domingo, 2 de agosto de 2015

PAS510. A figura varonil dum cavaleiro

A figura varonil do cavaleiro perfilou-se por instantes em contraluz, segundos antes de fazer cavalgar a sua montada em direção ao fundo do vale que tinha a seus pés, passando por um pequeno pinhal que crescia junto dum profundo arroio de águas límpidas e cristalinas. Era um lugar que ele conhecia perfeitamente. E quando recordou a quem pertencia, seu rosto duro crispou-se desaparecendo por momentos aquele ricto de amargura que desde há um ano permanecia inalterável na sua boca.
Depois, o cavaleiro recordou também a carta, escrita pelo proprietário das terras que começava agora a pisar. Era o antigo juiz de Belem, em pleno território do Novo México, Joe Kelly, o alto e maciço Joe Kelly.
Bob O'Hara recordava-se bem dele. Com a sua eterna sobrecasaca e a sua inseparável parelha de «Colt 45», pendurados baixo e presos às coxas, por finas e entrançadas correias de coiro.
Era ainda novo, pois agora deveria ter uns trinta e dois ou trinta e três anos, cabelo preto, nariz recto e olhos pardos, boca um tanto grande e o queixo tão quadrado como o seu próprio.
A seguir... o xerife Jim Madigan. Tão alto e atlético como o próprio juiz. Ruivo e de olhos extremamente azuis. Testa ampla, nariz aquilino e queixo ligeiramente pontiagudo. O'Hara pensou que agora deveria ter pouco mais ou menos a sua própria idade: trinta anos.
Ambos tinham sido, respetivamente, juiz e xerife, quando, cinco anos atrás, fora obrigado a sair de Belem, alegando todos que ele tinha por hábito fazer justiça por suas próprias mãos. E agora ele regressava, sabendo desde já que a sua volta ia provocar um verdadeiro cataclismo.
Pensando deste modo, O'Hara crispou ainda
mais o rosto quando o curso dos seus pensamentos se fixaram no rancheiro Kennedy e na sua ruiva, formosa e incitante filha Sílvia. Ambos tinham más recordações dele. Sobretudo ela, atendendo ao facto do seu noivo já há tempo estar criando flores no cemitério de Belem por suas próprias mãos.
Não. Sílvia Kennedy não poderia esquecer facilmente o homem que matou o seu noivo e que depois, graças à atuação de um xerife e de um juiz imparcial, tinha sido liberto de um julgamento que nunca chegou a realizar-se apesar da pressão nesse sentido. Limitaram-se, simplesmente, a dizer-lhe que partisse e ele limitou-se a cumprir a ordem.
E era por este facto, precisamente, que ele voltava: porque tanto o juiz como o xerife tinham perdido o cargo por isto. Joe Kelly assim o afirmava na carta que tinha no bolso.
Havia algo mais, e o jovem afastou essas ideias, pois que sentia na sua mente uma perturbação infernal. Esta luta que travara consigo próprio, refletia-se bem no seu rosto.
E isto aconteceu quando seus pensamentos se voltaram para a dama do poncho (') mexicano. Então, seu rosto dulcificou-se, enquanto um sorriso surgia nos seus lábios.
Ela não voltaria mais a cavalgar com a máscara vermelha, para lhe sair ao encontro um coiote com o fora Gary Mac Donald, ou Cliff Graham, como na verdade se chamava, conhecido em toda a Califórnia pela «Hiena da Califórnia».
Não, nunca mais Noemi Carter O'Hara pelo seu casamento com ele —, voltaria a cavalgar na noite, provocando estampidos e desafiando as feras. Porque ela estava morta!
E sem o poder evitar, O'Hara vacilou como se toda a sua inteireza se tivesse derrubado subitamente. Sua altiva cabeça, já com alguns cabelos brancos, apesar dos seus trinta anos, pendeu sobre o peito enquanto seus pensamentos mantinham viva aquela história do passado que para sempre ficara gravada a fogo na sua alma.

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