segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

KNS128.10 Armadilha na Passagem do Urso

Logo que pôde, Babe informou Ron do descabelado projeto de Virgínia. O jovem franziu a testa.
— Ela está doida?! Isso é perigoso! A sua expressão mudou subitamente.
— Mas, espera... Também é eficaz...
— Que queres dizer?
— Parece-me uma excelente ideia... É uma bela oportunidade para surpreender Savold.
— Deixarás essa rapariga afrontar o perigo ?
— Deus bem sabe quanto lamento. Mas assim é preciso...
— Ela quer partir amanhã, pois seu irmão já tinha tudo preparado.
— Então, não há tempo a perder. É necessário falar com o xerife esta noite...
Já a noite ia bastante avançada, quando teve oportunidade de dirigir-se ao escritório do xerife.
Savold já tinha saído. Provavelmente, o malvado rancheiro adotaria a mesma tática das vezes anteriores. Inteirado já da decisão de Virgínia Hamilton, estava preparado para sair ao seu encontro. Assim, permaneceu no «saloon» até bastante tarde, para não despertar suspeitas.
Entretanto, Ron andou cautelosamente, para não ser surpreendido. Quando chegou a casa do xerife, empurrou a porta e entrou. Este era bastante confiado, além de que tinha o sono bastante leve. De súbito, ouviu-lhe a voz:
— Quem anda aí ?


— Sou eu, Ron Delaney.
— Ah ! Pode entrar...
O xerife acendeu uma vela e pôs o revólver em cima da mesinha.
— Então, que há?
— De quantos homens podemos dispor para amanhã de manhã ?
— Os meus dois comissários, os Greene e Collin. Contando comigo, seis.
— Babe e eu, oito. Já não é mau...
— De que se trata?
— Virgínia Hamilton parte amanhã para Phoenix, com o gado. Savold prepara-se para armar-lhe uma emboscada. É a melhor oportunidade para cairmos sobre esses bandidos.
O xerife saltou da cama e começou a vestir-se.
— Vou avisar os homens. E, se me for possível, arranjarei mais dois...
— E eu vou-me embora. Às seis horas estaremos todos preparados.
Ron e Babe tomaram o pequeno almoço frugal no esconderijo, bebendo um copo de uísque cada um deles. Ron olhou o relógio.
— Falta um quarto para as seis. Temos de ir procurar o xerife.
De súbito, Babe levantou-se sem fazer ruído. Ron olhou-o surpreendido, mas aquele fez-lhe um sinal para que não dissesse nada. Depois, abriu a porta bruscamente.
Uma sombra retrocedeu, procurando alcançar a escada. Babe, porém, com um salto deitou-lhe a mão. O intruso tentou escapar-se e, como não pudesse, sacou um punhal para cravá-lo no corpo do seu inimigo. Babe, que viu o gesto, a tempo, agarrou-lhe o pulso direito e torceu-lho, dobrando o braço para trás. O criado soltou um grito de dor, ao mesmo tempo que os ossos do braço estalavam. Com um empurrão, Babe fê-lo entrar.
— Agora, senta-te Jackson... Assim poderás ouvir melhor a nossa conversa.
O criado começou a tremer, ao ver o olhar de Ron. Considerava-se perdido.
— Estavas então a escutar?
— Não. Eu ia a passar e estranhei ouvir falar, a esta hora. Parei, precisamente quando a porta se abriu. Não me podem acusar de nada...
— Então, porque sacaste este punhal?
— Foi com a surpresa, num gesto instintivo.
— Deixa-te de mentiras... Estás às ordens de Bert Savold, não é verdade? Vamos lá saber. Onde é que ele pensa atacar os vaqueiros da menina Hamilton?
— Asseguro-lhe que não sei nada.
Babe deitou-lhe a mão esquerda ao pescoço e a outra ao braço direito, fazendo-o soltar um doloroso grito.
— Não me toque aí... Tenho o braço partido.
— E o juiz Godfrey? — perguntou Ron.
Jackson ficou imobilizado pela surpresa.
— O senhor... sabe isso?
— E sei ainda mais... Ele e Savold...
— Foi ele quem preparou tudo...
— Sim... E Savold é que é o executor...
— Agora, vens connosco...
— Aonde me levam?
— De momento, ficarás preso. Depois, serás julgado. E o mais provável é que te enforquem.
Jackson não tentou resistir e foi levado pelos dois à presença do xerife, a quem contaram tudo.
— Por agora, fica preso.
Depois de encerrar Jackson na cela, o xerife disse:
— Os nossos homens já devem estar à espera. — Antes disso, temos de ir fazer uma visita! — retorquiu Ron.
— A quem?
— Ao juiz Godfrey, para vir fazer companhia a Jackson.
-- O meu amigo endoideceu?
— Nunca tive tanto juízo, como agora. Depois, verá... Tenho a certeza de que ele é que é o alma danada desse «trust». Além de evitarmos que ele fuja, poderemos saber onde é que Savold espera o gado do rancho Hamilton.
— Está bem. O senhor é que sabe!...
Apesar de ser muito cedo, encontraram-no já levantado. Godfrey ficou surpreendido, e pouco tranquilo também, pela estranha visita. No entanto, mostrando um sangue-frio admirável, perguntou:
— A que se deve a vossa visita, a esta hora? Não acham um pouco cedo?
Em vez de responder-lhe, Ron observou:
— Não julgava encontrá-lo já levantado, juiz.
— Como tenho de efetuar algumas diligências, muito cedo, vim tratar de vários documentos para o efeito.
— Pois é pena não poder realizá-las...
— Porquê? — Porque está preso!
— respondeu Ron, com firmeza.
Godfrey olhou para o xerife, que se conservava silencioso:
— Meta este homem no calabouço!
— Não! O senhor é que vai para lá...
— Mandarei um comunicado ao governador, para o destituir do cargo e...
— Pense nisso depois...
Lawrence Jackson acaba de confessar tudo. Agora, só queremos saber onde é que Bert Savold está emboscado. Sabe-mos que é perto do Desfiladeiro Dourado.
— Isso é uma calúnia...
— Babe, manieta-me o senhor juiz... Mas com delicadeza, para não lhe doer muito os pulsos... Assim, sempre é mais fácil responder à pergunta que lhe fiz... Ainda que tenha de arrancar-lhe a pele ou de fazer-lhe um escalpe, como os índios.
Godfrey estremeceu. Não podia fazer o menor movimento. Por outro lado, o tom de Ron era duro e implacável e convenceu-se de que ele era capaz de cumprir a sua ameaça. Pendeu a cabeça, abatido.
— Savold está, com os seus homens, à saída da Passagem do Urso.
— Conhece esse lugar, xerife?
— Conheço! — Espero que não me engane, Godfrey. Se me enganar, não será julgado.
Pouco depois, Lawrence Godfrey era encerrado no calabouço.
— Agora, não podemos perder tempo. A menina Hamilton deve chegar antes da meio-dia, à Passagem do Urso.
Mais tarde, os três homens partiram à desfilada, não tardando em chegar ao sítio combinado, onde os esperavam sete homens, mais dois do que calculavam. Depressa estabeleceram o seu plano tático.
Efetivamente, a Passagem do Urso não ficava muito longe. Depois do xerife indicar o local, Ron examinou as suas características. Prestava-se admiravelmente para uma emboscada. O terreno escabroso permitia aos salteadores estarem por ali escondidos.
Ron traçou rapidamente um plano de ação, com o qual o xerife concordou. Não era conveniente que Virgínia e os seus vaqueiros transpusessem a Passagem do Urso. A confusão dos animais facilitaria a fuga dos foragidos. Era necessário que ela se inteirasse da realidade. Então, ela e mais dois vaqueiros podiam permanecer no interior do desfiladeiro, enquanto os restantes saíam, para apanhar os salteadores entre dois fogos. Deviam atacar de tal forma que nenhum daqueles pudesse escapar. Todos eles eram dignos da forca, para benefício da Humanidade. Ron sobretudo desejava enfrentar Bert Savold.
Babe Custer foi o encarregado de ir ao encontro da jovem rancheira. Ron confiava nele, por ser hábil e capaz de conduzir os vaqueiros na luta contra os ladrões de gado.
Satisfeito pela confiança que punham nele, Babe lançou a sua montada num galope veloz, sem recear que fosse descoberto pelos seus inimigos. Estes confiavam em ver aparecer o gado e os vaqueiros, para crivá-los de balas. Uma nuvem de pó denunciou a presença do gado. Babe não se deteve e não tardou a ser visto pelos vaqueiros. De mãos no ar, para evitar que disparassem contra ele. Ao reconhecê-lo, Virgínia assustou-se:
— Danny piorou ?
— Não, menina...
— Então, foi Ron ?...
Babe interrompeu-a, sorridente:
— A Ron nunca pode acontecer nada de mau... Vejo que se interessa muito por ele...
Ela corou.
— Naturalmente... Estou-lhe muito grata pelo que fez por Danny.
— Só por isso?
Virgínia fitou-o.
— Custer! O senhor é odioso, tal como o seu amigo...
Babe desatou a rir.
— A menina não é sincera. Mas o assunto de agora é outro e mais sério. Venho avisá-la de que, do outro lado do desfiladeiro, na Passagem do Urso, Savold e os seus bandoleiros estão à espera que apareçam com o gado.
— Que devo então fazer?
— Seguir pelo desfiladeiro até à sua desembocadura, no interior da qual ficará com dois vaqueiros, para guardar o gado, e eu seguirei com os outros vaqueiros para metermos esses bandidos entre dois fogos, pois o xerife e Ron, estão do lado de lá, para os atacar.
O rosto de Virgínia iluminou-se de alegria. Isso significava a destruição do «trust», que oprimia a gente honrada da região.
A manada reatou a marcha, detendo-se a uma prudente distância da desembocadura. Dois vaqueiros destacaram-se para a frente, em observação, não encontrando sinais de salteadores.
De novo, se puseram a andar, entrando resolutamente na Passagem do Urso, onde então pararam. Virgínia e dois vaqueiros ficaram de guarda aos animais, enquanto os restantes, sob o comando de Babe, saíram decididamente, de armas preparadas para o ataque.
Craig, o capataz, ia ao lado do seu hercúleo companheiro. De súbito, soou uma detonação, seguida de um grito de dor. Imediatamente, como se aquilo fosse um sinal, ouviu-se uma descarga cerrada. Babe deu ordem de atacar e os vaqueiros lançaram-se em busca dos seus inimigos.
Logo que Babe partiu, procuraram um lugar, onde esconder os seus cavalos. O xerife e três homens dirigiram-se para um lado, enquanto Ron e os outros iam para o lado oposto. O sinal de ataque era um tiro de Ron, logo que Babe e os vaqueiros saíssem da passagem.
Adotando infinitas precauções, Ron deu um grande rodeio. Reprimiu um sorriso de satisfação quando descobriu o lugar onde os cavalos dos pistoleiros estavam ocultos, à guarda de um deles.
A segunda parte do avanço realizou-se, de rastos, à maneira dos peles-vermelhas, tendo o maior cuidado em não fazer o menor ruído. A saída formava uma suave rampa que se estendia durante alguns quilómetros, unindo-se no fundo, como se ao terminar a estreita passagem, esta se diluísse suavemente.
Havia várias rochas espalhadas, atrás das quais se ocultavam Bert e os seus pistoleiros.
O xerife e os seus três homens já se encontravam no alto de uma ladeira há bastante tempo. Do lugar onde estavam, distinguiam perfeitamente vários bandidos, cuja atitude parecia despreocupada, esperando confiados o aparecimento dos vaqueiros do rancho Hamilton.
Savold observou sorridente a manobra dos dois vaqueiros ao irem reconhecer o terreno. A sua surpresa seria terrível quando, ao chegarem a um quilómetro de distância, do sinistro lugar, caísse sobre eles uma chuva de balas.
Ron divisava Bert Savold, apesar deste se encontrar distante. Devia de estar a pensar nesse momento qual seria a surpresa de Virgínia quando as balas caíssem sobre os seus vaqueiros.
Nesse momento, Ron viu Babe aparecer com os restantes vaqueiros. Então, apontou e disparou contra um dos bandoleiros que, soltando um grito, caiu, dando duas voltas sobre si mesmo, até ficar imóvel.
Tanto os companheiros de Ron, como o xerife e os seus auxiliares começaram a disparar, sem qualquer contemplação.
Três foragidos caíram logo. Os outros voltaram-se assustados, completamente desmoralizados, ao verem-se atacados de surpresa. Babe e os seus companheiros lançaram-se denodadamente sobre eles, que ficaram entre dois fogos.
O tiroteio era infernal. E os bandidos iam caindo, pouco a pouco, dizimados pelas balas mortíferas. Os que escaparam, renderam-se logo, levantando os braços.
Ron, enraivecido, procurou Savold. Onde se teria metido ? Não tardou a vê-lo. O rancheiro deslizava para a passagem, único lugar por onde lhe seria possível fugir. Ao certificar-se da sua derrota, não vacilava em abandonar os seus homens. Contanto que se salvasse. Já tinha ouvido e reconhecido a voz de Delaney.
Um homem surgiu na sua frente para lhe embargar o passo. Savold, porém, antecipou-se a ele e disparou, matando-o. Desde então já não tentou passar despercebido e confiou a sua salvação nas suas pernas, sem suspeitar de que Ron Delaney ia atrás dele.
Quando se internou na Passagem do Urso, o seu rosto tomou uma expressão satânica. Acabava de ver Virgínia Hamilton. Ela servir-lhe-ia de escudo. Obrigá-la-ia a segui-lo, até conseguir passar para o Novo México, pelo sul, até El Paso ou para o norte, até Santa Fé.
Avançou lentamente, de «Colt» em punho. E já se dispunha a saltar sobre Virgínia, quando uma voz fria e autoritária lhe ordenou :
— Pare, Savold... E largue o revólver.
Savold, em vez de obedecer voltou-se rapidamente, disposto a disparar. Mas não teve tempo, para isso. Uma bala penetrara-lhe na testa. As suas pernas dobraram-se e caiu de borco.
Ron olhou-o friamente, enquanto Virgínia soltava um grito ao presenciar, quando menos esperava e mesmo na sua frente, a morte daquele bandido que tantas desgraças causara na região.
E admirou o valor e a serenidade que o homem amado dera mostras. Vira-o de pé, imóvel, de revólver em punho, atrás de Savold, sem querer aproveitar-se dessa vantagem. Pelo contrário: chamara-o, para tê-lo de frente e então disparar. Sem se poder conter, correu para ele.
— Obrigada, Ron !
Ele ficou desconcertado ao ouvi-la proferir o seu nome. Todo o seu sangue-frio o abandonou, ficando sem defesa ante a mulher que amava. Esse momento podia ter sido decisivo. Mas não foi, por causa de Babe, que acabava de aparecer.
— Conseguimos o que queríamos, Ron.
— Sim. Esse canalha não tornará a fazer mal.
Virgínia voltou-se lentamente, desolada.

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