sexta-feira, 23 de julho de 2021

BIS245.04 Frente a frente: Palácios e Quintana

Já passava das onze e meia da noite. Reinava espessa escuridão. A rua maior de Corrales estava quase deserta, mas pairava nela a vida que emanava dos ruídos provenientes, em diversa escala de tons, das suas tabernas e dos seus saloons.

Martin Palácios e o xerife estavam à porta do Saloon Império, sob um dos balouçantes candeeiros de petróleo.

— Porque não vais já para o rancho, Martin? — perguntou Larson, numa tentativa para o afastar de Corrales e da ameaça proferida por Luís Quintana. — Os teus estarão inquietos, com certeza.

— Espero os meus irmãos. Disse-lhes que chegaria hoje à noite. Sei que virão buscar-me.

— Diabo! Porque se empenham vocês todos em perturbar a paz de Corrales?

— Que paz tem havido, há dezenas de anos, entre os Palácios e os Quintana? — perguntou o ex-presidiário.

— Recorda-te do que disse Luis. Aproxima-se a meia--noite e, se vocês se encontrarem todos aqui, será difícil evitar um choque de consequências calamitosas.

— Não serei eu quem o provoque.

— Já o provocaste com a tua presença, Martin. O passado não se esquece.

— Por isso eu voltei, Larson. Já o disse. Também eu não o posso esquecer. Surpreender-te-ias se soubesses como o revivi e as conclusões que tirei de tudo o que se passou.

Dois cavaleiros, que surgiram a galope no extremo norte da rua, deixaram a resposta de Larson presa na garganta. Jorge e Enrique Palácios tinham chegado. Saltaram ambos agilmente das suas montadas, quando pararam junto deles, e atroaram os ares com gritos de alvoroçada alegria.

Os três irmãos fundiram-se num emotivo e longo abraço. Mas nenhum deles conseguia falar, por causa da emoção que lhes roubara a voz.

— O pai e a mãe, como estão? — pôde, enfim, perguntar o mais velho dos Palácios.

— Esperam com impaciência o momento de te abraçarem, Martin — respondeu Jorge.

Enrique meneou a cabeça.

— O papá não está muito bem, já sabes. Foi por isso que não veio.

— Bom, Larson, até outra ocasião — despediu-se Martin. — Vamo-nos.

Larson ficou satisfeito, mas por uns momentos apenas, porque logo chegou o que ele receava.

Talvez seis ou sete cavaleiros, vindos do Sul, despontaram na rua. A frente, galopava Luis Quintana.

O xerife não perdeu tempo. Tinha o cavalo amarrado a escassas três jardas. No respetivo coldre sobressaía uma espingarda de dois canos. Em poucos segundos a carregou. Junto dos Palácios, aguardou que até eles chegassem os cavaleiros.

— Aqui estou, Martin Palácios! — exclamou Luís Quintana.

— Trazes tanta companhia, que não podes passar despercebido — comentou Martin, ironicamente.

— Lembra-te do que eu disse. A meia-noite era o limite máximo para a tua permanência em Corrales.

Jorge e Enrique riram.

— Não queremos assassinos em Corrales — prosseguiu Quintana.

— Quando estiveres mais calmo, Luís — respondeu o primogénito dos Palácios — gostava de falar contigo a esse respeito.

— Falar?

— Foi o que eu disse, Luís. Só falar. Temos de extinguir de uma vez para sempre o ódio que nos lança uns contra os outros. E eu sei como.

—Também eu: acabando contigo!

Jorge e Enrique principiavam já a impacientar-se. Não viam como se pudesse resolver aquela situação com um duelo de palavras. Era melhor empunhar as armas e liquidar o fanfarrão, bem como os seus companheiros.

Larson permanecera em silêncio, mas atento. Compreendeu também que chegara o momento de intervir, para mostrar que a estrela pendurada ao peito não era simples adorno. Levantou os percutores e aferrou a arma com um estalido seco. Moveu a espingarda, de lado a lado, sem apontar concretamente para ninguém.

Quintana e os companheiros, assim como os Palácios, passaram, sucessivamente, diante do seu ponto de mira.

— Não se empertigue tanto, xerife — advertiu Marklyn, um pistoleiro dos Quintana. — Só tem dois cartuchos nesse objeto.

— Não sejas imbecil. A distância a que estão, com cada tiro derrubo mais de dois. Acabou-se tudo. Vocês —ordenou aos irmãos Palácios —, retirem-se por ali. —Apontou para o norte da rua. — Dentro de minutos, estes farão o mesmo, para o lado oposto.

— Xerife! — berrou Luís Quintana. — Não se esqueça de quem o elege e de quem lhe paga. Será destituído! Nós, os Quintana, somos mais influentes do que esses. Hoje é a segunda vez que se cruza no meu caminho. A terceira, mato-o!

— Estás a criar-me desejos de te cortar ao meio com uma saraivada, Luís. Engole o teu ódio até rebentares com a fartura dele. Em Corrales mando eu. Já tinha calos nas mãos, de usar os colts, quando tu andavas de cueiros.

— Também não esquecerei mais essa frase, Larson! —exclamou Montana, rubro de cólera. — Está bem. Rapazes! — Dirigiu-se aos seus homens. — Vamos beber ali alguma coisa.

Em silêncio, Quintana e os pistoleiros desmontaram e entraram na taberna. Larson não os perdia de vista nem um segundo. O mesmo se dava com os Palácios, vigilantes em relação aos seus inimigos.

— Que esperam? — disse o xerife, relanceando o olhar para os três irmãos. —Para casa! Hoje não hã baile!

Martin Palácios e os irmãos, Jorge e Enrique, montaram a cavalo. Minutos depois, perdiam-se nas trevas da noite, no extremo norte da rua. Larson, vendo-os desaparecer, respirou fundo.

— Houve sorte, não? — soou junto dele a voz de Lloyd Cormon.

— Maldição! Tu, outra vez? — exclamou o xerife, de cenho carregado.

Cormon riu.

— Sou parte da sua sombra. Não se recorda?

— Está bem — murmurou o representante da Lei, com resignação. —Vamos beber, mas em lugar tranquilo. Precisamo-lo.

Cormon aceitou alegremente a proposta. Quando Lloyd se voltou, Craig Larson pôde ver o que ele ocultava atrás das costas: a Winchester, com a qual pensaria apoiar a atitude que o xerife tomasse.

Matias Quintana, escondido nas sombras de um portal, assistira a tudo. Perante o desfecho da cena, rosnou uma praga. Enfurecido, dirigiu-se para o sítio onde tinha o cavalo amarrado.

 

 

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