A sala do tribunal estava cheia a deitar por fora. Os comissários Trenton, Burt e Rocky, com os rifles apontados, guardavam os pontos estratégicos da vasta sala, secundados pela espontânea colaboração de dois fazendeiros: Ted Barrell e Larry Donlan, que empunhavam as suas pistolas ameaçadoramente.
Com isto queria Jonathan Fox cobrir os possíveis perigos daquele julgamento. Faltavam ainda precisamente as duas máximas autoridades de Riverwood, quando introduziram na sala, no meio de um murmúrio inquietante, os quatro presos.
Rush notou a ausência de Fox e do juiz Benson, bem assim como do magistrado Mathews de Lide Rocky, e franziu o sobrolho. Cada vez gostava menos da maneira do decorrer daquele julgamento.
Estudou as saídas do vasto recinto, zelosamente guardadas, assim como o lugar destinado ao público, que se encontrava cheio por uma multidão na expectativa e hostil. Depois olhou para a porta mais próxima guardada por Trenton, e depois levantou o olhar para a galeria, demasiado alta para poder ser alcançada. Era uma estupenda ratoeira.
Rush e os Milligan, tomaram lugar nas cadeiras, em frente do estrado do júri. Nas primeiras filas de espectadores viu Doris Howland, que lhe dirigiu um olhar e um sorriso de ânimo. O «Anjo» inclinou a cabeça, sem responder. Pensava que aquele gesto de ânimo devia ser mais logicamente dirigido a Jess, o homem que a amava. Mas notou que se tivesse sido assim, ele teria sentido ciúme.
De repente abriu-se uma porta no fundo, e apareceu o juiz Benson, no seu melhor fato preto, impecável e direito. Rush, involuntariamente pensou na indumentária funerária de Homes.
Benson subiu ao estrado do juiz, e dali dirigiu--se, depois de uma pausa que permitiu fazer calar os murmúrios, a toda a assistência.
—Senhores e senhoras —disse em voz clara e vibrante. — Por causas que não compreendemos, e que de momento ignoramos, o juiz Benedict Mathews, de Litle Rocky, que teria de presidir como juiz deste processo, contra os acusados Slim, Harry e Jess Milligan e o forasteiro Rush Marlowe, não compareceu ainda em Riverwood. Assim, ante tal anomalia, e não desejando atrasar por mais tempo o funcionamento da justiça, devo informar que eu, Stuart Benson, juiz deste condado ocuparei o lugar que o meu ilustre colega não pode ocupar.
Rush levantou-se de um salto.
— Protesto! — exclamou. —Desejamos um juiz imparcial e sem influências!
— Duvida o acusado da minha integridade? — perguntou friamente o juiz, com uma luzinha brilhante nos olhos.
—Isso não é o que nos prometeu! —gritou Rush.
— Eu não prometi nada.
— Mas o sheriff Fox!...
—Ah, Fox... —Benson inclinou a cabeça com tristeza. — O velho amigo Jonathan não poderá já cumprir nenhuma promessa... se não se der um milagre.
Fez-se um espantoso silêncio. Rush empalideceu, e os seus olhos cravaram-se agudamente no juiz.
—Que quer dizer, Benson? — exigiu com voz enrouquecida.
O juiz permaneceu calado uns segundos, enquanto involuntariamente, o olhar de Rush se encontrava com o da angustiada Doris. Os Milligan, de expressão tensa, aguardavam o que se ia seguir.
—É algo lamentável, meus amigos — falou Benson com pesaroso acento dirigindo-se a todos. —Um infeliz acidente, que ninguém podia prever. Ao entrar nos estábulos para sair a cavalo ao encontro do juiz Mathews, parece que um dos animais se espantou, inesperadamente, golpeando o crânio de Jonathan com as patas. O sheriff caiu inconsciente, e recebeu ainda várias patadas do animal, antes que eu tivesse tempo de acalmar o espantado bicho. Neste momento, o seu estado é gravíssimo. Não cremos que se salve. Está inconsciente ainda. Eu ouvi as suas últimas frases, antes de perder a noção de tudo—o tom de Benson fez-se patético. — «Benson, procure fazer justiça e que Deus o ajude».
Ao denso silêncio criado pela inesperada notícia, seguiu-se uma enorme confusão. Rush deixou-se cair abatido no banco. Sabia o que ia acontecer agora. Eliminado o bom Fox, aquele julgamento não passava de uma fantochada com o pior dos finais. Ele e os Milligan estavam condenados de antemão. Devia tê-lo suspeitado antes.
Olhou para Doris com um sorriso amargo. Ela inclinou a cabeça, compreendendo muito bem o que sucedia.
— Céus, Rush, estamos perdidos! — queixou-se Jess com impotência. — Isto é urna vigarice.
— Sempre me pareceu que sim, mas ignorava que seriam capazes de chegar a tanto.
— Já verá o júri—rugiu Slim. — Toda a cambada de cúmplices.
Rush calou-se. O juiz ia designar os membros do júri. Quando ouviu os nomes de Lou Lashwell e Scott, não se surpreendeu nada. Olhou para o comissário Trenton, o seu mais próximo guarda: estava distraído, pensando na notícia do trágico acidente do sheriff. Pensou que não seria difícil arrebatar-lhe a arma. Mas nada conseguiria com isso. Nunca poderia sair daquela ratoeira cheia de gente.
Viu Doris levantar-se e abandonar a sala do tribunal. Agora nem sequer olhou para ele. O júri acabou por ser completado pelo fúnebre Homes e um tipo nada tranquilizador, que devia ser homem ao serviço de Lashwell.
Benson declarou aberta a audiência, e a fantochada começou. Várias testemunhas depuseram sobre a rivalidade entre Matt Howland e os Milligan, assim como as ameaças proferidas contra os irmãos, a quem acusavam de terem incendiado as suas plantações. Haviam proposto a compra das propriedades, mas Matt recusara. Slim levantou-se com violência.
—Isso é indecente e intolerável! — exclamou. —Também Lashwell quis comprar essas terras. E Donlan e Barrell! Todos sabíamos que os algodoeiros de Howland eram os melhores, e por ele não nos vender não íamos queimá-los.
—Depois terá ocasião de falar, Slim— cortou secamente Benson. — Deixe continuar as testemunhas.
Slim deixou-se cair com um gesto cansado. Era inútil lutar, ele sabia-o. Jess sorriu animoso.
—Devíamos ter continuado a resistir ontem à noite. Teria sido unia morte mais digna.
—Ainda não nos enforcaram—murmurou surdamente Harry.
— Não tardarão muito — grunhiu Slim.
O julgamento deslizava sempre à volta do mesmo, e Rush Marlowe via elevar-se implacavelmente o edifício sólido da acusação. De repente sucedeu alguma coisa.
Na rua soou uma grande explosão, e a sua violência arrancou bocados de madeira da porta principal, penetrando violentamente na sala uma espessa fumarada. O público, aterrorizado, lançou-se em avalanche contra os estrados, levando na sua frente o atónito Rocky, que nem chegou a empregar a sua espingarda, como devia ser sua intenção.
Um cheiro a pólvora invadiu a sala do tribunal. Vozes e maldições fizeram da sala uma barafunda.
—Cuidado com os presos! — gritou a voz de Benson, sobre a confusão reinante.
Slim e Jess, que tinham iniciado uma tentativa de fuga, viram-na cortada por dois disparos de Larry Donlan que passaram muito próximo. Barrell e o comissário Burt também visaram os Milligan com as suas armas. Mas Rush quando ouviu a explosão, soube que era a oportunidade esperada.
Lançou-se sobre Trenton e golpeou-o brutalmente no queixo, arrebatando-lhe, com firmeza quase selvagem, a espingarda. O comissário, apanhado de surpresa, caiu como um fardo, sem opor resistência.
Amparando-se no aterrorizado cerco humano que o rodeava, colocou o cano da espingarda na fechadura da porta lateral que Treton tinha estado a guardar e apertou o gatilho duas vezes, desfazendo-o.
Em seguida caiu sobre a porta, abrindo-a de par em par e saiu expelido como uma bala para o exterior, com um bloco humano atrás de si, levado pelo impulso da avalanche. Ao sair para o ar livre, debaixo do forte sol do meio-dia, Rush procurou desviar-se para a direita a fim de não ser encurralado.
Foi então que descobriu os dois cavalos parados junto da fachada principal. Um estava selado e sem cavaleiro. O outro tinha corno cavaleiro Doris Howland, que lhe estendia um revólver.
— Sabia que podia consegui-lo, Rush! — exclamou alegremente.
E ao vê-lo já armado com o rifle, disse:
—Vamos! Rush, sem pensar mais, saltou agilmente para o cavalo e ambos os cavaleiros esporearam com rudeza as suas montadas afastando-se daquele perigoso local.
Os cavalos, mantendo-se a par, alcançaram a parte da frente do edifício, onde ainda se elevava no céu puríssimo da manhã, uma espessa fumarada. Restos de barris e caixas, feitas em bocados estavam espalhados pela calçada.
Passaram sem parar, fazendo estremecer o chão com o furioso galope das suas montadas, e bem depressa deixaram para trás a rua principal, onde se viam já alguns assombrados cidadãos. Uns disparos brotaram dos alpendres, fazendo parar os possíveis perseguidores.
Rush chegou a ver prostrados, rifle na mão, vários homens do Mississípi Lady, incluindo a própria Jeannine, que lhe acenou com a mão um sinal de despedida. Existia demasiada preocupação para evitar a fuga dos Milligan e demasiado tumulto na sala de audiência para que alguém tivesse tomado a decisão necessária para perseguir Rush Marlowe, cujo cavalo devorava terreno numa correria vertiginosa.
Doris Howland, cuja enigmática participação na fuga Rush pensava aclarar oportunamente, demonstrava ser uma amazona extraordinária que mantinha o mesmo ritmo de velocidade.
Rush olhou-a um instante. Os cabelos ao vento, o rosto afogueado, os olhos brilhantes, o seu porte decidido e de ferro, tudo o assombrou com uma rara sensação enervante. Era formosa. Doris Howland era a mulher mais formosa, enérgica e sugestiva que Rush Marlowe tinha visto em toda a sua vida de corredor de terras. E também era a primeira que lhe fazia sentir tudo aquilo cuja natureza não podia explicar.
A frenética correria continuou até que Riverwood ficou muitas milhas para trás e avistaram um bosquezinho numa elevação de terreno. E para ali se dirigiram em linha recta, de comum acordo, e já no meio e à sombra dos seus altos pinheiros, que preservavam o famoso solo do sol abrasante do meio-dia, travaram as montadas.
Rush deteve o seu cavalo em frente de uma árvore mais grossa, cuja sombra era um amável convite ao repouso, e sorriu para Doris.
— Cansada?
— Um pouco — admitiu ela.
— Isso tem fácil remédio.
— Não podemos perder tempo.
— Serão só cinco minutos — disse Rush. — Necessitamos ambos deles.
Ela não se opôs. Rush aproximou-se e ajudou-a a descer do cavalo, agarrando-a pela cintura. Quando a teve próximo de si, por um instante sentiu fraquejar toda a sua vontade. Aspirou o perfume dos seus cabelos, do seu corpo, mais suave e penetrante que o do bosque. E pensou que só por aquele momento valia a pena morrer depois na forca ou crivado de balas em qualquer canto.
Desejava continuar assim, mais uns minutos, horas, anos. Mas colocou-a no chão, e o encanto quebrou-se. Doris Howland suspirou profundamente, e não devido à corrida. Os motivos eram outros.
Com isto queria Jonathan Fox cobrir os possíveis perigos daquele julgamento. Faltavam ainda precisamente as duas máximas autoridades de Riverwood, quando introduziram na sala, no meio de um murmúrio inquietante, os quatro presos.
Rush notou a ausência de Fox e do juiz Benson, bem assim como do magistrado Mathews de Lide Rocky, e franziu o sobrolho. Cada vez gostava menos da maneira do decorrer daquele julgamento.
Estudou as saídas do vasto recinto, zelosamente guardadas, assim como o lugar destinado ao público, que se encontrava cheio por uma multidão na expectativa e hostil. Depois olhou para a porta mais próxima guardada por Trenton, e depois levantou o olhar para a galeria, demasiado alta para poder ser alcançada. Era uma estupenda ratoeira.
Rush e os Milligan, tomaram lugar nas cadeiras, em frente do estrado do júri. Nas primeiras filas de espectadores viu Doris Howland, que lhe dirigiu um olhar e um sorriso de ânimo. O «Anjo» inclinou a cabeça, sem responder. Pensava que aquele gesto de ânimo devia ser mais logicamente dirigido a Jess, o homem que a amava. Mas notou que se tivesse sido assim, ele teria sentido ciúme.
De repente abriu-se uma porta no fundo, e apareceu o juiz Benson, no seu melhor fato preto, impecável e direito. Rush, involuntariamente pensou na indumentária funerária de Homes.
Benson subiu ao estrado do juiz, e dali dirigiu--se, depois de uma pausa que permitiu fazer calar os murmúrios, a toda a assistência.
—Senhores e senhoras —disse em voz clara e vibrante. — Por causas que não compreendemos, e que de momento ignoramos, o juiz Benedict Mathews, de Litle Rocky, que teria de presidir como juiz deste processo, contra os acusados Slim, Harry e Jess Milligan e o forasteiro Rush Marlowe, não compareceu ainda em Riverwood. Assim, ante tal anomalia, e não desejando atrasar por mais tempo o funcionamento da justiça, devo informar que eu, Stuart Benson, juiz deste condado ocuparei o lugar que o meu ilustre colega não pode ocupar.
Rush levantou-se de um salto.
— Protesto! — exclamou. —Desejamos um juiz imparcial e sem influências!
— Duvida o acusado da minha integridade? — perguntou friamente o juiz, com uma luzinha brilhante nos olhos.
—Isso não é o que nos prometeu! —gritou Rush.
— Eu não prometi nada.
— Mas o sheriff Fox!...
—Ah, Fox... —Benson inclinou a cabeça com tristeza. — O velho amigo Jonathan não poderá já cumprir nenhuma promessa... se não se der um milagre.
Fez-se um espantoso silêncio. Rush empalideceu, e os seus olhos cravaram-se agudamente no juiz.
—Que quer dizer, Benson? — exigiu com voz enrouquecida.
O juiz permaneceu calado uns segundos, enquanto involuntariamente, o olhar de Rush se encontrava com o da angustiada Doris. Os Milligan, de expressão tensa, aguardavam o que se ia seguir.
—É algo lamentável, meus amigos — falou Benson com pesaroso acento dirigindo-se a todos. —Um infeliz acidente, que ninguém podia prever. Ao entrar nos estábulos para sair a cavalo ao encontro do juiz Mathews, parece que um dos animais se espantou, inesperadamente, golpeando o crânio de Jonathan com as patas. O sheriff caiu inconsciente, e recebeu ainda várias patadas do animal, antes que eu tivesse tempo de acalmar o espantado bicho. Neste momento, o seu estado é gravíssimo. Não cremos que se salve. Está inconsciente ainda. Eu ouvi as suas últimas frases, antes de perder a noção de tudo—o tom de Benson fez-se patético. — «Benson, procure fazer justiça e que Deus o ajude».
Ao denso silêncio criado pela inesperada notícia, seguiu-se uma enorme confusão. Rush deixou-se cair abatido no banco. Sabia o que ia acontecer agora. Eliminado o bom Fox, aquele julgamento não passava de uma fantochada com o pior dos finais. Ele e os Milligan estavam condenados de antemão. Devia tê-lo suspeitado antes.
Olhou para Doris com um sorriso amargo. Ela inclinou a cabeça, compreendendo muito bem o que sucedia.
— Céus, Rush, estamos perdidos! — queixou-se Jess com impotência. — Isto é urna vigarice.
— Sempre me pareceu que sim, mas ignorava que seriam capazes de chegar a tanto.
— Já verá o júri—rugiu Slim. — Toda a cambada de cúmplices.
Rush calou-se. O juiz ia designar os membros do júri. Quando ouviu os nomes de Lou Lashwell e Scott, não se surpreendeu nada. Olhou para o comissário Trenton, o seu mais próximo guarda: estava distraído, pensando na notícia do trágico acidente do sheriff. Pensou que não seria difícil arrebatar-lhe a arma. Mas nada conseguiria com isso. Nunca poderia sair daquela ratoeira cheia de gente.
Viu Doris levantar-se e abandonar a sala do tribunal. Agora nem sequer olhou para ele. O júri acabou por ser completado pelo fúnebre Homes e um tipo nada tranquilizador, que devia ser homem ao serviço de Lashwell.
Benson declarou aberta a audiência, e a fantochada começou. Várias testemunhas depuseram sobre a rivalidade entre Matt Howland e os Milligan, assim como as ameaças proferidas contra os irmãos, a quem acusavam de terem incendiado as suas plantações. Haviam proposto a compra das propriedades, mas Matt recusara. Slim levantou-se com violência.
—Isso é indecente e intolerável! — exclamou. —Também Lashwell quis comprar essas terras. E Donlan e Barrell! Todos sabíamos que os algodoeiros de Howland eram os melhores, e por ele não nos vender não íamos queimá-los.
—Depois terá ocasião de falar, Slim— cortou secamente Benson. — Deixe continuar as testemunhas.
Slim deixou-se cair com um gesto cansado. Era inútil lutar, ele sabia-o. Jess sorriu animoso.
—Devíamos ter continuado a resistir ontem à noite. Teria sido unia morte mais digna.
—Ainda não nos enforcaram—murmurou surdamente Harry.
— Não tardarão muito — grunhiu Slim.
O julgamento deslizava sempre à volta do mesmo, e Rush Marlowe via elevar-se implacavelmente o edifício sólido da acusação. De repente sucedeu alguma coisa.
Na rua soou uma grande explosão, e a sua violência arrancou bocados de madeira da porta principal, penetrando violentamente na sala uma espessa fumarada. O público, aterrorizado, lançou-se em avalanche contra os estrados, levando na sua frente o atónito Rocky, que nem chegou a empregar a sua espingarda, como devia ser sua intenção.
Um cheiro a pólvora invadiu a sala do tribunal. Vozes e maldições fizeram da sala uma barafunda.
—Cuidado com os presos! — gritou a voz de Benson, sobre a confusão reinante.
Slim e Jess, que tinham iniciado uma tentativa de fuga, viram-na cortada por dois disparos de Larry Donlan que passaram muito próximo. Barrell e o comissário Burt também visaram os Milligan com as suas armas. Mas Rush quando ouviu a explosão, soube que era a oportunidade esperada.
Lançou-se sobre Trenton e golpeou-o brutalmente no queixo, arrebatando-lhe, com firmeza quase selvagem, a espingarda. O comissário, apanhado de surpresa, caiu como um fardo, sem opor resistência.
Amparando-se no aterrorizado cerco humano que o rodeava, colocou o cano da espingarda na fechadura da porta lateral que Treton tinha estado a guardar e apertou o gatilho duas vezes, desfazendo-o.
Em seguida caiu sobre a porta, abrindo-a de par em par e saiu expelido como uma bala para o exterior, com um bloco humano atrás de si, levado pelo impulso da avalanche. Ao sair para o ar livre, debaixo do forte sol do meio-dia, Rush procurou desviar-se para a direita a fim de não ser encurralado.
Foi então que descobriu os dois cavalos parados junto da fachada principal. Um estava selado e sem cavaleiro. O outro tinha corno cavaleiro Doris Howland, que lhe estendia um revólver.
— Sabia que podia consegui-lo, Rush! — exclamou alegremente.
E ao vê-lo já armado com o rifle, disse:
—Vamos! Rush, sem pensar mais, saltou agilmente para o cavalo e ambos os cavaleiros esporearam com rudeza as suas montadas afastando-se daquele perigoso local.
Os cavalos, mantendo-se a par, alcançaram a parte da frente do edifício, onde ainda se elevava no céu puríssimo da manhã, uma espessa fumarada. Restos de barris e caixas, feitas em bocados estavam espalhados pela calçada.
Passaram sem parar, fazendo estremecer o chão com o furioso galope das suas montadas, e bem depressa deixaram para trás a rua principal, onde se viam já alguns assombrados cidadãos. Uns disparos brotaram dos alpendres, fazendo parar os possíveis perseguidores.
Rush chegou a ver prostrados, rifle na mão, vários homens do Mississípi Lady, incluindo a própria Jeannine, que lhe acenou com a mão um sinal de despedida. Existia demasiada preocupação para evitar a fuga dos Milligan e demasiado tumulto na sala de audiência para que alguém tivesse tomado a decisão necessária para perseguir Rush Marlowe, cujo cavalo devorava terreno numa correria vertiginosa.
Doris Howland, cuja enigmática participação na fuga Rush pensava aclarar oportunamente, demonstrava ser uma amazona extraordinária que mantinha o mesmo ritmo de velocidade.
Rush olhou-a um instante. Os cabelos ao vento, o rosto afogueado, os olhos brilhantes, o seu porte decidido e de ferro, tudo o assombrou com uma rara sensação enervante. Era formosa. Doris Howland era a mulher mais formosa, enérgica e sugestiva que Rush Marlowe tinha visto em toda a sua vida de corredor de terras. E também era a primeira que lhe fazia sentir tudo aquilo cuja natureza não podia explicar.
A frenética correria continuou até que Riverwood ficou muitas milhas para trás e avistaram um bosquezinho numa elevação de terreno. E para ali se dirigiram em linha recta, de comum acordo, e já no meio e à sombra dos seus altos pinheiros, que preservavam o famoso solo do sol abrasante do meio-dia, travaram as montadas.
Rush deteve o seu cavalo em frente de uma árvore mais grossa, cuja sombra era um amável convite ao repouso, e sorriu para Doris.
— Cansada?
— Um pouco — admitiu ela.
— Isso tem fácil remédio.
— Não podemos perder tempo.
— Serão só cinco minutos — disse Rush. — Necessitamos ambos deles.
Ela não se opôs. Rush aproximou-se e ajudou-a a descer do cavalo, agarrando-a pela cintura. Quando a teve próximo de si, por um instante sentiu fraquejar toda a sua vontade. Aspirou o perfume dos seus cabelos, do seu corpo, mais suave e penetrante que o do bosque. E pensou que só por aquele momento valia a pena morrer depois na forca ou crivado de balas em qualquer canto.
Desejava continuar assim, mais uns minutos, horas, anos. Mas colocou-a no chão, e o encanto quebrou-se. Doris Howland suspirou profundamente, e não devido à corrida. Os motivos eram outros.
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