Quando os dois sujeitos, meia hora mais tarde, atravessavam o curso de água que corria pelo fundo do desfiladeiro, surpreenderam-se com a autoritária voz que provinha das sombras da vegetação:
— Não façam nenhum movimento. Um de vocês morreria, imediatamente, como morrerão se não me disserem quem planeou tudo isto.
Os dois patifes emudeceram.
— Vamos, falem!
— Quem é você?
— O homem a quem acabaram de «assassinar».
Um dos bandidos reagiu, «sacando» o revólver, lestamente. Sam limitou-se a cumprir o que ameaçara, mas não atirou a matar, contentando-se a desarmá-lo. A bala alcançou a mão assassina e o homem gritou de dor, ao mesmo tempo que soltava a arma.
O outro aproveitou a ocasião para deitar a mão ao revólver. E teria conseguido os seus propósitos se Sam não houvesse atuado tão rapidamente. Talvez por isso, não pôde afinar a pontaria e alcançou o bandido em cheio, derrubando-o do cavalo.
—Não posso perder mais tempo. Mataram-me o cavalo e, agora, terei de me servir desse. Aliás, levarei os dois.
O ferido não se atreveu a replicar. Quase podia dar graças por se encontrar ainda com vida. Sam montou, agilmente, num dos cavalos e agarrou as rédeas do outro, levando-o, também, consigo. Ao mesmo tempo que ganharia tempo na viagem, montando ora um ora outro dos animais, castigava o que tentara matá-lo, obrigando-o a regressar a pé.
O agente de Washington chegou dias depois, antes do regresso de Samuel Erikman. Recebido pelo coronel Morgan, ouviu as suas explicações e disse, por fim:
— Tenho ordens para investigar o que se passa e poder para transferir os «cherokees» para as Reservas do território de Oklahoma, se for caso disso.
— Permito-me lembrar-lhe que isso ocasionaria um grave conflito, senhor.
O agente Smith encolheu os ombros.
— Limito-me a cumprir ordens. Cumpra-as o senhor também.
— Não tenho feito outra coisa na vida, mas oxalá não tenha de propor a «Grande Trovão» o abandono das suas terras.
— «Grande Trovão» terá de obedecer.
— Nesse caso, deixa de ser uma proposta para se tornar num ultimato.
— Chame-lhe como quiser.
— Conduzir-nos-á, imediatamente, à guerra.
— Vamos falar com «Grande Trovão».
— De acordo, agente Smith. Irei, pessoalmente, consigo.
— Não. De momento, não será necessário. Quero ver o acampamento, sozinho, sem protocolos. Não temo os índios, coronel... Intervim já em muitos tratados.
Aos olhos do coronel Morgan, o agente Smith pareceu-lhe um homem íntegro, fiel cumpridor das ordens que recebia e completamente frio, quase insensível. Desejou, de todo o coração, que Deus o iluminasse.
E o que nunca supôs foi que Smith estivesse condenado à morte, logo após a sua entrevista com os «cherokees». O braço executor das ordens de Perkins dava pelo nome de Larry, e os dois homens conversavam, ultimando os preparativos da morte do agente federal.
— Aqui tens — murmurou Perkins, entregando a Larry um «tomahawk» dos «cherokees».
— Onde arranjaste isto?
—Roubei-o da tenda de um dos guerreiros. Desse modo, quando descobrirem o cadáver do agente, não subsistirão quaisquer dúvidas sobre quais foram os seus assassinos.
Larry sorriu. E, pouco depois, dirigiu-se para os arredores do povoado «cherokee». Aguardou quase uma hora, metido entre a frondosa vegetação, e era quase meia-noite quando o agente Smith abandonou o acampamento, depois de se ter entrevistado com o conselho de anciãos da tribo.
A Johnny, que continuava entre os índios, não lhe permitiram estar presente, e por isso, quando o agente Smith se dispôs a regressar, passou por ele, que, fora da sua tenda, contemplava as estrelas, esperando, fervorosamente, que tudo se resolvesse em bem.
Smith, com o cavalo a passo, afastava-se do acampamento para tomar a vertente que levava até à planície, quando Larry, agachado, surgiu por detrás dele.
— Desmonte! — ordenou. — Estou a apontar-lhe uma arma.
O agente vacilou, mas Larry repetiu a ordem.
— Dispararei, se não obedecer... Não complique as coisas, precisamos de falar.
—E necessita de uma arma para falar?
—Não faça perguntas.
Smith obedeceu, lentamente. Não esperava que o outro disparasse, friamente.
— Quem é você? — limitou-se a perguntar, tentando voltar-se.
— Quieto! Fique onde está.
Smith continuou de costas para Larry, que se aproximou, trocando o revólver pelo «tomahawk».
— Vai demorar muito tempo a dizer-me o que pretende?
— Não, Smith, acabarei agora mesmo.
O agente pressentiu o significado daquelas palavras no último momento, mas era já demasiado tarde. Larry brandia a arma «cherokee» e descarregava todo o seu peso contra as costas de Smith, que deixou escapar um grito, o último da sua vida. A afiada folha da terrível arma despedaçara-lhe o coração.
Foi então quando Johnny, ao ouvir o abafado grito, se apressou a correr para o bosque, a tempo de escutar os cascos do cavalo de Larry, que se afastava a galope. Viu corpo inerte do agente do Governo, com o «tomahawk» cravado nas costas, e descobriu algo mais. Sim! A marca de uma ferradura defeituosa! Não sabia quem fora o assassino, mas pensou que só poderia ser um dos dois patifes que continuavam à solta.
Foi em busca do seu cavalo, para o montar e perseguir o assassino, sem saber que Perkins, que continuava a incitar os homens, arranjara as coisas para que aquele cadáver fosse descoberto o mais cedo possível. F
oram três os homens que encontraram o corpo do agente federal. Os mesmos a quem Perkins pedira que inspecionassem os arredores do acampamento «cherokee». A notícia, apesar do adiantado da hora, despertou todo o povoado.
— Mataram o agente federal.
— Foram os «cherokees»!
— O tratado foi quebrado!
Johnny, entretanto, perdera o rasto da ferradura defeituosa. E perdera-o muito perto da taberna que pertencera a Brown. Preparava-se para bater à porta do estabelecimento, com o fim de averiguar se o assassino se escondia lá, quando a sua atenção foi despertada pelas vozes dos habitantes do povoado e dos forasteiros que haviam chegado atraídos pelo ouro.
A notícia da morte do agente Smith provocara um levantamento em massa e já ninguém estava disposto a esperar o desenrolar dos acontecimentos para iniciar a luta. O jovem, ao compreender que a guerra se desencadeava e que só um milagre poderia detê-la, galopou, desenfreadamente, para o forte, não tardando a ser recebido pelo coronel Morgan.
— Sei que não foram os «cherokee», coronel. O «tomahawk» foi manejado por um dos indesejáveis que descobriram o ouro.
— Tens a certeza do que afirmas, Johnny?
— Não vi o assassino, mas é inconfundível a marca que deixou uma das ferraduras do seu cavalo. Tanto poderia ter sido Larry como Farrell. Não tenho a certeza, mas o cavalo pertence a um dos dois...
— Não será fácil o nosso trabalho, Johnny.
— Bem o sei, coronel, mas há que evitar o que poderá vir a ser irreparável.
— Talvez o seja já, Johnny. Sabemos que os «cherokees» convocaram uma reunião geral com as tribos irmãs.
— Isso é coisa de «Cabeça de Alce». «Grande Trovão» jamais teria essa iniciativa, sem nos consultar primeiro.
— Tentarei fazer o que estiver ao meu alcance — prometeu Morgan.
Johnny, pelo seu lado, também estava disposto a sufocar aquela rebelião.
*
— «Cabeça de Alce» está no acampamento! — anunciou alguém, a «Grande Trovão».
O chefe dos «cherokees» voltou-se. «Cabeça de Alce», altivo e sobranceiro, avançava pele acampamento, depois de ter desmontado. Acompanhavam-no cerca de uma vintena de guerreiros.
— Que fazes aqui? Tu já não pertences à tribo e há muitos anos que te considero morto.
— Pois tu próprio podes comprovar que gozo de excelente saúde — sorriu, trocista, o rebelde.
— Por que vieste?
— Para te fazer abrir os olhos. Não é possível que ainda creias nas promessas dos brancos. Acorda para a realidade, «Grande Trovão». Tu nunca foste brando... No entanto, são, agora, muitos os que duvidam do teu valor. Conviveste demasiado com os brancos, «Grande Trovão». É hora de esqueceres os seus costumes e regressares aos nossos. Eu voltei para deixar as coisas postas nos seus lugares. Quando tudo tiver terminado, ir-me-ei embora, se é esse o teu desejo.
«Grande Trovão» não replicou e «Cabeça de Alce» compreendeu que aquele era um modo de lhe deixar o campo livrei
— É necessário recrutar todos os homens que aguentem uma carabina nas mãos! Tenho muitas armas e há que distribui-las. No povoado, os rostos-pálidos amotinam-se. E tenho informações que se dirigem para cá.
Em qualquer outra ocasião, «Grande Trovão» teria tomado uma enérgica decisão, mas, naqueles momentos, nem sequer a desagradável presença do rebelde o encorajava a tal.
Compreendia o perigo que corria o seu povo, mas era um perigo que subsistiria quer pegassem em armas quer não. Então, arquejando, quase sem alento em consequência do duro galope que imprimira à montada, chegou Johnny Erikman.
— Não façam nenhum movimento. Um de vocês morreria, imediatamente, como morrerão se não me disserem quem planeou tudo isto.
Os dois patifes emudeceram.
— Vamos, falem!
— Quem é você?
— O homem a quem acabaram de «assassinar».
Um dos bandidos reagiu, «sacando» o revólver, lestamente. Sam limitou-se a cumprir o que ameaçara, mas não atirou a matar, contentando-se a desarmá-lo. A bala alcançou a mão assassina e o homem gritou de dor, ao mesmo tempo que soltava a arma.
O outro aproveitou a ocasião para deitar a mão ao revólver. E teria conseguido os seus propósitos se Sam não houvesse atuado tão rapidamente. Talvez por isso, não pôde afinar a pontaria e alcançou o bandido em cheio, derrubando-o do cavalo.
—Não posso perder mais tempo. Mataram-me o cavalo e, agora, terei de me servir desse. Aliás, levarei os dois.
O ferido não se atreveu a replicar. Quase podia dar graças por se encontrar ainda com vida. Sam montou, agilmente, num dos cavalos e agarrou as rédeas do outro, levando-o, também, consigo. Ao mesmo tempo que ganharia tempo na viagem, montando ora um ora outro dos animais, castigava o que tentara matá-lo, obrigando-o a regressar a pé.
O agente de Washington chegou dias depois, antes do regresso de Samuel Erikman. Recebido pelo coronel Morgan, ouviu as suas explicações e disse, por fim:
— Tenho ordens para investigar o que se passa e poder para transferir os «cherokees» para as Reservas do território de Oklahoma, se for caso disso.
— Permito-me lembrar-lhe que isso ocasionaria um grave conflito, senhor.
O agente Smith encolheu os ombros.
— Limito-me a cumprir ordens. Cumpra-as o senhor também.
— Não tenho feito outra coisa na vida, mas oxalá não tenha de propor a «Grande Trovão» o abandono das suas terras.
— «Grande Trovão» terá de obedecer.
— Nesse caso, deixa de ser uma proposta para se tornar num ultimato.
— Chame-lhe como quiser.
— Conduzir-nos-á, imediatamente, à guerra.
— Vamos falar com «Grande Trovão».
— De acordo, agente Smith. Irei, pessoalmente, consigo.
— Não. De momento, não será necessário. Quero ver o acampamento, sozinho, sem protocolos. Não temo os índios, coronel... Intervim já em muitos tratados.
Aos olhos do coronel Morgan, o agente Smith pareceu-lhe um homem íntegro, fiel cumpridor das ordens que recebia e completamente frio, quase insensível. Desejou, de todo o coração, que Deus o iluminasse.
E o que nunca supôs foi que Smith estivesse condenado à morte, logo após a sua entrevista com os «cherokees». O braço executor das ordens de Perkins dava pelo nome de Larry, e os dois homens conversavam, ultimando os preparativos da morte do agente federal.
— Aqui tens — murmurou Perkins, entregando a Larry um «tomahawk» dos «cherokees».
— Onde arranjaste isto?
—Roubei-o da tenda de um dos guerreiros. Desse modo, quando descobrirem o cadáver do agente, não subsistirão quaisquer dúvidas sobre quais foram os seus assassinos.
Larry sorriu. E, pouco depois, dirigiu-se para os arredores do povoado «cherokee». Aguardou quase uma hora, metido entre a frondosa vegetação, e era quase meia-noite quando o agente Smith abandonou o acampamento, depois de se ter entrevistado com o conselho de anciãos da tribo.
A Johnny, que continuava entre os índios, não lhe permitiram estar presente, e por isso, quando o agente Smith se dispôs a regressar, passou por ele, que, fora da sua tenda, contemplava as estrelas, esperando, fervorosamente, que tudo se resolvesse em bem.
Smith, com o cavalo a passo, afastava-se do acampamento para tomar a vertente que levava até à planície, quando Larry, agachado, surgiu por detrás dele.
— Desmonte! — ordenou. — Estou a apontar-lhe uma arma.
O agente vacilou, mas Larry repetiu a ordem.
— Dispararei, se não obedecer... Não complique as coisas, precisamos de falar.
—E necessita de uma arma para falar?
—Não faça perguntas.
Smith obedeceu, lentamente. Não esperava que o outro disparasse, friamente.
— Quem é você? — limitou-se a perguntar, tentando voltar-se.
— Quieto! Fique onde está.
Smith continuou de costas para Larry, que se aproximou, trocando o revólver pelo «tomahawk».
— Vai demorar muito tempo a dizer-me o que pretende?
— Não, Smith, acabarei agora mesmo.
O agente pressentiu o significado daquelas palavras no último momento, mas era já demasiado tarde. Larry brandia a arma «cherokee» e descarregava todo o seu peso contra as costas de Smith, que deixou escapar um grito, o último da sua vida. A afiada folha da terrível arma despedaçara-lhe o coração.
Foi então quando Johnny, ao ouvir o abafado grito, se apressou a correr para o bosque, a tempo de escutar os cascos do cavalo de Larry, que se afastava a galope. Viu corpo inerte do agente do Governo, com o «tomahawk» cravado nas costas, e descobriu algo mais. Sim! A marca de uma ferradura defeituosa! Não sabia quem fora o assassino, mas pensou que só poderia ser um dos dois patifes que continuavam à solta.
Foi em busca do seu cavalo, para o montar e perseguir o assassino, sem saber que Perkins, que continuava a incitar os homens, arranjara as coisas para que aquele cadáver fosse descoberto o mais cedo possível. F
oram três os homens que encontraram o corpo do agente federal. Os mesmos a quem Perkins pedira que inspecionassem os arredores do acampamento «cherokee». A notícia, apesar do adiantado da hora, despertou todo o povoado.
— Mataram o agente federal.
— Foram os «cherokees»!
— O tratado foi quebrado!
Johnny, entretanto, perdera o rasto da ferradura defeituosa. E perdera-o muito perto da taberna que pertencera a Brown. Preparava-se para bater à porta do estabelecimento, com o fim de averiguar se o assassino se escondia lá, quando a sua atenção foi despertada pelas vozes dos habitantes do povoado e dos forasteiros que haviam chegado atraídos pelo ouro.
A notícia da morte do agente Smith provocara um levantamento em massa e já ninguém estava disposto a esperar o desenrolar dos acontecimentos para iniciar a luta. O jovem, ao compreender que a guerra se desencadeava e que só um milagre poderia detê-la, galopou, desenfreadamente, para o forte, não tardando a ser recebido pelo coronel Morgan.
— Sei que não foram os «cherokee», coronel. O «tomahawk» foi manejado por um dos indesejáveis que descobriram o ouro.
— Tens a certeza do que afirmas, Johnny?
— Não vi o assassino, mas é inconfundível a marca que deixou uma das ferraduras do seu cavalo. Tanto poderia ter sido Larry como Farrell. Não tenho a certeza, mas o cavalo pertence a um dos dois...
— Não será fácil o nosso trabalho, Johnny.
— Bem o sei, coronel, mas há que evitar o que poderá vir a ser irreparável.
— Talvez o seja já, Johnny. Sabemos que os «cherokees» convocaram uma reunião geral com as tribos irmãs.
— Isso é coisa de «Cabeça de Alce». «Grande Trovão» jamais teria essa iniciativa, sem nos consultar primeiro.
— Tentarei fazer o que estiver ao meu alcance — prometeu Morgan.
Johnny, pelo seu lado, também estava disposto a sufocar aquela rebelião.
*
— «Cabeça de Alce» está no acampamento! — anunciou alguém, a «Grande Trovão».
O chefe dos «cherokees» voltou-se. «Cabeça de Alce», altivo e sobranceiro, avançava pele acampamento, depois de ter desmontado. Acompanhavam-no cerca de uma vintena de guerreiros.
— Que fazes aqui? Tu já não pertences à tribo e há muitos anos que te considero morto.
— Pois tu próprio podes comprovar que gozo de excelente saúde — sorriu, trocista, o rebelde.
— Por que vieste?
— Para te fazer abrir os olhos. Não é possível que ainda creias nas promessas dos brancos. Acorda para a realidade, «Grande Trovão». Tu nunca foste brando... No entanto, são, agora, muitos os que duvidam do teu valor. Conviveste demasiado com os brancos, «Grande Trovão». É hora de esqueceres os seus costumes e regressares aos nossos. Eu voltei para deixar as coisas postas nos seus lugares. Quando tudo tiver terminado, ir-me-ei embora, se é esse o teu desejo.
«Grande Trovão» não replicou e «Cabeça de Alce» compreendeu que aquele era um modo de lhe deixar o campo livrei
— É necessário recrutar todos os homens que aguentem uma carabina nas mãos! Tenho muitas armas e há que distribui-las. No povoado, os rostos-pálidos amotinam-se. E tenho informações que se dirigem para cá.
Em qualquer outra ocasião, «Grande Trovão» teria tomado uma enérgica decisão, mas, naqueles momentos, nem sequer a desagradável presença do rebelde o encorajava a tal.
Compreendia o perigo que corria o seu povo, mas era um perigo que subsistiria quer pegassem em armas quer não. Então, arquejando, quase sem alento em consequência do duro galope que imprimira à montada, chegou Johnny Erikman.
*
— Com que então é este o filho de Samuel Erikman, eh? — perguntou, com dureza, «Cabeça de Alce», ao mesmo tempo que um brilho de ódio lhe perpassava pelos olhos.
Johnny encarou-se com «Grande Trovão».
— Nenhum dos teus homens deve empunhar as armas, «Grande Trovão»; se eles virem que vocês não atacam, pararão...
Os guerreiros de «Cabeça de Alce», enlouquecidos pelo álcool que continuavam a ingerir, espalhavam-se pelo acampamento, incitando os outros à luta.
— O filho de Erikman fala com língua falsa... como o pai.
— Eu diria que fala com sensatez — replicou «Grande Trovão».
— O nosso chefe está a tornar-se muito brando; mas, se ele não lutar, fá-lo-ão os nossos irmãos de raça.
— Não façam caso das suas palavras!... — protestou. Johnny, veementemente. — Eles darão cabo de vocês... É isso que pretendem. Se não pegarem em armas, o coronel Morgan apoiar-vos-á. Tenho a sua palavra.
— Não acreditem nele! Durante anos, mantiveram-nos acorrentados, enquanto eles prosperavam. Por isso não querem que nos revoltemos... Encontraram ouro na nossa montanha e só pensam em apoderar-se dela. Temos de defender o que nos pertence.
— Ninguém os obrigará a sair daqui, se não empunharem as armas! — repetiu Johnny. — Oh, meu Deus! Oxalá meu pai estivesse aqui com notícias de Washington.
A voz de Johnny foi abafada pela gritaria dos homens que se acercavam do povoado. Já distintamente, podia ouvir-se:
—Há que incendiar tudo!
— Não deixaremos nada de pé!
O coronel Morgan, à frente da guarnição do forte, avançava pelo lado oposto. Johnny correu para a entrada do acampamento, tentando deter os que se aproximavam.
— Que ninguém dê o primeiro passo!
— Fora daqui, Johnny Erikman! — gritou alguém. —Tu és amigo desses sujos índios. Como o teu pai... Se estás do seu lado, luta com eles; mas não nos convencerás.
A ingratidão humana ganhava uma força extraordinária naquela hora de loucura. Os anos de paz, as lutas e os perigos por que havia passado Samuel Erikman, tinham ficado no esquecimento.
Agora, acusavam-nos de traição, de serem amigos dos «cherokees». Sim. Na realidade, os Erikman eram amigos dos índios como o pretendiam ser de todos os que amassem a paz. Mas também para alguns «cherokees», pai e filho eram traidores ao serviço dos brancos e queriam, com boas palavras, detê-los, para que os explorassem ou lhes dessem a morte. Johnny encontrava-se, assim, entre dois fogos.
Os guerreiros, entretanto, tomavam posições para a luta. A coluna do coronel Morgan mantinha-se na expectativa, do outro lado da vertente, longe ainda do que parecia ser um iminente campo de batalha.
E, de súbito, no meio daquela caótica situação, provocada pela ambição de uns quantos homens, ressoou a voz potente e bem timbrada do veterano caçador.
— «Grande Trovão»!
— Pai!
Sim, Samuel Erikman chegara finalmente.
— Que ninguém empunhe as armas. Falei com o presidente Monroe e ele prometeu-me que ninguém os expulsará daqui, enquanto for ele a máxima autoridade da União.
Sobreveio um pesado silêncio.
— Mente! — gritou, de súbito, «Cabeça de Alce».
Os brancos mantinham-se expectantes. Misturados na multidão, encontravam-se Larry e Farrell. Saiu prosseguiu:
— Vai iniciar-se uma investigação, e os culpados de haverem vendido álcool aos índios serão castigados exemplarmente. E tu também, «Cabeça de Alce», pelo que fizeste há anos... Ainda tens uma conta pendente com a Justiça e, agora, agravaste a tua situação, querendo lançar os teus irmãos de raça numa guerra que só causaria vítimas inúteis.
As palavras de Sam pareciam ter dominado, momentaneamente, a situação, e isso ia contra os interesses de Larry, que aproveitando a confusão, «sacou» o revólver e apontou ao veterano caçador. Entretanto, Samuel Erikman continuava a falar:
— Regressem às vossas casas. Amanhã, com calma, depois de eu ter falado com o coronel, tudo se resolverá...
Nesse momento, Larry apertou o gatilho. Sam sentiu a mordedura do chumbo na carne. Quis dizer algo, mas as palavras não lhe saíram. E a sua majestosa figura tombou do cavalo, para ficar estendida no chão.
— Pai!...
— Foram os «cherokees»! — gritou alguém.
— Estava a tentar defender os que o assassinaram —acrescentou outra voz.
— A eles!
— Não! — gritou Johnny, apertando os punhos. —Não! Que ninguém se mova. O meu pai estava nessa posição, olhando para vocês — e apontou o grupo dos brancos. — A bala veio daí, logo, não foram os «cherokees» ... Há um Judas entre vocês, talvez mais do que um, mas eu farei que confessem. Todos têm de conhecê-los e a Justiça deverá ser exemplar.
Alguns «cherokees» puseram-se ao lado de Johnny.
— Estamos contigo, Johnny Erikman — disse um, no que foi corroborado pelos restantes.
— Os brancos são nossos inimigos! — gritou outro «cherokee».
— Matam-se entre eles! — ajuntou «Cabeça de Alce», aproveitando, de novo, a ocasião, para estimular os seus.
Por instantes, pareceu que tudo iria voltar ao princípio, tal a confusão que se gerou.
Johnny, alheio a quanto o rodeava, estava debruçado para o pai.
— Iremos em busca de um médico, pai...
—Não, filho... Creio que é demasiado tarde. Eu... Eu já fiz quanto me foi possível.
—Pai!...
«Grande Trovão» também estava inclinado para o seu velho amigo, bem como a formosa Nirva.
Os guerreiros continuavam a gritar e a proferir blasfémias e insultos contra os brancos. De um momento para o outro, poderia surgir o primeiro disparo ou a primeira flecha.
— O meu pai está a morrer — murmurou Johnny, com amargura. — Não façam que o seu sacrifício seja inútil. Ele sempre lutou pela conservação da paz e, agora, toca-me a mim prosseguir a sua obra. Dou-lhes a minha palavra que os culpados serão castigados...
De novo sobreveio um pesado silêncio. E foi «Grande Trovão» quem o quebrou, para dizer:
— Johnny Erikman fala com língua sensata. Nenhum dos meus guerreiros empunhará as armas.
O coronel Morgan apareceu no acampamento, para ver também o ferido.
Inclinou-se para ele.
— Morgan — murmurou Sam. — Falei com Monroe... Ele também quer a paz...
— Sim, Erikman. Eu garanto-ta, amigo. O teu sacrifício não terá sido inútil.
Samuel Erikman havia sido transportado para a tenda do chefe dos «cherokees», e o médico da coluna do coronel lutava, desesperadamente, para salvar aquela vida que se lhe escapava.
No exterior, os peles-vermelhas voltavam a escutar e palavra enérgica e decidida de «Grande Trovão». Os brancos, pelo seu lado, permaneciam silenciosos. Apenas «Cabeça de Alce» não parecia disposto a perder aquela ocasião.
— Só porque um branco morreu, iremos voltar para trás? Os que estão comigo, que se acerquem...
Adiantando-se aos acólitos do rebelde, Johnny Erikman avançou para ele.
—Há muitos anos, meu pai lutou contigo e venceu-te. Agora, irei lutar eu, «Cabeça de Alce». Creio que será a única maneira de aplacar as tuas iras. Poderás demonstrar aos teus que não tens medo. Eu tão-pouco o tenho. Aceitas o desafio?
— Lutar contigo?
— Sim... Ou será que te sentes demasiado velho? Se é assim, vai-te embora. Vai e não voltes mais.
— Agarra um «tomahawk», pequeno Erikman... Demonstrar-te-ei quem é o mais forte.
Johnny tinha refletida no rosto toda a amargura sentida pela agonia do pai, mas, com os olhos semicerrados, empunhou a arma que lhe estendia um guerreiro e preparou-se para o duelo.
Como outrora, quando ele fora mero espectador da luta travada entre o pai e «Cabeça de Alce», também, desta feita, foi o índio o primeiro a atacar, com golpes curtos, rápidos, contundentes, disposto a acabar no mais curto tempo possível.
Johnny esquivava, como podia, todos os golpes, enquanto, serenamente, aguardava a ocasião propicia para contra-atacar. Com um hábil golpe de rins, esquivou a última arremetida do «cherokee», e agarrou-lhe o braço armado, torcendo-lho com força não isenta de uma certa fúria.
O índio gritou e caiu para trás. Revolveu-se, como uma fera, para evitar a acometida de Johnny, quis passar ao ataque, mas, agora, era o jovem, digno herdeiro da bravura e valor do pai, quem atacava, obrigando o adversário a recuar, constantemente.
A luta tinha lugar num extremo do povoado, próximo da parte rochosa. Ambos os homens continuavam armados, mas o índio, com um certeiro golpe, conseguiu arrancar o «tomahawk» a Johnny. Tentou aproveitar a oportunidade para o atingir com a sua perigosa arma, mas o jovem, habilmente, esquivou o ataque, ao mesmo tempo que lançava um demolidor murro ao queixo de «Cabeça de Alce», que acusou a pancada, cambaleando ligeiramente.
Sem deixar que o outro se recompusesse, disparou a «esquerda» ao estômago do adversário, para acabar com um «gancho», que o projetou contra as rochas. A cabeça do «cherokee» chocou com a dura pedra, e caiu, inconsciente, soltando a arma.
Johnny esperou, uns instantes, que ele se levantasse, até que compreendeu que «Cabeça de Alce» jamais o faria sozinho. A pancada que dera na rocha fora mortal. Mas Johnny, enraivecido pelo que acontecera ao pai, dispunha-se a completar a sua obra.
— Coronel, vou trazer-lhe os principais culpados... Os que forneceram a uísque e armaram os «cherokees». Também tenho a certeza que foi um deles que disparou contra o meu pai... Não podem andar longe e creio que sei onde os encontrarei.
*
Larry, ao ver que a situação se complicara bastante com os últimos acontecimentos, optou por bater, dissimuladamente, em retirada. Farrell, pelo seu lado, limitou-se a resmungar, contrafeito:
— E fizemos nós tudo isto para nada...
— Teremos outras ocasiões, Farrell. Agora, o mais importante é conservar a vida. Pediremos a Perkins que nos facilite o que for necessário...
Afastaram-se, aproveitando o facto de todas as atenções estarem concentradas no duelo, mas Johnny, implacável, seguiu aquela marca inconfundível da ferradura defeituosa, que, uma vez mais, o levou até à taberna, quando os alvores da madrugada anunciavam já o nascer de um novo dia. Perkins, numa das janelas do sujo botequim, anunciou:
— Vem aí o jovem Erikman. Creio que suspeita da vossa presença aqui.
— Livrar-nos-emos dele, de uma maldita vez — disse Larry.
— Mas não aqui — replicou Perkins. — Eu quero permanecer à margem de tudo isto... para voltar à carga quando julgar oportuno.
— Vamos lá para fora, Larry. Serviram-se da porta traseira, seguindo cada um para o seu lado. Ambos iam armados e não tardaria que Johnny se encontrasse entre dois fogos. Escudados na penumbra da madrugada, esperaram que o jovem se aproximasse das traseiras da taberna.
Cautelosamente, mas sem se dar conta do iminente perigo que o espreitava, Johnny chegou até à porta e «sacou» o revólver. Ficava com outro no cinturão, com o que pertencia ao pai.
De súbito, ouviu um estalido e voltou-se, rapidamente, nessa direção. Distinguiu, claramente, a figura de Larry, e disparou, sem a mais pequena hesitação. Do lado oposto brotou, também, um fogacho, mas, como se, previamente, tivesse intuído o jogo dos dois patifes, Johnny «sacou» o outro revólver e disparou. O resultado foi idêntico. Johnny não falhara. As balas alcançaram o alvo escolhido de antemão. Os dois bandidos, com as mãos destroçadas, estavam completamente indefesos. A chegada de um oficial, à frente de alguns soldados, foi o epilogo do drama.
Farrell e Larry Stonner foram detidos e conduzidos aos calabouços, onde iriam esperar a instrução do processo, ao qual se seguiria um julgamento sumaríssimo.
Nas suas declarações, veio à baila o nome de Brown, em primeiro lugar, e, depois, o de Perkins. Como Brown já não poderia incomodar ninguém, só ficava por prender Perkins, que foi detido, quando já procurava salvação na fuga.
O juiz, enviado, expressamente, da capital federal, para que o julgamento fosse o mais imparcial possível, pronunciou a sua sentença:
— A Lei deve ser igual para todos, e a estes três homens, aos quais considero culpados de tudo o que são acusados — e nomeou o assassínio dos índios e o do agente federal enviado de Washington, além do conflito que estiveram a ponto de desencadear —, devo condená-los, e condeno-os, à pena máxima. Amanhã, ao romper do dia, serão enforcados. Que Deus tenha piedade das suas almas.
— Morreram — murmurou Johnny.
Sam, que passara vários dias lutando entre a vida e a morte, e que ainda se encontrava bastante débil, retorquiu:
— Se ao menos isso servisse para que os outros homens, qualquer que fosse a sua raça, procedessem com retidão...
— Teremos paz, pai... Mas, agora, deves descansar.
— Sim, filho, vejo que não tenho outro remédio.
Nirva acercou-se e sorriu docemente ao ferido. Beijou-o na testa e, depois, saiu com Johnny.
Estavam na granja dos Erikman.
— Salvar-se-á, salvar-se-á! — exclamou ela, feliz.
— Sim, salvar-se-á — repetiu Johnny, ajuntando: —No entanto, creio que ainda ninguém se deu verdadeira conta do muito que lhe devem. Essa bala, que o poderia ter matado, evitou o que já parecia inevitável...
Afastaram-se da casa.
O novo dia, com o sol brilhando no céu, parecia ser o prenúncio de vindouras jornadas de paz, que os homens voltariam a turvar com o seu afã de cobiça e o seu ódio ao semelhante.
Mas Johnny já não quis pensar nisso; abraçando Nirva pela cintura, atraiu-a a si, para a beijar.
— Crês que te habituarás a viver na granja quando nos casarmos?
— Sim, Johnny. Ao teu lado, viverei onde queiras —sussurrou ela.
— Com que então é este o filho de Samuel Erikman, eh? — perguntou, com dureza, «Cabeça de Alce», ao mesmo tempo que um brilho de ódio lhe perpassava pelos olhos.
Johnny encarou-se com «Grande Trovão».
— Nenhum dos teus homens deve empunhar as armas, «Grande Trovão»; se eles virem que vocês não atacam, pararão...
Os guerreiros de «Cabeça de Alce», enlouquecidos pelo álcool que continuavam a ingerir, espalhavam-se pelo acampamento, incitando os outros à luta.
— O filho de Erikman fala com língua falsa... como o pai.
— Eu diria que fala com sensatez — replicou «Grande Trovão».
— O nosso chefe está a tornar-se muito brando; mas, se ele não lutar, fá-lo-ão os nossos irmãos de raça.
— Não façam caso das suas palavras!... — protestou. Johnny, veementemente. — Eles darão cabo de vocês... É isso que pretendem. Se não pegarem em armas, o coronel Morgan apoiar-vos-á. Tenho a sua palavra.
— Não acreditem nele! Durante anos, mantiveram-nos acorrentados, enquanto eles prosperavam. Por isso não querem que nos revoltemos... Encontraram ouro na nossa montanha e só pensam em apoderar-se dela. Temos de defender o que nos pertence.
— Ninguém os obrigará a sair daqui, se não empunharem as armas! — repetiu Johnny. — Oh, meu Deus! Oxalá meu pai estivesse aqui com notícias de Washington.
A voz de Johnny foi abafada pela gritaria dos homens que se acercavam do povoado. Já distintamente, podia ouvir-se:
—Há que incendiar tudo!
— Não deixaremos nada de pé!
O coronel Morgan, à frente da guarnição do forte, avançava pelo lado oposto. Johnny correu para a entrada do acampamento, tentando deter os que se aproximavam.
— Que ninguém dê o primeiro passo!
— Fora daqui, Johnny Erikman! — gritou alguém. —Tu és amigo desses sujos índios. Como o teu pai... Se estás do seu lado, luta com eles; mas não nos convencerás.
A ingratidão humana ganhava uma força extraordinária naquela hora de loucura. Os anos de paz, as lutas e os perigos por que havia passado Samuel Erikman, tinham ficado no esquecimento.
Agora, acusavam-nos de traição, de serem amigos dos «cherokees». Sim. Na realidade, os Erikman eram amigos dos índios como o pretendiam ser de todos os que amassem a paz. Mas também para alguns «cherokees», pai e filho eram traidores ao serviço dos brancos e queriam, com boas palavras, detê-los, para que os explorassem ou lhes dessem a morte. Johnny encontrava-se, assim, entre dois fogos.
Os guerreiros, entretanto, tomavam posições para a luta. A coluna do coronel Morgan mantinha-se na expectativa, do outro lado da vertente, longe ainda do que parecia ser um iminente campo de batalha.
E, de súbito, no meio daquela caótica situação, provocada pela ambição de uns quantos homens, ressoou a voz potente e bem timbrada do veterano caçador.
— «Grande Trovão»!
— Pai!
Sim, Samuel Erikman chegara finalmente.
— Que ninguém empunhe as armas. Falei com o presidente Monroe e ele prometeu-me que ninguém os expulsará daqui, enquanto for ele a máxima autoridade da União.
Sobreveio um pesado silêncio.
— Mente! — gritou, de súbito, «Cabeça de Alce».
Os brancos mantinham-se expectantes. Misturados na multidão, encontravam-se Larry e Farrell. Saiu prosseguiu:
— Vai iniciar-se uma investigação, e os culpados de haverem vendido álcool aos índios serão castigados exemplarmente. E tu também, «Cabeça de Alce», pelo que fizeste há anos... Ainda tens uma conta pendente com a Justiça e, agora, agravaste a tua situação, querendo lançar os teus irmãos de raça numa guerra que só causaria vítimas inúteis.
As palavras de Sam pareciam ter dominado, momentaneamente, a situação, e isso ia contra os interesses de Larry, que aproveitando a confusão, «sacou» o revólver e apontou ao veterano caçador. Entretanto, Samuel Erikman continuava a falar:
— Regressem às vossas casas. Amanhã, com calma, depois de eu ter falado com o coronel, tudo se resolverá...
Nesse momento, Larry apertou o gatilho. Sam sentiu a mordedura do chumbo na carne. Quis dizer algo, mas as palavras não lhe saíram. E a sua majestosa figura tombou do cavalo, para ficar estendida no chão.
— Pai!...
— Foram os «cherokees»! — gritou alguém.
— Estava a tentar defender os que o assassinaram —acrescentou outra voz.
— A eles!
— Não! — gritou Johnny, apertando os punhos. —Não! Que ninguém se mova. O meu pai estava nessa posição, olhando para vocês — e apontou o grupo dos brancos. — A bala veio daí, logo, não foram os «cherokees» ... Há um Judas entre vocês, talvez mais do que um, mas eu farei que confessem. Todos têm de conhecê-los e a Justiça deverá ser exemplar.
Alguns «cherokees» puseram-se ao lado de Johnny.
— Estamos contigo, Johnny Erikman — disse um, no que foi corroborado pelos restantes.
— Os brancos são nossos inimigos! — gritou outro «cherokee».
— Matam-se entre eles! — ajuntou «Cabeça de Alce», aproveitando, de novo, a ocasião, para estimular os seus.
Por instantes, pareceu que tudo iria voltar ao princípio, tal a confusão que se gerou.
Johnny, alheio a quanto o rodeava, estava debruçado para o pai.
— Iremos em busca de um médico, pai...
—Não, filho... Creio que é demasiado tarde. Eu... Eu já fiz quanto me foi possível.
—Pai!...
«Grande Trovão» também estava inclinado para o seu velho amigo, bem como a formosa Nirva.
Os guerreiros continuavam a gritar e a proferir blasfémias e insultos contra os brancos. De um momento para o outro, poderia surgir o primeiro disparo ou a primeira flecha.
— O meu pai está a morrer — murmurou Johnny, com amargura. — Não façam que o seu sacrifício seja inútil. Ele sempre lutou pela conservação da paz e, agora, toca-me a mim prosseguir a sua obra. Dou-lhes a minha palavra que os culpados serão castigados...
De novo sobreveio um pesado silêncio. E foi «Grande Trovão» quem o quebrou, para dizer:
— Johnny Erikman fala com língua sensata. Nenhum dos meus guerreiros empunhará as armas.
O coronel Morgan apareceu no acampamento, para ver também o ferido.
Inclinou-se para ele.
— Morgan — murmurou Sam. — Falei com Monroe... Ele também quer a paz...
— Sim, Erikman. Eu garanto-ta, amigo. O teu sacrifício não terá sido inútil.
Samuel Erikman havia sido transportado para a tenda do chefe dos «cherokees», e o médico da coluna do coronel lutava, desesperadamente, para salvar aquela vida que se lhe escapava.
No exterior, os peles-vermelhas voltavam a escutar e palavra enérgica e decidida de «Grande Trovão». Os brancos, pelo seu lado, permaneciam silenciosos. Apenas «Cabeça de Alce» não parecia disposto a perder aquela ocasião.
— Só porque um branco morreu, iremos voltar para trás? Os que estão comigo, que se acerquem...
Adiantando-se aos acólitos do rebelde, Johnny Erikman avançou para ele.
—Há muitos anos, meu pai lutou contigo e venceu-te. Agora, irei lutar eu, «Cabeça de Alce». Creio que será a única maneira de aplacar as tuas iras. Poderás demonstrar aos teus que não tens medo. Eu tão-pouco o tenho. Aceitas o desafio?
— Lutar contigo?
— Sim... Ou será que te sentes demasiado velho? Se é assim, vai-te embora. Vai e não voltes mais.
— Agarra um «tomahawk», pequeno Erikman... Demonstrar-te-ei quem é o mais forte.
Johnny tinha refletida no rosto toda a amargura sentida pela agonia do pai, mas, com os olhos semicerrados, empunhou a arma que lhe estendia um guerreiro e preparou-se para o duelo.
Como outrora, quando ele fora mero espectador da luta travada entre o pai e «Cabeça de Alce», também, desta feita, foi o índio o primeiro a atacar, com golpes curtos, rápidos, contundentes, disposto a acabar no mais curto tempo possível.
Johnny esquivava, como podia, todos os golpes, enquanto, serenamente, aguardava a ocasião propicia para contra-atacar. Com um hábil golpe de rins, esquivou a última arremetida do «cherokee», e agarrou-lhe o braço armado, torcendo-lho com força não isenta de uma certa fúria.
O índio gritou e caiu para trás. Revolveu-se, como uma fera, para evitar a acometida de Johnny, quis passar ao ataque, mas, agora, era o jovem, digno herdeiro da bravura e valor do pai, quem atacava, obrigando o adversário a recuar, constantemente.
A luta tinha lugar num extremo do povoado, próximo da parte rochosa. Ambos os homens continuavam armados, mas o índio, com um certeiro golpe, conseguiu arrancar o «tomahawk» a Johnny. Tentou aproveitar a oportunidade para o atingir com a sua perigosa arma, mas o jovem, habilmente, esquivou o ataque, ao mesmo tempo que lançava um demolidor murro ao queixo de «Cabeça de Alce», que acusou a pancada, cambaleando ligeiramente.
Sem deixar que o outro se recompusesse, disparou a «esquerda» ao estômago do adversário, para acabar com um «gancho», que o projetou contra as rochas. A cabeça do «cherokee» chocou com a dura pedra, e caiu, inconsciente, soltando a arma.
Johnny esperou, uns instantes, que ele se levantasse, até que compreendeu que «Cabeça de Alce» jamais o faria sozinho. A pancada que dera na rocha fora mortal. Mas Johnny, enraivecido pelo que acontecera ao pai, dispunha-se a completar a sua obra.
— Coronel, vou trazer-lhe os principais culpados... Os que forneceram a uísque e armaram os «cherokees». Também tenho a certeza que foi um deles que disparou contra o meu pai... Não podem andar longe e creio que sei onde os encontrarei.
*
Larry, ao ver que a situação se complicara bastante com os últimos acontecimentos, optou por bater, dissimuladamente, em retirada. Farrell, pelo seu lado, limitou-se a resmungar, contrafeito:
— E fizemos nós tudo isto para nada...
— Teremos outras ocasiões, Farrell. Agora, o mais importante é conservar a vida. Pediremos a Perkins que nos facilite o que for necessário...
Afastaram-se, aproveitando o facto de todas as atenções estarem concentradas no duelo, mas Johnny, implacável, seguiu aquela marca inconfundível da ferradura defeituosa, que, uma vez mais, o levou até à taberna, quando os alvores da madrugada anunciavam já o nascer de um novo dia. Perkins, numa das janelas do sujo botequim, anunciou:
— Vem aí o jovem Erikman. Creio que suspeita da vossa presença aqui.
— Livrar-nos-emos dele, de uma maldita vez — disse Larry.
— Mas não aqui — replicou Perkins. — Eu quero permanecer à margem de tudo isto... para voltar à carga quando julgar oportuno.
— Vamos lá para fora, Larry. Serviram-se da porta traseira, seguindo cada um para o seu lado. Ambos iam armados e não tardaria que Johnny se encontrasse entre dois fogos. Escudados na penumbra da madrugada, esperaram que o jovem se aproximasse das traseiras da taberna.
Cautelosamente, mas sem se dar conta do iminente perigo que o espreitava, Johnny chegou até à porta e «sacou» o revólver. Ficava com outro no cinturão, com o que pertencia ao pai.
De súbito, ouviu um estalido e voltou-se, rapidamente, nessa direção. Distinguiu, claramente, a figura de Larry, e disparou, sem a mais pequena hesitação. Do lado oposto brotou, também, um fogacho, mas, como se, previamente, tivesse intuído o jogo dos dois patifes, Johnny «sacou» o outro revólver e disparou. O resultado foi idêntico. Johnny não falhara. As balas alcançaram o alvo escolhido de antemão. Os dois bandidos, com as mãos destroçadas, estavam completamente indefesos. A chegada de um oficial, à frente de alguns soldados, foi o epilogo do drama.
Farrell e Larry Stonner foram detidos e conduzidos aos calabouços, onde iriam esperar a instrução do processo, ao qual se seguiria um julgamento sumaríssimo.
Nas suas declarações, veio à baila o nome de Brown, em primeiro lugar, e, depois, o de Perkins. Como Brown já não poderia incomodar ninguém, só ficava por prender Perkins, que foi detido, quando já procurava salvação na fuga.
O juiz, enviado, expressamente, da capital federal, para que o julgamento fosse o mais imparcial possível, pronunciou a sua sentença:
— A Lei deve ser igual para todos, e a estes três homens, aos quais considero culpados de tudo o que são acusados — e nomeou o assassínio dos índios e o do agente federal enviado de Washington, além do conflito que estiveram a ponto de desencadear —, devo condená-los, e condeno-os, à pena máxima. Amanhã, ao romper do dia, serão enforcados. Que Deus tenha piedade das suas almas.
— Morreram — murmurou Johnny.
Sam, que passara vários dias lutando entre a vida e a morte, e que ainda se encontrava bastante débil, retorquiu:
— Se ao menos isso servisse para que os outros homens, qualquer que fosse a sua raça, procedessem com retidão...
— Teremos paz, pai... Mas, agora, deves descansar.
— Sim, filho, vejo que não tenho outro remédio.
Nirva acercou-se e sorriu docemente ao ferido. Beijou-o na testa e, depois, saiu com Johnny.
Estavam na granja dos Erikman.
— Salvar-se-á, salvar-se-á! — exclamou ela, feliz.
— Sim, salvar-se-á — repetiu Johnny, ajuntando: —No entanto, creio que ainda ninguém se deu verdadeira conta do muito que lhe devem. Essa bala, que o poderia ter matado, evitou o que já parecia inevitável...
Afastaram-se da casa.
O novo dia, com o sol brilhando no céu, parecia ser o prenúncio de vindouras jornadas de paz, que os homens voltariam a turvar com o seu afã de cobiça e o seu ódio ao semelhante.
Mas Johnny já não quis pensar nisso; abraçando Nirva pela cintura, atraiu-a a si, para a beijar.
— Crês que te habituarás a viver na granja quando nos casarmos?
— Sim, Johnny. Ao teu lado, viverei onde queiras —sussurrou ela.
FIM
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