sexta-feira, 16 de julho de 2021

BIS088.14 Uma mulher de coragem nas mãos de bandidos

As reses roubadas do gado de Nancy foram estacionar a uma milha mais para lá do acampamento dos bandidos. A comitiva formada pelos dois Wells, a jovem e o resto dos homens alcançaram igualmente o ponto de destino.

Nancy observou cuidadosamente aqueles bandidos. Incomodavam-na os olhares de Jim, os seus sorrisos significativos e até a sua aparente amabilidade. Receava daquele bandido muito mais do que de todos os bandidos que compunham a quadrilha de Buck Wells. Mas tinha a esperança de que Buck a defendesse contra qualquer cilada do irmão.

Drolet, com um outro componente do bando, levou-a para uma cabana situada a um quarto de milha mais para lá do local onde o gado estacionava. Drolet ficou de sentinela à porta. Nancy, ao ver-se ali não sentiu medo algum. Tinha liberdade de movimentos e tinha aprendido a defender-se só contra todos os perigos de que o Oeste era fértil.

Tardou muito tempo até que ouvisse passos, perto da meia-noite, e vozes de homens muito próximo da porta. O tom daquela voz forte não lhe era desconhecida embora demorasse algum tempo a associá-la aos seus pensamentos. Subitamente, a lembrança de. Bob acudiu-lhe à mente. Onde estaria e que seria dele? Porque não tinha vindo em seu socorro?

Lembrou-se então de tudo quanto tinha acontecido naqueles últimos dias. Recriminou-se do seu modo de proceder, da maneira como o havia tratado, quando, na verdade, Bob não lhe tinha dado motivo algum para tanta dureza. Era um pistoleiro, um ser desumano, talvez, como todos aqueles que a rodeavam agora. Mas nele havia ainda qualquer coisa de bom, qualquer coisa que serviria de base para o fazer voltar ao caminho do dever.

Sentiu que o seu orgulho fraquejava. Experimentou uma fúria contra si própria, ao aperceber-se de que Bob McCoy se tinha apoderado um pouco dos seus pensamentos. Era um homem jovem, bastante bem parecido, valente até à temeridade. Tinha-lhe pedido uma enorme soma para a defender, para defender os seus interesses, mas... acaso não era um homem contratado para procurar a morte ou a vitória em seu proveito e do seu rancho? Tinha, portanto, o direito de fazer aquelas exigências monetárias. A verdade era que Bob parecia atraída de um modo irresistível. Julgava ver, naquela solidão, o seu sorriso franco e ao mesmo tempo trocista, ouvir o eco das suas palavras, repletas de ironia, de chiste, contra tudo o que ela dizia ou pretendia atribuir-lhe.

Quando Bradley o defendia sempre tão cegamente, era porque algo de especial tinha descoberto no pistoleiro. O abrir da porta obrigou a rapariga a voltar a cabeça. Um homem passou através da abertura, parando quase verticalmente debaixo do umbral. Os seus olhos cinzentos, penetrantes, de um olhar aguçado, contemplaram-na.

Nancy abriu a boca a ponto de lançar uma exclamação de assombro. Jim Wells estava ali. Vinha em mangas de camisa e apenas uma cartucheira, cheia de balas, da qual pendia um coldre com um grosso revólver -de seis tiros, o qualificavam como pistoleiro. Tinha-se barbeado e parecia uma pessoa muito diferente. Só o brilho daqueles olhos que queriam confundi-la, que tentavam dominá-la, fez que Nancy McCoy estremecesse!

—Olá, minha bela! — saudou ele alegremente. — Vim fazer-te companhia para não te deixar só. Como verás, os Wells não são tão terríveis nem tão perigosos como supões. Sabemos dar a cada pessoa o que lhe compete, o que lhe pertence pela sua posição na sociedade. Somos distintos, compreendes?

— Que queres daqui? — perguntou ela surpreendida ainda, sem um tom de altivez na voz.

— Já te disse. Buck, o meu irmão, é muito condescendente, e sabe que os meus caprichos são ordens. Deu-me carta branca para regular contigo o negócio do gado.

—Fora daqui! — disse ela numa explosão. Fora!

O sorriso do pistoleiro tornou-se mais largo. Olhou do alto para a rapariga e caminhou com passo lento para ela, enquanto dizia:

— Não é uma maneira muito cortês essa a de receber um amigo, Nancy McCoy. Não estás tão-pouco em condições de gritar, porque ninguém te ouviria, nem te defenderia, porque isso é impossível. Pertence-nos, compreendes? Estamos a muitas milhas do lugar em que os homens se movem; quer dizer, em que essas néscias pessoas honradas se encontram. Aqui obedecem às minhas ordens, até mesmo Buck o «assassino de Nevada». Há um homem lá fora: Drolet. É surdo como uma porta quando me interessa que o seja. Por esta razão poderíamos deixar de parte as asperezas, ser bons amigos, viver alegres e confiados aqui, onde nada te faltará. Algum dia, quando me apetecer, voltaremos ao rancho e estabelecer-nos-emos nele. A ideia é nobre e agradável não achas?

Tinha-se aproximado dela e os seus braços estendiam-se para a apertar pelos ombros. Fê-lo de uma maneira confiante, como se todo o terreno estivesse abandonado a seu favor. Mas de repente, com uma força quase impossível numa mulher, a mão direita de Nancy levantou-se, rápida e terrível, descarregando no rosto de Jim uma sonora bofetada, que o fez cambalear, chocando de costas com a parede oposta da cabana.

—Maldita! — gritou. — Maldita sejas mil vezes, víbora!

O aspeto confiado, austero, mas simples e a sua maneira delicada no falar e de procedimento desapareceram por completo. Deixou-se ver de novo a fúria incontida de um homem depravado, de uma fera sedenta vingança.

Ergueu-se e olhou para a rapariga. Depois abriu um sorriso nos seus lábios, mas um sorriso cruel, crível, que não augurava nada de bom e caminhou para ela com frenesi.

Nancy iludiu aquele ataque, dando a volta à mesa de pinho. Jim pegou nesta atirando-a contra a parede, furiosamente, e a mesa fez-se em pedaços saltando as tábuas em várias direções. Mas as cadeiras, tudo quanto podia servir como arma de arremesso, foram utilizadas pelas mãos firmes de Nancy.

Assim, furiosamente, com um nervo que muitos vaqueiros experimentados teriam invejado, defendeu-se do ataque terrível daquele canalha. Jim compreendeu que nada conseguiria pelo caminho que levava. A jovem era rápida, terrivelmente eficaz nos seus golpes de defesa, e escapava-se-lhe das mãos como uma enguia. Então gritou, chamando por Drolet em alta voz. O pistoleiro entrou. A cabana assemelhava-se a um campo de batalha.

—Vamos, estúpido! — gritou Wells, fora de si. — Agarra-a.

Mas Drolet recebeu com uma cadeira na cabeça que o fez cambalear. Tentou apoderar-se da rapariga, atacando os dois ao mesmo tempo. E embora Nancy corresse com rapidez, arfando, suando por todos os poros do seu corpo, Drolet, atirando-se ao chão, colheu-a por uma perna. Nancy rolou pelo solo e Jim Wells lançou uma exclamação de alegria, saltando sobre ela.

Quase nesse instante a porta da cabana abriu-se. Drolet estava de pé e voltou-se com a rapidez de um raio. A mão direita correu para a coronha do revólver. Sem que a arma tivesse tempo de sair do coldre, uma detonação seca, terrível, atroou o espaço. A bala cravou-se entre os olhos de Drolet, que caiu fulminado.

Jim Wells deixou a rapariga. Ainda no solo, julgando surpreender o seu inimigo, tratou de disparar. Bob McCoy, sem se alterar, começou a arrancar línguas de fogo do seu «seis tiros». Um atrás outro os pedaços de chumbo atravessaram de lado a lado o corpo do pistoleiro.

Nancy, a poucos passos dele, ainda no chão, contemplava a cena horrorizada e cravava os seus grandes olhos no rosto do primo. Nunca em toda a sua vida levada no Oeste tinha visto um homem como aquele, com tanto sangue-frio, com tanta coragem, que transpirava de todas as suas atitudes.

Olhou também para Jim Wells. O chumbo que lhe rasgava as carnes ia-lhe arrebatando a vida. Esforçou-se por conseguir levantar o cano do seu «45» para tirar e matar o seu inimigo, antes de morrer. Mas não pôde.

Detrás de McCoy outro homem surgiu. Era Sharp. Com os olhos esbugalhados olhava para aquela cena sangrenta, sem se atrever a avançar ou a recuar. Bob aproximou-se da rapariga, estendendo-lhe a mão, e disse:

— Vamos para casa, Nancy.

Ela não respondeu. Não teve coragem para pronunciar uma única palavra. Apenas fez o gesto de cobrir a parte do Ombro que estava a nu, rotas as roupas pelas duras garras dos seus dois adversários. Seguiu o pistoleiro, que se deteve junto de Sharp a quem olhou fixamente:

— Livraste-te de algo semelhante. Teddy Drolet enganou-se no caminho. Agora quero que me faças um favor. Leva a Nancy para o rancho e espera lá por mim até que eu regresse. As detonações devem ter sido ouvidas no acampamento. Hão de vir ver o que aconteceu e seríamos perseguidos. Queres fazer isso?

— Honras-me com essa confiança, McCoy.

— Entrego-ta e espero que a defendas até sua casa. Não quereria nunca ter de seguir-te os passos, ter de remover pedra sobre pedra para te procurar e fazer contigo o mesmo que a estes.

— Nem, eu... por cem mil coiotes, McCoy! Fá-lo-ei.

— Então depressa!

Nancy tentou dizer algo, falar-lhe, mas ele voltou-lhe as costas. Sharp quase que a arrastou para os cavalos. Pouco depois o pistoleiro ouviu o ruído dos cascos dos animais que se perdia para o sul daquele estreito vale, procurando a saída por um ponto diferente. Moveu-se então como uma sombra, com a espingarda na mão, levando o cavalo pelo freio e ocultou-se, prestando a tudo a maior atenção.

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