terça-feira, 16 de abril de 2019

BUF004.12 Cavalgada para demonstrar a inocência e perseguição

Barry Meeker aguardava na sua cela da prisão de «Três Árvores», sob a guarda de um subordinado do xerife Imber. Haviam já decorrido várias horas da noite, e o sono chegou aos olhos do descuidado vigilante. Não resultou difícil, portanto, para «Mustache», deslizar pelo interior da prisão e reduzi-lo à impotência, ameaçando-o com o revólver.
— «Mustache»!... Como se atreve?
— Cala-te! Cerra o bico… e abre a gaiola ao pássaro!
Em poucos minutos, Barry Meeker se viu fora do calabouço, passando a substituí-lo o seu carcereiro.
— O culpado disto é Imber por me deixar aqui só! — protestou o homem.
E deixou de o fazer ao ser convenientemente amordaçado e sujeito com cordas ao catre da prisão.
— Vamos, em marcha!
— Correu tudo bem? — quis saber Barry.
— Muito bem. Há meia hora que efetuaram a tentativa contra Tommy.
— Tex Glendin?
— Sim. E Don Crater. Este está agora num lugar afastado, para ser interrogado convenientemente. Falará.
— E Tex?
— Tex, não. Não é fácil que fale.
— Está...
— Sim. Tal como o meu avô.
— Evelyn sabe-o?
— Ainda não. Mas saberá a seu tempo.
— E «Grand Fox»?
— Desapareceu da povoação com os seus homens. Vamos.


Já no caminho, uniu-se a eles um novo cavaleiro que os estava esperando.
— Evelyn? Que fazes aqui? — aborreceu-se «Mustache».
— Vou com vocês.
— Não! — gritaram os dois homens.
— Sim! — disse a mulher.
E a mulher pôde mais que os homens, naturalmente. Ao reiniciarem a marcha, fizeram-no em grupo de três. Um pouco mais longe, encontrava-se aguardando um quarto cavaleiro. Levantou os braços em sinal de amizade.
— Quem? — perguntou Barry.
— Tommy.
— Rapaz!... Que diabos queres?
— Vou com vocês.
— Não!
Mas ele seguiu atrás deles com inquebrantável teimosia. Finalmente, tiveram de lhe dar lugar.
— Perfeito — murmurou «Mustache —. Uma mulher para um homem, e uma criança para um velho. Sempre é assim.
* * *
O xerife Imber tardou várias horas a inteirar-se da fuga do preso. E deixou decorrer uma hora mais, antes que se organizasse um grupo de perseguição.
Os seus homens murmuravam, descontentes com aquela demora. «Está a tornar-se velho — diziam —. Falta-lhe o ímpeto dos outros tempos».
Formaram no grupo alguns fazendeiros da povoação, entre os quais se contava o rancheiro Harley Dorcas. Depressa averiguaram o caminho seguido por Barry Meeker e os seus amigos; mas, ao encontrarem-se num cruzamento, o xerife obstinou-se em seguir pela esquerda, contra a opinião dos outros, que praguejavam e maldiziam, afirmando que a pista dos fugitivos mostrava que estes haviam seguido pela direita.
Ao cabo de algumas milhas, o xerife teve de reconhecer o seu erro, e tiveram de voltar ao cruzamento. Não foi este o único engano em que Imber incorreu ao longo da perseguição. Acumulou erro sobre erro, de modo que os dias passavam, e os perseguidores não conseguiram alcançar os perseguidos.
O velho Dorcas estava derreado, e a sua irritação crescia à medida que as suas reservas físicas se iam minguando. Até que uma noite agarrou o xerife por um braço e afastou-se com ele do lugar onde estavam acampados.
— Maldito sejas, Imber! — interpelou-o —. Que diabo pretendes?
— Que julgas tu? — disse o representante da Lei.
— Estás dificultando a perseguição... Por este andar, nunca os alcançaremos!
— Nisso enganas-te. Alcançá-los-emos.
— Quando?
— Quando eles se deixarem apanhar — disse Imber, tranquilamente. Dorcas ficou a olhá-lo cheio de espanto —. Não sejas tonto, Harley. Ainda continuas a crer que o rapaz é culpado?
O rancheiro moveu a cabeça, completamente aturdido.
— Não sei — confessou —. Mas, então, para quê esta pantomina?
— O rapaz está inocente, mas tem de o demonstrar.
— Como?
— Amanhã o saberemos. Estamos chegando ao final.
— Amanhã?
— Sim.
O ancião deixou escapar um suspiro de alívio.
— Bem — resmungou —. Creio que as minhas forças aguentarão até amanhã. Mas só até amanhã, maldito sejas!

***

Caminhavam por um lugar agreste, entre montanhas. A pista tornava-se difícil pela natureza do terreno; facilitava-a, no entanto, o facto de serem as marcas dos carros dos cavalos dos seus perseguidos as únicas que ali deviam ter em conta. Talvez durante meses não tivessem posto os pés ali quaisquer outros seres humanos.
Um dos homens de Imber deteve-se, subitamente, e apontou na sua frente.
— Há ali qualquer coisa! — exclamou. — Parecem... parecem cadáveres!
Esporearam os cavalos.
— índios! — assombrou-se o mesmo homem. — São índios!
Desmontaram, e viram os corpos de quatro... de cinco índios, espalhados pelo solo. Há muitos dias já que tinham sido mortos à punhalada.
— Meu Deus! — exclamou o velho Dorcas. — Vêem-se os sinais de uma luta... que deve ter sido terrível!
— Sim. Foi terrível — disse uma voz.
E Barry Meeker apareceu detrás de umas rochas. Depois apareceu o velho «Mustache», a jovem Evelyn e Tommy. Os seus perseguidores ficaram pasmados pela surpresa.
— Houve dois outros selvagens feridos — continuou Barry. — E alguns mais, que abandonaram a luta. Olhavam-no, sem o compreenderem. — Era de noite. Éramos dois homens brancos. Só dois. E lutámos cegamente, na escuridão. Os índios não nos podiam ver a nós, nem nós os víamos.
O xerife sorria, sem fazer qualquer gesto de se aproximar do fugitivo. O velho Dorcas começava a compreender. Olhou Evelyn, «Mustache», o seu amigo e Tommy, o rapazinho desorientado. Os três encostavam-se ao forasteiro, cotovelo com cotovelo, fazendo causa comum com ele.
— Porque nos trouxeram até aqui? — perguntou.
— Era necessário que vocês vissem isto — disse Barry. — Pensei que assim me justificaria.
O velho Dorcas calou-se durante breves instantes, assimilando a significação do que os seus olhos viam.
— Quem era o outro homem branco? — perguntou, finalmente.
— Milo Kerigan. Lutámos juntos, como dois camaradas. Milo morreu, morto pelos índios, e está aqui enterrado.
Evelyn deixou que um gemido se escapasse dos seus lábios.
— Sei que vai ser muito doloroso para Evelyn — continuou Barry — mas desejo que desenterrem o cadáver e que o reconheçam. «Mustache» não se enganará quando o vir. Conhecia Milo melhor que ninguém.
— Melhor que o seu próprio pai — afirmou o velho. — Mas... quem era, então, o rapaz morto no nosso vale? Disseram que era Milo.
— Houve uma confusão por parte dos assassinos. Milo está aqui. Enterrei-o eu. E é a melhor prova de que não assassinei aquele jovem —disse Barry. — Nunca poderia propor-me a matar Milo, como alguns pretendem, sabendo perfeitamente que ele já estava morto.
— Eu acredito-o... cegamente! Sei que é verdade! — proclamou Evelyn, e o fogo da sua afirmação acendeu um leve rubor no seu rosto pálido.
— Quanto à luta que tive com Florence e com os dois homens que a acompanhavam, aqui está Tommy que viu como se passaram as coisas.
O rapazinho adiantou-se uns passos, para dar mais ênfase à sua declaração.
— Sim — disse — eu presenciei tudo. E sei também muitas outras coisas. Florence... creio que era irmã de «Grand Fox». Ela e Tex estavam combinados para acabarem com a vida de Evelyn. Pensavam casar-se depois, para se tornarem senhores do rancho. Chamaram «Grand Fox» e os seus homens para que os ajudassem. Houve várias tentativas de assassinato dirigidas contra Evelyn. E, ao mesmo tempo, estavam roubando gado aos seus vizinhos. Não perdiam nada roubando também o gado do «Doble Z», visto que embolsavam o dinheiro do mesmo. Eu... lamento a parte que tomei no conluio, e prometo desde agora ser pessoa honrada. Já vi, suficientemente, que é o que mais convém.
***
Evelyn Kerigan nunca se cansava de contemplar o novo capataz do «Doble Z». «É, em tudo e para tudo, um homem forte e recto — pensava com deleite. — É... até no modo que tem de me beijar».
— Barry, sabes uma coisa? — disse-lhe um dia.
—O quê?
— Daria qualquer coisa para que meu irmão vivesse, qualquer coisa... Mas, ao mesmo tempo, alegro-me que tu não sejas meu irmão.
— Também eu, Evelyn.
— Porque não nos casamos? — perguntou ela, olhando-o francamente nos olhos. — Receavas que te dissesse que não?
Barry sorriu, mas os seus olhos estavam sérios.
— Algum dia... nos casaremos.
— Que receias agora?
— Nada.
— Eu, sim. É... aquele homenzinho horrível, não é verdade? Sabes que voltará.
— Não deves preocupar-te, Evelyn. Eu não me preocupo.
— Porque não sorris, então, com os olhos?... A nossa vida... poderia ser muito doce, e tem um travo de amargura porque os dois pensamos sempre nesse homem. Sempre! Não nos sai do pensamento. E virá... virá! Sabemo-lo os dois, e é uma coisa horrível!
— Sim, virá. Mas estou preparado.
— Dizem... dizem que é impossível superá-lo no manejo do revólver.
—Dizem...
— E que... que vais fazer?... Não quero que o enfrentes! Não quero!
— Preferes que saia fugindo?
— Não... tampouco o farias.
— Então, temos de esperar.
Mas era terrível aquela espera!... Barry, uma manhã após outra, afastava-se da casa e disparava o seu revólver na solidão. Disparava uma e cem vezes, incansavelmente. Evelyn ouvia os tiros que repercutiam no seu coração como o tanger de um sino que dobrasse a mortos.
— Crês... crês que lograrás ganhar-lhe em velocidade? — quis saber.
Barry moveu a cabeça.
— A habilidade de cada homem tem sempre um limite — disse. — Quando o alcança, já não o pode ultrapassar. É inútil qualquer coisa que se faça.
— Mas... isso quer dizer que te matará!
— Não. Necessariamente não quer dizer isso.
Barry tinha um plano. Mas, qual era o seu plano, se sabia que jamais conseguiria disparar adiantando-se a «Grand Fox»?
E chegou o dia. Tinha de chegar!... «Grand Fox» materializou-se ante Barry. Estavam sós. Sós e alerta os dois, as mãos próximas aos coldres.
— Esperavas-me.
— Sim.
—Tenho de matar-te, sabes? E, agora, não só pelo que me fizeste a mim. Mataste Florence.
— A tua irmã.
— Sim. Florence era minha irmã. Era um diabo que brincava comigo e se ria... Ria-se de tudo!... Também de mim. Sempre se riu de mim e do terror, que eu infundia aos outros homens. Ela podia fazê-lo... só ela... porque eu sempre a adorei. E tu mataste-a!
— Sim. Concordo que era um diabo... E não era minha irmã.
— Cala-te, cão!
— Faze-me tu calar!
«Grand Fox» avançou lentamente. Barry obliquou o corpo, sem se mover do lugar onde estava. O assassino olhava-o, gozando antecipadamente com a visão da morte... da morte, que guardava, feita chumbo, na sua pistola. Continuou avançando.
Cada pistoleiro tem a sua «maneira», e agrada-lhe disparar sempre à mesma distância. Ambos os antagonistas ainda se encontravam a uma distância superior à normal em duelos desta índole.
E Barry não esperou que se encurtassem as distâncias. A sua destreza ao empunhar o «Colt» foi pasmosa. Viu um brilho de surpresa nos olhos de «Grand Fox», que não esperava tão próximo a iniciação dos tiros. e nem assim conseguiu Barry superá-lo em velocidade.
A pistola, como num exercício de prestidigitação, pareceu saltar por si só aos dedos ávidos do pistoleiro e colocar-se espontaneamente em posição de disparar. Mas aquela não era a «distância» de «Grand Fox». A bala zumbiu aos ouvidos de Barry, como uma vespa enfurecida, perdendo-se na atmosfera sem «achar carne».
Barry disparou instantaneamente, e retrocedeu. Nisto era constituído o seu longo treino. Não em disparar avançando, mas em fazê-lo ao retroceder e a longa distância. Aquela tática era nova para «Grand Fox», e única talvez que o conseguiria desconsertar.
Disparou duas vezes no lapso brevíssimo em que Barry o fez só uma. E feriram-se os dois. A última bala do homenzinho penetrou no braço esquerdo do nosso jovem. Foi um fracasso, porque o pistoleiro quis enviá-la à altura do coração... E a última bala de Barry penetrou, com tremendo destroço, na boca de «Grand Fox» ...
O terrível homenzinho morreu sem que nos seus olhos se apagasse totalmente a expressão de surpresa ante a tática do seu inimigo.
O velho «Mustache» ergueu-se como um boneco surpresa saindo repentinamente da sua caixa. Havia permanecido atrás de uma rocha, com uma carabina preparada para entrar em ação.
— Rapaz, rapaz! — gritou freneticamente, abraçando Barry. — Foi magnífico! Esperava-o, de certo modo, porque assisti muitos dias ao teu treino, oculto entre as rochas, e compreendia a tática que ias empregar. Se falhasses, teria feito voar a cabeça a essa víbora com a minha carabina... Mas pensei que te devia dar uma oportunidade.
— Fizeste bem.
— Barry!... Barry!
Algum oculto sentido devia ter avisado a jovem que corria para o local da luta. Gritava pondo toda a sua alma no grito.
— Aqui estou, Evelyn, não te assustes.
— Que te fez?... Estás ferido?
— Nada. Não é nada. Um arranhão.
A jovem parou ante o cadáver de «Grand Fox».
— Tu... Tu...
— Acabou a ameaça.
— Mas... corre-te sangue pelo braço! Não o podes levantar!
O braço de Barry pendia, efetivamente, inerte e pesado.
— Não é nada.
— Apenas é preciso adiar a boda — riu «Mustache». — Nestas condições, não te poderá abraçar.
— Mas posso beijá-la — disse Barry.
E beijou-a...





FIM


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