O tiro foi como um sinal.
Nenhum dos presentes o disparara, mas entraram imediatamente em ação, com uma velocidade espantosa. Franck, em vez de tirar as armas, atirou para trás o tronco, com um impulso forte, levantou os pés quando as costas entraram em contacto com a superfície do balcão e, um segundo depois, desaparecia atrás dele.
No mesmo instante uma chuva de balas crivava o ponto onde antes estivera. Kirby e os companheiros não tinham ficado parados desde que soara o primeiro tiro: o gigante deixou-se cair de lado, imitado por Pat, do lado oposto, e ainda os seus corpos não haviam tocado o chão já as suas mãos empunhavam os «Colts» e disparavam contra Bryce, felizmente para o rapaz uma fração de segundo tarde de mais, pois já ele se ocultara atrás do balcão.
O jogador que esperara os facínoras para aliar-se aos seus projetos assassinos, em vez de disparar ocultou-se atrás da mesa mais próxima, deitando-a ao chão e transformando o tampo de mármore num escudo eficaz.
Por instantes os homens ficaram assombrados, ao verem que os tiros se tinham cravado na madeira, por falta do alvo a que eram destinados. No entanto, não tiveram tempo para perceber o que acontecera nem de continuar a olhar naquela direção, pois nesse momento atraiu-lhes a atenção um homem que entrou aos trambolhões, como se o houvessem empurrado brutalmente.
Todos os olhares se dirigiam para ele — com exceção do de Franck, que continuava no seu esconderijo — a tempo de verem que deixava cair o «Colt» dava uma volta sobre si mesmo e caía de bruços. Nas costas puderam ver a mancha de sangue produzida pela bala que o matara.
As portas abriram-se de novo, agora para deixarem passar o corpo volumoso de Elvis Emerson, que se movia com assombrosa agilidade e fazia vomitar chumbo dos «Colts» que apontava para Kirby e Pat.
Donna, que no princípio da refrega procurara refúgio num dos cantos da sala, com os três clientes neutros, viu o ruivo estremecer e rebolar, ficando com o rosto sujo do próprio sangue voltado para ela. Viu também alastrar uma mancha vermelha no peito de Emerson, atingido sem dúvida por uma das balas que Kirby disparava furiosamente do chão.
Emerson ainda disparou, mas inutilmente, já com as mãos crispadas. Soou nova detonação, procedente do que se ocultara atrás da mesa, e o velho caiu.
Kirby arrastou-se para trás, com o olhar agora fixo no balcão, de onde esperava que surgisse de um momento para o outro aquele que Emerson quisera defender. De facto assim aconteceu, mas tão bruscamente que não teve tempo de disparar.
O rapaz, pelo contrário, disparou, não para Kirby, mas na direção oposta. O gigante seguiu instintivamente a trajetória da bala e viu, assombrado, a cabeça do companheiro que se ocultaria atrás da mesa, que lhe pareceu adornada com um terceiro olho: o buraco sangrento que lhe abrira na testa a bala de Bryce.
Kirby disparou então, mas sem resultado, pois o rapaz voltara a desaparecer atrás do balcão. Com um leve volver de cabeça, verificou que nada se interpunha entre ele e a porta e, por isso, começou a soerguer-se lentamente, na preparação do salto com que se precipitaria para a saída.
Ao olhar de novo, porém, para o balcão, encontrou o «Colt» de Bryce, do qual saiu o chumbo que lhe tirou a vida, abrindo caminho através do seu coração. Ainda o seu corpo gigantesco se convulsionava quando Bryce lhe passou por cima e correu para Emerson, cujos ombros soergueu tentando levantá-lo.
— Não me toques... filho — gemeu o velho, num sussurro. — Seria pior, fugir-me-ia mais depressa a vida...
— Porque te meteste? — perguntou-lhe Franck. — Eu ter-me-ia entendido com os canalhas.
Foi a maneira como Emerson sorriu, parecendo orgulhoso do rapaz:
— Eu sei, filho, eu sei... Mas eles tinham-te preparado uma armadilha... Cheguei a tempo de disparar sobre o que, lá fora, ia fazê-lo contra ti... Não me importa tê-lo morto pelas costas... é assim que se matam os coiotes.
Bryce voltou-se para a mulher, que a seu lado ouvia o moribundo, e pediu-lhe, comovido:
— Por Deus, Donna, um médico!
Emerson perdia as forças lentamente, mas apesar disso falou depressa, como se receasse iniciar a viagem eterna antes de dizer o que tinha a dizer:
— Aí na minha algibeira, Franck... estão os cinquenta mil dólares que te prometi... Tira-os, são teus... é a minha herança... a minha última vontade... Aceita-os, filho.
Era tal a ansiedade com que lho pedia, que Bryce pensou que o consolaria na hora derradeira se lhe obedecesse. Por isso meteu a mão na algibeira que o ancião indicava com o olhar e, não sem certa relutância, tirou o maço de notas. Emerson suspirou.
— A senhora é testemunha... de que entrego este dinheiro ao rapaz... sem que ninguém me obrigue...
Bryce levantou a cabeça e deparou-se-lhe o rosto de Graça, que olhava o moribundo com imensa pena.
— É... é meu pai — confessou Bryce, num sopro de voz.
Dir-se-ia que, ao ouvi-lo, as feições de Emerson resplandeceram de felicidade. Murmurou:
— Obrigado, filho...
E fechou os olhos, com uma espécie de sorriso de satisfação.
— Sim, Graça, este homem é meu pai — prosseguiu Bryce. — Nunca te falei a seu respeito porque me envergonhava dele, mas agora... Porquê tão tarde, meu Deus?
A rapariga apertou-lhe um ombro, compadecida, e - quando os seus olhares se cruzaram, Bryce viu tanta tristeza no dela, que fitou novamente o homem cuja cabeça repousava no seu braço. Parecia dormir, mas o sono era o da morte.
Bryce chamou o pai, com voz entrecortada, primeiro timidamente, com se lhe custasse ainda pronunciar o nome que durante toda a vida lhe negara, mas depois com todo o seu coração:
— Pai, não me deixes agora! Pai!
Atrás dele, um homem vestido de preto, que chegara com Donna, movia negativamente a cabeça, ao mesmo tempo que abria as mãos num gesto de impotência.
Nenhum dos presentes o disparara, mas entraram imediatamente em ação, com uma velocidade espantosa. Franck, em vez de tirar as armas, atirou para trás o tronco, com um impulso forte, levantou os pés quando as costas entraram em contacto com a superfície do balcão e, um segundo depois, desaparecia atrás dele.
No mesmo instante uma chuva de balas crivava o ponto onde antes estivera. Kirby e os companheiros não tinham ficado parados desde que soara o primeiro tiro: o gigante deixou-se cair de lado, imitado por Pat, do lado oposto, e ainda os seus corpos não haviam tocado o chão já as suas mãos empunhavam os «Colts» e disparavam contra Bryce, felizmente para o rapaz uma fração de segundo tarde de mais, pois já ele se ocultara atrás do balcão.
O jogador que esperara os facínoras para aliar-se aos seus projetos assassinos, em vez de disparar ocultou-se atrás da mesa mais próxima, deitando-a ao chão e transformando o tampo de mármore num escudo eficaz.
Por instantes os homens ficaram assombrados, ao verem que os tiros se tinham cravado na madeira, por falta do alvo a que eram destinados. No entanto, não tiveram tempo para perceber o que acontecera nem de continuar a olhar naquela direção, pois nesse momento atraiu-lhes a atenção um homem que entrou aos trambolhões, como se o houvessem empurrado brutalmente.
Todos os olhares se dirigiam para ele — com exceção do de Franck, que continuava no seu esconderijo — a tempo de verem que deixava cair o «Colt» dava uma volta sobre si mesmo e caía de bruços. Nas costas puderam ver a mancha de sangue produzida pela bala que o matara.
As portas abriram-se de novo, agora para deixarem passar o corpo volumoso de Elvis Emerson, que se movia com assombrosa agilidade e fazia vomitar chumbo dos «Colts» que apontava para Kirby e Pat.
Donna, que no princípio da refrega procurara refúgio num dos cantos da sala, com os três clientes neutros, viu o ruivo estremecer e rebolar, ficando com o rosto sujo do próprio sangue voltado para ela. Viu também alastrar uma mancha vermelha no peito de Emerson, atingido sem dúvida por uma das balas que Kirby disparava furiosamente do chão.
Emerson ainda disparou, mas inutilmente, já com as mãos crispadas. Soou nova detonação, procedente do que se ocultara atrás da mesa, e o velho caiu.
Kirby arrastou-se para trás, com o olhar agora fixo no balcão, de onde esperava que surgisse de um momento para o outro aquele que Emerson quisera defender. De facto assim aconteceu, mas tão bruscamente que não teve tempo de disparar.
O rapaz, pelo contrário, disparou, não para Kirby, mas na direção oposta. O gigante seguiu instintivamente a trajetória da bala e viu, assombrado, a cabeça do companheiro que se ocultaria atrás da mesa, que lhe pareceu adornada com um terceiro olho: o buraco sangrento que lhe abrira na testa a bala de Bryce.
Kirby disparou então, mas sem resultado, pois o rapaz voltara a desaparecer atrás do balcão. Com um leve volver de cabeça, verificou que nada se interpunha entre ele e a porta e, por isso, começou a soerguer-se lentamente, na preparação do salto com que se precipitaria para a saída.
Ao olhar de novo, porém, para o balcão, encontrou o «Colt» de Bryce, do qual saiu o chumbo que lhe tirou a vida, abrindo caminho através do seu coração. Ainda o seu corpo gigantesco se convulsionava quando Bryce lhe passou por cima e correu para Emerson, cujos ombros soergueu tentando levantá-lo.
— Não me toques... filho — gemeu o velho, num sussurro. — Seria pior, fugir-me-ia mais depressa a vida...
— Porque te meteste? — perguntou-lhe Franck. — Eu ter-me-ia entendido com os canalhas.
Foi a maneira como Emerson sorriu, parecendo orgulhoso do rapaz:
— Eu sei, filho, eu sei... Mas eles tinham-te preparado uma armadilha... Cheguei a tempo de disparar sobre o que, lá fora, ia fazê-lo contra ti... Não me importa tê-lo morto pelas costas... é assim que se matam os coiotes.
Bryce voltou-se para a mulher, que a seu lado ouvia o moribundo, e pediu-lhe, comovido:
— Por Deus, Donna, um médico!
Emerson perdia as forças lentamente, mas apesar disso falou depressa, como se receasse iniciar a viagem eterna antes de dizer o que tinha a dizer:
— Aí na minha algibeira, Franck... estão os cinquenta mil dólares que te prometi... Tira-os, são teus... é a minha herança... a minha última vontade... Aceita-os, filho.
Era tal a ansiedade com que lho pedia, que Bryce pensou que o consolaria na hora derradeira se lhe obedecesse. Por isso meteu a mão na algibeira que o ancião indicava com o olhar e, não sem certa relutância, tirou o maço de notas. Emerson suspirou.
— A senhora é testemunha... de que entrego este dinheiro ao rapaz... sem que ninguém me obrigue...
Bryce levantou a cabeça e deparou-se-lhe o rosto de Graça, que olhava o moribundo com imensa pena.
— É... é meu pai — confessou Bryce, num sopro de voz.
Dir-se-ia que, ao ouvi-lo, as feições de Emerson resplandeceram de felicidade. Murmurou:
— Obrigado, filho...
E fechou os olhos, com uma espécie de sorriso de satisfação.
— Sim, Graça, este homem é meu pai — prosseguiu Bryce. — Nunca te falei a seu respeito porque me envergonhava dele, mas agora... Porquê tão tarde, meu Deus?
A rapariga apertou-lhe um ombro, compadecida, e - quando os seus olhares se cruzaram, Bryce viu tanta tristeza no dela, que fitou novamente o homem cuja cabeça repousava no seu braço. Parecia dormir, mas o sono era o da morte.
Bryce chamou o pai, com voz entrecortada, primeiro timidamente, com se lhe custasse ainda pronunciar o nome que durante toda a vida lhe negara, mas depois com todo o seu coração:
— Pai, não me deixes agora! Pai!
Atrás dele, um homem vestido de preto, que chegara com Donna, movia negativamente a cabeça, ao mesmo tempo que abria as mãos num gesto de impotência.
/ / / No pequeno cemitério da Cidade do Lago Salgado, em redor de uma sepultura acabada de abrir, um grupo de pessoas via desaparecer o caixão que continha o corpo do que fora Elvis Emerson. Os gemidos de várias mulheres perturbavam o silêncio habitual do campo santo.
Um homem novo, sobrepondo-se pela sua estatura a todos os familiares do finado, abriu caminho por entre eles, chegou à beira da campa e atirou sobre o caixão um punhado de terra. Ninguém reparou nele, pois todos faziam o mesmo, entre choros e lamentações.
O rapaz afastou-se, despercebido como se aproximara, saltou para o cavalo que deixara à porta do cemitério e partiu a galope para o povoado. Alegrou-se ao entrar na rua principal e ao ver no meio dela um carro cujos cavalos se empinavam de impaciência. Entregou as rédeas da montada à mulher loura que se aproximou, e disse-lhe, ao mesmo tempo que quase a levantava do chão e. a beijava:
— É teu, Donna. Tem cuidado contigo, querida. Dar-te-ei notícias nossas assim que possa indicar-te para onde podes mandar as tuas.
Do alto da diligência desceu uma voz enfadada:
— Eh, amigo, estamos dez minutos atrasados por sua culpa e agora faz desesperar os cavalos com a sua maldita despedida...
Franck Bryce entrou no veículo e Donna afagou as mãos de Graça e Alfredo, que lhas estendiam pela janela.
— Adeus, filhos! Adeus, Franck!
O chicote do condutor estalou e os cavalos nervosos partiram à desfilada, iniciando-se os solavancos que haviam de fazer-se sentir durante toda a viagem.
Bryce instalara-se à janela e parecia despedir-se com o olhar das casas e paisagens que desfilavam ante os seus olhos. A seu lado, Graça respeitou-lhe o silêncio, enquanto o garoto se divertia à grande debruçado da outra janela.
— Gostas muito da Donna, não gostas? — perguntou por fim a rapariga.
Bryce voltou-se, com um sorriso, e apertou-lhe carinhosamente a mão. Por sorte viajavam sós, naquela primeira jornada do caminho, e por isso puderam falar à vontade.
— Sim, pode dizer-se que ela e o velho Bob foram os únicos amigos que tive... Até que chegaste tu, claro — emendou, apertando-lhe ainda mais a mão.
— Bob? — admirou-se ela. — Quem é?
— Foi o homem que recolheu minha mãe na pradaria. Viu-me nascer e deu-lhe sepultura a ela, que morreu ao dar-me a vida.
Bryce fez uma pausa, com a cabeça encostada às costas do banco, e depois prosseguiu:
— Foram os melhores anos da minha vida, os que passei com o velho por esses bosques... Por fim, quando Bob se apercebeu de que estava demasiado doente para continuarmos na solidão da nossa cabana, viemos para o Lago Salgado... Antes de morrer revelou-me a verdade do meu nascimento e disse-me que meu pai era o temível Elvis Emerson. Só não compreendo como este soube ser eu seu filho. Talvez Bob lho dissesse, esperando que me protegesse quando ele partisse.
Pareceu despertar de súbito do devanear em que mergulhara e desculpou-se:
— Perdoa, querida, creio que estive' a pensar em voz alta. Aborreci-te?
Desta vez foi Graça quem lhe apertou a mão, a exprimir-lhe o seu afeto.
— Porque havias de aborrecer-me, Franck? Tenho muito interesse em conhecer todos os pormenores da tua vida.
Ele protestou:
— Não, não! Mereço que os teus parentes de Sacramento me neguem a tua mão.
— Que tolo és! — exclamou, encostando a cabeça no ombro do rapaz. — Julgas que, se negassem, deixaria de casar contigo?
Franck inclinou a cabeça, como se fosse dar-lhe o beijo por que ambos anelavam, mas a voz de Alfredo quebrou o encanto:
— Olhem, uma manada de vacas! Devem ser pelo menos mil! Bryce tossicou e a rapariga endireitou-se, sorrindo ao avaliar como tinham estado perto de serem surpreendidos pelo garoto.
— Que exagero! — disse o rapaz, olhando para o ponto que Alfredo indicava. — Aposto um dólar em como não chegam sequer a duzentas.
— Um dólar! Vais perdê-lo, Bryce! Uma, duas, três...
E o garoto esqueceu-os, embrenhado na tarefa difícil de contar as cabeças de gado.
Bryce passou então um braço pelos ombros da rapariga e puxou-a para si. Feliz pelo estratagema que o rapaz arranjara, Graça consentiu que os seus lábios se unissem no prazer do primeiro beijo.
Um primeiro beijo tão grande e embriagador, que não terminara ainda quando o garoto, ignorando o que sucedia nas suas costas, contava:
— Setenta e quatro, sententa e cinco...
F I M
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