sexta-feira, 12 de abril de 2019

BUF004.07 Uma frase que anuncia o perigo: «Milo, és tu!»

«Três Árvores» era uma povoação sem nenhuma característica especial que a diferençasse de outras povoações conhecidas antes por Barry Meeker.
O edifício dos Correios encontrava-se na praça: um quadrilátero não muito regular rodeado. de alpendres e varandins. E, também na praça, elevava-se o estabelecimento — mistura de hotel e taberna — que constituía o ponto de reunião dos rudes habitantes da região.
Quando penetrou no salão da taberna, Barry notou-se alvo de um furtivo exame. A dissimulada atenção com que o taberneiro o examinou dos pés à cabeça não foi suficientemente encoberta.
— Bons dias, forasteiro — saudou-o o homem — Ou não?
— Ou não, o quê — perguntou Barry, secamente.
— Refiro-me ao forasteiro. Talvez não o seja.
— Interessa isso para o seu negócio?
— Não. Simples curiosidade. «Whisky»?
— Qualquer coisa, desde que não seja veneno.
O taberneiro pareceu ofendido, mas imediatamente mudou de expressão e começou a rir.
— Veneno? — repetiu —. Há muito tempo que deixei de o servir. Os fregueses começavam a queixar-se.
Piscou um olho e riu-se do seu próprio gracejo.
— O meu nome é Trimmer, Stan Trimmer —informou seguidamente.


Barry fez um movimento com a cabeça, dizendo:
— Alegro-me em o conhecer, Trimmer.
O taberneiro ficou parado um momento, esperando que Barry correspondesse à apresentação declinando o seu nome. Depois, colocou um copo sobre o balcão deitando nele uma apreciável porção de «whisky».
— Aqui tem a bebida, amigo.
— Obrigado.
O local estava ocupado por oito ou dez indivíduos, dificilmente catalogável a maioria deles na ordem das pessoas honradas. Subitamente, um dos clientes levantou a cabeça fixando-se no recém-chegado com um exagerado gesto de surpresa, como reconhecendo subitamente unia pessoa, cuja presença é inesperada. Aproximou-se rapidamente, de mão estendida.
— Milo, és tu! — exclamou.
Barry não hesitou. Aquelas palavras — as mesmas com que haviam recebido na povoação o pobre Catesby —, despertaram no seu peito uma onda de cólera.
Agachou-se um pouco e o seu punho direito saiu disparado à semelhança de uma catapulta chocando violentamente no ventre do indivíduo com um ruído seco. O resultado foi fantástico. Tratava-se de um homenzarrão cheio de fortaleza e pujança... Mas num só instante e como consequência daquele único soco, pareceu desvanecer-se a sua consistência como um balão que se esvazia ao ser picado.
Os braços penderam aos lados do corpo e toda a musculatura do seu corpo se tornou branda e flácida como se se tivesse transformado repentinamente num invertebrado. Barry apontou-lhe a porta com um gesto imperioso.
— Ao largo!... Fora daqui!... Não quero voltar a ver-te!
O indivíduo permaneceu de pé, cambaleando, com o olhar vago de um idiota. Barry empurrou-o e o outro saiu da taberna sem resistir, como um ser sem vontade. Barry ouvira o ruído de várias cadeiras ao voltarem-se.
Não houve um só cliente que deixasse de saltar do seu assento ao produzir-se o tremendo embate. Alguns deles puseram a mão sobre o coldre dos seus revólveres. O nosso jovem olhou-os com gelada firmeza e todas as mãos se ergueram dissimuladamente, desistindo de qualquer intento ofensivo.
O taberneiro abriu a boca várias vezes antes de poder exclamar:
— Meu Deus! Jamais vi um soco como esse! Não o poderei esquecer e hei-de contar isso aos meus netos quando os tiver! É verdade!
— E fizeram-no a «Fiest Sage», nada menos! Tão orgulhoso dos seus punhos! — afirmou um dos presentes.
Trimmer, atrás do balcão, limpou os lábios várias vezes com as costas da mão. Barry compreendeu que o taberneiro hesitava em lhe dizer qualquer coisa. Animou-o a falar com um leve sorriso.
— Porquê?... Porque o fez? — perguntou Trimmer finalmente.
— Não me agradou que se dirigisse a mim com essas palavras. Será que todas as caras novas que aparecem por aqui são acolhidas com a mesma saudação?
O taberneiro limpou novamente os lábios.
— Refere-se... a outro rapaz da sua idade, que teve, segundo dizem, um grave contratempo?
— Que sabe você sobre isso?
— O que me disseram. Creio que «Fiest Sage» o interpelou com as mesmas palavras que hoje lhe dirigiu a si; mas isso aconteceu na praça. Não o deixaram viver.
— Então foi esse gorila? Foi essa a minha primeira impressão. Dou o soco por muito bem empregado!
Stan Trimmer decidiu-se a falar abertamente.
— Olhe, amigo — murmurou. — Não sei o que terá imaginado antes, de mim, mas o certo é que nunca fui amigo de «Fiest Sage». Nem sequer amigo dos seus amigos. Creio que você compreende o que lhe quero dizer.
— Talvez.
— Nesse caso, permite que lhe dê um conselho?
— Tente. Um bom conselho é melhor que um «whisky» ... quando o «whisky» não é bom.
O taberneiro agarrou uma garrafa e voltou a encher o copo.
— Beba este, agora. É bom... como um bom conselho. Vai por minha conta.
— Obrigado.
Bebeu lentamente. O taberneiro esperava com mal dissimulada impaciência, dirigindo frequentes olhares receosos a alguns dos clientes.
— Vamos, amigo. Desembuche — disse Barry após ter esgotado o conteúdo do copo.
— Não convém que eleve a voz. Olhe, meu rapaz; «Fiest Sage» não é o mais perigoso. Tem amigos que o são muito mais.
— Refere-se a «Grand Fox»?
— A ele e outros. «Grand Fox» é o chefe e, sem comparação, o mais perigoso de todos. Mas creio que teve qualquer desastre.
— Ouvi qualquer coisa a esse respeito.
— E que mais? Qual é o seu conselho?
— A estas horas eles sabem que você está aqui... e temo que apareçam de um momento para o outro. Creio saber quem você é. Todos o sabemos depois do que fez a «Fiest Sage»., Poderá, sem dúvida, tombar alguns deles... dois, três... mas não poderá tombar todos. Vá-se embora, Milo. Vá-se embora daqui.
— É esse o seu conselho? Pois prefiro o seu «whisky».
— Escute, por favor. Na povoação há essa má gente, mas também aqui existem muitas pessoas boas; aqueles que sempre aqui estiveram. E estão-se preparando alguns acontecimentos.
— Um choque entre bons e maus?
— Sim, é isso. Estou atraiçoando um segredo, mas creio que consigo o posso fazer. Há muito tempo que os elementos sãos aguardavam uma oportunidade, que chegou consigo. Estávamos assustados porque nos faltava um chefe. Pode sê-lo você, se não se deixar assassinar estupidamente. Vá-se embora, Milo Kerigan! Peço-lhe em nome de todos e para bem desta terra.
Barry moveu a cabeça lentamente. Stan Trimmer suspirou.
— Bem o receava — disse —É o mau que têm as pessoas como você. Confiam demasiado nos seus próprios recursos... e temem demasiado que uma suspeita de cobardia turve a sua reputação.
— Neste caso não se trata disso. É que... preciso continuar no seu estabelecimento, simplesmente. Agora não o posso abandonar. Não o faria por nada deste mundo.
O taberneiro encolheu os ombros com ar resignado.
— Está bem. Mas recorde-se: todos iremos para o diabo. E você, será o primeiro.
Barry, sem responder, afastou-se do balcão, situando-se atrás da porta de acesso. Dali divisava perfeitamente a porta dos Correios. Evelyn não tardaria muito a chegar.
Em poucos minutos pôde aperceber-se de que algo, na povoação, entrava em ebulição. Viu correr um homem que entrou numa das casas fronteiras. Momentos mais tarde saiu com dois outros homens atrás.
Os três olhavam interessados para a taberna e, por fim, começaram a andar naquela direção. Um deles fez o gesto instintivo de puxar o revólver... Por uma rua lateral aproximavam-se outros dois indivíduos. Barry voltou a encostar-se ao balcão.
— Você disse que todos iríamos para o diabo — exclamou.
Trimmer empalideceu.
— Sim, e então?
— Ele já está aí.
— Quem?
— O diabo. Ou, pelo menos, alguns dos seus representantes.
A palidez do taberneiro acentuou-se.
— Você não se mova nem se meta em nada — murmurou Barry. —O seu caso é diferente do meu. Não tem uma reputação a salvar.
— Oiça, Milo! — disse Trimmer ansiosamente. — Há outra porta nas traseiras.
— Pois então corra, corra... — disse o nosso jovem com um sorriso trocista.
— Oh! — desesperou-se o outro. — Com você é inútil! Tudo é inútil!
A porta abriu-se bruscamente e entraram os três primeiros indivíduos. Percorreram o salão com a vista, detendo o olhar durante um breve instante no jovem, que se apoiava indolentemente ao balcão. Depois, como obedecendo a um plano preconcebido, cada um deles se separou dos seus companheiros, sentando-se em lugares diferentes do salão, estrategicamente.
Quase a seguir, entraram também os dois homens que Barry havia visto vir pela rua lateral, e repetiu-se a mesma manobra.
Na taberna fizera-se, repentinamente, o silêncio. Quatro ou cinco dos clientes levantaram-se e, colocando umas moedas sobre as mesas, encaminharam-se para a saída com ar que, inutilmente, procuravam que parecesse indiferente. Na porta cruzaram-se com outros três indivíduos que então entravam.
— Creio... — murmurou Barry, notando uma certa sequidão na boca —, creio que não terei de esperar que «Grand Fox» se reponha da lesão.

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