Jim Grosvenor, apesar de estar rodeado pelos revólveres daqueles homens, apesar de ouvir como os armavam, parecia não notar a sua presença. Pensava apenas na jovem que ele julgara ser Lena Coleman, aquela bela jovem de doce olhar que tinha ficado em Green River.
— Se a Lena morreu, se está aqui enterrada... aquela rapariga é uma impostora, deve ser uma das filhas do Benjamin Andella, enganaram-me para ficarem com o dinheiro do Coleman. Enganou-me o ferreiro e enganou-me ela, com os seus olhos inocentes, enganou-me também...
Matt Coleman rosnou:
— Fale de uma vez, está descoberto, jovem; você não entregou dinheiro a ninguém! Não lho reprovo, cada qual ocupa-se do seu futuro como pode, mas acontece que esse dinheiro me pertence. Eu também penso no meu futuro. Rapaz, vou ser razoável. Se nos evitar perdas de tempo, poderá conservar parte desse dinheiro. Dez por cento. E uma oferta generosa.
Grosvenor respondeu:
— Não o tenho. Não posso aceitar nenhuma oferta.
Matt Coleman disse:
— Como queira, doutor. Tu! Avisa esse homem, rápido! Um dos pistoleiros saiu do cemitério.
Pouco depois regressou, trazendo seguro por um braço um velho encolhido e assustado, que tentava libertar-se. Matt Coleman disse ao velho:
— Tu és o coveiro, não é verdade?
— Sim, senhor... Mas eu não fiz nada, sem dúvida...
— Basta! Cala-te, idiota. Começa a trabalhar.
— Que querem que faça?
Matt assinalou a terra.
—O teu trabalho! És coveiro? Pois cava uma bonita cova!
O velho olhava para eles, confundido.
— Onde está o morto, senhor? Não sei de ninguém que tenha morrido na povoação...
—Este é o teu cliente! Trabalha!
O coveiro, que tinha as suas ferramentas junto de um muro, olhou para Jim Grosvenor com espanto, e quando o empurraram, foi buscar as ferramentas e começou a trabalhar. Jim murmurou:
— Você é muito teatral, Coleman. Assustou bem esse pobre velho.
Coleman fez um gesto de desprezo.
— Espero que no fim seja você a assustar-se, doutor. Porque vamos matá-lo quando esse velho cave a última pazada. Não tenha a menor dúvida. Matá-lo-emos. Se decidiu não falar, não falará e, nesse caso, não precisamos de si vivo para nada. Compreende? Isto não é um jogo, também não vamos humilhá-lo batendo-lhe para que fale, você escolherá livremente o que prefere. Se quer ficar com o dinheiro e morrer a entregá-lo, pode fazê-lo. Morrerá e eu procurarei o dinheiro depois. E hei-de encontrá-lo, porque eu consigo sempre o que quero.
O coveiro, apressado por um dos pistoleiros, começara a cavar. Matt Coleman, a quem, sem dúvida, a situação agradava, disse ao seu prisioneiro:
— Um bonito lugar para descansar, este. Faça a cova larga, velho, não quero que o doutor fique mal instalado!
O coveiro trabalhava lentamente. Deteve-se.
— Não é verdade que isto é uma brincadeira? —perguntou.
O homem que o viajava assestou-lhe uma pancada com o revólver, na cabeça, e o velho cambaleou, gemendo. Então Matt Coleman lançou-se sobre o pistoleiro, rugido:
—Imbecil, não lhe batas! Ou queres cavar tu a cova?
Deu-lhe uma bofetada de revés, marcando-lhe a face com o anel que tinha na mão direita. Houve um instante de confusão por causa daquilo, e Jim Grosvenor aproveitou-o muito bem. Tinha aos pés o monte de terra que o coveiro já tirara da cova. E a pá cravada nele. Segurou-a nervosamente.
Matt e os seus homens já se voltavam para ele, os revólveres começavam a procurá-lo. Jim moveu a pá com rapidez e uma nuvem de terra voou para o grupo. Os pistoleiros gritaram, levantando as mãos para se protegerem.
Só Matt Coleman teve tempo de afastar-se, só ele podia disparar naquele momento. Jim atirou-lhe a pá, batendo-lhe no braço e também na cara.
Matt Coleman largou a arma, tropeçou na terra e perdeu o equilíbrio. Foi cair sobre o coveiro, dentro da cova meio cavada.
O doutor Grosvenor, obrigado pelas circunstâncias a trabalhos tão diferentes dos da sua profissão, pisou o montículo de terra; depois, tomando impulso, sobre um dos pistoleiros, que estava inclinado, procurando a sua arma, saltou por cima do muro do cemitério, indo cair do outro lado, entre o mato.
Matt Coleman gritava ordens, insultava os seus homens, disparou mesmo para o ar. Jim Grosvenor corria já pelo monte, pois sabia que apostava a vida naquela corrida.
*
Benjamin, o ferreiro de Telluride, vestia roupas da melhor qualidade, calçava botas finas e a população de Green River, que cheirava dinheiro de muito longe, assediavam-no com elogios e sorrisos.
Mesmo Jano, o encarregado da «Danver-Great Lake, Diligências» tinha tentado vê-lo várias vezes. Benjamin evitava-o.
— Não sei quem terá dito a esta gente que temos dinheiro. Não fazem outra coisa senão propor-me negócios.
Margaret, a mulher, sabia.
-- O banqueiro sempre foi um palrador. Todos devem saber do dinheiro que lá depositaste. Tenho desejos de deixar Green River quanto antes.
Benjamin suspirou.
— Também eu queria ir para onde não nos conheçam, onde ninguém nos possa dizer que somos uns ladrões, que esse dinheiro não nos pertence.
— Ainda receias que esse jovem...?
— Não, sei que não voltaremos a vê-lo, mas não durmo tranquilo. Que inoportuna esta doença da Maria! Já podíamos estar longe daqui.
Margaret Andella suspirou:
—Pobrezinha! Creio que amava aquele rapaz.
— Bah! Mal o viu!
— Eu apaixonei-me por ti naquele dia em que o meu pai e eu entrámos na tua ferraria em Telluride para arranjar um carro. Foi só ver-te, Benjamin.
Ele atrapalhou-se.
— Isso já foi há muito tempo, Margaret. A Maria tem febre, isso é tudo. Logo que ela possa viajar, partiremos desta cidade.
Maria Andella viu-se livre da febre no dia seguinte. Os pais, que estavam impacientes, obrigaram-na a levantar-se.
— As tuas irmãs ajudar-te-ão, Maria. Vou sair e comprar uma boa carroça, com molas. Viajarás com comodidade.
— Onde vamos, papá?
Benjamin encolheu os ombros.
— Não sei, filha. Para longe daqui.
Maria suspirou. O pai foi comprar a carroça. Teve a sorte de encontrar um veículo excelente, quase novo, e um tiro de fortes cavalos belgas. Depois de encomendar o que necessitava para a viagem, foi ao Banco. Quando entrou, o diretor correu ao seu encontro, sorrindo amplamente. Benjamin era o seu melhor cliente. Mas, naquele dia, o seu melhor cliente ia dar-lhe um desgosto.
— Quero retirar os meus fundos. Parto de Green River. Faça o favor de me dar o dinheiro.
— Tudo? — perguntou o banqueiro, empalidecendo.
— Sim!
— Mas é uma imprudência viajar com tanto dinheiro. Dar-lhe-ei uma carta de crédito. Poderá levantar dinheiro onde quer que esteja, transferi-lo para o lugar para onde se dirigir...
— Prefiro levá-lo comigo, se não se importa. E agora mesmo. Ao fim e ao cabo, ele é meu, não é verdade? O banqueiro assentiu. Mas, antes de entregar o dinheiro, voltou a dizer que era uma imprudência levar aquela quantia com ele.
Benjamin Andella respondeu:
— Será uma imprudência menor se o senhor não disser a ninguém que o levantei; como contou a todos que o tinha depositado.
— Segredo profissional! Nunca falo nos assuntos dos meus clientes, senhor Andella!
—Eu sei ao que você chama segredo profissional. Diga ao caixa que prepare o pagamento.
O banqueiro entregou o depósito de Andella como se entregasse um filho ao verdugo. Andella meteu o dinheiro num saco e, antes de sair do Banco, moldou o saco à cintura, sob o casaco, prendendo-o com um cordão. O banqueiro repetia que aquilo era uma imprudência.
Benjamin assinou os recibos e saiu do Banco. Não correspondia aos cumprimentos de ninguém. A carroça tinha sido levada para a porta do hotel, a mulher examinava tudo e deu a sua aprovação às compras.
— Creio que teremos uma longa viagem sem problemas.
Benjamin apalpava o dinheiro sob o casaco.
— Espero que sim. Mas... tenho as minhas dúvidas. Vou pagar o hotel e dizer às pequenas que desçam. Como está a Maria?
—Bem, resignada.
Maria Andella estava resignada, silenciosa, muito pálida. Quando, sentada na carroça, via Green River ficar para trás, a pobre rapariga pensava: «Isto é o fim. Não voltarei a vê-lo. Que estúpida sou! Isto é o melhor que pode acontecer-me. Afastar-me de Jim Grosvenor para sempre, sem que ele saiba que sou uma vulgar ladra». Começou a chorar em silêncio. As irmãs riam, contentes com a viagem.
O diretor do Banco de Green River não se tinha ainda recomposto do desgosto pela perda do seu melhor cliente, quando lhe anunciaram uma visita. Mandou entrar o visitante para o seu gabinete. Reconheceu-o imediatamente.
— Oh, o senhor é o cavalheiro que trouxe a fortuna aos Andella!
— Uma coisa assim. Disseram-me que eles partiram de Green River. Quero saber se levantaram o dinheiro depositado em nome de Lena Coleman. O discreto banqueiro apressou-se a replicar.
—Nunca houve dinheiro nesse nome no meu Banco! Refere-se ao dinheiro dos Andella? Depositaram-no em nome do Benjamin, do pai. E levantou-o todo! Disse-lhe que era uma loucura, mas levou-o, enrolado à cintura, veja bem! Prometi-lhe não falar a ninguém no assunto para que os não seguissem todos os ladrões de Green River. Já sabe: antes de tudo, o segredo profissional. Mas não fez caso. Felizmente sou um homem muito reservado, pois de contrário essa família já teria sido assaltada e talvez assassinada.
— Bem vejo que é muito reservado e nunca fala nos assuntos dos seus clientes — comentou Jim com ironia.
— É básico no meu negócio! Sou como um confessor e como um médico. Ninguém deve saber dos assuntos económicos dos meus clientes. Nisso se baseia a confiança que têm neste Banco. Pois, como lhe estava a dizer... esse homem levou todo o dinheiro, ontem, em notas. Aconselhei-lhe uma transferência, cartas de crédito; enfim, processos seguros, mas parece-me que não quer que ninguém saiba para onde foi.
Jim Grosvenor pensava o mesmo. Benjamin queria desaparecer por completo.
— Mas não lhe vai ser fácil. Um dia é muito pouca vantagem, quando se viaja de carroça e com tanta família.
Despediu-se do banqueiro, que tentava continuar a falar-lhe nos assuntos dos Andella, apesar dos seus protestos de discrição. Jim tinha muita pressa. Abandonou a cidade naquele mesmo instante.
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