sexta-feira, 16 de fevereiro de 2018

PAS850. Chega o herdeiro

A chegada da diligência era sempre um acontecimento em Enid. Ela trazia notícias dos outros Estados da União, passageiros, encomendas, etc... O veículo poeirento, puxado por quatro solípedes suados, percorria velozmente a cidade, a voz forte do cocheiro a comandar os cavalos, o chicote a estalar, para parar à porta da Agência. O garotio, geralmente, corria atrás da carruagem, misturando-se com o pó que o rodado levantava e fazendo uma gritaria infernal.
Naquela manhã, tudo isto aconteceu. A carruagem chegava pontualmente à hora e, quando assim sucedia, era certo e sabido ser o «índio» o cocheiro, apelido por que era conhecido um indivíduo de meia idade, de tez escura, curtida pelos sóis da planície abrasante, baixote, homem conhecedor de todos os caminhos de Cherokee e hábil na sua profissão. Corton, o «Incho», era uma espécie Bufalo Bill da região. E, doesse a quem doesse, para que a sua fama não fosse desmentida, a diligência tinha de chegar pontualmente à tabela.
Assim que a carruagem parou à porta da Agência, juntou-se a habitual roda de curiosos. Os cavalos foram desatrelados, dois empregados subiram ao tejadilho para descarregar as encomendas e, enquanto isto, a portinhola abriu-se para dar passagem aos dois únicos passageiros.
Um era «rancheiro» na região e conhecido em Enid. O outro ninguém o conhecia e foi imediatamente focado pela curiosidade dos circunstantes. Apeou-se agilmente, sacudiu as calças listradas e O casaco preto, perguntou qualquer coisa a um empregado e caminhou em seguida, levando duas maletas, para o «Saloon Estrela Prateada». Era um tipo alto, magro, possuía olhos pequenos, nariz anguloso e barba hirsuta. Abeirou-se de Mallor, que estava no seu posto por detrás do balcão, pediu um quarto e quando o taberneiro lhe pediu que assinasse o livro de registo, fez um gesto de enfado, respondendo:
— Logo!
Depois, apanhou a chave e desapareceu escadas acima.
Como se afirmou, Enid era, de facto, uma progressiva cidade, sempre a renovar-se. Pelas suas ruas passeavam, coches e carruagens de carga, cavalos puro-sangue e pilecas de transporte, homens bem vestidos e simples tratadores de gado. As suas artérias tinham movimento, bulício que, afinal, se transmitia aos escritório e lojas comerciais. Os vestidos coloridos das mulheres eram, uma nota alegre a cobrir o ambiente. Ninguém diria sem o saber, que o solo onde a urbe se erguia era, havia poucos anos atrás, terreno deserto e árido, terra de índios, porque o crescimento da cidade processara-se em ritmo acelerado. No entanto, embora grande, Enid não era tão extensa que impossibilitasse uma noticia de, em pouco tempo, correr todas as bocas, isto é, de ser conhecida em toda a cidade. Foi o que aconteceu com a chegada do forasteiro na diligência do meio-dia. Uma hora depois, já não devia haver ninguém que não soubesse da sua onda. E o comportamento que viria a tomar, ainda mais espicaçou a curiosidade geral. O desconhecido esteve uma boa parte da tarde metido no quarto, depois de ter pedido que lhe levassem lá uma frugal refeição. Desceu por volta das quatro horas e já não parecia o mesmo homem, alquebrado e cansado da viagem. Agora estava alegre e folgazão. Os quatro vaqueiros que se encontravam no «saloon», a jogar às cartas, viram-no a descer as escadas. Envergava uma camisa, branca com riscas verticais pretas, por baixo do casaco de couro, calças pretas e sapatos. Dirigiu-se ao balcão. Mallor serviu-lhe o uísque que havia pedido e ouviu-o dizer, enquanto admirava numa visão geral e rápida o interior do estabelecimento:
— O meu «saloon»!
Depois, voltou-se e ordenou: — Ponha mais quatro uísques e vá levá-los àqueles cavalheiros.
Mallor obedeceu. Os quatro vaqueiros, ao receberem aquele inesperado oferecimento, perguntaram a quem se devia a oferta e o taberneiro informou-os em voz baixa:
— Foi aquele tipo que chegou na diligência! Eles olharam então na direção indicada e viram o forasteiro, encostado displicentemente ao balcão, que lhes sorria. Levantou o copo e disse:
— Bebam à saúde do novo dono desta casa! Sou o irmão do inditoso Bishop O'Brien!
O efeito destas palavras não podia ter sido mais espetacular. Mallor ficou confundido, com a bandeja na mão, esquecendo-se talvez de que estava de pé! Os quatro vaqueiros, assim que se refizeram da surpresa, levantaram o copo e tomaram a bebida, porque um uísque oferecido não é coisa, de se deitar a perder. Um deles, porém, falou com os outros e saiu.
Queria ser o primeiro a dar a grande novidade!
O irmão do falecido atirou uma moeda para cima do balcão para pagar a despesa e caminhou para a porta cumprimentando.
Jefferson Bronco recebeu a noticia com a esperada admiração. Ninguém conhecia nenhum parente de Bishop O'Brien e muito menos um irmão! Ficou intrigado, pegou no chapéu e saiu em busca do forasteiro.
Enquanto caminhava pela rua via os olhares que os transeuntes lhe dirigiam, o que o convenceu de que toda a cidade conhecia a grande nova. Maior, do «Estrela Prateada», voltou a contar-lhe a mesma história que ele já conhecia e informou-o de que o misterioso indivíduo não se encontrava lá, tendo ido a pé pela rua acima.
De informação em informação, Bronco foi encontrá-lo dentro do cemitério, ajoelhado diante da campa de Bishop O'Brien. Nessa altura, levantou-se e veio saindo. Bronco não queria encontrar-se com ele, mas foi o próprio forasteiro quem o chamou:
— Xerife!
Bronco parou. O outro vinha mais ligeiro e cobria a cabeça com o chapéu.
Estendeu a mão ao xerife, cumprimentando-se
— Sou Brown O'Brien, irmão de Bishop O'Brien. Certamente já foi avisado da minha chegada. Bronco acenou afirmativamente.
— Hei-de procurá-lo para me constituir herdeiro universal de meu irmão.
— A pessoa mais indicada para esse fim é «mister» Mc'Cleen, o Promotor de Justiça e juiz.
Caminhavam juntos. Brown riu.
— Tanto faz um como outro. Não tenho pressa! Contaram-me já o modo misterioso como o meu irmão foi morto e certamente ainda não descobriram o assassino. O xerife confirmou com um aceno. Assim que receber a herança, vou pagar a um agente particular para trabalhar no caso. O assassínio de meu irmão não pode ficar impune! Bronco ficou parado na calçada, estupefacto. Mas, vencida a surpresa, respondeu:
— «Mister» Brown é que sabe e agirá como entender.

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