quarta-feira, 17 de agosto de 2022

CLF002.07 Assalto à diligência durante as festas. Novas acusações falsas


— Fizeram-me perder o afeto de todos. Ele tem razão. São uns cobardes. Eu não tinha autorizado nada.

— Mas estavas desejando que matassem esse rapaz e ele deu conta disso...

— Os dois acabarão com vocês! — augurou a rapariga. — Qualquer deles é mais do que suficiente para acabar com vocês... Que medo apanharam!

— Foi uma surpresa!

— Não digas tolices! O que caiu morto ia disparar sobre ele. Há uma grande diferença na rapidez, como vocês puderam apreciar e por isso tiveram medo.

— Minha filha tem razão. Não houve vantagem e esses dois rapazes matarão todos que os defrontarem. E parece-me que Joan deixou de ter fitas nos torneios e exercícios. Esses dois rapazes bastam para não deixarem escapar nem uma só.

— Hoje tomo eu parte — disse Bowler. — Não esqueças, Milnor.

— É o mesmo. Se eles tomarem parte, ganhar-te-ão...

— És muito astuto! Queres defrontar. Não julgues que os temo, embora confesse que me assustei ao ver a fronte de Bristol ser feita em pedaços pela bala...

— Como a tua, se o provocares — disse Milnor.

 

*

 

Os vaqueiros esperavam que Chester e Pete tomassem parte nos torneios e preparavam-se para apostar todas as suas economias a favor deles. Os amigos de Bowler, aconselhados por este e por Fairmont, aceitavam todas as apostas que lhes propunham. Um dos convidados de Milnor dizia aos seus amigos:

— Não me agrada esse rapaz... Sabe os nossos nomes e conhece-nos! O que temos que fazer, é partir quanto antes. Acontecer-nos-á o mesmo que aconteceu a Bristol, se esperarmos que terminem os exercícios!

— Vocês é que têm a culpa — acusou Milnor. — Eu avisei-os de que era uma loucura vir a um sítio onde se celebram torneios que atraem muita gente. Há sempre o perigo de que alguém os conheça de longe. E esse rapaz é um dos que os conheceu de longe.

— Já não são horas de protestar. O que é preciso fazer é sair daqui, enquanto houver tempo de fazê-lo.

Discutiram muito.

Tracy aproximara-se de Joan, para lhe dizer:

— Deves estar tranquila. Já não nos escapará uma só fita.

— Não creio que possam consegui-lo, mas para ser sincera, asseguro-te que daria tudo o que tenho para continuar a ser a Rainha da Festa, ainda que eles não queiram — confessou a rapariga.

— Pois asseguro-te que, sem que dês nada do que é teu, serás Rainha por direito próprio.

Joan sorriu ao ouvir as palavras do capataz.

O xerife estava também a dar conselhos aos dois rapazes.

— Nada de tomar parte nos exercícios de lançamento de faca. Não devem fazer com que se riam de vocês. Quem intervém neles é Bowler, que ganhou no Texas e na cidade de El Passo, donde são os melhores lançadores.

— Não faça isso, xerife! — disse Pete — Eu e seu sobrinho também sabemos o que isso é.

— Mas não como Bowler. Não me agrada que se riam dos dois...

— Verá como não é assim...

— Vocês são teimosos. Compreendo que meu sobrinho o seja, porque é como eu. Mas tu...

Pete sorriu.

— Eu nasci longe do Texas, mas é o mesmo —afirmou.

— Deves deixar que, pelo menos, tentemos vencer Bowler, já que estás tão seguro de que ele é invencível — disse Chester a seu tio.

— É inútil falar... Estou seguro de que vais fazer o que queres...

— Todos os vaqueiros apostaram as suas economias a nosso favor. Não podemos deixar que lhes levem o dinheiro sem luta. Se perdermos não haverá remorso para nós. O que não pode fazer-se é abandoná-los.

— Estou de acordo com Chester! — disse Pete.

Quando a rapariga voltava com todos, depois de um passeio, até à parte em que ia celebrar-se o exercício, Tracy disse:

— Podes estar tranquila. Isto não é como ontem. Bowler não tem tido rival em parte alguma, a lançar a faca.

— Mas não sabemos o que esses rapazes são capazes de fazer.

— Asseguro-te que nenhum deles pode igualar-se a Bowler. Já vês se terei confiança ou não nele, pois estou jogando tudo quanto possuo — disse Tracy.

— Eu não ponho em dúvida a tua confiança em Bowler — retorquiu Joan — O que digo e é preciso admitir como sensato, é que não sabem nada do que eles são capazes de fazer.

— Não se fala mais nesse assunto — interrompeu Milnor, o pai de Joan — A mim, o que me preocupa é que, se eles hoje também ganharem, não haverá quem defronte um só cow-boy contra eles.

— Se tivessem visto esta manhã, Bowler a treinar-se, jogariam a vida por ele — exclamou um vaqueiro.

— Já sei que és o mais interessado em matar o sobrinho do xerife. O outro não me importa. Mas se o matasses, dar-te-ia mil dólares. «Deves dizer que o melhor meio de demonstrar a tua superioridade é um duelo de morte.

— Escuta, Bowler — disse o velho Milnor — Se provocares esse rapaz para uma luta, enforcar-nos-ão. sem que possamos evitá-lo. Nada de cometer tolices.»

Ipsurich fez um sinal a Bowler e este, sorrindo, encolheu os ombros.

— Tem em conta, Ipsurich, que se ele o provocar, direi que foste tu que o impeliu a fazê-lo. Não quero que me pendurem por coisas que não fiz.

— Se ele o provocar — replicou o interpelado, depois de Bowler afastar-se para o centro da paliçada — será exclusivamente por sua conta e eu não saberei nada.

— Mas como eu vi que lhe davas parte do que lhe ofereceste, é fácil acreditarem mais em mim do que em ti.

— É melhor que não tenhas que dizer nada para não andarmos sempre a discutir.

— O que não quero é que me enforquem por tua culpa.

— Não me agrada nada esse rapaz que nos conhece — declarou Ipsurich.

— A culpa é só de vocês. Eu disse-lhes muitas vezes que não deviam vir!...

Acabaram por separar-se, a fim de presenciarem o exercício, cada um em lugar diferente.

 

*

 

A rapariga continuava rodeada dos seus amigos e admiradores. — Aviso-os de que não estou tão convencida do triunfo de Bowler, como Tracy e meu pai — disse-lhes — Se esses rapazes se resolverem a tomar parte, depois do que disseram, é porque estão certos do triunfo.

— Tu verás que, quando presenciarem o que Bowler é capaz de fazer, se retiram para não sofrerem a vergonha da derrota — disse Tracy.

Bowler estava tentado a provocar Chester para uma luta de morte. Quando chegou o momento de inscrever-se para o exercício, ao ver os dois amigos, gritou:

— É com o sobrinho do xerife que quero defrontar-me.

— Não se trata aqui de defrontar ninguém! — disse o xerife — Todos tomam parte e o mais certo e o que menos tempo empregar é que ganhará.

— Parece-me que o que quer dizer — interveio Chester — é que, para saber qual dos dois é mais certo e rápido, há um meio que não falha. Não é verdade que é isso o que te pediram que digas e faças? Quanto dinheiro te deu Ipsurich por conta? Viram-te receber um maço de notas da sua mão.

O interessado, que ouvira, tratou de meter-se por entre os curiosos para se afastar dali e, sendo possível, da cidade. As coisas caminhavam mal e se Bowler ficasse vencido, procurá-lo-iam para lhe fazer o mesmo que fizeram a Bristol.

— Não me ofereceram nada, nem me deram dinheiro. Fizemos uma aposta e ele cometeu a tolice de fazê-la em teu favor. Eu disse-lhe que seria melhor os dois defrontarmo-nos de faca na mão... Porque não autoriza a Rainha esta luta?

Entre os curiosos levantou-se um rumor enorme.

— Não autorizo esse duelo! — exclamou Joan, com coragem e decisão.

— Não sejas estúpida e autoriza esse duelo! — aconselhou seu pai.

— Já disse que não autorizo.

Os vaqueiros aplaudiram as palavras de Joan.

— Pois tens de autorizar! — disse Bowler — Assim como demonstrarei a esse rapaz a tolice que fez em tomar parte no exercício.

— Embora a Rainha não o autorize, aceito pela minha parte! — disse Pete.

— Quem o fizer, sem autorização minha, será enforcado — gritou Joan.

Os participantes tiveram que enfrentar o alvo. Chester pediu ao seu amigo e companheiro, Pete, que o deixasse defrontar Bowler. Bowler lançou as facas, admitindo Chester que ele era um bom atirador. E aplaudiu com entusiasmo, como a maioria dos espectadores.

— Reparem naquele rapaz!... Não há dúvida de que sabe perder. Aplaude como os outros.

— Faz isso, para que depois não se riam dele. Todos dirão que ele soube perder -- comentou Tracy.

— Mas o outro ainda não perdeu! — disse Joan.

— Porque julgas que ele aplaude? Porque está certo de não poder igualar Bowler.

Chester compreendia o que os vaqueiros, que haviam apostado por ele tudo quanto possuíam, pensavam nesse momento. Por isso lhes disse, erguendo a voz:

— Tenho de reconhecer que me surpreendeu. «Lança a faca melhor do que eu esperava. Mas eu ainda não atirei o meu e, portanto, ainda não está tudo perdido. Ele falhou uma faca e demorou muito. É bom, mas... é lento. Creio que ganharei com facilidade.

Bowler não pôde ouvir aquilo porque estava perto de Joan, a quem acabava de dizer:

— És tola! Devias ter permitido que acabasse com esse fanfarrão de uma vez para sempre. Foi uma bela oportunidade. Eu ouvi ele dizer que depois devias autorizar a luta.

— Eu não ouvi.

— Mas é certo. Vais ver.

E em altos gritos, Bowler perguntou se era verdade ou não que havia dito que a Rainha podia autorizar a luta depois do exercício dos dois. Joan teve a surpresa de ouvir a confirmação.

— Vês como ele é fanfarrão?! — retorquiu seu pai —Ele bem viu o que este fez e ainda se atreve a dizer que deves autorizar a peleja. Deves responder que sim.

Mas a surpresa de todos foi ouvirem Chester:

— Cabe-me tomar parte. A Rainha autoriza essa luta? Antes de realizar o meu exercício tem de dizer se autoriza ou não. Se a resposta for negativa, não farei o exercício.

— Trata de fazer ver que se não deres a necessária autorização, não tomará parte no exercício e assim não se verá derrotado. É um rapaz esperto, porque supõe que os vaqueiros não te vão permitir que a autorizes...

— Deve realizar, como ele, primeiro o exercício —disse Joan.

— Antes deve dizer se está disposta a autorizá-la —insistiu Chester.

— És tão fanfarrão que vou deixar que Bowler te mate!

— É o mesmo que dizer que a autoriza, não é isso? Gosto das coisas claras.

— Já que queres, assim seja. Autorizo

— Obrigado! Isso quer dizer que posso atirar.

Chester voltou-se lentamente para o alvo. E de súbito, as facas, umas após outras, como ligadas por um fio invisível, saíram da sua mão com uma velocidade inconcebível, indo cravar-se todos no sítio exato. A aclamação foi retumbante, apoteótica.

Bowler estava pálido como um cadáver. Joan fitou-o. Estava certo de que era um garoto comparado com Chester. E, de repente, começou a correr numa fuga desenfreada. As testemunhas, porém, impediram-no que fugisse.

— Falaste tanto da luta, que agora não escaparás! — disseram-lhe.

— Deixem-me! — exclamou, aterrado — Ele matar-me-á. Eu não sabia que ele fosse assim...

Estas palavras demonstravam claramente que era um assassino cobarde. Como chegassem aos ouvidos de Joan, Bowler, cheio de medo, disse-lhe quem lhe dera quinhentos dólares, para cometer a sua nefanda proeza. Em vista de tal, a rapariga mandou chamar o capataz.

— Tracy! Não disseste que eu ia ter a fita ganha por vocês, ou, melhor, por Bowler? Já vês o que aconteceu! E esse rapaz acabará por matá-lo, depois de o obrigar a revelar muitas coisas interessantes.

O pai estava assustado:

— Tens de impedir essa luta, Joan.

— Obrigaste-me a autorizá-la e agora pedes o contrário. Já não posso voltar atrás. Terás de lutar Se não o pendurarem antes. O que ele está dizendo demonstra que é um assassino a soldo.

Depois de recolher a fita, Chester foi entregá-la a Joan, dizendo-lhe:

— Creio que a senhorita começou a compreender as coisas como são, e que as fará bem daqui em diante.

— Visto que me faz a honra de entregar-me o que não mereço — replicou ela — quero pedir-lhe que deixe, sem efeito, o caso da luta...

Não pôde acabar. Os vaqueiros rodearam Bowler e, lançando-se sobre ele, aplicaram-lhe uma sova mestra, deixando-o como morto.

Chester acedeu ao pedido de Joan.

Entretanto, Milnor ordenou que socorressem Bowler. Com efeito, conseguiram reanimá-lo. Não obstante, o miserável cobarde ainda teve o desplante de afirmar:

— Ele não queria lutar comigo, porque estava certo de que eu o mataria.

Quando ela soube desta sua afirmação, comentou:

— Foi uma tolice que não o obrigasse a lutar. És um cobarde!

— Ouve, Joan! — interveio o pai. — Não julgues que seria ele o morto!

— O que eu julgo é que todos são uns cobardes! Pediram-me que eu não autorizasse essa luta e agora dizem que o morto seria esse rapaz! Ele teria brincado como um gato com o rato... Não querem reconhecer isso, e esse rapaz matá-los-á, à medida que o forem defrontando.

 

*

 

Chester estava com Pete.

— Não sei se fizeste bem em entregar essa fita novamente a essa rapariga.

— Afirmo-te que essa rapariga vai mudando, a pouco e pouco, e conhecendo quem tem ao pé de si, e entre eles, seu pai, que é o pior.

Nesse momento, o xerife apareceu esbaforido.

— Acabam de dar-me uma notícia desagradável. Preston Madison e Stickney assaltaram a diligência, mataram os condutores, roubando tudo quanto os passageiros levavam.

Pete fitou o xerife e inquiriu:

— Onde foi isso? Próximo daqui?

Chester fitava-o, interessado.

— A poucas milhas daqui. Vou ao encontro da carruagem, que está avariada.

— Permite que o acompanhe?

— Iremos os dois — disse Chester.

O xerife não se opôs. Pelo contrário, agradava-lhe que os dois fossem com ele, visto que assim afastavam-se do perigo de que os homens de Milnor os matassem à traição.

Poucos minutos depois, os três homens punham-se a caminho, na direção do local onde se dera o assalto.

Os passageiros estavam junto do veículo, à espera de que o arranjassem, visto que outros já tinham partido a pé, para a cidade.

Pete examinou os passageiros e perguntou como se dera o assalto e quem eram os assaltantes. Um deles, vestido de cow-boy respondeu:

— Eram Preston Madison e Stickney.

— Tens a certeza? — perguntou Pete, fixando-o.

— Sim.

— Conheces os dois?

— Vi os seus retratos nos pasquins.

— Tinham os rostos tapados com lenços — explicou outro.

— Mesmo assim, estou certo de que eram eles — acrescentou o outro.

Chester sorriu para Pete. E disse:

— Eu encarrego-me dele. Não te preocupes. Parece que tem muito interesse em atribuir a proeza a esses dois personagens.

O vaqueiro fitou Chester, bastante preocupado. E perguntou-lhe:

— Que queres dizer?

— Já vais ver. Levanta as mãos. Prepara uma corda, Pete. Este é um dos cúmplices. Ficou aqui só para dizer que foram os dois.

— Vejo que também compreendeste — disse Pete —Não me demoro a preparar o laço.

— Não podem fazer isso comigo. Todos sabem que eu não me meti em nada.

—Os vaqueiros não sabem que estavas combinado com os bandidos. Se não falares, serás enforcado.

— Não podem fazer isso! Xerife!...

— Tens a corda preparada, Pete? — perguntou o xerife.

— Não! Isso não! Eu falarei!... É verdade que eles combinaram comigo e que...

Não pôde dizer mais nada. Os passageiros caíram sobre ele e antes de que os três homens pudessem evitar, lincharam-no.

 

 

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