Ainda não haviam decorrido duas horas, desde que partira o tílburi com Rex Prince e Olímpia e o entardecer ainda tinha luz suficiente para que não fosse preciso acender as lanternas, quando Percy Descamps, a galope, foi deter-se junto de Bart Taylor, que examinava a tarefa que Anderson realizava com a sua equipa. Apeou-se de um salto, para lhe dizer:
— Um momento, chefe. — Taylor seguiu Descamps, que se afastava um pouco. — Vem aí Gene Larvin. E Gene Larvin é um brigão profissional, que começou por partir cabeças em Nevada, continuou fazendo o mesmo em Idaho e há uns meses que se encontra em Oregon. Tem muito olho, por que ele é decidido, traiçoeiro e com mais força do que um urso. Sabe-as todas.
— Na vida, temos de ir aprendendo sempre, Percy.
O cavaleiro, que trazia a sua montada a passo, tinha o aspeto insolente do profissional. Quando passou pela frente de John Maldonado, olhou este como quem examina um bicho fétido. Apeou-se, atando as rédeas a um tronco de árvore; e, ao aproximar-se, fitou Percy Descamps:
— Boas tardes! Isto parece que vai sendo uma via, hem?
Alto, de ombros largos, pescoço redondo como uma maça compacta, fronte estreita, rosto achatado com algumas cicatrizes, olhos azuis, inquietos, em constante observação, sem, contudo, parecer fixar coisa alguma, Gene Larvin gostava da sua alcunha de «Sete Vidas», que lhe tinham dado pelos buracos que outros tantos projéteis haviam deixado no seu corpo.
— Vais de passagem, Gene Larvin? — perguntou-lhe Descamps.
— Vou e venho. Tu bem me conheces... Disseram-me que guardas as costas de um tal...
— Bart Taylor — interrompeu-o este —. Sou eu próprio, Gene Larvin.
— Muito gosto, Bart. Rijo moço!... — E voltando-se para Descamps: — Importas-te de que eu fale com o senhor Taylor, sem que nos espies? Eu não venho brigar, nem Taylor quer brigas enquanto não terminar esta via. Trata-se de um emprego para mim.
Percy Descamps afastou-se, convidado por um gesto impaciente de Taylor.
— Emprego na Companhia Dalton, Larvin?!
— Isto foi um pretexto para afastar Descamps. Trata de escutares tranquilo, por que eu não quero peleja e, se te encrespares, ficarão a perder, principalmente duas pessoas, completamente alheias a nós. Tens calma para me ouvir, Bart Taylor?
— Veremos se a tenho. Eu venho, pode dizer-se, como embaixador. O que vou contar, se o repetires, prejudicará duas pessoas, uma delas muito estimada por ti. Pagam-me para vir aqui, com um recado... Sabes onde está situada a «Cabana Vermelha» do lago Malheur?
— Não faço ideia.
— O lago está em terra livre, entre os ranchos de Chet Muldorf e Wilburn Lang. Se fores com o xerife e a sua gente, nada encontrarás. Se fores sozinho, ao escurecer, pode ser que te matem, pode ser que não. Ao que suponho, aquele que me pagou para vir aqui vai propor-te um golpe firme... Abandonas Oregon e pronto... Não acontecerá nada.
— Ah! Sim? Pois o «trail» vai andando.
—É isso o que traz molestado aquele que me paga o recado. E vais-te rir quando eu te jurar que não é Lang, nem Muldorf, nem Walker. É alguém... que tu nem esperas, chefe de equipa.
— Ele que venha fazer-me essa proposta e eu lhe darei a resposta que melhor entender.
— Ele tem ouvido que sabes dar golpes. Se for possível, ele só quer que tu partas e deixes esta vida. E que venha outro chefe de equipa. E eu, se for possível, não desejo esta noite ter qualquer briga. Eu estarei aqui, apenas, para proteger de qualquer golpe aquele que me paga o recado. Ah! Sim! E dizes a Percy Descamps que eu vim aqui pedir emprego... A ti, interessa-te sair de Oregon, com dinheiro e com ela... Cuidado, Bart!... Lembra-te de que vais jogar a formosa pele de Olímpia e a de Rex Prince. Eles estão com o tílburi na «Cabana Vermelha» do lago. Vai a Eagle convencer-te de que eles não voltaram ali. Avisa o xerife e saio de Oregon, mas tu não tornas a ver nem o tílburi, nem Rex, nem Olímpia...
— Canalha!
— Asseguro-te que sim, e quem duvidar do que eu digo, ofende-me...
— Irei a Eagle e... ficas aqui, Gene Larvin!
— Mas que ganhamos com isso, tu e eu? Chumbo candente e aquele que mexe os cordelinhos larga fogo a «dois atados» na «Cabana Vermelha» do Lago, se eu demorar mais de uma hora. Daqui até lá, é coisa de meia hora. O tipo que me paga...
— E que evitarei, se lá for?
— Não é o que pensas, Bart. Não é negócio matar-te. Só interessa àquele que me paga que tu largues isto, de maneira que não possas voltar. Mas é em troca de te devolver a tua Olímpia e o seu irmãozito, que estão bem guardados na Cabana. Até quando quiseres, Bart Taylor. Eu não posso perder mais tempo a contemplar-te. Acabarias por estalar.
Gene Larvin deu uma rápida meia volta. E quando passou pela frente de Descamps, disse:
— O teu bebé tem muito mau génio. Incomodo-me em vir pedir-lhe um emprego e ele pôs-se logo com febre. Até outra vez!
Os lábios de Descamps murmuraram uma frase de despedida:
— Oxalá que rebentes, boi matreiro!
Taylor empunhou um martelo e, durante alguns minutos, procurou no trabalho uma válvula de escape para o seu furor. Depois, atirando o martelo para o lado, encaminhou-se para o carro, onde tinha a sua roupa. Vestiu a camisa e o jaquetão, pondo o cinto donde pendia a bainha do punhal. Tirou o lenço e pôs o chapéu de aba larga. E, já a cavalo, foi direito a Percy Descamps.
— Eu vou a Eagle. Quero verificar ali uma coisa que Larvin me contou.
— Ele é uma língua venenosa. Não faças caso do que ele diz. Eu vou contigo.
— Não. Tu ficas aqui. Levo comigo o rifle e sei valer-me dos meus dedos. Pode ser que volte ainda hoje ou fique em Eagle.
—Tu mandas. Mas a ordem era que nós...
— Tu o disseste: eu mando. E até amanhã Percy.
O potro partiu a galope rasgado para Eagle Já ao escurecer, quando vadeava o Cedder, Bart Taylor subiu pela parte sem dono, entre os campos de pastagem de Ruby Cardigan e a extensão de cedros pertencentes a Wilburn Lang.
Podia ser que Gene Larvin quisesse estender-lhe uma armadilha, mas o seu modo de expor o sequestro de Olímpia e de Rex e a razão que o motivava eram bastante eloquentes. Não queriam matar sem proveito e com risco de futuras responsabilidades. Que espécie de plano seria o que ia propor-lhe aquele que pagava ao temerário brigão, em troca de ele sair de Oregon, com Olímpia, de modo que não pudessem voltar?
Contornou a cerca, ao norte do Cedder cujas águas, como as do Rogue, regavam os ranchos e pastos, nutrindo-se do lago Malheur. No tempo do estio, as nascentes ficavam secas e minguavam muito nos fins da Primavera. A lua irradiava a luz suficiente para que se divisassem todos os contornos a mais de vinte passos.
Dezoito dias de constante tensão nervosa, de duro labor, ofuscavam o raciocínio de Taylor. Esquecia o «trail», para só pensar em que um homem do calibre de Gene Larvin não se teria exposto, se não estivesse certo de que «aquele que lhe pagava e mexia os cordelinhos» estava convencido de que o sequestro garantia qualquer pacto com Bart Taylor.
Pela clareada ladeira, onde os cedros se espaçavam de cada lado de divergência dos dois rios, Bart Taylor diminuiu o avanço impetuoso do potro.
Ele divisava já a «Cabana Vermelha», assim denominada pela pedra das suas paredes e pelo telhado. Com o cavalo a passo, manteve as rédeas baixas, com a mão direita livre, junto da culatra do rifle.
Ouviu o ténue assobio de convite e olhou para as rochas. Viu sair delas o homem que acabava de assobiar e que tornava a colocar na parte inferior do rosto a nota garrida de um lenço amarelo de seda. Mas não viu mais nada, porque, da ramada da árvore, por baixo da qual passava, caiu sobre a garupa do seu cavalo outro homem que, tecnicamente, lhe deu uma pancada na nuca.
— Um momento, chefe. — Taylor seguiu Descamps, que se afastava um pouco. — Vem aí Gene Larvin. E Gene Larvin é um brigão profissional, que começou por partir cabeças em Nevada, continuou fazendo o mesmo em Idaho e há uns meses que se encontra em Oregon. Tem muito olho, por que ele é decidido, traiçoeiro e com mais força do que um urso. Sabe-as todas.
— Na vida, temos de ir aprendendo sempre, Percy.
O cavaleiro, que trazia a sua montada a passo, tinha o aspeto insolente do profissional. Quando passou pela frente de John Maldonado, olhou este como quem examina um bicho fétido. Apeou-se, atando as rédeas a um tronco de árvore; e, ao aproximar-se, fitou Percy Descamps:
— Boas tardes! Isto parece que vai sendo uma via, hem?
Alto, de ombros largos, pescoço redondo como uma maça compacta, fronte estreita, rosto achatado com algumas cicatrizes, olhos azuis, inquietos, em constante observação, sem, contudo, parecer fixar coisa alguma, Gene Larvin gostava da sua alcunha de «Sete Vidas», que lhe tinham dado pelos buracos que outros tantos projéteis haviam deixado no seu corpo.
— Vais de passagem, Gene Larvin? — perguntou-lhe Descamps.
— Vou e venho. Tu bem me conheces... Disseram-me que guardas as costas de um tal...
— Bart Taylor — interrompeu-o este —. Sou eu próprio, Gene Larvin.
— Muito gosto, Bart. Rijo moço!... — E voltando-se para Descamps: — Importas-te de que eu fale com o senhor Taylor, sem que nos espies? Eu não venho brigar, nem Taylor quer brigas enquanto não terminar esta via. Trata-se de um emprego para mim.
Percy Descamps afastou-se, convidado por um gesto impaciente de Taylor.
— Emprego na Companhia Dalton, Larvin?!
— Isto foi um pretexto para afastar Descamps. Trata de escutares tranquilo, por que eu não quero peleja e, se te encrespares, ficarão a perder, principalmente duas pessoas, completamente alheias a nós. Tens calma para me ouvir, Bart Taylor?
— Veremos se a tenho. Eu venho, pode dizer-se, como embaixador. O que vou contar, se o repetires, prejudicará duas pessoas, uma delas muito estimada por ti. Pagam-me para vir aqui, com um recado... Sabes onde está situada a «Cabana Vermelha» do lago Malheur?
— Não faço ideia.
— O lago está em terra livre, entre os ranchos de Chet Muldorf e Wilburn Lang. Se fores com o xerife e a sua gente, nada encontrarás. Se fores sozinho, ao escurecer, pode ser que te matem, pode ser que não. Ao que suponho, aquele que me pagou para vir aqui vai propor-te um golpe firme... Abandonas Oregon e pronto... Não acontecerá nada.
— Ah! Sim? Pois o «trail» vai andando.
—É isso o que traz molestado aquele que me paga o recado. E vais-te rir quando eu te jurar que não é Lang, nem Muldorf, nem Walker. É alguém... que tu nem esperas, chefe de equipa.
— Ele que venha fazer-me essa proposta e eu lhe darei a resposta que melhor entender.
— Ele tem ouvido que sabes dar golpes. Se for possível, ele só quer que tu partas e deixes esta vida. E que venha outro chefe de equipa. E eu, se for possível, não desejo esta noite ter qualquer briga. Eu estarei aqui, apenas, para proteger de qualquer golpe aquele que me paga o recado. Ah! Sim! E dizes a Percy Descamps que eu vim aqui pedir emprego... A ti, interessa-te sair de Oregon, com dinheiro e com ela... Cuidado, Bart!... Lembra-te de que vais jogar a formosa pele de Olímpia e a de Rex Prince. Eles estão com o tílburi na «Cabana Vermelha» do lago. Vai a Eagle convencer-te de que eles não voltaram ali. Avisa o xerife e saio de Oregon, mas tu não tornas a ver nem o tílburi, nem Rex, nem Olímpia...
— Canalha!
— Asseguro-te que sim, e quem duvidar do que eu digo, ofende-me...
— Irei a Eagle e... ficas aqui, Gene Larvin!
— Mas que ganhamos com isso, tu e eu? Chumbo candente e aquele que mexe os cordelinhos larga fogo a «dois atados» na «Cabana Vermelha» do Lago, se eu demorar mais de uma hora. Daqui até lá, é coisa de meia hora. O tipo que me paga...
— E que evitarei, se lá for?
— Não é o que pensas, Bart. Não é negócio matar-te. Só interessa àquele que me paga que tu largues isto, de maneira que não possas voltar. Mas é em troca de te devolver a tua Olímpia e o seu irmãozito, que estão bem guardados na Cabana. Até quando quiseres, Bart Taylor. Eu não posso perder mais tempo a contemplar-te. Acabarias por estalar.
Gene Larvin deu uma rápida meia volta. E quando passou pela frente de Descamps, disse:
— O teu bebé tem muito mau génio. Incomodo-me em vir pedir-lhe um emprego e ele pôs-se logo com febre. Até outra vez!
Os lábios de Descamps murmuraram uma frase de despedida:
— Oxalá que rebentes, boi matreiro!
Taylor empunhou um martelo e, durante alguns minutos, procurou no trabalho uma válvula de escape para o seu furor. Depois, atirando o martelo para o lado, encaminhou-se para o carro, onde tinha a sua roupa. Vestiu a camisa e o jaquetão, pondo o cinto donde pendia a bainha do punhal. Tirou o lenço e pôs o chapéu de aba larga. E, já a cavalo, foi direito a Percy Descamps.
— Eu vou a Eagle. Quero verificar ali uma coisa que Larvin me contou.
— Ele é uma língua venenosa. Não faças caso do que ele diz. Eu vou contigo.
— Não. Tu ficas aqui. Levo comigo o rifle e sei valer-me dos meus dedos. Pode ser que volte ainda hoje ou fique em Eagle.
—Tu mandas. Mas a ordem era que nós...
— Tu o disseste: eu mando. E até amanhã Percy.
O potro partiu a galope rasgado para Eagle Já ao escurecer, quando vadeava o Cedder, Bart Taylor subiu pela parte sem dono, entre os campos de pastagem de Ruby Cardigan e a extensão de cedros pertencentes a Wilburn Lang.
Podia ser que Gene Larvin quisesse estender-lhe uma armadilha, mas o seu modo de expor o sequestro de Olímpia e de Rex e a razão que o motivava eram bastante eloquentes. Não queriam matar sem proveito e com risco de futuras responsabilidades. Que espécie de plano seria o que ia propor-lhe aquele que pagava ao temerário brigão, em troca de ele sair de Oregon, com Olímpia, de modo que não pudessem voltar?
Contornou a cerca, ao norte do Cedder cujas águas, como as do Rogue, regavam os ranchos e pastos, nutrindo-se do lago Malheur. No tempo do estio, as nascentes ficavam secas e minguavam muito nos fins da Primavera. A lua irradiava a luz suficiente para que se divisassem todos os contornos a mais de vinte passos.
Dezoito dias de constante tensão nervosa, de duro labor, ofuscavam o raciocínio de Taylor. Esquecia o «trail», para só pensar em que um homem do calibre de Gene Larvin não se teria exposto, se não estivesse certo de que «aquele que lhe pagava e mexia os cordelinhos» estava convencido de que o sequestro garantia qualquer pacto com Bart Taylor.
Pela clareada ladeira, onde os cedros se espaçavam de cada lado de divergência dos dois rios, Bart Taylor diminuiu o avanço impetuoso do potro.
Ele divisava já a «Cabana Vermelha», assim denominada pela pedra das suas paredes e pelo telhado. Com o cavalo a passo, manteve as rédeas baixas, com a mão direita livre, junto da culatra do rifle.
Ouviu o ténue assobio de convite e olhou para as rochas. Viu sair delas o homem que acabava de assobiar e que tornava a colocar na parte inferior do rosto a nota garrida de um lenço amarelo de seda. Mas não viu mais nada, porque, da ramada da árvore, por baixo da qual passava, caiu sobre a garupa do seu cavalo outro homem que, tecnicamente, lhe deu uma pancada na nuca.
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