Os quatro homens olharam-se em silêncio. Aquilo começava a adquirir forma. Rush Marlowe começou a crer na inocência dos Milligan, ou pelo menos em que, fossem o que fossem, Lashwell, ou qualquer outro, procuravam suprimi--los.
—É uma pena, rapazes—disse Rush. —Se estivesse vivo Burton, ter-nos-ia podido dizer alguma coisa interessante.
— Não devia ter-me precipitado — queixou-se Jess, arrependido. — Mas estava desejando caçar o cobarde que...
— Compreendo-o, Jess — sorriu Rush. — Agora não remedeia nada apoquentar-se. A coisa já não tem remédio.
—Que fazemos com ele?
— Deixamo-lo aí —disse secamente Slim. — Será um bom aviso para Lou Lashwell.
—Vamos para casa. Se continuamos na cidade, ainda podem complicar-se mais as coisas.
—Bom, amigos, parece-me muito prudente a ideia de Harry— interveio Rush. — E eu deixo-os. Alegro-me por ter contribuído um pouco para resolver a situação.
—Deixa-nos já, Marlowe?
—Sim, Slim. Volto para o barco. Prefiro Jeannine aos atiradores emboscados.
Riram todos e Slim estendeu a mão ao jogador.
—Até outro dia, Marlowe, e perdoe os sarilhos em que o metemos sem ter culpa nenhuma.
—Desculpado, Slim—sorriu o «Anjo», estendendo-lhe a mão.
—Quando quiser visitar-nos, siga pela margem do rio e dirija-se para o Norte. As primeiras plantações que encontrar a umas três milhas daqui, com o nome de «Cotton Land», são as nossas.
—De acordo, rapazes. Até outro dia.
Afastaram-se os três em direção ao estábulo próximo do saloon de Big Wilkes, onde guardavam os cavalos. Rush viu-os afastarem-se e voltou a olhar o morto.
O barbudo de olhos malignos, que naquela manhã incitara os outros a atacar Jess no saloon, tinha sido capataz de Lashwell nas suas terras algodoeiras. Isso indicava que podia ser muito bem Lashwell quem preparou a emboscada. Mas, porquê? Ninguém leva a tal extremo o seu ódio, por simples amizade com um morto. E além disso o fazendeiro não parecia homem muito dado a tão surpreendentes reações. Por que lutaria com tão afinco o rico fazendeiro para eliminar os Milligan? Teria sido ele que assassinou Matt Howland e pretendia deitar as culpas aos outros? Absorvido nestes pensamentos, Rush não deu pela proximidade de Jonathan Fox, senão quando viu na sua frente a delgada figura do velho sheriff e escutou a sua voz glacial:
—Desta vez foste apanhado, Rush. Não te mexas.
O jogador olhou serenamente o representante da Lei.
—Estás bêbedo, Fox? —grunhiu, aborrecido.
Mas o sheriff continuou impassível, apontando--lhe o seu «Colt»:
—Eu não, mas tu deves estar, para haveres cometido a asneira de assassinar o pobre Burton deste modo.
—Estás louco, amigo. Burton atacou-nos com um rifle.
—A quem?
—Aos Milligan e a mim.
Ouviu-se o galope de cavalos afastando-se da cidade. Rush fez um gesto.
— Ouve! São eles, Fox.
—E são as únicas testemunhas que tens que Burton te atacou?
— Atacou-nos aos quatro, Fox. Não deturpes as coisas.
—Não deturpo nada — disse, secamente. —Quem viu o suposto ataque?
— Suponho que ninguém, mas deve tê-lo ouvido toda a população.
—Isso não pega, Marlowe. E os Milligan não são testemunhas dignas de crédito. Numa acusação de assassinato, não poderás utilizar um truque desses.
—Assassinato? Insinuas que assassinei esse tipo?
— Não insinuo nada, Marlowe. Acuso.
—Isso é um disparate! Se conservas o juízo...
—Sim, conservo-me no meu perfeito juízo. Levar-te-ei agora mesmo para a prisão da cidade. Amanhã preparamos a acusação legalmente.
— Não podes fazer um disparate destes, Fox. Não me levarás preso! O revólver do sheriff soou desagradavelmente ao ser engatilhado.
— Julgas isso, Marlowe? — interrogou com aspereza. — Não te aconselho resistência. Entrega--me as armas.
— Ouve, Fox, isto não é normal em ti. Sabes que não assassinei Burton. Que se passa contigo? Quem te ordenou que o fizesses?
—Dá-me as tuas armas ou disparo—replicou o sheriff, decidido. — Não penso discutir as tuas teorias.
Rush começou a sentir-se desesperado. Ali ocorria algo estranho. Não era possível que um homem corno Fox atuasse assim por iniciativa própria. A tenebrosa conspiração ia convertê-lo também em vítima das circunstâncias. Se não entregasse os revólveres, talvez Fox disparasse. E ainda que não pensasse fazê-lo, era uma alternativa que não, podia admitir. Optou por obedecer-lhe.
Tirou ambos os revólveres e pegando-lhes pelos canos, estendeu-os ao sheriff. Fox segurou nas armas e disse:
—A caminho, Marlowe. E não tentes nada, ou crivo-te de balas.
Rush começou a andar. Cada vez doía-lhe mais a ferida, e notava as pernas cada vez mais débeis ao caminhar. Continuava a perder sangue.
— Preciso tratar-me, Fox — começou a dizer.
— Na prisão... o médico irá ver-te. Vamos.
E assim começaram a andar pelo meio da rua principal. Rush caminhava a umas três jardas na frente de Fox, que caminhava com firmeza, sem afastar a vista dele.
— Que pensas fazer comigo? — perguntou o jogador.
—Não sei. Um tribunal julgar-te-á legalmente por homicídio e cumplicidade com os Milligan. E depois veremos o veredicto.
—É uma canalhice, Fox, e tu sabes isso muito bem — Rush falou com uma calma fria. — Não sei se é Lashwell ou outro pirata igual que te paga para fazeres isto...
— Rush! — interrompeu o sheriff, em tom azedo. —Se voltas a dizer isso, mato-te sem contemplações.
O jogador riu sardonicamente e continuou em silêncio. As feições de Jonathan Fox eram rugosas e sombrias. Nenhum falou até chegarem ao escritório do sheriff, e prisão municipal de Riverwood.
Entraram no gabinete onde a débil luz do candeeiro de petróleo iluminava as desnudas paredes, só salpicadas pelas sombras de cartazes pedindo a captura de célebres bandidos.
O olhar de Rush não se fixou nos cartazes, mas sim na jovem de cabelo castanho e de rosto tão belo como mármore, que se encontrava recostada numa descolorida cadeira. A luz do candeeiro arrancou reflexos quase dourados das suas escuras pupilas quando Rush entrou seguido de Fox.
—Esse não é nenhum Milligan, sheriff— disse em tom incisivo.
— Não, mas é um dos seus cúmplices. Um jogador do barco que está no cais.
— Interveio, acaso, na morte de meu pai?
—Isso não sabemos, embora julgue que não.
Rush examinou com curiosidade Doris Howland, apreciando pela primeira vez as suas negras roupas. Talvez tivesse normalmente uma cor saudável, mas agora estava pálida, A jovem levantou-se, e aproximou-se de Rush.
—É então amigo dos assassinos de meu pai?
— Não é verdade, menina. Eles não mataram o seu pai.
A mão, pequena, mas enérgica, estalou duas vezes no rosto sereno do «Anjo» cujos olhos relam-pejaram um instante, voltando rapidamente à sua primitiva expressão benigna.
— Menina Howland! —reprovou secamente o sheriff.
— Mente, cobarde! — exclamou Doris, olhando furiosamente Rush. — Só eles são capazes de atirar sobre um homem velho e confiado. Ele tinha razão. Tinha razão!
Rompeu em histéricos soluços e voltou a sentar--se. A Rush, aquela situação pareceu-lhe absurda.
—Encerre-me de uma vez, Fox— pediu cansado. — Prefiro isso a aguentar histerismos ridículos.
Fox, sem largar a pistola, encaminhou-se para a cancela que separava a cela do gabinete trazendo um molho de chaves. Ela continuou a soluçar. Ao chegar à porta da cela, Rush sentiu a vista nublar-se-lhe e uma dor aguda subiu pelo braço. Fox notou a sua repentina palidez e o esforço que fez para não cair.
— Eh, Rush, que se passa? — perguntou alarmado.
Rush pensou velozmente. Era a melhor ocasião, talvez a última que se lhe apresentava. Fechou os olhos, deixou escapar um gemido e caiu no chão com um surdo golpe.
— Rush! — ouviu exclamar ao sheriff.
Continuou imóvel, enquanto o seu braço, sacudido por violentos estremecimentos, voltava a sangrar abundantemente.
— Diabo, a ferida é séria! —grunhiu Fox, retirando a mão manchada de vermelho.
—Está ferido! —falou agora a voz de Doris, aproximando-se.
—E vai ficar sem sangue se não o socorremos. Segure na pistola, por favor, menina Howland, enquanto preparo água, álcool e ligaduras. Nem a um assassino se deixa morrer sem tentar salvá-lo.
O jogador não tentou nada, notando que por um momento perdia o conhecimento. Sentiu que lhe lavavam a ferida. Depois passaram-lhe um pano embebido em álcool e retorceu-se de dor, continuando a fingir que estava inconsciente.
Sentiu um grato estremecimento quando uma mão pequena e suave, tão diferente da do sheriff, lhe colocou um pedaço de algodão cheio de álcool e depois lhe ligou a ferida. Doris Howland sabia fazer as coisas. Quase que deixou escapar um gemido de alívio, quando o deixaram os dois improvisados enfermeiros.
— Chamo o médico, sheriff? —perguntou Doris.
—Não creio que seja necessário. De todos os modos pode avisá-lo quando se for embora. E fará bem em voltar já para casa. Lou Lashwell e os meus comissários não tardarão a chegar, e começarão a recrutar gente para capturar esta noite ainda os Milligan.
— Um linchamento? — e a voz dela estremeceu visivelmente.
— Não, enquanto eu possa impedi-lo. Mas eles não se renderão, e será necessário atacá-los nas suas plantações. Têm mais de vinte homens armados lá. «Cotton Land» é difícil de ocupar-se nestas condições. Com a ajuda da população conseguiremos apanhá-los.
Com infinitas precauções, Rush entreabria os olhos de modo impercetível. O que estava ouvindo era grave. Por muito que o sheriff e os seus ajudantes tentassem, a multidão, incitada por Lashwell e os seus cúmplices, enforcariam em qualquer árvore os três irmãos. Depois, também ele seria enforcado por aquele bando de assassinos. A morte de Burton era um motivo tão bom como qualquer outro.
As suas pupilas, entre o véu das pestanas, viram a cena. O sheriff segurava ainda os medicamentos e as ligaduras, enquanto ela lavava as mãos no lavatório.
Viu o «Colt» de Jonathan Fox sobre a mesa, muito próximo da beira do seu lado. Não o haviam tirado do umbral da cela. Só dois passos... e a arma seria sua. Parecia tudo tão simples, que teve medo do que iria acontecer naquela noite em Riverwood se não chegasse a sentir entre os dedos aquele cabo de nácar.
Um só movimento mal calculado, uma leve indecisão, ou uma simples sensação de perigo que se apoderasse do sheriff ou de Doris, podia ser o fracasso. E com ele, inevitavelmente, a morte de várias pessoas. Os Milligan, outros inocentes cujo sangue talvez corresse e... o dele mesmo... Todos pendentes de uma ação aparentemente tão simples. E, sem dúvida, não era fácil. Isso sabia Rush demasiado bem, e era o que mais o assustava.
—É uma pena, rapazes—disse Rush. —Se estivesse vivo Burton, ter-nos-ia podido dizer alguma coisa interessante.
— Não devia ter-me precipitado — queixou-se Jess, arrependido. — Mas estava desejando caçar o cobarde que...
— Compreendo-o, Jess — sorriu Rush. — Agora não remedeia nada apoquentar-se. A coisa já não tem remédio.
—Que fazemos com ele?
— Deixamo-lo aí —disse secamente Slim. — Será um bom aviso para Lou Lashwell.
—Vamos para casa. Se continuamos na cidade, ainda podem complicar-se mais as coisas.
—Bom, amigos, parece-me muito prudente a ideia de Harry— interveio Rush. — E eu deixo-os. Alegro-me por ter contribuído um pouco para resolver a situação.
—Deixa-nos já, Marlowe?
—Sim, Slim. Volto para o barco. Prefiro Jeannine aos atiradores emboscados.
Riram todos e Slim estendeu a mão ao jogador.
—Até outro dia, Marlowe, e perdoe os sarilhos em que o metemos sem ter culpa nenhuma.
—Desculpado, Slim—sorriu o «Anjo», estendendo-lhe a mão.
—Quando quiser visitar-nos, siga pela margem do rio e dirija-se para o Norte. As primeiras plantações que encontrar a umas três milhas daqui, com o nome de «Cotton Land», são as nossas.
—De acordo, rapazes. Até outro dia.
Afastaram-se os três em direção ao estábulo próximo do saloon de Big Wilkes, onde guardavam os cavalos. Rush viu-os afastarem-se e voltou a olhar o morto.
O barbudo de olhos malignos, que naquela manhã incitara os outros a atacar Jess no saloon, tinha sido capataz de Lashwell nas suas terras algodoeiras. Isso indicava que podia ser muito bem Lashwell quem preparou a emboscada. Mas, porquê? Ninguém leva a tal extremo o seu ódio, por simples amizade com um morto. E além disso o fazendeiro não parecia homem muito dado a tão surpreendentes reações. Por que lutaria com tão afinco o rico fazendeiro para eliminar os Milligan? Teria sido ele que assassinou Matt Howland e pretendia deitar as culpas aos outros? Absorvido nestes pensamentos, Rush não deu pela proximidade de Jonathan Fox, senão quando viu na sua frente a delgada figura do velho sheriff e escutou a sua voz glacial:
—Desta vez foste apanhado, Rush. Não te mexas.
O jogador olhou serenamente o representante da Lei.
—Estás bêbedo, Fox? —grunhiu, aborrecido.
Mas o sheriff continuou impassível, apontando--lhe o seu «Colt»:
—Eu não, mas tu deves estar, para haveres cometido a asneira de assassinar o pobre Burton deste modo.
—Estás louco, amigo. Burton atacou-nos com um rifle.
—A quem?
—Aos Milligan e a mim.
Ouviu-se o galope de cavalos afastando-se da cidade. Rush fez um gesto.
— Ouve! São eles, Fox.
—E são as únicas testemunhas que tens que Burton te atacou?
— Atacou-nos aos quatro, Fox. Não deturpes as coisas.
—Não deturpo nada — disse, secamente. —Quem viu o suposto ataque?
— Suponho que ninguém, mas deve tê-lo ouvido toda a população.
—Isso não pega, Marlowe. E os Milligan não são testemunhas dignas de crédito. Numa acusação de assassinato, não poderás utilizar um truque desses.
—Assassinato? Insinuas que assassinei esse tipo?
— Não insinuo nada, Marlowe. Acuso.
—Isso é um disparate! Se conservas o juízo...
—Sim, conservo-me no meu perfeito juízo. Levar-te-ei agora mesmo para a prisão da cidade. Amanhã preparamos a acusação legalmente.
— Não podes fazer um disparate destes, Fox. Não me levarás preso! O revólver do sheriff soou desagradavelmente ao ser engatilhado.
— Julgas isso, Marlowe? — interrogou com aspereza. — Não te aconselho resistência. Entrega--me as armas.
— Ouve, Fox, isto não é normal em ti. Sabes que não assassinei Burton. Que se passa contigo? Quem te ordenou que o fizesses?
—Dá-me as tuas armas ou disparo—replicou o sheriff, decidido. — Não penso discutir as tuas teorias.
Rush começou a sentir-se desesperado. Ali ocorria algo estranho. Não era possível que um homem corno Fox atuasse assim por iniciativa própria. A tenebrosa conspiração ia convertê-lo também em vítima das circunstâncias. Se não entregasse os revólveres, talvez Fox disparasse. E ainda que não pensasse fazê-lo, era uma alternativa que não, podia admitir. Optou por obedecer-lhe.
Tirou ambos os revólveres e pegando-lhes pelos canos, estendeu-os ao sheriff. Fox segurou nas armas e disse:
—A caminho, Marlowe. E não tentes nada, ou crivo-te de balas.
Rush começou a andar. Cada vez doía-lhe mais a ferida, e notava as pernas cada vez mais débeis ao caminhar. Continuava a perder sangue.
— Preciso tratar-me, Fox — começou a dizer.
— Na prisão... o médico irá ver-te. Vamos.
E assim começaram a andar pelo meio da rua principal. Rush caminhava a umas três jardas na frente de Fox, que caminhava com firmeza, sem afastar a vista dele.
— Que pensas fazer comigo? — perguntou o jogador.
—Não sei. Um tribunal julgar-te-á legalmente por homicídio e cumplicidade com os Milligan. E depois veremos o veredicto.
—É uma canalhice, Fox, e tu sabes isso muito bem — Rush falou com uma calma fria. — Não sei se é Lashwell ou outro pirata igual que te paga para fazeres isto...
— Rush! — interrompeu o sheriff, em tom azedo. —Se voltas a dizer isso, mato-te sem contemplações.
O jogador riu sardonicamente e continuou em silêncio. As feições de Jonathan Fox eram rugosas e sombrias. Nenhum falou até chegarem ao escritório do sheriff, e prisão municipal de Riverwood.
Entraram no gabinete onde a débil luz do candeeiro de petróleo iluminava as desnudas paredes, só salpicadas pelas sombras de cartazes pedindo a captura de célebres bandidos.
O olhar de Rush não se fixou nos cartazes, mas sim na jovem de cabelo castanho e de rosto tão belo como mármore, que se encontrava recostada numa descolorida cadeira. A luz do candeeiro arrancou reflexos quase dourados das suas escuras pupilas quando Rush entrou seguido de Fox.
—Esse não é nenhum Milligan, sheriff— disse em tom incisivo.
— Não, mas é um dos seus cúmplices. Um jogador do barco que está no cais.
— Interveio, acaso, na morte de meu pai?
—Isso não sabemos, embora julgue que não.
Rush examinou com curiosidade Doris Howland, apreciando pela primeira vez as suas negras roupas. Talvez tivesse normalmente uma cor saudável, mas agora estava pálida, A jovem levantou-se, e aproximou-se de Rush.
—É então amigo dos assassinos de meu pai?
— Não é verdade, menina. Eles não mataram o seu pai.
A mão, pequena, mas enérgica, estalou duas vezes no rosto sereno do «Anjo» cujos olhos relam-pejaram um instante, voltando rapidamente à sua primitiva expressão benigna.
— Menina Howland! —reprovou secamente o sheriff.
— Mente, cobarde! — exclamou Doris, olhando furiosamente Rush. — Só eles são capazes de atirar sobre um homem velho e confiado. Ele tinha razão. Tinha razão!
Rompeu em histéricos soluços e voltou a sentar--se. A Rush, aquela situação pareceu-lhe absurda.
—Encerre-me de uma vez, Fox— pediu cansado. — Prefiro isso a aguentar histerismos ridículos.
Fox, sem largar a pistola, encaminhou-se para a cancela que separava a cela do gabinete trazendo um molho de chaves. Ela continuou a soluçar. Ao chegar à porta da cela, Rush sentiu a vista nublar-se-lhe e uma dor aguda subiu pelo braço. Fox notou a sua repentina palidez e o esforço que fez para não cair.
— Eh, Rush, que se passa? — perguntou alarmado.
Rush pensou velozmente. Era a melhor ocasião, talvez a última que se lhe apresentava. Fechou os olhos, deixou escapar um gemido e caiu no chão com um surdo golpe.
— Rush! — ouviu exclamar ao sheriff.
Continuou imóvel, enquanto o seu braço, sacudido por violentos estremecimentos, voltava a sangrar abundantemente.
— Diabo, a ferida é séria! —grunhiu Fox, retirando a mão manchada de vermelho.
—Está ferido! —falou agora a voz de Doris, aproximando-se.
—E vai ficar sem sangue se não o socorremos. Segure na pistola, por favor, menina Howland, enquanto preparo água, álcool e ligaduras. Nem a um assassino se deixa morrer sem tentar salvá-lo.
O jogador não tentou nada, notando que por um momento perdia o conhecimento. Sentiu que lhe lavavam a ferida. Depois passaram-lhe um pano embebido em álcool e retorceu-se de dor, continuando a fingir que estava inconsciente.
Sentiu um grato estremecimento quando uma mão pequena e suave, tão diferente da do sheriff, lhe colocou um pedaço de algodão cheio de álcool e depois lhe ligou a ferida. Doris Howland sabia fazer as coisas. Quase que deixou escapar um gemido de alívio, quando o deixaram os dois improvisados enfermeiros.
— Chamo o médico, sheriff? —perguntou Doris.
—Não creio que seja necessário. De todos os modos pode avisá-lo quando se for embora. E fará bem em voltar já para casa. Lou Lashwell e os meus comissários não tardarão a chegar, e começarão a recrutar gente para capturar esta noite ainda os Milligan.
— Um linchamento? — e a voz dela estremeceu visivelmente.
— Não, enquanto eu possa impedi-lo. Mas eles não se renderão, e será necessário atacá-los nas suas plantações. Têm mais de vinte homens armados lá. «Cotton Land» é difícil de ocupar-se nestas condições. Com a ajuda da população conseguiremos apanhá-los.
Com infinitas precauções, Rush entreabria os olhos de modo impercetível. O que estava ouvindo era grave. Por muito que o sheriff e os seus ajudantes tentassem, a multidão, incitada por Lashwell e os seus cúmplices, enforcariam em qualquer árvore os três irmãos. Depois, também ele seria enforcado por aquele bando de assassinos. A morte de Burton era um motivo tão bom como qualquer outro.
As suas pupilas, entre o véu das pestanas, viram a cena. O sheriff segurava ainda os medicamentos e as ligaduras, enquanto ela lavava as mãos no lavatório.
Viu o «Colt» de Jonathan Fox sobre a mesa, muito próximo da beira do seu lado. Não o haviam tirado do umbral da cela. Só dois passos... e a arma seria sua. Parecia tudo tão simples, que teve medo do que iria acontecer naquela noite em Riverwood se não chegasse a sentir entre os dedos aquele cabo de nácar.
Um só movimento mal calculado, uma leve indecisão, ou uma simples sensação de perigo que se apoderasse do sheriff ou de Doris, podia ser o fracasso. E com ele, inevitavelmente, a morte de várias pessoas. Os Milligan, outros inocentes cujo sangue talvez corresse e... o dele mesmo... Todos pendentes de uma ação aparentemente tão simples. E, sem dúvida, não era fácil. Isso sabia Rush demasiado bem, e era o que mais o assustava.
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