sexta-feira, 26 de maio de 2023

ARZ077.11 Um encontro no oásis: mau presságio

Ao meio-dia voltaram a não parar.

— Para a frente!... Comeremos no oásis! — bradou Patrick, descarregando o chicote sobre os animais.

Ninguém fez qualquer comentário. Tinham perdido as forças até para rirem-se do seu próprio destino.

— Para diante! — gritou o escocês, sem conter a sua ira.

Os animais tinham as patas cravadas no solo, o pescoço estendido no ar e aspiravam sofregamente. Patrick compreendeu o que aquilo significava. A fina sensibilidade dos animais captava partículas de humidade suspensas na atmosfera. O oásis ainda estava longe, mas até eles chegava a humidade em proporções mínimas.

— Estamos a chegar! — gritou, louco de alegria. — Os cavalos farejam a água.

Assim era. Os animais recomeçaram a marcha. Mas agora a passo vivo. Ouviu-se um relincho. Um cavalo apercebera-se da presença da humidade na atmosfera.

— Vamos!

A caravana pareceu despertar. Os chicotes estalaram no ar e os cavalos recomeçaram a puxar os carroções, com ânsia, quase com violência. Em breve começaram a trotar. Era a presença da água, ao longe, que os atraía.

Patrick pôs-se em pé na boleia, de rédeas na mão, disposto a governar os seus cavalos. As estacas, que até ali pareciam nunca mais acabar, eram agora transpostas com rapidez quase surpreendente. Os animais já não avançavam a trote; iam quase a galope.

Apareceu uma mancha ao longe, interrompendo a superfície sem fim do deserto. Uma mancha que, à medida' que se aproximavam, mostrava cada vez mais a sua cor verde.

— O oásis! — gritou o escocês.

Era verdade. O Clermont estava a menos de quatro milhas. A partir daquele momento, ninguém conseguiu dominar os animais. Meteram a galope furioso, correram ao encontro da água de que se encontravam privados havia muitas horas. As rodas levantavam montanhas de areia. Os chicotes cortavam o ar. Em todos os olhos brilhava a alegria feroz do desejo cumprido e em breve satisfeito.

— Água! -- rugiu Benton.

— Água! — respondeu Stefan.

— Água! — gritou Catalina Ilivitch.

Aquele era o desejo de todos — um desejo que em breve seria satisfeito. As quatro milhas desapareceram debaixo das patas lançadas a galope.

O carro de Patrick foi o primeiro a chegar. Como uma tromba, atravessou a estreita faixa onde a areia lutava contra a erva que nascia junto da água e atirou-se para a superfície cristalina do líquido. Os animais não pararam enquanto as suas patas não mergulharam na água.

Claudine saltou da boleia e mergulhou. Patrick seguiu--lhe o exemplo.

Segundos mais tarde, os outros quatro carros chegaram também. E todos os colonos fizeram o mesmo. Deixaram-se cair junto do pequeno charco do oásis Clermont. Aquele oásis era um fenómeno da Natureza.

Sem explicação possível, rodeada pelas areias do deserto, nascia água cristalina. Não se conhecia a fonte, mas nunca faltava ali. Era uma água de sabor forte, fresca e agradável… Todos a sentiram correr pela garganta.

Foram minutos de felicidade completa, empapadas as roupas, molhado o corpo. Homens e mulheres, juntamente com os animais, acalmavam a sede.

O juiz Benton foi o primeiro a sentir-se satisfeito. A seguir Claudine e depois John Huston. Até o irmão deste saltara do carro para saciar a sede que lhe queimava as entranhas. A tortura experimentada nos últimos dias necessitou apenas de poucos minutos para ser aplacada.

Quando Patrick se ergueu, um sorriso de triunfo brilhava-lhe no rosto.

— Chegámos — murmurou. — Mas ainda faltava o resto do deserto — disse uma voz.

Patrick virou-se surpreendido. Fora uma voz desconhecida, alheia ao grupo da caravana. E assim era. Diante dele encontrava-se um homem de cerca de vinte e dois anos, de barba de quatro ou cinco dias, que sorria. Trazia dois «Colts» pendurados à cintura.

— Que faz você aqui? — perguntou-lhe Patrick, fitando-o.

— Esperava-os.

— Esperava-nos?... A nós?

— Quem primeiro passasse. Viajava com outros, mas não nos entendíamos. Deixaram-me aqui, um bom sítio para esperar duas semanas...

Os homens de Patrick rodeavam-no e olhavam para o desconhecido como se fosse um bicho raro. O escocês ia a perguntar-lhe o nome, quando a voz de Bardon o interrompeu:

— Que fazes aqui, Paul?

O desconhecido virou-se bruscamente, como se o tivessem picado e as suas mãos dirigiram-se rapidamente para os «Colts», que apareceram entre os seus dedos com rapidez surpreendente.

— Quieto, Paul!... Sou Louis.

O desconhecido encarou Bardon. Depois, sorrindo, guardou a artilharia, ao mesmo tempo que o sorriso que aparecera nos seus lábios se transformava em gargalhada.

— Ah, ah, ah!... Louis, meu querido Louis!... Como o mundo é pequeno! Nunca acreditaria: voltar a encontrar-te aqui, num oásis...

— Que fazes aqui, Paul? — cortou, friamente, Bardon.

— Esperava-os, já disse. Zanguei-me com a gente do grupo com que viajava e fiquei aqui, disposto a prosseguir com a primeira caravana que aparecesse. Mas nunca teria acreditado que nela viajasse o meu querido irmão.

— Mas assim sucedeu...

Todos olharam para Louis.

— Teu irmão? — perguntou Mary.

— Sim. Nasceu do segundo casamento de minha mãe.

— Apesar de sermos filhos de diferentes pais, sempre nós entendemos bem, não é verdade? — observou Paul, sorrindo.

Demonstrava possuir uma calma impressionante.

— Talvez — replicou Louis.

Os dois homens tratavam-se com uma frieza não dissimulada.

— E agora quero continuar com vocês. Suponho que não verão inconveniente...

— Vamos atravessar o deserto para o sul, afastando--nos da rota — explicou Patrick.

— Depois do Enclave Jack?

— Sim.

— Parece-me loucura, mas tenho de aceitar. Os índios atacaram a nossa expedição e suponho que não serão muitas as que tentem a travessia neste momento. Se não os sigo, exponho-me a converter-me em cadáver, esperando. Não te parece, Louis?

— Podes fazer o que quiseres.

— Obrigado, querido irmão... Acompanho-os; pelo menos até ao enclave. Lá poderei esperar todo o tempo que for preciso.

— Pode vir connosco. Sempre se arranja lugar para os amigos — disse Patrick.

— Muito bem, aceito.

A caravana ficou no oásis o resto do dia. Louis e Paul conversaram durante a maior parte da tarde.

— Por que te atravessaste no meu caminho, justamente agora? — era a pergunta de Louis.

— Em breve o saberás, irmão... E verás que te interessa.

— Mudei muito. Sou outro.

— Não acredito, Louis... Continuarás a ser o mesmo de sempre, até morreres. Conheço os homens e estou certo do que digo... Nunca me engano ao julgar o tipo de homens...

As palavras de Paul ficavam pairando. Não pressagiavam nada de bom.

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