Dave Doston e “Niño” Gallardo trabalhavam num rancho perto de Hawthorne, ao norte de Candelaria há muitos anos. Juntos tinham passado muitos bons e maus momentos. Por isso, o patrão os havia escolhido para ir a Santa Fé buscar doze bois "Hereford", para sementais.
Depois de uma longa jornada, quando se encontravam perto de Candelaria, Dave disse para o companheiro:
— Vais gostar de Candelaria. E uma terra tranquila.
Algumas horas depois, avistavam as casas da povoação. Entardecia. Gallardo picou esporas ao cavalo. Estava cansado, tinha sede e fome. O mexicano era jovem, de mediana estatura, e gorducho, e Dave Doston era alto e seco de carnes.
Ao trote dos corcéis alcançaram as primeiras casas de Candelaria. Todas se encontravam fechadas não se observando vivalma por ali perto. Dave sorriu para o companheiro.
— Eu bem te disse, "Niño". Uma terra tranquila.
Foi então que divisaram um numeroso grupo de gente, vociferante. Dave semicerrou os olhos, surpreendido, observando a multidão, cuja maioria era constituída por homens, mas onde não faltavam rapazes e mulheres. Estas eram as que mais gritavam, enquanto os homens gesticulavam violentamente. "Niño" depois de observar a cena, disse para Dave:
— Não te enganaste, realmente... Um povoado tranquilo, hem?
Estavam já bastante perto para ouvir os gritos ameaçadores.
— Cadela!
— Enforquem a “Loira Jane"!
Os dois amigos apearam-se, um tanto confundidos. A multidão concentrava-se junto ao escritório do xerife. A porta duma taberna oferecia-se-lhes ali perto, tentadora, para saciar a sede que os atormentava. Entraram e Deve pediu uísque, enquanto o mexicano preferiu tequila. Depois de beberem, Dave perguntou:
— Que se passa com esta gente?
— Querem enforcar a "Loira".
— Isso já nós sabemos. O que não sabemos é por que querem enforcá-la.
— É uma assassina.
— E querem enforcá-la, sem esperar pelo julgamento?
— A "Loira" nunca foi vista com bons olhos por esta gente. Além disso, é a primeira vez q u e assassinam uma pessoa em Candelaria.
Dave olhou para "Niño" com ar triunfal.
— Já te tinha dito. É uma terra tranquila.
— Agora não o é — respondeu o mexicano. — Não se pode linchar alguém lá porque as pessoas se querem divertir.
— Há testemunhas?
— Foi surpreendida por alguns clientes com o revólver na mão e Tony a seus pés com um balázio no coração. O xerife tomou conta dela, mas não acredito que segure a multidão. Os ânimos estão muito exaltados.
Dave colocou umas moedas sobre o balcão e disse:
— Vamos "Nino". O espetáculo começa a interessar-me.
O mexicano seguiu-o, afirmando:
— Não mais do que a mim.
Quando chegaram perto da multidão, abriu-se a porta do gabinete do xerife, recortando-se, no limiar, a figura de um homem baixo e forte, com uma espingarda nas mãos e uma estrela de cinco pontas no blusão.
— Queremos a prisioneira, Percy — gritou uma voz.
— É uma assassina! — acusou uma mulher.
O xerife levantou as mãos, pedindo silêncio. Com isso somente conseguiu duas coisas: que os protestos aumentassem e que deixasse de apontar a espingarda aos amotinados. Foi o momento em que os que estavam mais próximo se decidiram aproveitar. Dois tipos lançaram-se ao xerife e, enquanto um segurava a espingarda, o outro arrancava-a da mão do representante da lei.
— Acabou-se, Percy — disse este último, furioso —. Essa mulher tem de morrer.
Ultrapassada a barreira que o xerife representava, a multidão ululante penetrou, de roldão, no interior do gabinete, apesar dos protestos daquele que gritou:
— Não sejam loucos! Vão cometer um crime! Essa mulher será enforcada, mas depois de julgada e condenada!
Ninguém o escutou, e, poucos momentos depois, vários homens saíram trazendo a "Loira Jane". A sua aparição voltou a provocar um rumor furioso de doestos e invectivações, em especial das mulheres.
— Enforquem-na!
— Assassina!
— Porca!
Uma voz, dominando as outras, gritou:
— Uma corda! Tragam uma corda!
Dave e "Niño" encostados às ombreiras da porta, fumando com calma, assistiam ao espetáculo como se não fosse nada com eles. Apesar disso, a aparição da "Loira Jane" fez com que o primeiro arrojasse para longe a ponta do cigarro, num movimento rápido.
— Céus! — exclamou — Estás a ver, “Niño"?
— Pois claro que vejo! Ou pensas que sou cego? Pode lá perder-se uma estampa destas!
Efetivamente, a "Loira Jane" era uma bela mulher. Explicava-se que os homens ficassem loucos por ela e que as mulheres a odiassem. Homens a quem ela tinha desprezado clamavam, agora, para que fosse enforcada. Mulheres que viam nela uma poderosa rival, também queriam, a todo o custo, que ela desaparecesse, não lhes importando que tivesse ou não cometido um crime.
Um tipo apareceu com uma corda enrolada e, pondo-se em frente doe amotinados, gritou:
— Vamos enforcá-la na praça!
Gritos de júbilo acolheram as suas palavras. Rodearam a formosa rapariga e puseram-se em marcha, passando junto aos dois amigos, sem lhes prestar atenção. Foi, então, que eles viram bem como ela era formosa.
— Caramba! — disse Dave, admirando-lhe a cintura estreita, as pernas bem feitas, os cabelos loiros e uma pureza de linhas no rosto que faziam dela um prodígio de formusura.
Dave começou a andar pela rua abaixo, seguido de "Niño".
— Até o pior dos criminosos tem direito a ser julgado. Vamos deixá-los cometer tal crime?
Os dois pensavam o mesmo, mas foi o mexicano quem rompeu o silêncio.
— Ou eu deixo de me chamar "Niño” Gallardo, ou não consinto que eles a enforquem!
— Bravo, "Niño"! Estava a pensar o mesmo... vai pelos cavalos e abre bem os olhos.
— Farei mais do que isso... espera-me na praça.
Deu meia volta e afastou-se em busca dos cavalos, enquanto Dave se encaminhava para a praça, sem voltar a cabeça. Ali tudo se preparava para que a "Loira” passasse desta para melhor. A corda pendia já de um grosso ramo de árvore. Dave acercou-se do grupo, que rodeava a rapariga, pronto para entrar em ação, mal "Niño" regressasse.
Numa das extremidades da corda, já estava feito o laço, o qual foi ajustado ao pescoço da jovem, enquanto um tipo mal encarado segurava a outra extremidade, no meio do burburinho, provocado pela multidão.
— Queres dizer alguma coisa, rapariga?
A pergunta provocou a ira dos assistentes que soltaram mais imprecações, berrando e acenando, perigosamente, os punhos.
— Nesse caso — juntou o homem —, que Deus tenha piedade de ti!
Voltou-se para dar o sinal de puxarem a corda, mas não o chegou a fazer, pois algo viu no céu, que o surpreendeu.
— Fogo! — gritou passados uns segundos.
Todos se voltaram. Efetivamente, grandes chamas, rodeadas de fumo, destacaram-se no céu. A reação dos amotinados foi instantânea: saíram todos a correr para o local do incêndio, gritando:
— Fogo! Fogo!
Dave sorriu. Aquilo não era fortuito. Devia ser uma das geniais ideias de "Niño" Gallardo. Antes que os poucos homens, que tinham ficado junto da "Loira", se repusessem da surpresa, saltou para o centro do grupo. Empunhava, firmemente, o resolver, intimando:
— Todos para trás!
Os outros fizeram um movimento para ele, rapidamente sustido, ao verem a arma apontada. Também eles compreendiam que o fogo não era outra coisa que um estratagema para afastar a multidão.
— Para trás! — repetiu Dave, ao mesmo tempo que livrava a rapariga do incomodo "colar" que tinha ao pescoço.
Os outros obedeceram, soltando expressões de furor.
— Custar-te-á caro, maldito.
— Não escaparás!
Naquele momento, escutou o galope de dois cavalos e "Niño" apareceu no largo. Dave saiu a o seu encontro, sem perder de vista os homens. Um deles, pensando que não era visto, levou a mão a o coldre.
Deve disparou rapidamente, atravessando-lhe o braço. O tipo soltou um gemido e caiu de joelhos. "Niño" tomou a rapariga pela cintura, içando--a até à garupa do seu cavalo. Depois, esporeou o animal, gritando:
— Para a frente, Dave!
Este montou, com um salto prodigioso, lançando o corcel em galope desesperado. ao mesmo tempo que disparava, para trás, vários tiros para manter imóveis os verdugos que só reagiram quando voltaram alguns dos outros que tinham acorrido ao fogo.
— Não havia qualquer incêndio! Alguém se entreteve a queimar no meio da rua, um montão de feno seco.
— Esses tipos enganaram-nos! —bradou um sujeito forte, de barba hirsuta e despenteado. — Malditos sejam!
— Temos de persegui-los! Dentro de pouco tempo cerca de vinte cavaleiros saíram em perseguição dos fugitivos, dispostos a não regressar sem eles. Percy Cadwell, o xerife, viu-os partir, com uma expressão impotente. Só eles tinham a culpa do sucedido!
O facto de ser o representante da lei obrigava-o a ir em perseguição da prisioneira. Contudo, não o faria! Pelo menos, enquanto os amotinados conservassem a sua belicosa atitude. No fundo estava contente por os desconhecidos os terem enganado com tanta facilidade.
— Oxalá não os alcancem — murmurou.
De contrário, tanto a "Loira" como os seus salvadores não tardariam a ficar pendurados numa boa árvore!
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