domingo, 11 de junho de 2023

CLF028.05 E até o irmão o quis expulsar

Brod Nolan atirou novamente com o machado para a frente e a árvore caiu com fragor. Nolan cuspiu nas palmas das mãos antes de cortar as ramadas. O suor deslizava pelo torso nu.

Quando o tronco ficou liso, sentou-se nele, limpando o suor do rosto e do peito. Buffalo Creek era um sítio ideal: água, erva alta, bosque... tudo o que um homem podia desejar para montar o seu rancho. Rochas e madeiras para construir, lenha para o fogo, erva e água abundante. E estrada aberta para o carro rodar. Para a Primavera, já teria uma cabana, estabulo e uma cerca de arame cercando a sua propriedade.

Cinco anos mais e seria um proprietário firme. Apalpou a ligadura húmida de suor. A ferida estava fechada. Ouviu campainhas.

Um carromato vetusto, puxado por duas mulas magras, aproximava-se. Da boleia saltaram dois homens com baldes. Começaram a encher de água os vários barris atados ao carromato.

Com o machado ao ombro, Nolan aproximou-se. Reconheceu no barbudo o homem que em «Las Riberas» o havia acolhido em silêncio. O outro era um rapaz de uns dezassete anos.

— Olá. Chamo-me Nolan.

— Já sabemos — disse o barbudo. — Sou Kent Flores, e este é Russ, meu filho.

— Tenho um balde de sobra, senhor Flores. Vou dar-lhe uma ajuda.

— Vejo que pretende instalar-se aqui, não é verdade? — e, de súbito, Kent Flores tirou da carroça uma espingarda, encostando-a ao estômago de Nolan

— Deixe cair o machado.

— Vigia-o bem, pai — ganiu Russ. — É capaz de rachar a cabeça...

Movendo o fecho da arma, Flores fez entrar uma bala na câmara, preparando-se para disparar. Brod Nolan deixou cair o machado para trás e ergueu mãos à altura dos ombros.

— Aquela pedra, que assinala um dos limites da sua propriedade, Nolan, você vai tirá-la... — ordeno Flores.

Caminhando até à pedra, Nolan pensou que havia levado uma hora a trazê-la desde a encosta ao vale. Cinco minutos depois conseguiu desviá-la um pouco para o lado. Limpou as mãos às calças.

— Tenho a cabeça dura, Flores e não percebo certas coisas. Porque é tudo isto?

— Amarre o seu tronco ao carro e desapareça daqui Nolan.

— Oiça, acabo de suar e tenho sede.

—Beba. Vigia-o, Russ. Apanha o machado, rapaz.

O rapaz correu a apanhar o machado. Aproximando-se da beira do riacho, Nolan ajoelhou-se, banhando o peito e a cara. Depois mergulhou os lábios nas águas cristalinas. Viu refletida a figura de Kent Flores, com a arma apoiada no antebraço.

Mergulhou as mãos na água e recolheu duas mancheias de barro e pedra do fundo do rio. Pôs-se em pé e, nas suas costas, Kent Flores ordenou:

— Conserve as mãos erguidas.

— Sim, homem. Você manda.

E voltando-se rapidamente arrojou o barro ao rosto de Flores, ao mesmo tempo que, lançando-se pelo ar, segurava com ambas as mãos a espingarda do barbudo. Flores gritou, retrocedendo, sacudindo a cabeça, lutando para ficar na posse da arma. A espingarda disparou para o céu. Nolan meteu uma perna atrás da perna esquerda de Flores e empurrou-o com a espingarda.

Quando Flores caiu para trás, Nolan deu outro esticão e apropriou-se da arma. Alojou a segunda bala na câmara, apontando-a para Russ Flores, que corria ao seu encontro com o machado na mão.

— Puxa as rédeas, rapazito. Quieto.

Russ Flores estacou de súbito, deixando cair o machado. Kent Flores levantou-se pesadamente, limpando o rosto. Deslocando-se para o lado, de forma a poder cobrir ambos, Nolan disse afavelmente:

— Volta a colocar a pedra onde estava, Kent.

— Fá-lo pai — voltou a chiar Russ. — Ele é capaz de «assar-te».

— Exatamente, filho — sorriu Nolan. — Vá, ajuda o teu paizinho, queres?

Os dois Flores trabalharam silenciosamente. Quando a pedra ficou novamente no seu devido sítio, bem perfilada com as outras, Flores grunhiu:

— Voltarei com os meus amigos, Nolan.

— Para quê continuarmos com este jogo de «tira e põe»? Não faz sentido, Kent.

—É possível que, por agora, os granjeiros signifiquem pouco, mas não consentiremos que alguém da Associação tente vedar-nos a água potável.

—E porque diabos julga você que eu trabalho par a Associação?

—E porque não? Se você bloqueia este prado, teremos de ir buscar a água a cinco milhas daqui.

— Porque nenhum de vocês reclamou esta parcela de terreno?

— Porque esta terra não pertence a ninguém. Assim o decidiu Miller. Ninguém. Ninguém pode reclamar este terreno sem o consentimento de Miller. Não se faça estúpido.

— Pode ser que eu seja ingénuo. Miller mandou-embora daqui?

— Daqui, não, mas do Grande Vau. Jones, o seu «pistoleiro», deu dez minutos a minha mulher, ao rapaz e a mim, para carregar e partir. Obedeci porque não me agrada nada ser recheado de chumbo.

— Nem a mim. Concluindo: diga aos seus amigos que eu estou aqui e que podem vir buscar toda a água que quiserem.

Receoso, Flores perguntou:

— Grátis?

— A água vem das montanhas e do céu, não é verdade?

— Continuo a crer que você é um enviado da Associação.

-- Aqui vai uma prova de que não sou, barbas.

E Brod colocou a espingarda nas mãos de Kent que, surpreendido, quase a deixou cair, enquanto Russ Flores, boquiaberto, não tinha uma expressão de grande inteligência.

— Encha os seus barris, Kent Barbas, e vá-se embora.

Voltando as costas, Nolan afastou-se. Flores foi atrás dele, dizendo:

—Eu não disparo pelas costas. Mas há outros que o farão.

Nolan apanhou o seu machado, afastando-se. Coçando a barba, Flores murmurou:

— Deve estar mais louco que um chibo.

Junto do carro, Nolan sacou da caixa das ferramentas uma picareta. Silencioso. foi marcando a linha do que seria o seu estábulo. Uma terra negra, espessa, rica...

Os Flores continuavam a encher os seus barris, olhando-o de quando em quando.

Um cavaleiro. surgiu de súbito, a toda a brida. Pensativamente, Nolan contemplou o seu irmão que desmontava e que, em silêncio, observava os troncos cortados, a terra removida e, finalmente, os dois Flores que haviam suspendido a sua tarefa.

— São teus amigos? — perguntou.

— Ainda não. Mas pode ser que se deixem domesticar.

Nervoso, Hart Nolan verificou os arreios da sua montada. Depois, sacudiu a terra do tacão da sua bota, dizendo:

— Miller foi ontem ao meu rancho. Dá-te dois dias para te ires embora.

— Ele não tinha de mandar o recado por ti.

— Penso que foi correto da sua parte meter-me no assunto.

— Isto é um assunto entre mim e Miller, Hart, Não teu.

— Que esperas aproveitar de tudo isto?

— Cento e setenta acres. Miller tem sessenta mil, Se quer que eu abandone estes cento e sessenta acres terá de o conseguir a tiros.

— Vejamos — e Hart tirou do bolso da camisa ut pequeno livro de apontamentos e um lápis. — Calculamos a um dólar e meio cada acre... — e começou a escrever números. — Acrescentemos quatro semanas de salários pelo trabalho despendido. A quarenta dólares por... Bem, arredondo a conta para quinhentos dólares. Vem comigo à cidade e eu dou-te quinhentos dólares em metal sonante. Vá, abandona esta caverna.

— Escuta, Hart. Não quero o teu dinheiro nem quero luta. Quando pedi trabalho, a tua maldita «Associação» disse que não. Mas, agora, para me afastarem daqui, será necessário um «sheriff» enviado pela capital.

— Brod... Desde que os nossos velhos morreram tentei cuidar de ti. Pensei que algum dia haveria juízo nessa cabeça. Mas enganei-me. Ainda não estás aqui há duas semanas e já causaste um borborinho dos diabos.

— Sinto muito, mas não quero discutir contigo Hart.

— Vens comigo, Brod?

— Não.

— Ofereço-te mil. É o máximo.

— A consciência acusa-te de alguma coisa, irmão?

Rápido, Hart Nolan atirou um formidável soco, cujo impacto obrigou Brod a retroceder, tropeçando na picareta e caindo de costas no solo. Levantou-se lentamente, passando as costas da mão pelos lábios sangrentos.

— Nunca mais voltes a dizer isso — gritou Hart —. Sela a tua égua e vamos.

Cuspindo sangue, Brod murmurou:

— É melhor que te afastes, Hart, por favor...

Hart desapertou os cintos e deixou cair no chão os «Colts».

— Há muito tempo que não te dou uma sova. Há demasiado tempo.

— Não o tentes, Hart. Não me obrigues a lutar contigo. Hart deu um passo e atirou um «direto» ao maxilar do irmão, obrigando-o a dar meia-volta.

Brod desequilibrou-se e foi de encontro à roda do carro. Hart avançou confiante, oscilando os braços, em posição de ataque.

Brod fintou com a direita, aplicando em seguida um colossal soco no nariz de Hart. Simultaneamente, passando por debaixo do braço estendido de Hart, safou-se do carro.

Quando Hart se voltou, recebeu uma esquerda na orelha e um «gancho» no estômago. Com expressão de assombro, Hart, com os braços estendidos ao longo do corpo, viu chegar o terceiro soco que lhe acertou no queixo. A violência do choque repercutiu-se no ombro e no braço de Brod.

Hart Nolan abraçou a roda, resvalou e caiu n erva, onde permaneceu com os olhos vidrados, respirando com dificuldade. Brod disse:

—Já basta, não é verdade?

Hart Nolan ajoelhou-se e ainda não acabara de s erguer totalmente quando investiu. Brod encaixou um esquerdo no rosto e pensou que Hart não desistiria até ficar sem sentidos. Pesava vinte quilos menos, mas dois anos de pá e picareta nas minas tinham-lhe endurecido os músculos.

A luta prosseguiu furiosa. O olho esquerdo de Brod estava quase fechado. O rosto de Hart era, todo ele, um inchaço vermelho e sangrento. Cada vez que Hart investia, Brod afastava-o com um empurrão. Mas Hart voltava sempre ao ataque. Por fim conseguiu atingi-lo no estômago, obrigando-o a dobrar-se sobre si próprio, aplicando em seguida um colossal soco no queixo.

Hart elevou-se um pouco no ar. Brod empurrou-o com a palma da mão e Hart caiu de costas, desmaiado. Brod Nolan sentou-se num tronco, deixando tombar a cabeça sobre os joelhos

Quando recuperou a sua respiração normal, aproximou-se do irmão e sentou-se a seu lado. Hart Nolan tinha o rosto inchado e uma face rasgada. Brod colocou-lhe a mão no ombro:

— Vou buscar-te um pouco de água, Hart.

Hart sentou-se com dificuldade, sacudindo os ombros para afastar a mão de Brod. Pôs-se de pé e, cambaleando, foi até ao carro, onde se encontravam, caídos no chão, os seus «Colts». Colocou o chapéu e, sempre a cambalear, dirigiu-se para o cavalo. Ergueu-se lenta e dolorosamente para a sela.

— Ouve, Hart, espera um momento. Não te vás embora assim. Se quiseres, estou disposto a apertar-te a mão.

Hart Nolan voltou-se na sela e olhou o irmão através dos olhos semicerrados pelo inchaço.

— A partir de hoje, nunca mais te voltes a atravessar no meu caminho. Se apareceres no rancho, abater-te-ei, como se abate um animal ruim.

Puxou um pouco as rédeas, tentando manter-se erguido na sela. Brod engoliu em seco. Nas suas costas ouviu o assobio de Kent Flores, que disse com simpatia:

— Aquele homem não é seu irmão, meu rapaz?

Brod assentiu pesaroso, vendo afastar-se a figura de Hart Nolan bamboleando-se na sela.

 

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