Um cavalo chegou a todo o galope, à rua principal de Misoula. O homem que o montava saltou para o chão e encaminhou-se na direção do "Strafford Saloon". Vestia de uma forma estranha, demasiadamente janota e vistosa. Uma sobrecasaca clara, às riscas, calças escuras, chapéu largo e meias botas, lustrosas, castanhas. Tudo novo, tudo luxuoso, a cheirar bem.
O homem era alto e de aspeto decidido. Entrou no "saloon" e encaminhou-se imediatamente para Dick Steiner, de braços espetacularmente abertos.
— Dick, meu rapaz!
— Olá, Gilbert...
— Sabia que devias estar à minha espera!
— E eu supunha que tu me esperasses. A que distância fica a tua mina?
— Menos de quatro milhas...
— Olympia fica a umas quantas centenas... era de esperar que chegasses primeiro.
Gilbert riu alegremente.
— Tens razão, rapaz! Mas cá estamos e isso é o que importa...
— Sim, acho que sim...
— Eh, Strafford! ... — bradou Gilbert. — Serve bebidas a toda a gente. Ofereço eu. Quero festejar a chegada do meu irmão Dick!
— Teu irmão… Pois é um prazer conhecê-lo amigo... — disse Strafford. — Basta ser irmão de Gilbert para que todos o estimem.
— Obrigado... — volveu Dick, parecendo pouco convencido.
— Eh, escutem todos!... — exclamou Strafford, batendo no balcão para reclamar silêncio. — Chegou a Misoula Dick Steiner, irmão de Gilbert e o nosso homem de oiro quer festejar o caso. Estão todos convidados a beber, ele paga!
Houve uma correria para o balcão. O convite, que ninguém se lembrou sequer de agradecer, parecia ter despertado uma sede geral. Dick sentia-se vagamente irritado com aquilo. Disse:
— Se não te importas, Gilbert... prefiro ir dormir umas horas. Estou cansado a valer e...
— Não vais desapontar-me assim, Dick! Não estragues a festa que eu esperava com tanto empenho!
— Bom, bebo um copo ou dois, mas não aguentarei mais. Estou a cair de sono, homem!
— Pois sim, mas agora vamos aquecer o estômago...
Dick bebeu dois copos, observando o irmão. Gilbert parecia ter-se tornado um bebedor, inveterado, a julgar pela maneira como consumia uísque.
— Dantes não bebias assim... — comentou.
— Dantes não podia gastar dinheiro, irmão! Agora sou rico e posso fazer o que me agrada...
— Compreendo...
Dick tinha vinte e seis anos, e Gilbert cerca de trinta. Os dois irmãos tinham-se despedido meia dúzia de anos antes, em Olympia.
Depois da morte dos pais, Gilbert partira a tentar a sorte. Sempre tinha sido ambicioso, ao contrário de Dick. Este deixara-se ficar a tomar conta do rancho que pertencia a ambos... até ao dia em que havia recebido uma carta de Gilbert, contando-lhe que, em companhia de um amigo chamado Lee Stevens descobrira um filão de oiro perto de Montana, a curta distância de uma povoação denominada Misoula.
A essa carta tinham-se seguido outras. Gilbert oferecera ao irmão a sua parte no rancho, mandara-lhe dinheiro... e acabara por lhe pedir que fosse para o seu lado.
Dick partira contra vontade... e agora encontrava o irmão transformado, vestido como uma peça de museu, vaidoso e julgando-se superior a toda a gente porque tinha feito fortuna,
Lamentou ter feito a viagem. Se tivesse calculado o que ia encontrar, nunca teria avido de Olympia...
Tal como o irmão, Dick tinha esplêndida figura e era atraente, embora as suas feições, curtida a pele pelo sol e pelo vento, tivessem uma expressão mais enérgica. Era alto, de ombros largos, cintura estreita e reflexos rápidos, movendo-se coma leveza e a força de um felino.
— Dick, meu rapaz... pareces preocupado... —disse Gilbert. — Que há?
— Nada... Estou cansado já te disse...
— Bebe mais um copo e conversemos, irmão. Vendeste o rancho, não?
— Não vendi...
— Mas não precisas dele...
— Também não preciso de dinheiro, Gilbert. Tenho o que tu me mandaste e mais o que ganhei nestes seis anos... Deixei lá um homem de confiança.
— Não te preocupes com isso. Encher-te-ei os bolsos de oiro...
— Nunca fui ambicioso, e vim aqui apenas par a voltar a ver-te, mas fiquei surpreendido. Não pareces o mesmo, com essas roupas e essa nova maneira de ser... Tu lá sabes, Gilbert..., mas não tens a impressão de que exageras?
— Talvez, Dick... Mas tu não sabes como e para quê vivem as pessoas...
— Mudaste por causa dos outros?
— Sim, embora te pareça estranho. Tens vivido toda a tua vida nesse rancho em Olympia, e desconheces muitas coisas. Por isso as consideras extravagantes, quando as vês.
— Mas, Gilbert... toda esta gente é normal.
— Normal, essa cambada?
— Esquece o facto de serem pobres. Isso não é vergonha...
— Também nesse aspeto te enganas, e vou demonstrar-to... — disse Gilbert, tirando o revólver do coldre e voltando-se para os outros, ao mesmo tempo que exclamava:
— O vosso amigo Gilbert está hoje disposto a gastar dinheiro, e vai fazer-lhes uma oferta. Afastem-se!
Os homens, como se já soubessem o que ia acontecer, afastaram-se. Gilbert disparou a arma, cinco vezes, para sítios diferentes, e as cinco balas cravaram-se no chão, levantando estilhas de madeira. Quando levantou o cano da arma, sinal de que não ia disparar a sexta bala, houve uma autêntica corrida, em que todos tentavam, com as pontas das facas, arrancar as balas da madeira. Ao que parecia era um jogo a que estavam habituados.
— Que pretendes demonstrar, Gilbert?... — perguntou Dick, espantado.
— Quero que vejas o que esses brutos são capazes de fazer por dinheiro... Se fossem ricos... fariam banheiras de oiro, como já se tem visito.
— E admiras os que fazem isso? Eu não. São ambiciosos, apenas.
— Chamas ambição a espalhar oiro assim?
— Seja insensatez ou ignorância, se preferires. Mas por que motivo lutam esses que aí estão?
— Por isto... — respondeu Gilbert, tirando a última bala do cilindro da arma e pondo-a sobre o balcão. — Fica com ela, como recordação...
— Balas de oiro!
— É um dos meus luxos. Nunca precisei de matar ninguém com elas..., mas se o fizer... o morto ficará agradecido.
— Mas isso é loucura, Gilbert! É uma temeridade. Parece que provocas uma revolta... ou um gesto de violência. E uma ostentação absurda...
— Rapaz — disse Gilbert, encolhendo os ombros —, fazes demasiadas críticas. Se não te sentes bem a meu lado, podes partir quando quiseres.
Dick poisou a bala sobre o balcão, novamente.
— Perguntaste e eu respondi-te. Lamento que te ofendesses. Não mudei. Gilbert. E amanhã ponho-me a caminho de Olympia.
— Como quiseres...
Sem comentários:
Enviar um comentário