O mais difícil estava feito.
Mas nem todos se tinham decidido e Ken sabia-o bem. Também ela se apercebera de tudo quanto ainda faltava fazer. Lia-se na sua expressão inquieta, na dilatação das suas pupilas e na tremura das suas mãos.
Tinham escapado, sim. Os muros cinzentos, tal como as roupas de Ken Millard, tinham finalmente ficado para trás. Era um pesadelo bem escuro suportado durante anos. Poucos anos, sem dúvida. Mas tinham que ser mais, muito mais...
Os cavalos eram resistentes. Mas os dos cavaleiros e soldados também o eram. E com a vantagem de serem muitos mais. Se algum desfalecesse, outros continuariam a sua perseguição, aquela caçada humana. Se um dos seus falhasse... tudo estaria perdido.
— Depressa, Ken! — exclamou, esporeando a sua montada desesperadamente. — Já ali vêm no alto da montanha! São pelo menos vinte!
— Não percas a serenidade, Dinah — recomendou Ken secamente. — Se espicaças muito o animal, corres o risco de rebentá-lo ou de o esgotar, na melhor das hipóteses. Então não poderás contar mais com ele. É preferível manter o mesmo ritmo. Estes animais são a nossa única esperança. A divisória não pode estar longe. Pelo menos cruzaremos a do Condado. Aí estaremos um pouco mais seguros. Parece-me que não conhecerão bem a localização do Condado vizinho.
— E tu conhece-la bem?
— Também não. Mas estou habituado a esquivar-me aos meus perseguidores — riu-se Ken, duramente.
Continuaram o caminho. O cavaleiro vestido de cinzento, com as suas roupas grosseiras e o número de presidiário ainda posto no peito, corria desenfreadamente, sem no entanto acossar a montada. Sabia quanto um cavalo dá de si, quase tal como pode dar um homem. Um cavalo, muitas vezes, significa a salvação do seu cavaleiro, se este o conhecer bem.
O caminho agora era plano e seco, o que era um inconveniente para a fuga. Além disso, o vento impetuoso, soprava contra eles, levantando nuvens de areia, que molestavam os cavalos, ao introduzir-se--lhes nos olhos e na boca tanto dos animais como dos cavaleiros.
Ken sentia a irritante areia entre os dentes, cuspindo com frequência. Fazia frio e o ar cortava a pele. O céu estava coberto de grossas nuvens negras e tristes. Tristes como as paredes impenetráveis da Prisão Territorial, sujas como a própria prisão. Mas, mesmo assim, Ken preferia isto. Desejava cavalgar sob nuvens assim nem que fosse toda a vida, a estar encarcerado. Não se sentir emparedado por altas muralhas de pedra e com a sua liberdade circunscrita a um pátio retangular, de pedra, gélido, ou então na velha cela número trinta e sete. Não se sentir junto com outros infelizes que não tinham tido a sua sorte e audácia, continuando pois lá. De resto, também não tinham uma Dinah, trabalhando cativa e febrilmente, cá por fora, para o tirar de lá.
Olhou de soslaio para Dinah. Armas, cavalos, a oportunidade de fugir, tudo fora obra dela. Ninguém tinha suspeitado duma mulher. E ainda menos que ninguém, a própria sentinela de serviço naquela noite. Quando ela se apercebeu, já Dinah lhe ia vibrar o golpe certeiro na cabeça. Após isto, não lhe foi difícil entrar na prisão deserta, silenciosa. Escolhera bem o ponto de acesso. Próximo do pátio para onde davam as portinholas das celas. Uma delas era a de Ken. Uma arma rapidamente passada por uma corda através das grades. E logo ela se foi embora.
Ken queixou-se em voz alta. O carcereiro acudiu. Era um preso dócil pelo que de nada podia desconfiar. Quando o guarda entrou, Ken subjugou-o. Apoderou-se das suas chaves e da arma. Os restantes não quiseram fugir. As suas penas eram pequenas, e a sua fuga podia significar a morte. Não se arriscaram, mas desejaram-lhe boa sorte.
Logrou alcançar a plataforma exterior, depois de derrubar inesperadamente outro guarda. Quando deram conta do que se passava, na torre de controle, e começaram a disparar sobre ele, já, tinha saltado o muro e pulava para um cavalo, junto de Dinah, que o aguardava mesmo junto da cerca de pedra.
Depois disto, a perseguição... E aí vinham eles. Cavaleiros, guardas e soldados da guarnição do presídio, no seu encalce.
Desciam já um monte, a galope. Os tiros ressoavam naquela manhã. As suas fardas de cor avermelhada eram como que coisas sem cor naquela luz do amanhecer escuro e frio.
As balas sibilavam bem perto dos cavalos em fuga, Ken voltou-se sem afrouxar a marcha. Disparou também sobre eles. Não sobre os homens. Não queria mortes na consciência.
Atingiu um cavalo que tombou espetacularmente monte abaixo, arrastando o cavaleiro e fazendo cair mais três ou quatro cavaleiros, que vinham bem lançados após esse.
Ken riu-se inclinando-se sobre a garupa da sua montada e fazendo-a correr velozmente aos ziguezagues para evitar que lhe acertassem. Dinah, sempre astuta, adotou igual tácita sem precisar de avisos,
Resultou, pois, que os tiros, agora, eram mais e disparados nervosamente, procurando atingir qualquer uma das presas. A mudança constante dos dóis alvos, porém, impedia que eles fizessem pontaria certeira.
A isto juntou-se a nuvem de pó levantado pelo vento, e que pouco a pouco constituiu uma cortina protetora dos perseguidos.
Ken pensou ser este o momento propício para desnortear os seus perseguidores e ganhar uns minutos preciosos. Com sorte, podiam até atingir uma hora de vantagem.
A areia no ar, batendo nós seus rostos, parecia alfinetes, mas Ken Millard não se preocupava com dores físicas. Através da poeirada muito densa, mas conveniente, vislumbrava umas estreitas rochas à sua esquerda. A seguir era a planície, lisa e deserta até ao limite do Condado. A planície era agora totalmente invisível devido à poeirada.
— Vira para a esquerda, Dinah! -- disse com rapidez.— Para esses estreitos!
Ela pareceu perceber. Assentiu com a cabeça e lançou-se qual flecha até lá, imitando a rápida manobra de Ken, que não mostrou hesitação alguma.
Os cavalos vacilaram pressentindo a profundidade das brechas abertas no caminho. Ken, então esporeou a sua montada e Dinah fez o mesmo. Saltaram.
Eram fundos barrancos, autênticos fossos, onde os animais se precipitavam violentamente, mas a terra era macia lá em baixo, evitando assim um trágico desastre para os cavalos e suas montadas.
Sobre as suas cabeças, atrás de si, ficaram as rochas que formavam o despenhadeiro e Ken, ergueu a cabeça, hirto, empunhando o revólver com mão firme. Dinah, estendida junto do seu cavalo, tirou um. «Winchester» e aguardou, olhando para cima.
Se algum rosto aparecesse lá em cima, significaria que a manobra fora descoberta. E isso seria então o fim, mas um fim que Ken estava disposto a vender por alto preço bem como o da mulher que o havia salvo.
Ouvia-se, distintamente, o galopar dos cavalos. Tremeu a terra à sua volta. As patas dos cavalos batiam no chão com tal ritmo que o estremeciam. Cada vez se aproximavam mais...
O dedo indicador de Ken Millard curvou-se no gatilho. Sob o tecido cinzento do fato de presidiário, vibraram músculos e nervos.
Foi nesse momento que os cavalos passaram em grande velocidade, bem perto do despenhadeiro. Parecia um trovão que rebentava sobre eles. A pouco e pouco ia-se perdendo na distância, até deixar de se ouvir completamente, levado pelo soprar impetuoso do vento.
Um ruído que, agora, parecia ser a Ken, verdadeira música angelical...
Mas nem todos se tinham decidido e Ken sabia-o bem. Também ela se apercebera de tudo quanto ainda faltava fazer. Lia-se na sua expressão inquieta, na dilatação das suas pupilas e na tremura das suas mãos.
Tinham escapado, sim. Os muros cinzentos, tal como as roupas de Ken Millard, tinham finalmente ficado para trás. Era um pesadelo bem escuro suportado durante anos. Poucos anos, sem dúvida. Mas tinham que ser mais, muito mais...
Os cavalos eram resistentes. Mas os dos cavaleiros e soldados também o eram. E com a vantagem de serem muitos mais. Se algum desfalecesse, outros continuariam a sua perseguição, aquela caçada humana. Se um dos seus falhasse... tudo estaria perdido.
— Depressa, Ken! — exclamou, esporeando a sua montada desesperadamente. — Já ali vêm no alto da montanha! São pelo menos vinte!
— Não percas a serenidade, Dinah — recomendou Ken secamente. — Se espicaças muito o animal, corres o risco de rebentá-lo ou de o esgotar, na melhor das hipóteses. Então não poderás contar mais com ele. É preferível manter o mesmo ritmo. Estes animais são a nossa única esperança. A divisória não pode estar longe. Pelo menos cruzaremos a do Condado. Aí estaremos um pouco mais seguros. Parece-me que não conhecerão bem a localização do Condado vizinho.
— E tu conhece-la bem?
— Também não. Mas estou habituado a esquivar-me aos meus perseguidores — riu-se Ken, duramente.
Continuaram o caminho. O cavaleiro vestido de cinzento, com as suas roupas grosseiras e o número de presidiário ainda posto no peito, corria desenfreadamente, sem no entanto acossar a montada. Sabia quanto um cavalo dá de si, quase tal como pode dar um homem. Um cavalo, muitas vezes, significa a salvação do seu cavaleiro, se este o conhecer bem.
O caminho agora era plano e seco, o que era um inconveniente para a fuga. Além disso, o vento impetuoso, soprava contra eles, levantando nuvens de areia, que molestavam os cavalos, ao introduzir-se--lhes nos olhos e na boca tanto dos animais como dos cavaleiros.
Ken sentia a irritante areia entre os dentes, cuspindo com frequência. Fazia frio e o ar cortava a pele. O céu estava coberto de grossas nuvens negras e tristes. Tristes como as paredes impenetráveis da Prisão Territorial, sujas como a própria prisão. Mas, mesmo assim, Ken preferia isto. Desejava cavalgar sob nuvens assim nem que fosse toda a vida, a estar encarcerado. Não se sentir emparedado por altas muralhas de pedra e com a sua liberdade circunscrita a um pátio retangular, de pedra, gélido, ou então na velha cela número trinta e sete. Não se sentir junto com outros infelizes que não tinham tido a sua sorte e audácia, continuando pois lá. De resto, também não tinham uma Dinah, trabalhando cativa e febrilmente, cá por fora, para o tirar de lá.
Olhou de soslaio para Dinah. Armas, cavalos, a oportunidade de fugir, tudo fora obra dela. Ninguém tinha suspeitado duma mulher. E ainda menos que ninguém, a própria sentinela de serviço naquela noite. Quando ela se apercebeu, já Dinah lhe ia vibrar o golpe certeiro na cabeça. Após isto, não lhe foi difícil entrar na prisão deserta, silenciosa. Escolhera bem o ponto de acesso. Próximo do pátio para onde davam as portinholas das celas. Uma delas era a de Ken. Uma arma rapidamente passada por uma corda através das grades. E logo ela se foi embora.
Ken queixou-se em voz alta. O carcereiro acudiu. Era um preso dócil pelo que de nada podia desconfiar. Quando o guarda entrou, Ken subjugou-o. Apoderou-se das suas chaves e da arma. Os restantes não quiseram fugir. As suas penas eram pequenas, e a sua fuga podia significar a morte. Não se arriscaram, mas desejaram-lhe boa sorte.
Logrou alcançar a plataforma exterior, depois de derrubar inesperadamente outro guarda. Quando deram conta do que se passava, na torre de controle, e começaram a disparar sobre ele, já, tinha saltado o muro e pulava para um cavalo, junto de Dinah, que o aguardava mesmo junto da cerca de pedra.
Depois disto, a perseguição... E aí vinham eles. Cavaleiros, guardas e soldados da guarnição do presídio, no seu encalce.
Desciam já um monte, a galope. Os tiros ressoavam naquela manhã. As suas fardas de cor avermelhada eram como que coisas sem cor naquela luz do amanhecer escuro e frio.
As balas sibilavam bem perto dos cavalos em fuga, Ken voltou-se sem afrouxar a marcha. Disparou também sobre eles. Não sobre os homens. Não queria mortes na consciência.
Atingiu um cavalo que tombou espetacularmente monte abaixo, arrastando o cavaleiro e fazendo cair mais três ou quatro cavaleiros, que vinham bem lançados após esse.
Ken riu-se inclinando-se sobre a garupa da sua montada e fazendo-a correr velozmente aos ziguezagues para evitar que lhe acertassem. Dinah, sempre astuta, adotou igual tácita sem precisar de avisos,
Resultou, pois, que os tiros, agora, eram mais e disparados nervosamente, procurando atingir qualquer uma das presas. A mudança constante dos dóis alvos, porém, impedia que eles fizessem pontaria certeira.
A isto juntou-se a nuvem de pó levantado pelo vento, e que pouco a pouco constituiu uma cortina protetora dos perseguidos.
Ken pensou ser este o momento propício para desnortear os seus perseguidores e ganhar uns minutos preciosos. Com sorte, podiam até atingir uma hora de vantagem.
A areia no ar, batendo nós seus rostos, parecia alfinetes, mas Ken Millard não se preocupava com dores físicas. Através da poeirada muito densa, mas conveniente, vislumbrava umas estreitas rochas à sua esquerda. A seguir era a planície, lisa e deserta até ao limite do Condado. A planície era agora totalmente invisível devido à poeirada.
— Vira para a esquerda, Dinah! -- disse com rapidez.— Para esses estreitos!
Ela pareceu perceber. Assentiu com a cabeça e lançou-se qual flecha até lá, imitando a rápida manobra de Ken, que não mostrou hesitação alguma.
Os cavalos vacilaram pressentindo a profundidade das brechas abertas no caminho. Ken, então esporeou a sua montada e Dinah fez o mesmo. Saltaram.
Eram fundos barrancos, autênticos fossos, onde os animais se precipitavam violentamente, mas a terra era macia lá em baixo, evitando assim um trágico desastre para os cavalos e suas montadas.
Sobre as suas cabeças, atrás de si, ficaram as rochas que formavam o despenhadeiro e Ken, ergueu a cabeça, hirto, empunhando o revólver com mão firme. Dinah, estendida junto do seu cavalo, tirou um. «Winchester» e aguardou, olhando para cima.
Se algum rosto aparecesse lá em cima, significaria que a manobra fora descoberta. E isso seria então o fim, mas um fim que Ken estava disposto a vender por alto preço bem como o da mulher que o havia salvo.
Ouvia-se, distintamente, o galopar dos cavalos. Tremeu a terra à sua volta. As patas dos cavalos batiam no chão com tal ritmo que o estremeciam. Cada vez se aproximavam mais...
O dedo indicador de Ken Millard curvou-se no gatilho. Sob o tecido cinzento do fato de presidiário, vibraram músculos e nervos.
Foi nesse momento que os cavalos passaram em grande velocidade, bem perto do despenhadeiro. Parecia um trovão que rebentava sobre eles. A pouco e pouco ia-se perdendo na distância, até deixar de se ouvir completamente, levado pelo soprar impetuoso do vento.
Um ruído que, agora, parecia ser a Ken, verdadeira música angelical...
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