O ar do "saloon” estava carregado do fumo dos cigarros. Uma nuvenzinha azulada, parecia esbater todas as figuras que o ocupavam.
A uma mesa, quatro homens, quatro exemplares típicos do Oeste, mas tão diferentes entre si, que a única coisa que tinham de comum era o baralho de cartas com que jogavam.
Pelo vestuário, distinguiam-se perfeitamente um mineiro, um jogador profissional e um vaqueiro.
O quarto homem merecia um estudo mais pormenorizado. Estava totalmente vestido de negro, com botões de prata, e tinha o cabelo escuro e olhos esverdeados. Forte, ainda que não o parecesse, os seus movimentos recordavam os de um puma jovem.
A partida decorria, como era lógico, com o profissional a ganhar.
Terminou mais uma jogada e foi a vez de ele dar. Voltou a cabeça para o balcão, pedindo um baralho novo. Não era de estranhar, pois sucedia, com frequência, trocarem de cartas ao fim de um reduzido número de jogadas, evitando, assim, que alguém as conhecesse.
Enquanto as baralhava e distribuía, o homem de negro riu suavemente, obrigando os outros a olharem-no com certa surpresa.
— Vejam o vosso jogo, senhores. — Sorriu. — Este cavalheiro parece muito divertido.
— Não imagina quanto — retorquiu o dos olhos verdes, fitando-o profundamente.
O mineiro, com um jogo insignificante, passou. O mesmo não sucedeu com o vaqueiro. Tinha duas damas, que, com o curinga, formavam um trio. Descartando-se de duas, poderia fazer um "poker" ou, pelo menos, um "full". Foi a jogo, satisfeito.
O homem de negro voltou a sorrir. As suas cartas não poderiam ser melhores. De mão, quatro ases. Também ele acompanhou o jogo.
O vaqueiro pediu duas cartas. O seu rosto não se alterou ao receber mais uma dama. Era difícil haver um jogo superior ao seu.
— O senhor? — sorriu o profissional, olhando o homem de negro.
O interpelado lançou uma nuvem de fumo para o tecto. Depois, calmamente, arrojou as cartas para a mesa, pedindo cinco.
O profissional sofreu pouco menos do que uma apoplexia. Sobreveio-lhe um fingido ataque de tosse e deixou as cartas sobre a mesa para tirar o lenço da algibeira. Mas o que fez, dissimuladamente, foi sacar a sua pequena "Derringer". Depois, só com a mão esquerda, deu as cinco cartas, que nem sequer foram vistas pelo homem de negro.
E, de súbito, os seus olhos habituados a captar todos os pormenores, chocaram com as botas do estranho personagem que pedira as cinco cartas. Tanto as do vaqueiro como as do mineiro estavam bastantes sujas. Mas, as do outro brilhavam como espelhos. E as suas esporas eram muito grandes, de oiro.
Imediatamente abandonou os seus propósitos de usar a arma. Guardou o lenço, endireitando-se subitamente. Os outros dois jogadores entreolharam-se; jogar, pedindo cinco cartas, e nem sequer as olhar, era demais. Ainda por cima, estando já tantos dólares na mesa.
O jogador profissional, como que a medo, apostou mais vinte dólares. O vaqueiro sorridente, acompanhou a aposta, e subiu para cinquenta. E então, sucedeu algo de surpreendente.
A voz metálica do homem impecavelmente vestido fez-se ouvir, subindo a parada para mil dólares. Umas gotas de suor perlaram a testa do profissional. Empurrando a quantia correspondente à parada para a sua frente, levantou-se da mesa, desculpando-se com uma súbita dor de cabeça.
— Que me enforquem se percebi alguma coisa — resmungou o vaqueiro, deixando cair as cartas sobre a mesa. — Mas se nem sequer viu as suas cartas, nem esperou para ver as cartas!
De novo, um sorriso nasceu no estranho personagem.
— Sabia que tinha perdido — explicou paciente. — As cartas vêm ordenadas da fábrica por cores e, dentro delas, por números. Ele baralhou-as a seu modo, fazendo com que lhe saíssem quatro cartas altas. A mim, deu-me também um "poker", mas maior do que o seu. Mas ele teria arranjado uma sequência na cor. E um truque muito velho. Logo que eu me descartei do excelente jogo que tinha, compreendeu que perdera. Para que ia olhar as cartas? Assim que eu pedisse mais do que uma o seu jogo ia por água abaixo. E agora, meus senhores, quanto perderam?
— Trinta dólares — respondeu o vaqueiro, algo envergonhado por se ter deixado roubar tão facilmente.
— E eu, oitenta e sete — disse o mineiro, sacudindo a cabeça.
O vencedor da partida separou as duas quantias, deixando-as sobre a mesa.
— Aí têm — sorriu. — O dinheiro mal ganho não costuma voltar às algibeiras dos que o perderam ainda pior. Mas esta é uma exceção.
Com uma leve inclinação de cabeça, cumprimentou-os, saindo do "saloon". Quando desapareceu, o mineiro e o vaqueiro, com um encolher de ombros, embolsaram o dinheiro. E, de súbito, quase ao mesmo tempo, deixaram ouvir as suas aterradas vozes.
— Mas este tipo é o Colorado Silver!
Sem comentários:
Enviar um comentário