-se embora e deixar as coisas tal como estavam. Sadie acabava de o beijar. Os seus lábios pareciam fogo, como toda ela. Mas aquele beijo e aquela partida imprevista escondiam qualquer coisa. Qualquer coisa que não conseguia explicar. Qual seria o seu jogo?

Soube-o naquele momento. Acabava de atravessar a porta que dava acesso ao hall, quando soou uma voz nas suas costas.

— Agradecia que não se movesse, nem fizesse nada que não esteja certo, mister Durgan. Voltou-se lentamente. Eram dóis. Um deles com uma estrela prateada na camisa.

Durgan não os conhecia. Nunca os tinha visto, mas soube quem eram, e sem que nenhum deles se apresentasse. Federais. Aquela era a segunda coisa que Sadie tinha ido fazer à capital.

Olhou-os durante algum tempo, observando que nenhum deles trazia as mãos perto das armas. Tão-pouco tentou aproximar a sua do cabo do colt.

— Que desejam? — perguntou.

O homem da insígnia respondeu:

—Temos uma ordem de captura contra o senhor, mister Durgan. Tem que nos entregar a arma.

Olhou-os e esboçou um leve sorriso.

—Mais nada? — perguntou.

— Sim. Terá que nos acompanhar a Fowler e dali para a capital. 

— Vão julgar-me neste Estado, agente?

— Não, suponho que não. Porquê?

Durgan encolheu os ombros.

— Por nada. Simples curiosidade.

Lentamente levou a mão ao colt e sacou. Segundos depois este estava em poder do federal. Depois, Durgan estendeu-lhe as mãos, mas o federal negou com um gesto.

—Não é necessário, se nos dera sua palavra que não foge, mister Durgan.

Sorriu 'levemente.

— Bem — replicou. —Dar-lha-ei por agora. Mas veja se compreende agente, só por agora.

—Que quer dizer com isso?

—Que a partir do momento em que me deixem na cela, na prisão de Fowler, a minha palavra caducará.

—Pensa escapar facilmente dali, mister Durgan? Se assim é, aconselho-o a não tentar. Isso só lhe traria prejuízo.

Durgan sorriu, mas o seu sorriso era extremamente frio.  Não respondeu a isso, mas acrescentou:

— Bem, quando quiserem.

Subiu para a sela de um salto, e esperou que os federais viessem para junto dele, um para cada lado. Segundos depois partiam os três para Fowler a todo o galope. Chegaram ao anoitecer, pelo que foram poucos os que notaram que sucedera qualquer coisa fora do normal.

Chegaram assim ao escritório do sheriff sem que ninguém os seguisse, nem se formassem grupos de curiosos. A autoridade limitou-se a olhar para Durgan. Depois lançou um grunhido. Durgan avançou e minutos mais tarde ouvia fechar-se a porta da cela. Estendeu-se no duro colchão com um sorriso nos lábios.

Sadie tinha arranjando tudo muito bem. Mas tinha-se precipitado. Ela mesma, sem o saber, acabava de fechar a única porta por onde podia saber tudo aquilo que avia muito tempo ansiava. Com ele na prisão não havia qualquer possibilidade.

Passou uma hora, duas...

A povoação começou a ficar silenciosa. Durgan, dentro da cela, esperava. Esperava, enquanto permanecia atento. Sabia que o sheriff tinha abandonado a prisão com os dois agentes federais. Estes apesar daquilo que ele dissera no rancho, julgavam-no seguro. A verdade é que estava, mas precisava de umas horas de liberdade. Tinha uma conta pendente com Sadie e queria cobrá-la.

Continuou à espera sem dar razão do tempo que passava.

Repentinamente, Durgan levantou-se, ouvia-se no corredor um ruído. Uns passos de mulher. Reconheceu-os. Mona acabara de dar um espetáculo aos clientes do saloon e agora estava ali.

Aproximou-se das grades. Quase na mesma altura as mãos de Mona agarraram as suas como numa carícia muda.

—Mona! Que fazes aqui?

A rapariga sorriu levemente.

— Vou abrir-te a cela, Jack — disse simplesmente.

Ouviu-se a chave correr na fechadura. Lentamente abandonou a cela, enquanto ela sussurrava nas suas costas.

— Confessa que não me esperavas, Jack.

Já no escritório, enquanto afivelava o cinturão, respondeu:

— Não, a ti, confesso que não. Por que o fizeste?

— Soube e vim. Isto é tudo, Jack. Portanto, podes guardar as perguntas.

Olharam-se em silêncio. Finalmente Durgan interrompeu-o.

— Devo agradecer-te, Mona. Mas perdeste tempo.

—Porquê? —perguntou assombrada.

—Por nada, querida. Mas esses homens têm e devem levar-me para a capital. Quero ser julgado. E... E o desejo de Sadie, e vou satisfazer-lho.

—Então?...

— Precisava de algumas horas e graças a ti consegui. Tenho que ajustar umas contas — olhou-a de frente. —Estive lá dentro a pensar a melhor maneira de atrair o sheriff para a porta, mas afinal poupaste-me esse trabalho. Obrigado.

— Não servirá de nada aquilo que eu fiz se te apanharem aqui. Por que não foges?

Durgan assentiu com um gesto mudo da sua cabeça, deu um passo em frente e beijou ternamente os vermelhos e carnudos lábios, e, antes que Mona pudesse dizer qualquer coisa, saiu para a rua.

Entre as sombras, junto à parede do edifício, Durgan chegou à cavalariça. O seu cavalo estava lá. Da porta e antes de entrar, olhou em volta. Estava vazia.

Silenciosamente selou o animal e cavalgou lentamente até que chegou fora da cidade. Só então picou as esporas arrancando num galope desenfreado. Para a cabana do cão. Para o lugar onde se encontrava Sadie. A Sadie que não o esperava. A Sadie que ia receber uma surpresa.

Por volta da meia-noite e depois de dar uma grande volta para evitar encontrar-se com os vaqueiros, Durgan alcançou a cabana, a pé, pois tinha deixado o cavalo escondido entre um frondoso grupo de árvores.

A primeira coisa que pensou foi que Sadie estivesse acordada, uma vez que entre as ripas de união das janelas se divisava luz.

Aproximou-se da porta e apalpou. Estava aberta. Pelo visto, Sadie tinha plena confiança, apesar da sua beleza, nos homens da sua equipa. Empurrou-a suavemente e fechou-a em seguida com o tacão da bota.

Sadie estava voltada de costas, sentada num banco, com a saia de montar por cima dos joelhos, fumando um cigarro. Em que estaria a pensar, uma vez que não conseguia dormir?

Durgan pensou que fosse nele, na sua detenção, naquilo que ela queria saber.

Avançou.

O tilintar das esporas ouviu-se claramente dentro da espaçosa e cómoda cabana. Sadie pôs-se rígida em cima do banco. Durgan reparou nisso só de ver o movimento quase impercetível que acusaram os seus belos ombros.

Depois pôs-se de pé e voltou-se.

A sua cara refletiu a admiração que sentia, e depois, como consciente do perigo, olhou em volta.

— Chega aqui, querida — chamou-a curvando os dedos da mão direita.

Sadie olhou-o, incapaz de dizer fosse o que fosse, de pronunciar uma só palavra. Vacilou uns segundos e então fui Durgan que se aproximou dela.

Sem dizer nada, afundou as mãos no seu sedoso e ruivo cabelo, deitando-lhe a cabeça para trás. Depois beijou-a longamente.

Sadie debateu-se alguns. segundos entre os seus braços, mas acabou por se render a eles. O sol do dia seguinte surpreendeu uma Sadie de cabelos revoltos, olhos brilhantes de rancor, meio encostada contra uma das paredes da cabana, e com o olhar fixo nela.

Foi Durgan quem primeiro se pôs de pé. Olhou-a com um ar divertido enquanto os olhos dela brilhavam de uma forma estranha, e disse:

— Bem, querida, compreende, mas tenho que te deixar. Estão à minha espera. Se não me engano é um sheriff e dois agentes federais.

Avançou para a porta sem que Sadie fizesse o menor movimento ou respondesse às suas palavras. Mas Durgan não chegou àquela. De repente, abriu-se bruscamente, e no umbral, com os colts na mão, apareceram os agentes federais e o sheriff. Durgan olhou-os com um sorriso irónico.

—Isto não está certo—disse. —Nunca se deve entrar nos aposentos de uma dama sem primeiro pedir autorização. Podem-se ver coisas que não se devem.

—Porco!

As palavras saíram sibilantes dos lábios apertados de Sadie.

Mas Durgan não quis reparar nisso ainda que tivesse ouvido perfeitamente. Sem perder o sorriso, aproximou-se do trio.

— Bem — disse. — Aqui já não resta nada para fazer.

Mas ficara qualquer coisa, ainda que ele não o quisesse compreender. Ficara Sadie. Ficara a dívida que tinha para com ela, divida que acabava de saldar a seu modo.

Levaram-no. Nessa mesma noite, alguém fez voar parte do dique. Duas noites depois, uns quantos homens atacaram os trabalhos em pontos diferentes. Sadie perdeu homens e o seu novo engenheiro.




FIM DA PRIMEIRA PARTE

 

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