Perdeu demasiado tempo. Gozava vendo Pat Barton retroceder aterrorizado, sem sequer tentar levar as mãos aos «Colts».
Não tinha a mínima reação viril. A sua entrega era absoluta. Dava-lhe asco.
Para Barton nada mais existia, naquele momento, além do revólver de cuja boca sairia o projétil que lhe aniquilaria a vida de uma vez para sempre.
Olhava-o obcecado, ofegante e mudo, entrechocando os dentes, espaço de tempo que Claer prolongava como quisesse. Nem sequer tinha forças para dar meia-volta desatar a correr. Claer ainda insistiu:
— Tens dois revólveres, Pat.
Baixou os olhos para eles e olhou-os. As ideias confundiam-se-lhe no cérebro. Sim, tinha dois revólveres, mas não lhe daria tempo de fazer uso deles. Dizia aquilo simplesmente para fazer pouco dele. Bastava uma tentativa para lhes tocar e...
Continuou com os braços caídos ao longo do corpo, sem os erguer nem um centímetro. O que ergueu, isso sim, foi a cabeça olhando em frente, para a retaguarda de Claer. Parecera-lhe ouvir...
Sim, era o galope de um cavalo. Alguém se dirigia para ali. A esperança voltou a renascer no seu coração.
— Pega nos revólveres, Pat — trovejou o assassino.
Não lhes pegaria. Tinha de prolongar aquela situação uns minutos, apenas uns minutos, até que o cavaleiro que galopava velozmente na direção deles chegasse ali.
Continuou a retroceder, agora mais devagar, e suplicou:
— Por que queres matar-me, Claer, se John...?
Queria dizer-lhe que não tinha enviado John contra ele, ganhar uns minutos. Mas as suas palavras tiveram o condão de enfurecer o assassino que, alheio à proximidade do cavaleiro, gritou, interrompendo-o:
— Mentes, Pat. Tu mandaste-o contra mim. Foi ao «Ás de Copas» à minha procura. Foste tu quem...
Não continuou. Acabava de ver um fulgor de alegria nos olhos de Pat, e, apesar de ouvir mal, chegava-lhe aos ouvidos um rumor estranho, como o bater dos cascos contra o solo.
Não obstante a surdez, acabara por dar conta de que se aproximava um cavalo, pela sua retaguarda. Rápido, com uma velocidade incrível, rodou sobre os tacões e apertou o gatilho do revólver sem a mínima demora...
O cavaleiro era John. Não esperava que Claer se voltasse tão depressa. Descia, já, do cavalo, quando recebeu o tiro num ombro. Esperava poder capturar Claer antes de este dar fé da sua presença, mas Pat denunciara-o com a expressão de alegria que chamou a atenção do assassino.
John, apesar de ferido, não perdeu tempo em ripostar. Antes de Claer premir o gatilho pela segunda vez, o xerife disparou o revólver e uma das balas foi incrustar-se na mão do proprietário do «Ás de Copas», precisamente naquela que segurava o «Colt».
Não tinha querido matá-lo. Podia tê-lo feito, mas preferiu assim.
Claer, uivando de dor, tentou sacar o outro revólver, com a mão esquerda. O xerife intimou-o:
— Quieto, Claer, se não disparo de novo. Levanta os braços!
Obedeceu, praguejando.
— Perdi esta jogada — disse — por conversar demais. Sempre por causa desse maldito Pat. Podia tê-lo matado como a um cão.
—Também eu podia ter-te matado como a um cão e... bem vês — objetou John.
Claro que via, e se não o mataram como a um cão, acabariam por pendurá-lo como a um porco ou qualquer coisa parecida. Se lhe dessem a escolher, tanto lhe fazia uma coisa como a outra.
John ameaçava-o com o revólver, enquanto Pat continuava imóvel, atrás dele, sem ter saído ainda da sua estupefação.
Não obstante, ainda não terminara tudo. John estava gravemente ferido. Os olhos, mau grado os seus esforços, fechavam-se-lhe e tremia-lhe a mão que empunhava o «Colt».
Claer podia vê-lo, mas não Pat.
Claer pressentia os esforços que ele estava fazendo para manter-se de pé, enquanto o sangue lhe jorrava pela ferida.
Com as costas apoiadas ao cavalo, John continuava a ameaçá-lo com o revólver. Claer, para experimentá-lo, avançou um passo para ele. Nada. Avançou outro passo, sem baixar os braço-John não disparava. Vê-lo-ia sequer?
Tinha o olhar perdido no vácuo. Claer acentuou sorriso. Bem, as coisas voltavam a pôr-se a seu favo! John, afinal, era um palerma...
Pat não corria em auxílio do irmão. Na realidade ainda não tinha conseguido dominar a emoção da sul presa.
Além disso, tudo ocorrera depressa demais. Via o irmão dominando Claer com o revólver e considerava-se salvo. A alegria egoísta de viver entontecia-o.
John manteria em respeito o assassino até que ele se refizesse, até que pudesse correr em sua ajuda. Nem sequer reparara que o irmão estava ferido. E John mantinha-se em pé por milagre. Já não via Claer. Um véu espesso, quase negro, nublava-lhe vista. O revólver pesava-lhe incrivelmente. As pernas. Ah! As pernas como lhe doíam! Nunca as tinha sentido tão fracas. Por que não vinha Pat em sua ajuda? Chamou-o: «Pat, irmão, anda cá, não vês como estou?»
A voz não lhe saiu da garganta. Só um ruído estranho, um queixume. E Claer, com os braços erguidos, avançava para ele... Pat apercebeu-se do que sucedia quando John caiu no chão, de joelhos, e Claer se precipitou sobre ele, lançando ao ar a estridência metálica das suas gargalhadas...
— Com que então, hã? Vinhas prender-me — proferiu com sarcasmo. — Vê o que ganhaste com isso. É difícil apanhar James Claer.
Enquanto falava tirou o revólver do coldre com a mão esquerda.
— Linda figura a tua, xerife Barton. Dá cá...
Arrancou-lhe o «Colt» da mão, com um puxão violento.
John, de joelhos, parecia pedir-lhe piedade. Pat pensou que o irmão ia morrer por ter tentado salvá-lo. E não devia consenti-lo.
Instintivamente, levou a mão ao «Colt» e, febril, empunhou-o.
Se até então fora um cobarde, se até ali tivera medo de Claer, agora não o tinha. Só ele podia salvar John. Ergueu o revólver e apontou-o às costas do assassino.
E apertou o gatilho.
A detonação quebrou o silêncio sem rumores de vida, do deserto.
James Claer voltou-se lentamente com um esgar de irreprimível estupefação no rosto balofo. Já não ria.
— Tu, Pat, foste tu? — disse.
Parecia um boneco desarticulado. A cicatriz que lhe cortava a cara parecia mais vermelha do que nunca, e a mão já não tinha forças para segurar o pesado revólver com que pretendera disparar contra John. Depois, foi distendendo a boca, pouco a pouco, num último sorriso, como se quisesse troçar do homem que apertava de novo o gatilho do seu revólver atirando contra ele nova carga de chumbo...
—Tu, Pat... co...?
Nada mais disse. Levou as mãos ao peito e cai de bruços, por cima do «Colt». Pat aproximou-se dele, passo a passo. Não era que o temesse, porque não temia agora nada nem ninguém. Voltou-o com o pé e murmurou:
— Está morto.
Acertara. James Claer tinha morrido. Agora só o irmão o preocupava. Aproximou-se de devagar. Temia que estivesse morto. Tinha-o a seus pés, no chão, de bruços.
—John, ouves-me? — murmurou sem se atrever tocar-lhe.
John continuou imóvel, os dedos crispados na terra.
Pat insistiu:
— John, ouves-me?
Ajoelhou-se a seu lado e estendeu um braço pai tocar-lhe:
—John! John, escuta-me.
Manchou as mãos de sangue ao voltá-lo de rosto para cima. Observou-lhe a cara. Estaria morto? Encostou-lhe o ouvido ao peito para escutar coração.
— Vive, vive! — exclamou imediatamente.
Era preciso sair dali quanto antes. Voltar a Winona. Curar a ferida de John. Começou por pensar o ombro do irmão. Rasgou a própria camisa e ligou-o com ela. Estava, provisoriamente, feito o curativo. Agora tinha de regressar à cidade...
Mas como?...
Reparou então em que a noite tombara sobre eles e que os cavalos, espantados, sem dúvida, pelos tiros, tinham fugido dali.
Como iria chegar a Winona a pé, de noite, e com o ferido às costas?
Que poderia fazer senão esperar que amanhecesse? De qualquer modo, iria avançando até onde as forças lhe permitissem.
Carregou com o irmão e começou a andar. John gemia de quando em quando e os queixumes do irmão estimulavam-no a continuar.
Subitamente, deteve-se espantado. Com tudo aquilo esquecera-se de que se encontrava a braços com um novo perigo. Mesmo durante o Verão, o «Deserto Amarelo» costumava ser o lugar de reunião dos coiotes.
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