sábado, 3 de março de 2018

BIS156.07 Sepultura para os mexicanos

Ira Holker regressou ao seu «rancho» acompanhado dos homens que haviam tomado parte no frio assassínio dos quatro homens da família Lanuza.
— Caçámo-los como coelhos na armadilha — comentou Jess Craige ao desmontar.
— Mas o juiz apanhou uma formosa pomba — acrescentou Len Riester.
— Não julgues que o gordalhudo vai passar muito bem. A sua «pomba» tem garras e bico — disse Holker, entregando as rédeas a um dos seus vaqueiros.
O «rancheiro» sentia-se satisfeito com a sua «façanha». Tinha eliminado quatro inimigos perigosos e o juiz encarregar-se-ia de que as terras dos Lanuza passassem para o seu poder. Seria fácil falsificar uns documentos nos quais António Lanuza reconheceria dever elevada quantia a Hol-ker... e ninguém iria verificar a sua autenticidade.
Ao entrar na sala de jantar do seu «rancho», deteve--se bruscamente, como se diante dele se tivesse aberto um profundo abismo. Esperava encontrar o seu capataz sentado à mesa, bebendo uísque... ...E encontrava-o com a cabeça destroçada a tiro e pendurado numa corda, com os pés muito perto da superfície da mesa.
— Maldito «Pecos»! — exclamou, enquanto uma palidez de morte lhe cobria as feições.
Jess Craige cambaleou ao contemplar o cadáver de Felter, e Len Riester chiou como uma rata apanhada numa ratoeira. Os quatro pistoleiros não fizeram qualquer comentário, mas os dois jogadores profissionais começaram a recear terem-se metido num assunto demasiado perigoso.
— Foi «Pecos» Dieter — disse Holker, começando a recuperar a calma.
Fez um sinal a Mansell para que fizesse descer o corpo de Felter. Quando o pistoleiro ia para cortar a corda, descobriu o que Dieter tinha gravado na madeira.
— Há algo escrito na viga, patrão disse Mansell.
— O que é que está, aí escrito? — perguntou Holker.
— Alguns nomes... o seu, o de Craige, o do juiz e também o de Riester — informou Mansell.
— Isto foi coisa do «Pecos». É mais do que certo que Ronnie Denker se separou de nós para lhe prestar ajuda — comentou Holker.
— «Pecos» salvou-lhe a vida — esclareceu Josh Carver, lembrando-se do certeiro balázio que acabara com a serpente cascavel.
— Que... significam os nossos... nomes na viga? – - balbuciou Riester.
— Suponho que «Pecos» nos quis indicar que também nós acabaremos da mesma forma que Felter — respondeu Holker, que estava furioso. Não estava habituado a fracassar e a fuga de «Pecos» podia constituir um sério perigo para os seus planos.
Lançou um olhar a Craige, pois receava que o banqueiro tivesse comprado «Pecos» para o empregar nos seus propósitos ocultos. Mas o pânico que se instalara no rosto do banqueiro convenceu-o do contrário.
«Para quem trabalhará «Pecos»?» — perguntou-se, mentalmente.
Converteu-se bruscamente numa fera sedenta de sangue e começou a dar ordens para que os quatro pistoleiros e os jogadores profissionais procurassem «Pecos» Dieter e Ronnie Denker.
— Quero vê-los crivados de balas o mais cedo possível — foram as suas últimas palavras.
— É melhor que comecem a procurá-los amanhã, Ira. Agora, temos de regressar à povoação e tanto eu como Riester precisamos de proteção — disse o banqueiro, passando nervosamente um dedo pelo colarinho da camisa.
Holker ia mandá-lo para o diabo, mas pensou que ainda precisava dos seus cúmplices para completar os seus planos. Por outro lado, tinha a certeza de que os homens que procurava não se encontravam naquele momento na povoação.
— De acordo, Jess. A caça começará amanhã e eu tomarei parte nela. Mansell e os seus amigos podem acompanhar-vos e é necessário que tenhais os olhos muito abertos para descobrirem «Pecos» e Ronnie — disse, depois de uns instantes de silêncio.
— Tê-los-emos — afirmou o banqueiro, deixando escapar um suspiro de alivio.
Não podia esquecer que tinha sido ele quem havia posto a corda à volta do pescoço de Eusébio Lanuza.
Pensou que um assassínio fosse uma coisa muito divertida... mas não tinha pensado em «Pecos» Dieter. Quem podia pensar num homem que estava condenado a morrer e que tinha ficado em poder de Felter, um tipo que tinha uma terrível facilidade para matar?
— Amanhã irei à povoação para falar com o juiz. Temos de ultimar alguns pormenores. Antes de dois meses, todas as terras e nascentes situadas nos arredores de Desolação têm de estar em nosso poder — disse Holker.
Mansell, sem prévio aviso, cortou a corda que rodeava o pescoço retorcido de Felter e o cadáver caiu sobre a mesa, produzindo um desagradável ruído; resvalou depois para o solo e ficou muito próximo dos pés do armazenista.
Len Riester deu meia volta e saiu da sala de jantar como se o perseguissem todos os diabos do inferno.
Jess Craige também abandonou o edifício com grandes pressas.
Holker sorriu ironicamente e ordenou aos dois jogadores que tirassem de ali o corpo do capataz. Quando se encontrou só, encheu um copo de uísque e começou a bebê-lo em pequenos sorvos.
— Para quem trabalhará o maldito «Pecos» Dieter? — murmurou.
Lutava com unhas e dentes para se transformar no único dono de Desolação. Mas sabia que a paciência de todos os homens tinha um limite e que tinha de se apressar a eliminar os seus inimigos, antes que estes reagissem violentamente.
Quando os quatro pistoleiros regressaram, Holker ainda não se tinha deitado, esperando saber algumas notícias vindas da povoação.
— Viste algum dos dois traidores? — perguntou a Mansell.
— Não.
— Bem, amanhã acabaremos com eles — disse Holker, muito convencido.
Os dois jogadores tinham regressado ao «Fortuna» e o «rancheiro» tinha-lhes ordenado que recrutassem mais homens entre os empregados do defunto Warren Bremer.
— Quando acabar com os mexicanos, poderei procurar tranquilamente o jazigo de prata de Ritter. Durante quinze anos não consegui encontrá-lo, mas hei-de dar com ele — murmurou, antes de adormecer.
No dia seguinte, o assassino abandonou o «rancho» seguido dos quatro pistoleiros e dirigiu-se para a povoação para falar com o juiz Waltis. Apesar de o ter procurado durante todo o dia, enquanto os pistoleiros farejavam por todos os cantos em busca de Dieter e Ronnie, ele não conseguiu encontrar Waltis.
Dieter tinha tido a precaução de cobrir o sangue, que havia caído sobre o solo do gabinete, com uma velha alcatifa e ao sair tinha fechado a janela. Ele saíra pela porta.
«Tão-pouco encontro a rapariga. Certamente, o velho canalha ocultou-se para que ninguém o incomode durante as suas horas amorosas», pensou o «rancheiro».
Quando anoiteceu, reuniu os pistoleiros e disse-lhes:
—É mais do que certo que os homens que procuramos hão-de visitar algum bar durante a noite. Vamos ficar todos de vigia e quando os descobrirmos...
Holker deixou o resto da frase no ar, mas os quatro assassinos contratados compreenderam perfeitamente o que se esperava deles. Matar Dieter e Ronnie. Nenhum pareceu sentir muitos escrúpulos ante a ideia de assassinar os homens que haviam sido seus companheiros de viagem.
Na realidade, eles matavam por dinheiro e apenas odiavam as autoridades e os tipos que pagavam mal... mas Holker tinha-lhes prometido uma boa recompensa por cada morto. Portanto, em Desolação, não odiavam ninguém. Não havia autoridades e recebiam um bom ordenado. Matariam quem quer que fosse, mas sem ódio. Aquela espécie de assassinos era a pior.
Dieter e Ronnie não tinham nenhuma intenção de irem à povoação; pensavam realizar outro trabalho muito diferente do de visitar estabelecimentos de bebidas e casas de jogo. Dieter tinha a certeza de que Holker e os seus perdigueiros estariam a rondar a povoação com a esperança de os apanharem. E isso deixaria o «rancho» entregue apenas aos cuidados dos vaqueiros.
Quando anoiteceu, colocaram o cadáver de Waltis sobre o cavalo de Ronnie, e Dieter disse ã rapariga:
— Regressaremos cedo, Mercedes.
— Estarei intranquila até ao vosso regresso — disse a rapariga.
Tinham começado a tratar-se por tu, entre os três, pois achavam ridículo que dois homens e uma mulher, com as vidas pendentes de uns frágeis fios, se falassem como desconhecidos.
Nenhum deles poderia dizer quem tinha começado com o tratamento.
— Voltaremos depois de deixarmos o corpo do juiz na sala de jantar de Ira Holker — disse Dieter.
A cabana encontrava-se situada no fundo de um estreito vale e António Lanuza tinha-a preparado para uma longa estadia, talvez pensando que algum dia teria de se esconder nela, fugindo de Ira Holker.
No interior da cabana, havia alimentos, roupas, munições e mesmo alguns medicamentos. Mercedes pudera, assim, trocar as suas destroçadas roupas por umas que haviam pertencido ao seu irmão mais novo. Os seus grandes olhos negros, herança de sua mãe, nascida em Chihuahua, seguiram as silhuetas dos dois homens até que ambos se perderam na escuridão. Mas um observador atento — se o houvesse no vale —teria descoberto que o olhar da bela e ardente rapariga se detinha mais tempo na figura de Dieter que na de Ronnie.
Os dois homens dirigiram-se para o «rancho» de Hol-ker e, quando se encontraram perto dos edifícios, Dieter adiantou-se para examinar o terreno. Não se havia enganado ao imaginar que Holker e os pistoleiros se achavam fora.
O edifício principal estava mergulhado na escuridão e os vaqueiros permaneciam nos seus dormitórios. Foi fácil entrarem na sala de jantar e pendurarem o cadáver do juiz Waltis na parte da viga onde estava gravado o seu nome.
— Isto fará Holker pensar — disse Dieter, quando saíram do edifício.
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Empreenderam o regresso à cabana e uma vez nela, Dieter disse:
— Ainda há uma coisa que temos de fazer. Os cadáveres dos Lanuza ficaram no solo e devem ser enterrados.
—É natural que Holker tenha montado vigilância volta do «rancho» de Mercedes — disse Ronnie.
— Não, agora só pensa em acabar connosco e procurar-nos-á pela povoação. No entanto, vamos correr o risco. Escutai o meu plano — pediu Dieter.
Durante um quarto de hora falou sem descanso. Quando terminou, um sorriso havia aparecido nos lábios de Ronnie. Mercedes moveu afirmativamente a cabeça e disse:
— Irei convosco. Há muitas coisas que quero trazer.
— Haverá perigo, Mercedes — recordou-lhe Dieter.
— Já sabes que as mulheres da família Lanuza sabem manejar armas — respondeu a rapariga.
— Nesse caso, é melhor que partamos para a povoação — disse Dieter.
A rapariga montou na garupa de «Charro» e, pela segunda vez em poucas horas, os cavalos afastaram-se do vale.
*
Art Loube era um homem que coxeava da perna direita. Anos antes, tinham-lhe metido uma bala nela, porque o descobriram a fazer trapaça. Depois da morte de Warren Bremer, tinha-se encarregado do «Bar Fortuna», seguindo as ordens de Ira Holker. Loube era um tipo tão cobarde que até a própria sombra o assustava.
Naquela noite, quando o local ficou vazio, ordenou aos empregados que fechassem as portas e as janelas.
Em seguida, dirigiu-se para o piso superior. Havia ali um grande número de quartos e Art ocupava um deles. Os outros eram destinados a alguns dos jogadores profissionais da casa. Art sentia-se seguro entre os seus empregados. Se tivesse de dormir num edifício em que se encontrasse sozinho, certamente passaria a noite sentado numa cadeira, esperando que alguma das suas vítimas regressasse do outro mundo para se vingar. Art Loube tinha sido um cobarde durante toda a sua vida... mas também tinha sido um assassino. Tinha roubado e matado até que um balázio o deixou coxo.
Quando entrou no quarto, apressou-se a fechar a porta à chave e, em seguida, deixou o revólver ao alcance da mão. Lançou uma maldição, ao ver que o candeeiro a petróleo despedia pouca luz, e murmurou:
— Amanhã despedirei Guadalupe. Guadalupe era uma criada mexicana que se encarregava da limpeza daquele piso. Art ia para dar mais potência à chama quando uma voz seca lhe ordenou:
— Quieto, Loube, para morrer não é preciso muita luz.
As pernas de Loube negaram-se a sustentá-lo e ele tombou no solo, enquanto começava a babar-se de terror. Tentou guinchar quando se viu rodeado por três silhuetas.
— É melhor matá-lo agora mesmo — disse outra voz.
— Morrerá sozinho — acrescentou uma suave voz de mulher.
Loube abriu a boca para lançar um grito, mas a mão de Ronnie Denker apertou-lhe brutalmente a garganta e o sangue concentrou-se no rosto do aterrado homem, que julgou morrer.
— Se lanças um único grito, podes ter a certeza de que será o último — avisou Ronnie, quando as feições de Loube adquiriram uma cor roxa.
Retirou a mão e Loube esfregou a dolorida garganta. Quando pôde falar, disse em voz muito baixa:
— Que... procuram?
— Todos os quartos têm duas chaves. Uma delas tem--na aquele que o ocupa... mas a outra tem-la tu. Procuramos essa chave — informou-o Dieter.
Loube deixou escapar um suspiro de alivio e, levantando a mão, indicou a primeira gaveta de uma velha cómoda situada no outro extremo do quarto. Dieter abriu-a e encontrou um molho de chaves, cada uma delas marcada com o número do quarto a que dizia respeito.
Fez um sinal afirmativo com a cabeça e Ronnie colocou-se atrás de Loube. Bastou uma única coronhada, aplicada por detrás da orelha, para que o homem tombasse sem conhecimento.
— Dormirá tranquilamente e sem pesadelos durante algumas horas — comentou Ronnie.
— Vamos — ordenou Dieter, saindo do quarto de Loube.
Mercedes, empunhando uma espingarda de cano curto que trouxera da cabana, ficou no centro do corredor, vigiando a parte superior das escadas que conduziam àquele piso. As suas mãos não tremiam e ela sabia que lhe bastaria apertar os gatilhos para varrer completamente os inimigos que tentassem alcançar o primeiro piso.
Dieter e Ronnie dedicaram-se a abrir a porta de um dos quartos e a tirar para fora o jogador que dormia nele. O homem, com os olhos vermelhos de sono, encontrou-se diante dos canos ameaçadores de dois revólveres e uma voz seca ordenou-lhe:
— Veste-te. Obedeceu sem replicar, pois os negros orifícios apontavam diretamente para a sua cabeça.
Meia hora mais tarde, oito empregado do «Fortuna» encontravam-se no corredor, meio mortos de sono e de medo. Nenhum deles compreendia o que se estava a passar, mas ninguém fez perguntas. Um dos jogadores tentou protestar, mas um golpe selvagem aplicado na boca com o cano de um revólver rasgou-lhe os lábios e arrancou-lhe dois dentes. Isto demonstrou aos restantes que aqueles dois homens e a rapariga não estavam a brincar e o melhor seria calarem-se e obedecerem.
Dieter e Ronnie levaram os homens pelas traseiras do estabelecimento e conduziram-nos para os estábulos do «Fortuna». Ali, obrigaram-nos a selar os seus cavalos.
— Sela aquela égua, Mercedes. Será uma excelente montada para ti. Quando virmos o seu dono pagar-lhe-emos o que ela vale — disse Dieter.
— Não poderemos fazê-lo; era de Warren Bremer -- respondeu a rapariga.
Pouco depois, e através da escuridão da noite, uma estranha caravana atravessava as ruas de Desolação e dirigia-se para o Este.
Em primeiro lugar, cavalgavam oito homens silenciosos, com as mãos atadas à frente do corpo e os rostos contraídos pelo medo ao desconhecido. Atrás, seguiam Dieter, Ronnie e a rapariga, cobrindo os jogadores e empregados do bar com as suas armas.
Quando chegaram ao «rancho» dos Lanuza, os oito homens foram obrigados a desmontar e a cavar quatro profundas valas. Quando terminaram, estava a amanhecer, mas os Lanuza já tinham sido enterrados.
— Podeis regressar ao «Fortuna» e continuar o vosso sono. Mas ireis dizer a Ira Holker, a Jess Craige e a Len Riester que bem depressa terão também uma vala para eles — disse, secamente, Dieter.
Os oito homens montaram nos seus cavalos e afastaram-se, antes que os jovens mudassem de opinião e os enforcassem nas mesmas árvores em que tinham sido assassinados os quatro membros da família Lanuza.
— Regressaremos agora à cabana e permaneceremos nela durante três dias. Depois de descansarmos, faremos uma visita a Len Riester — disse Dieter.
— Pensas enforcá-lo na sala de jantar do «rancho»? — perguntou Ronnie.
— Não. Holker deve ter colocado alguns homens à volta do edifício para acabar connosco, mas a morte de Riester far-lhe-á compreender' que a sua está muito próxima.
—É muito natural que se rodeie de todos os homens do «Fortuna», dos pistoleiros contratados e talvez, também, dos vaqueiros do seu «rancho» — comentou Ronnie.
— O medo fá-lo-á cometer muitos erros. Depois de Riester será a vez de Craige.
— Eu posso reunir uma dúzia de amigos do meu pai — disse a rapariga.
— Talvez sejam necessários para a luta final — concordou Dieter.
Afastaram-se do «rancho» dos Lanuza, deixando atrás de si quatro tumbas. Mas, agora, a rapariga tinha a mais completa certeza de que o seu pai e os seus irmãos seriam completamente vingados.
 

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