Diana e sua filha Dora desceram da diligência, sacudindo das suas roupas o pó nelas acumulado durante a viagem. A jovem tomou conta das duas malas que o condutor desceu do veículo.
— Estou moída, minha filha. Estas viagens são de arrasar. E não quero nem pensar no que ainda nos espera até Prescou. A diligência vai parecer-nos um fofo colchão de penas comparado com outros meios de transporte que temos de utilizar.
— Se vão passar a noite em Silver City, recomendo--lhes o «Hotel Peary». É o melhor e o pior da povoação. Com isto quero dizer-lhes que não existe outro num raio de várias milhas.
As duas mulheres olharam para o velhote que lhes falava, cujas bochechas inchavam alternadamente ao dar voltas na boca ao enorme pedaço de tabaco de mascar.
— De facto, pensamos passar a noite em Silver City — respondeu Diana. — Seria tão amável que nos indicasse onde fica o «Hotel Peary»? Fica no outro extremo da rua principal. Por meio dólar levo-as no meu carro mesmo até à porta. Claro que também levo a bagagem.
O velho carregou as malas numa desconjuntada caleche, convidando-as em seguida a subir para a boleia.
Fustigou a cavalgadura, que empreendeu a marcha com passo vagaroso. Apesar da lentidão da marcha, o carro ameaçava desfazer-se de cada vez que as suas rodas passavam por cima de algum dos inumeráveis calhaus semeados no solo.
— Você acha que conseguiremos chegar até ao hotel neste carro? —inquiriu Diana, com evidente sarcasmo.
— A isso responder-lhe-ei depois, senhora. Foram muitas as vezes que fiz este percurso e nunca aconteceu nada. Claro que alguma vez tem de acontecer.
— Você é muito otimista.
—É a única coisa sã que ainda me resta no mundo. O carro está feito num feixe, o cavalo já era velho quando nasceu o meu avô e eu fui vencido pelo maldito reumatismo. Mas continuo a conservar o mesmo otimismo de quando tinha vinte anos.
Fez uma pausa. Perguntou em seguida:
—Pensam permanecer muito tempo em Silver City?
— Depende das circunstâncias. Não há serviço regular de diligências entre esta povoação e Prescou. É para aí que nos dirigimos. Partiremos logo que encontrarmos um meio de transporte. Se você nos pudesse indicar algo a esse respeito...
— Creio que posso. Metade do trajeto até Prescou podem fazê-lo em carromato. Para o resto convir-lhes-á dois bons cavalos. Pouparão assim uns quantos dias de viagem. Não lhes será difícil voltar a vender o carro no lugar onde decidirem prescindir dele.
— Onde poderemos comprar essa carroça? Também precisaremos de um guia de confiança.
— Levá-las-ei a casa de Midway. É o melhor construtor de carros de toda a região. Ele proporcionar-lhes-á o necessário. Carromato, cavalos, provisões e um bom
guia.
— Quando poderemos falar com ele?
— Agora mesmo. Fica-nos no caminho para o hotel.
O velhote deteve a lenta marcha do animal defronte de uma modesta construção de madeira, cuja frente era quase toda ocupada por um enorme portão, de cujo interior brotava o característico ruído rítmico do malho a moldar o ferro sobre uma bigorna.
O homenzinho ajudou-as a descer, fazendo-lhes sinal de que o seguissem.
Midway era um homenzarrão com corpo de gigante e cara de bebé. Recebeu-as com um sorriso, introduzindo a longa barra de ferro, que havia estado a moldar com o malho, entre os carvões incandescentes da forja.
Em poucas palavras, o velho pô-lo ao corrente dos desejos das duas mulheres.
Midway, lentamente, abanou a cabeça de forma negativa.
— Sinto-o deveras-- disse. — Há exatamente duas horas que vendi o último carro.
— Nesse caso, chegámos tarde — suspirou Diana.
— Procuraremos por outro lado.
— Cansar-se-ão em vão — interveio o velho. — Não encontrarão carros disponíveis em toda a. região. As pessoas escolhem a Primavera para emigrar. É nessa época do ano que se encontram carros por todo o lado. Mas agora que o Inverno está próximo... — Moveu a
cabeça em sinal de dúvida.
— Rally tem razão — disse o ferreiro.
Diana meditou durante curtos instantes nas palavras dos dois homens.
— Quanto tempo demoraria a construir outro carromato?
— Uma semana. Talvez mais.
— É demasiado tempo. Teremos de experimentar fazer a viagem a cavalo.
— Não vo-lo recomendo. Nesta época do ano, são frequentes as chuvas na região montanhosa que têm de atravessar.
— Que havemos de fazer então?
Midway desviou o olhar para o fundo do telheiro onde se achava o carromato novo que havia vendido duas horas antes da chegada das duas mulheres.
— É possível que haja uma solução — disse por fim. — O jovem que comprou o carro pensa dirigir-se para essa parte do Arizona. Não disse o ponto exato, mas é possível que possam fazer juntos grande parte do trajeto. Poderia servir-lhes de guia ao mesmo tempo. Parece boa pessoa.
— Onde poderíamos encontrar esse homem? — inquiriu Diana, de acordo com a ideia do ferreiro.
—Tu conhece-lo, Rally? É o forasteiro que chegou ontem à tarde à povoação.
— Creio que o conheço. Ontem à noite pagou-me dois copos no «saloon» de Wolf. Todas as raparigas do «saloon» andam numa roda viva por causa dele.
— Bem; leve-nos ao hotel — disse Diana. — Depois, procure esse homem e diga-lhe que precisamos de falar com ele. Estaremos à espera dele nos nossos aposentos.
Assim fizeram. Mas as coisas não correram como elas desejavam.
O velho Rally, cabisbaixo, voltou a apresentar-se-lhes no hotel.
— Que se passou, Rally? Não o encontrou?
— Sim. Estava no «saloon» acompanhado de Myra. Myra é uma rapariga loira que todos os sábados põe em polvorosa os corações dos vaqueiros da região. Dei-lhe o seu recado, e o rapaz respondeu-me que se sentia muito bem ali. Que como são vocês, no fim de contas, as interessadas no assunto, que fossem ao «saloon» tratar com ele as condições.
Algo se sublevou no interior de Nora ao ouvir as palavras do improvisado mensageiro.
— Diga a esse grosseirão...
Diana interrompeu-a com um imperioso gesto da mão direita.
— Iremos falar com ele — disse. — Quer acompanhar-nos, senhor Rally?
O «saloon» estava quase deserto àquelas horas. Rally conduziu-as através do labirinto de mesas até um canto, onde as convidou a sentar-se.
— Não tardarei a voltar com ele.
Nora fixou os seus olhos num ponto indeterminado da mesa que ocupavam, enrubescendo ao dar-se conta de que os olhares dos frequentadores convergiam sobre elas. Sentiu-se, de súbito, alarmada ao sentir sobre o seu braço a mão de sua mãe, que lho oprimiu até quase cravar as unhas na sua carne.
— O Destino continua a rir-se de mim — sussurrou.
Nora levantou a vista, pousando-a no homem que chegava acompanhado de Rally. E teve a sensação de que o seu coração deixava de palpitar por instantes ao reconhecer no jovem robusto, de face sorridente, o seu antigo noivo, Hal Cargan.
— Aqui o tem, senhora — falou Rally, sem se aperceber da perturbação das duas mulheres.
Diana tirou algumas moedas da bolsinha e entregou-as ao velhote. Este contou-as, lançando um alarido de júbilo.
—Hurra! Dois dólares e cinquenta cêntimos! Já tenho o suficiente para me embebedar cinco vezes.
— Por favor, senhor Rally — disse Diana, ainda não refeita da sua surpresa. — Devia gastar o seu dinheiro em algo mais proveitoso do que embriagar-se.
— Se o gastar numa refeição pantagruélica até posso ter uma congestão ao pensar que não me ficou um triste cêntimo no bolso. Em contrapartida, o uísque faz-me esquecer que sou mais pobre do que as ratas. Se permanecessem mais tempo nesta povoação ouviriam dizer que me caíram os dentes de tanto mastigar uísque.
O sorriso não abandonou os lábios de Hal quando se sentou numa cadeira, com o espaldar para a frente, diante das duas mulheres. A presença de Nora havia despertado uma luta surda no seu interior, mas não deixou que nenhum dos seus gestos o deixasse transparecer.
— O mundo é pequeno — disse à guisa de saudação.
Diana forçou um sorriso, que no fundo não passou de uma careta.
— Aquilo já passou... — disse a meia voz.
—Naturalmente. Bem; o velho Rally pôs-me ao corrente da vossa viagem a Prescou e dos vossos propósitos de alugar o meu carromato. Que há de concreto acerca disso?
— Não lhe vou ocultar nada — começou a dizer Diana.
—Há dois meses que nos vimos obrigados a vender as últimas coisas de valor que ainda nos restavam para fazermos face às despesas de primeira necessidade.
— A fazenda dos Norton era uma das melhores do Novo México.
— Sim. Mas uma enfermidade contagiosa no gado e dois anos de más colheitas bastaram para afundá-la até aos alicerces.
— Sinto muito.
— E eu prefiro acreditá-lo, Hal. Mas isso não resolve nada.
—A que pensa dedicar-se em Prescou? Diana engoliu saliva, como se lhe custasse um enorme esforço continuar a falar.
— Conhece Geat Butte?
— Nunca o vi na minha vida, embora tenha ouvido falar dele. É dono do rancho mais importante do Arizona, o «Cruz-D-30».
— Exato. Nora e ele ficaram noivos em Santa Fé. Casar-se-ão logo que cheguemos a Prescou.
Hal acusou o golpe com admirável sangue-frio.
— Felicito-te, Nora.
A rapariga quis articular umas palavras de agradecimento, mas a voz não lhe saiu da garganta.
— Podem contar com o carromato — prosseguiu Hal. — Se assim o desejarem, podemos fazer a viagem juntos até Prescou.
— Não queremos dar-lhe demasiados incómodos, Hal — interveio Diana. — Só iremos consigo até à próxima povoação em que possamos arranjar um carro para nós. Você viajará muito mais depressa sem a nossa companhia.
Hal ampliou o seu permanente sorriso. Era evidente que não agradava a Diana a perspetiva de uma longa viagem em sua companhia. Um contacto prolongado podia reverdecer o antigo sentimento que havia unido os dois jovens e isso não entrava nos cálculos da arruinada mãe de Nora. Era muito mais seguro o «Cruz-D-30» de Butte que os projetos do jovem, cuja realização poderia ver-se adiada indefinidamente.
— E John? — perguntou a mulher.
O semblante de Hal tornou-se um tanto sombrio ao responder.
— As coisas correram-nos bastante mal ultimamente. Faltou-nos um ideal para levarmos por diante a gigantesca tarefa que lançámos sobre os nossos ombros. O meu pai morreu... há seis meses.
Diana, por instantes, deixou pender a cabeça. Não sabia porquê, mas a morte do seu antigo noivo afetou-a profundamente. Talvez porque com ele havia sido a parte mais feliz e, ao mesmo tempo, mais amarga da sua existência. Nora envolveu num olhar venenoso a provocante loira que acabava de chegar junto deles.
— Ainda te demoras muito, Hal? — perguntou Myra, apoiando a mão no ombro do jovem.
Hal enlaçou-a pela cintura e atraiu-a para si.
— Estou moída, minha filha. Estas viagens são de arrasar. E não quero nem pensar no que ainda nos espera até Prescou. A diligência vai parecer-nos um fofo colchão de penas comparado com outros meios de transporte que temos de utilizar.
— Se vão passar a noite em Silver City, recomendo--lhes o «Hotel Peary». É o melhor e o pior da povoação. Com isto quero dizer-lhes que não existe outro num raio de várias milhas.
As duas mulheres olharam para o velhote que lhes falava, cujas bochechas inchavam alternadamente ao dar voltas na boca ao enorme pedaço de tabaco de mascar.
— De facto, pensamos passar a noite em Silver City — respondeu Diana. — Seria tão amável que nos indicasse onde fica o «Hotel Peary»? Fica no outro extremo da rua principal. Por meio dólar levo-as no meu carro mesmo até à porta. Claro que também levo a bagagem.
O velho carregou as malas numa desconjuntada caleche, convidando-as em seguida a subir para a boleia.
Fustigou a cavalgadura, que empreendeu a marcha com passo vagaroso. Apesar da lentidão da marcha, o carro ameaçava desfazer-se de cada vez que as suas rodas passavam por cima de algum dos inumeráveis calhaus semeados no solo.
— Você acha que conseguiremos chegar até ao hotel neste carro? —inquiriu Diana, com evidente sarcasmo.
— A isso responder-lhe-ei depois, senhora. Foram muitas as vezes que fiz este percurso e nunca aconteceu nada. Claro que alguma vez tem de acontecer.
— Você é muito otimista.
—É a única coisa sã que ainda me resta no mundo. O carro está feito num feixe, o cavalo já era velho quando nasceu o meu avô e eu fui vencido pelo maldito reumatismo. Mas continuo a conservar o mesmo otimismo de quando tinha vinte anos.
Fez uma pausa. Perguntou em seguida:
—Pensam permanecer muito tempo em Silver City?
— Depende das circunstâncias. Não há serviço regular de diligências entre esta povoação e Prescou. É para aí que nos dirigimos. Partiremos logo que encontrarmos um meio de transporte. Se você nos pudesse indicar algo a esse respeito...
— Creio que posso. Metade do trajeto até Prescou podem fazê-lo em carromato. Para o resto convir-lhes-á dois bons cavalos. Pouparão assim uns quantos dias de viagem. Não lhes será difícil voltar a vender o carro no lugar onde decidirem prescindir dele.
— Onde poderemos comprar essa carroça? Também precisaremos de um guia de confiança.
— Levá-las-ei a casa de Midway. É o melhor construtor de carros de toda a região. Ele proporcionar-lhes-á o necessário. Carromato, cavalos, provisões e um bom
guia.
— Quando poderemos falar com ele?
— Agora mesmo. Fica-nos no caminho para o hotel.
O velhote deteve a lenta marcha do animal defronte de uma modesta construção de madeira, cuja frente era quase toda ocupada por um enorme portão, de cujo interior brotava o característico ruído rítmico do malho a moldar o ferro sobre uma bigorna.
O homenzinho ajudou-as a descer, fazendo-lhes sinal de que o seguissem.
Midway era um homenzarrão com corpo de gigante e cara de bebé. Recebeu-as com um sorriso, introduzindo a longa barra de ferro, que havia estado a moldar com o malho, entre os carvões incandescentes da forja.
Em poucas palavras, o velho pô-lo ao corrente dos desejos das duas mulheres.
Midway, lentamente, abanou a cabeça de forma negativa.
— Sinto-o deveras-- disse. — Há exatamente duas horas que vendi o último carro.
— Nesse caso, chegámos tarde — suspirou Diana.
— Procuraremos por outro lado.
— Cansar-se-ão em vão — interveio o velho. — Não encontrarão carros disponíveis em toda a. região. As pessoas escolhem a Primavera para emigrar. É nessa época do ano que se encontram carros por todo o lado. Mas agora que o Inverno está próximo... — Moveu a
cabeça em sinal de dúvida.
— Rally tem razão — disse o ferreiro.
Diana meditou durante curtos instantes nas palavras dos dois homens.
— Quanto tempo demoraria a construir outro carromato?
— Uma semana. Talvez mais.
— É demasiado tempo. Teremos de experimentar fazer a viagem a cavalo.
— Não vo-lo recomendo. Nesta época do ano, são frequentes as chuvas na região montanhosa que têm de atravessar.
— Que havemos de fazer então?
Midway desviou o olhar para o fundo do telheiro onde se achava o carromato novo que havia vendido duas horas antes da chegada das duas mulheres.
— É possível que haja uma solução — disse por fim. — O jovem que comprou o carro pensa dirigir-se para essa parte do Arizona. Não disse o ponto exato, mas é possível que possam fazer juntos grande parte do trajeto. Poderia servir-lhes de guia ao mesmo tempo. Parece boa pessoa.
— Onde poderíamos encontrar esse homem? — inquiriu Diana, de acordo com a ideia do ferreiro.
—Tu conhece-lo, Rally? É o forasteiro que chegou ontem à tarde à povoação.
— Creio que o conheço. Ontem à noite pagou-me dois copos no «saloon» de Wolf. Todas as raparigas do «saloon» andam numa roda viva por causa dele.
— Bem; leve-nos ao hotel — disse Diana. — Depois, procure esse homem e diga-lhe que precisamos de falar com ele. Estaremos à espera dele nos nossos aposentos.
Assim fizeram. Mas as coisas não correram como elas desejavam.
O velho Rally, cabisbaixo, voltou a apresentar-se-lhes no hotel.
— Que se passou, Rally? Não o encontrou?
— Sim. Estava no «saloon» acompanhado de Myra. Myra é uma rapariga loira que todos os sábados põe em polvorosa os corações dos vaqueiros da região. Dei-lhe o seu recado, e o rapaz respondeu-me que se sentia muito bem ali. Que como são vocês, no fim de contas, as interessadas no assunto, que fossem ao «saloon» tratar com ele as condições.
Algo se sublevou no interior de Nora ao ouvir as palavras do improvisado mensageiro.
— Diga a esse grosseirão...
Diana interrompeu-a com um imperioso gesto da mão direita.
— Iremos falar com ele — disse. — Quer acompanhar-nos, senhor Rally?
O «saloon» estava quase deserto àquelas horas. Rally conduziu-as através do labirinto de mesas até um canto, onde as convidou a sentar-se.
— Não tardarei a voltar com ele.
Nora fixou os seus olhos num ponto indeterminado da mesa que ocupavam, enrubescendo ao dar-se conta de que os olhares dos frequentadores convergiam sobre elas. Sentiu-se, de súbito, alarmada ao sentir sobre o seu braço a mão de sua mãe, que lho oprimiu até quase cravar as unhas na sua carne.
— O Destino continua a rir-se de mim — sussurrou.
Nora levantou a vista, pousando-a no homem que chegava acompanhado de Rally. E teve a sensação de que o seu coração deixava de palpitar por instantes ao reconhecer no jovem robusto, de face sorridente, o seu antigo noivo, Hal Cargan.
— Aqui o tem, senhora — falou Rally, sem se aperceber da perturbação das duas mulheres.
Diana tirou algumas moedas da bolsinha e entregou-as ao velhote. Este contou-as, lançando um alarido de júbilo.
—Hurra! Dois dólares e cinquenta cêntimos! Já tenho o suficiente para me embebedar cinco vezes.
— Por favor, senhor Rally — disse Diana, ainda não refeita da sua surpresa. — Devia gastar o seu dinheiro em algo mais proveitoso do que embriagar-se.
— Se o gastar numa refeição pantagruélica até posso ter uma congestão ao pensar que não me ficou um triste cêntimo no bolso. Em contrapartida, o uísque faz-me esquecer que sou mais pobre do que as ratas. Se permanecessem mais tempo nesta povoação ouviriam dizer que me caíram os dentes de tanto mastigar uísque.
O sorriso não abandonou os lábios de Hal quando se sentou numa cadeira, com o espaldar para a frente, diante das duas mulheres. A presença de Nora havia despertado uma luta surda no seu interior, mas não deixou que nenhum dos seus gestos o deixasse transparecer.
— O mundo é pequeno — disse à guisa de saudação.
Diana forçou um sorriso, que no fundo não passou de uma careta.
— Aquilo já passou... — disse a meia voz.
—Naturalmente. Bem; o velho Rally pôs-me ao corrente da vossa viagem a Prescou e dos vossos propósitos de alugar o meu carromato. Que há de concreto acerca disso?
— Não lhe vou ocultar nada — começou a dizer Diana.
—Há dois meses que nos vimos obrigados a vender as últimas coisas de valor que ainda nos restavam para fazermos face às despesas de primeira necessidade.
— A fazenda dos Norton era uma das melhores do Novo México.
— Sim. Mas uma enfermidade contagiosa no gado e dois anos de más colheitas bastaram para afundá-la até aos alicerces.
— Sinto muito.
— E eu prefiro acreditá-lo, Hal. Mas isso não resolve nada.
—A que pensa dedicar-se em Prescou? Diana engoliu saliva, como se lhe custasse um enorme esforço continuar a falar.
— Conhece Geat Butte?
— Nunca o vi na minha vida, embora tenha ouvido falar dele. É dono do rancho mais importante do Arizona, o «Cruz-D-30».
— Exato. Nora e ele ficaram noivos em Santa Fé. Casar-se-ão logo que cheguemos a Prescou.
Hal acusou o golpe com admirável sangue-frio.
— Felicito-te, Nora.
A rapariga quis articular umas palavras de agradecimento, mas a voz não lhe saiu da garganta.
— Podem contar com o carromato — prosseguiu Hal. — Se assim o desejarem, podemos fazer a viagem juntos até Prescou.
— Não queremos dar-lhe demasiados incómodos, Hal — interveio Diana. — Só iremos consigo até à próxima povoação em que possamos arranjar um carro para nós. Você viajará muito mais depressa sem a nossa companhia.
Hal ampliou o seu permanente sorriso. Era evidente que não agradava a Diana a perspetiva de uma longa viagem em sua companhia. Um contacto prolongado podia reverdecer o antigo sentimento que havia unido os dois jovens e isso não entrava nos cálculos da arruinada mãe de Nora. Era muito mais seguro o «Cruz-D-30» de Butte que os projetos do jovem, cuja realização poderia ver-se adiada indefinidamente.
— E John? — perguntou a mulher.
O semblante de Hal tornou-se um tanto sombrio ao responder.
— As coisas correram-nos bastante mal ultimamente. Faltou-nos um ideal para levarmos por diante a gigantesca tarefa que lançámos sobre os nossos ombros. O meu pai morreu... há seis meses.
Diana, por instantes, deixou pender a cabeça. Não sabia porquê, mas a morte do seu antigo noivo afetou-a profundamente. Talvez porque com ele havia sido a parte mais feliz e, ao mesmo tempo, mais amarga da sua existência. Nora envolveu num olhar venenoso a provocante loira que acabava de chegar junto deles.
— Ainda te demoras muito, Hal? — perguntou Myra, apoiando a mão no ombro do jovem.
Hal enlaçou-a pela cintura e atraiu-a para si.
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