Tinha a certeza que um terrível perigo a ameaçava. E não era só o medo que a fazia aborrecer, mas também pensar que não voltaria a ver a figura de Jim, porque, talvez o jovem tivesse abandonado a cidade. Começou a andar em direção da loja, ao passar pelo poste sentiu um desejo instintivo de o acariciar.
Faltava pouco para chegar à loja, quando conteve um grito de alegria. Acabava de ver «Calamidade» Jim que vinha na sua direção, e parecia que não a tinha visto ainda, ou não prestava atenção à sua presença. Isto produziu-lhe uma grande contrariedade, fazendo morder os lábios de despeito.
A figura do jovem dava a impressão de ter sofrido uma grande transformação, não sabendo o que era, pois a única coisa a mais eram os revólveres que levava no cinto; o resto da sua indumentária era idêntica, não levando lenço ao pescoço, e a camisa desabotoada.
Sem dúvida, o seu rosto era diferente e já não tinha aquela expressão de indiferença, mas sim mostrava agora uma firmeza extraordinária. Sim, agora tinha a certeza de que Jim podia ser um excelente vaqueiro, sendo capaz de realizar todos os trabalhos.
Sem vacilar encaminhou-se ao seu encontro. Ele parou a vê-la chegar e os seus olhos cinzentos pousaram nela interrogativamente.
— Olá, Jim! Ele levou a mão à aba do chapéu.
— Bons dias, menina Gladys.
A jovem gaguejou; agora já não se atrevia a falar com a ligeireza dantes. Aquele homem intimidava-a mas, num esforço, disse:
— Queria pedir-lhe um favor, Jim.
— Estou à sua disposição.
— Não me atrevo a pedir-lhe, pois a última vez que me ajudou não quis receber.
Ele rechaçou as palavras da jovem com energia.
— Isso não tem importância. Você é uma mulher que precisa de ajuda.
— Sim, mas sei que noutras vezes você aceitava dinheiro, ainda que fosse de uma mulher.
O bronzeado rosto do jovem corou ligeiramente, mas permaneceu impassível.
— Antes era diferente.
Estas três palavras só podiam ter um significado, queria dizer, que agora se considerava um homem diferente Gladys hesitou, e por fim decidiu-se:
— O serviço que desejo que me faça é diferente. Terá que perder toda a manhã.
— Isso não tem importância, o tempo carece de valor para mim.
— Mas... é possível que agora corra perigo.
O aspeto do jovem mudou repentinamente. Olhava-a fixamente, e as suas pupilas cinzentas, davam a sensação de penetrar até ao fundo do seu cérebro.
— Isso quer dizer que um perigo a ameaça.
Ela disse que sim com um movimento de cabeça.
— Sim — murmurou com voz sumida.
— Não se preocupe, estarei a seu lado.
— Obrigado, Jim.
E retomaram a marcha até à loja. O jovem encontrava -se intrigado, mas não fez nenhuma pergunta mais. Só sabia uma coisa e essa bastava; ela estava em perigo e era seu dever protegê-la. Ainda que fosse um bando de selvagens gritando, ele teria permanecido, a pé firme, disparando sem parar.
Gladys comprou tudo que lhe fazia falta, e Jim levou tudo para a carruagem, ficando imóvel esperando que ela falasse. A jovem não tardou em fazê-lo.
— Suba para o meu lado, Jim. Acompanhe-me até ao rancho; depois empresto-lhe um cavalo.
— Não é preciso, paremos um momento na minha casa e levarei o meu.
— Tem cavalo?
— Sim, e magnífico.
— Surpreende-me, Jim.
Pela primeira vez o viu sorrir, verificando quanto era atrativo o seu rosto varonil. Estava contente de tê-lo a seu lado; agora tinha a certeza de sentir-se protegida e que nenhum perigo podia ameaçá-la, pois aquele homem se encarregaria de os afastar. Como gostaria de apoiar a cabeça no ombro de Jim, e que diferença da sensação que lhe produziria sentir-se abraçada pelos braços dele, à de Harry Radford.
— É aqui, menina Gladys.
A jovem olhou com curiosidade para a mísera casa feita de madeira.
— É sua?
— Não, pertence a um velho caçador. Durante a sua ausência encarrego-me de cuidar dela. O velho Cumming portou-se sempre bem comigo.
Gladys pôde observar, em tudo o que via, que Jim estava limpo. Isto foi sempre uma característica do vagabundo, pois a sua pessoa, apesar, das constantes bebedeiras, sempre foi limpa.
O jovem saltou agilmente para o chão. Os seus movimentos eram rápidos e seguros; desapareceu por detrás da casa e não demorou a aparecer com o seu cavalo. Um simples olhar bastou a Gladys para verificar que Jim não exagerara ao afirmar que o animal era magnífico.
Jim atou o cavalo à traseira como pouco antes tinha feito Harry Radford. De novo ia acompanhá-la uni homem mas agora tudo era diferente, pois este inspirava absoluta confiança, quando na realidade devia ser o contrário. O jovem tinha feito menção de segui-la montado no seu cavalo, mas ela indicou-lhe o lugar a seu lado.
Gladys notava que o seu companheiro a olhava fixamente de soslaio e com frequência. Por fim disse:
— Alegro-me muito com a mudança que se deu em Jim.
— Só me limitei a deixar de beber.
— E parece-lhe pouco?
Ele voltou a cabeça e os seus olhos encontraram-se. Foi um só instante. Jim afastou os olhos e sorriu.
— Na realidade, não. Mas continuo a ser uni vagabundo, um homem inútil para os seus semelhantes.
— E porque não se decide a trabalhar? O papá admiti-lo-ia na sua equipa; tenho a certeza de que você sempre foi vaqueiro.
— Não se engana. Que perigo a ameaça ?
A jovem hesitou, mas compreendeu que o seu compa-nheiro devia saber o que se tinha passado, não devia en-frentar-se às cegas com o perigo, se Harry Radford tentasse alguma coisa contra ela. Já decidida contou tudo o que se tinha passado.
Apesar do semblante de «Calamidade» Jim continuar impassível, a jovem notou que a dureza do seu olhar se acentuava e como a sua mandíbula se contraía.
— Radford é um canalha.
O breve comentário que fez foram as suas únicas palavras, mas a jovem teve a certeza que não queria estar no lugar do rancheiro, se o jovem se decidisse a atacá-lo.
— Peço-lhe que não diga nada a meu pai.
— Não se preocupe com isso. Tem razão, o seu pai deve ignorar o que se passou. É muito valente, menina Gladys.
— Porquê, Jim? — perguntou ela surpreendida.
— Poucas mulheres teriam tido ânimo de apoderar-se do revólver de Radford e ameaçá-lo.
— Não podia permitir que me beijasse.
— Pois claro.
Gladys sentia-se contente pelo elogio de Jim, e mais quando julgou perceber um brilho de admiração no seu olhar. Um inesperado solavanco do carro fez os seus corpos unirem-se, e ela não fez o menor movimento para o evitar. Mordeu os lábios, despeitada, quando notou que ele se apressava a afastar-se.
Continuou a marcha até que, de súbito, Gladys notou como o seu companheiro se inclinava para a frente.
— Passa-se alguma coisa, Jim?
— Sim, diminua a marcha dos cavalos. Rápido! Endireitou-se, dando a sensação de ter sido impulsionado por uma mola. De um salto colocou-se na parte posterior do carro, e com uma ágil reflexão encontrou-se sobre o seu cavalo. Com um movimento desatou-o.
Jim passou pela frente de Gladys como um furacão. A jovem olhou-o surpreendida, sem compreender a que se devia a violenta reação do seu companheiro. De repente soltou um grito de terror; acabava de ver surgir vários cavaleiros mascarados.
Mas o vagabundo pareceu não ouvi-la, dirigindo-se em linha recta para os seus inimigos, sem parecer importar-se com a sua superioridade numérica. Gladys não pôde deixar de sentir-se admirada pela sua decisão e valor, assim como os seus seguros movimentos e a potência do seu poderoso ruano.
Era uma temeridade atacar de frente um inimigo superior. «Calamidade» Jim não tardaria a cair crivado pelas balas dos seus inimigos. Surpreendia-a esta louca conduta, pois o jovem demonstrou uma grande inteligência ao descobrir a emboscada antes de cair nela e, sem dúvida, a sua conduta naquele momento era inacreditável.
Ia fechar os olhos para não presenciar a morte do vagabundo, mas não o fez; pelo contrário, abriu-os o mais que podia. Acabava de ver, com assombro, como «Calamidade» Jim fazia evolucionar a sua montada de forma surpreendente, no momento preciso em que os seus inimigos disparavam.
O ruano desviou-se para a esquerda, afastando-se dos foragidos. Estes ficaram surpreendidos ao dar conta que os seus disparos se perdiam no ar. Soltaram gritos de fúria e dispuseram-se a empreender a perseguição do vagabundo.
Mas a rápida manobra que realizou surpreendeu-os por completo, não tendo tempo para pensar. O ruano obedecendo à férrea mão do seu dono fez uma brusca mudança, lançando-se como uma flecha contra os bandidos. Estes ao verem cair sobre eles aquela fúria, tentaram deter os seus cavalos para tentarem defender-se, mas Jim não lhes deu tempo.
O jovem mantendo-se erguido com uma só pressão das pernas, empunhava os seus Colts e começou a disparar com rapidez. A sua pontaria foi fatal para os homens de Radford. Três cavaleiros caíram das suas montadas, rolando pelo chão, sem vida.
No primeiro choque, Jim tinha-se desembaraçado de metade dos seus inimigos, e com a agilidade de um pele--vermelha deixou-se cair de lado do ruano, evitando, com esta rápida manobra, ser alcançado pelas balas dos foragidos. Se estes julgaram que o jovem se afastaria e pensavam atacá-lo com mais eficácia, enganaram-se. Jim realizou outra hábil manobra e voltou a disparar duas vezes. Um dos seus inimigos, alcançado na cabeça, caiu para trás, enquanto os seus companheiros completamente assustados se apressaram a fugir.
O jovem ficou indeciso por um instante não sabendo se perseguir os dois ladrões ou regressar para junto da jovem. Por fim optou pelo último, embora, tivesse gostado de acabar com aqueles canalhas. Disparou a matar, sem o menor remorso, pois na sua mente ainda estava gravado o vil assassínio dos dois vaqueiros. Quantos mais inimigos matasse, mais possibilidades teria em vencer Harry Radford.
Gladys tinha presenciado a extraordinária façanha realizada pelo vagabundo. A sua rapidez de movimentos e as suas inesperadas reações, encheram-na de admiração. Atou de novo o ruano na traseira do carro e deu uma carinhosa palmada no pescoço ao mesmo tempo que murmurava:
— Portaste-te bem, amigo.
E não tardou a estar ao lado de Gladys, que ainda não tinha saído do seu assombro.
— Já passou o perigo, menina Gladys. Podemos continuar.
— Foi admirável, e senão tem vindo comigo tinha caído em poder desses homens.
— É, provável.
— Nunca lhe poderei pagar o que fez por mim.
E apertou a mão do jovem com carinho. Jim ficou confuso e apressou-se a retirá-la.
— Não tem importância, menina Gladys.
— O que é que não tem importância? Lutou contra seis homens.
— Sim, mas eles ignoravam que estou acostumado lutar contra ladrões.
A simplicidade com que comentava a sua atuação acabou por surpreender Gladys, que perguntou, intrigada:
— Como notou a emboscada que nos preparavam?
— O brilho de um punhal fez compreender a presença desses bandidos atrás das rochas. Pagaram caro o seu erro.
O carro passou junto dos quatro cadáveres e a jovem fechou os olhos para não os ver. A voz de Jim fê-la sobressaltar ligeiramente.
— Já pode abrir os olhos.
Ela obedeceu, vendo muito próximo dela o atrativo rosto do vagabundo. Os seus olhos fixaram-se, e durante momentos perderam a noção de quanto os rodeava.
— Não volte a fechar os olhos, Gladys.
Era a primeira vez que ele a chamava simplesmente pelo seu nome, e a jovem sentiu-se dominada por uma intensa emoção. Sem dar pelo que fazia pôs as mãos no peito varonil, enquanto dizia:
— Porquê, Jim?
— Estava maravilhosa.
E Jim já não foi dono dos seus atos. A sua vontade naufragou por completo e só via aqueles lábios que se lhe ofereciam tentadores. Inclinou-se e beijou-a com ardor.
Só depois teve consciência do que tinha feito e tentou afastar-se, mas os braços da jovem estavam fortemente enlaçados à volta do seu pescoço, impedindo-o de realizar o seu propósito.
De novo voltou a beijá-la, e acariciou com ternura a nuca de Gladys, enquanto a jovem permanecia agarrada ao seu pescoço com os olhos fechados.
Jim reagiu e afastou-se com suavidade. Sentiu-se confuso, não sabendo o que fazer e para mais vendo que Gladys ocultava o rosto entre as mãos. Acusou-se de ter abusado da jovem, pois pensava que ela estava assustada e não tinha podido reagir quando ele a beijou. Tinha--se aproveitado do agradecimento que Gladys tinha por ele. Mas rechaçou esse pensamento, pois parecia-lhe sentir ainda a pressão dos braços à volta do seu pescoço; e os seus beijos tinham sido correspondidos com ardor.
— Perdoe-me, portei-me como um selvagem.
Então ela levantou a cabeça. Se esperava vê-la zangada enganou-se, o seu semblante estava corado, os seus lábios entreabertos e as suas brilhantes pupilas irradiavam unia felicidade completa.
— Não me chames menina, Jim.
— Não devia beijá-la.
— Acaso não gostaste? — perguntou a jovem com malícia.
— Sim, mas expus-me a receber um balázio.
Gladys sorriu.
— Não, Jim. Fui eu a causadora. Como ia arrebatar-te o revólver e disparar?
O rosto de Jim tornou-se sério.
— Temos que esquecer isto, Gladys.
— Porquê, Jim? — perguntou ela angustiada.
— Sou um vagabundo. — Isso não é verdade. És o homem mais nobre e valente que conheci, e já conseguiste vencer o vício da bebida.
E apoiou a cabeça no seu ombro. Foi um gesto cheio de ingénua confiança. Jim acariciou-lhe os sedosos cabelos, e continuaram em silêncio.
Faltava pouco para chegar à loja, quando conteve um grito de alegria. Acabava de ver «Calamidade» Jim que vinha na sua direção, e parecia que não a tinha visto ainda, ou não prestava atenção à sua presença. Isto produziu-lhe uma grande contrariedade, fazendo morder os lábios de despeito.
A figura do jovem dava a impressão de ter sofrido uma grande transformação, não sabendo o que era, pois a única coisa a mais eram os revólveres que levava no cinto; o resto da sua indumentária era idêntica, não levando lenço ao pescoço, e a camisa desabotoada.
Sem dúvida, o seu rosto era diferente e já não tinha aquela expressão de indiferença, mas sim mostrava agora uma firmeza extraordinária. Sim, agora tinha a certeza de que Jim podia ser um excelente vaqueiro, sendo capaz de realizar todos os trabalhos.
Sem vacilar encaminhou-se ao seu encontro. Ele parou a vê-la chegar e os seus olhos cinzentos pousaram nela interrogativamente.
— Olá, Jim! Ele levou a mão à aba do chapéu.
— Bons dias, menina Gladys.
A jovem gaguejou; agora já não se atrevia a falar com a ligeireza dantes. Aquele homem intimidava-a mas, num esforço, disse:
— Queria pedir-lhe um favor, Jim.
— Estou à sua disposição.
— Não me atrevo a pedir-lhe, pois a última vez que me ajudou não quis receber.
Ele rechaçou as palavras da jovem com energia.
— Isso não tem importância. Você é uma mulher que precisa de ajuda.
— Sim, mas sei que noutras vezes você aceitava dinheiro, ainda que fosse de uma mulher.
O bronzeado rosto do jovem corou ligeiramente, mas permaneceu impassível.
— Antes era diferente.
Estas três palavras só podiam ter um significado, queria dizer, que agora se considerava um homem diferente Gladys hesitou, e por fim decidiu-se:
— O serviço que desejo que me faça é diferente. Terá que perder toda a manhã.
— Isso não tem importância, o tempo carece de valor para mim.
— Mas... é possível que agora corra perigo.
O aspeto do jovem mudou repentinamente. Olhava-a fixamente, e as suas pupilas cinzentas, davam a sensação de penetrar até ao fundo do seu cérebro.
— Isso quer dizer que um perigo a ameaça.
Ela disse que sim com um movimento de cabeça.
— Sim — murmurou com voz sumida.
— Não se preocupe, estarei a seu lado.
— Obrigado, Jim.
E retomaram a marcha até à loja. O jovem encontrava -se intrigado, mas não fez nenhuma pergunta mais. Só sabia uma coisa e essa bastava; ela estava em perigo e era seu dever protegê-la. Ainda que fosse um bando de selvagens gritando, ele teria permanecido, a pé firme, disparando sem parar.
Gladys comprou tudo que lhe fazia falta, e Jim levou tudo para a carruagem, ficando imóvel esperando que ela falasse. A jovem não tardou em fazê-lo.
— Suba para o meu lado, Jim. Acompanhe-me até ao rancho; depois empresto-lhe um cavalo.
— Não é preciso, paremos um momento na minha casa e levarei o meu.
— Tem cavalo?
— Sim, e magnífico.
— Surpreende-me, Jim.
Pela primeira vez o viu sorrir, verificando quanto era atrativo o seu rosto varonil. Estava contente de tê-lo a seu lado; agora tinha a certeza de sentir-se protegida e que nenhum perigo podia ameaçá-la, pois aquele homem se encarregaria de os afastar. Como gostaria de apoiar a cabeça no ombro de Jim, e que diferença da sensação que lhe produziria sentir-se abraçada pelos braços dele, à de Harry Radford.
— É aqui, menina Gladys.
A jovem olhou com curiosidade para a mísera casa feita de madeira.
— É sua?
— Não, pertence a um velho caçador. Durante a sua ausência encarrego-me de cuidar dela. O velho Cumming portou-se sempre bem comigo.
Gladys pôde observar, em tudo o que via, que Jim estava limpo. Isto foi sempre uma característica do vagabundo, pois a sua pessoa, apesar, das constantes bebedeiras, sempre foi limpa.
O jovem saltou agilmente para o chão. Os seus movimentos eram rápidos e seguros; desapareceu por detrás da casa e não demorou a aparecer com o seu cavalo. Um simples olhar bastou a Gladys para verificar que Jim não exagerara ao afirmar que o animal era magnífico.
Jim atou o cavalo à traseira como pouco antes tinha feito Harry Radford. De novo ia acompanhá-la uni homem mas agora tudo era diferente, pois este inspirava absoluta confiança, quando na realidade devia ser o contrário. O jovem tinha feito menção de segui-la montado no seu cavalo, mas ela indicou-lhe o lugar a seu lado.
Gladys notava que o seu companheiro a olhava fixamente de soslaio e com frequência. Por fim disse:
— Alegro-me muito com a mudança que se deu em Jim.
— Só me limitei a deixar de beber.
— E parece-lhe pouco?
Ele voltou a cabeça e os seus olhos encontraram-se. Foi um só instante. Jim afastou os olhos e sorriu.
— Na realidade, não. Mas continuo a ser uni vagabundo, um homem inútil para os seus semelhantes.
— E porque não se decide a trabalhar? O papá admiti-lo-ia na sua equipa; tenho a certeza de que você sempre foi vaqueiro.
— Não se engana. Que perigo a ameaça ?
A jovem hesitou, mas compreendeu que o seu compa-nheiro devia saber o que se tinha passado, não devia en-frentar-se às cegas com o perigo, se Harry Radford tentasse alguma coisa contra ela. Já decidida contou tudo o que se tinha passado.
Apesar do semblante de «Calamidade» Jim continuar impassível, a jovem notou que a dureza do seu olhar se acentuava e como a sua mandíbula se contraía.
— Radford é um canalha.
O breve comentário que fez foram as suas únicas palavras, mas a jovem teve a certeza que não queria estar no lugar do rancheiro, se o jovem se decidisse a atacá-lo.
— Peço-lhe que não diga nada a meu pai.
— Não se preocupe com isso. Tem razão, o seu pai deve ignorar o que se passou. É muito valente, menina Gladys.
— Porquê, Jim? — perguntou ela surpreendida.
— Poucas mulheres teriam tido ânimo de apoderar-se do revólver de Radford e ameaçá-lo.
— Não podia permitir que me beijasse.
— Pois claro.
Gladys sentia-se contente pelo elogio de Jim, e mais quando julgou perceber um brilho de admiração no seu olhar. Um inesperado solavanco do carro fez os seus corpos unirem-se, e ela não fez o menor movimento para o evitar. Mordeu os lábios, despeitada, quando notou que ele se apressava a afastar-se.
Continuou a marcha até que, de súbito, Gladys notou como o seu companheiro se inclinava para a frente.
— Passa-se alguma coisa, Jim?
— Sim, diminua a marcha dos cavalos. Rápido! Endireitou-se, dando a sensação de ter sido impulsionado por uma mola. De um salto colocou-se na parte posterior do carro, e com uma ágil reflexão encontrou-se sobre o seu cavalo. Com um movimento desatou-o.
Jim passou pela frente de Gladys como um furacão. A jovem olhou-o surpreendida, sem compreender a que se devia a violenta reação do seu companheiro. De repente soltou um grito de terror; acabava de ver surgir vários cavaleiros mascarados.
Mas o vagabundo pareceu não ouvi-la, dirigindo-se em linha recta para os seus inimigos, sem parecer importar-se com a sua superioridade numérica. Gladys não pôde deixar de sentir-se admirada pela sua decisão e valor, assim como os seus seguros movimentos e a potência do seu poderoso ruano.
Era uma temeridade atacar de frente um inimigo superior. «Calamidade» Jim não tardaria a cair crivado pelas balas dos seus inimigos. Surpreendia-a esta louca conduta, pois o jovem demonstrou uma grande inteligência ao descobrir a emboscada antes de cair nela e, sem dúvida, a sua conduta naquele momento era inacreditável.
Ia fechar os olhos para não presenciar a morte do vagabundo, mas não o fez; pelo contrário, abriu-os o mais que podia. Acabava de ver, com assombro, como «Calamidade» Jim fazia evolucionar a sua montada de forma surpreendente, no momento preciso em que os seus inimigos disparavam.
O ruano desviou-se para a esquerda, afastando-se dos foragidos. Estes ficaram surpreendidos ao dar conta que os seus disparos se perdiam no ar. Soltaram gritos de fúria e dispuseram-se a empreender a perseguição do vagabundo.
Mas a rápida manobra que realizou surpreendeu-os por completo, não tendo tempo para pensar. O ruano obedecendo à férrea mão do seu dono fez uma brusca mudança, lançando-se como uma flecha contra os bandidos. Estes ao verem cair sobre eles aquela fúria, tentaram deter os seus cavalos para tentarem defender-se, mas Jim não lhes deu tempo.
O jovem mantendo-se erguido com uma só pressão das pernas, empunhava os seus Colts e começou a disparar com rapidez. A sua pontaria foi fatal para os homens de Radford. Três cavaleiros caíram das suas montadas, rolando pelo chão, sem vida.
No primeiro choque, Jim tinha-se desembaraçado de metade dos seus inimigos, e com a agilidade de um pele--vermelha deixou-se cair de lado do ruano, evitando, com esta rápida manobra, ser alcançado pelas balas dos foragidos. Se estes julgaram que o jovem se afastaria e pensavam atacá-lo com mais eficácia, enganaram-se. Jim realizou outra hábil manobra e voltou a disparar duas vezes. Um dos seus inimigos, alcançado na cabeça, caiu para trás, enquanto os seus companheiros completamente assustados se apressaram a fugir.
O jovem ficou indeciso por um instante não sabendo se perseguir os dois ladrões ou regressar para junto da jovem. Por fim optou pelo último, embora, tivesse gostado de acabar com aqueles canalhas. Disparou a matar, sem o menor remorso, pois na sua mente ainda estava gravado o vil assassínio dos dois vaqueiros. Quantos mais inimigos matasse, mais possibilidades teria em vencer Harry Radford.
Gladys tinha presenciado a extraordinária façanha realizada pelo vagabundo. A sua rapidez de movimentos e as suas inesperadas reações, encheram-na de admiração. Atou de novo o ruano na traseira do carro e deu uma carinhosa palmada no pescoço ao mesmo tempo que murmurava:
— Portaste-te bem, amigo.
E não tardou a estar ao lado de Gladys, que ainda não tinha saído do seu assombro.
— Já passou o perigo, menina Gladys. Podemos continuar.
— Foi admirável, e senão tem vindo comigo tinha caído em poder desses homens.
— É, provável.
— Nunca lhe poderei pagar o que fez por mim.
E apertou a mão do jovem com carinho. Jim ficou confuso e apressou-se a retirá-la.
— Não tem importância, menina Gladys.
— O que é que não tem importância? Lutou contra seis homens.
— Sim, mas eles ignoravam que estou acostumado lutar contra ladrões.
A simplicidade com que comentava a sua atuação acabou por surpreender Gladys, que perguntou, intrigada:
— Como notou a emboscada que nos preparavam?
— O brilho de um punhal fez compreender a presença desses bandidos atrás das rochas. Pagaram caro o seu erro.
O carro passou junto dos quatro cadáveres e a jovem fechou os olhos para não os ver. A voz de Jim fê-la sobressaltar ligeiramente.
— Já pode abrir os olhos.
Ela obedeceu, vendo muito próximo dela o atrativo rosto do vagabundo. Os seus olhos fixaram-se, e durante momentos perderam a noção de quanto os rodeava.
— Não volte a fechar os olhos, Gladys.
Era a primeira vez que ele a chamava simplesmente pelo seu nome, e a jovem sentiu-se dominada por uma intensa emoção. Sem dar pelo que fazia pôs as mãos no peito varonil, enquanto dizia:
— Porquê, Jim?
— Estava maravilhosa.
E Jim já não foi dono dos seus atos. A sua vontade naufragou por completo e só via aqueles lábios que se lhe ofereciam tentadores. Inclinou-se e beijou-a com ardor.
Só depois teve consciência do que tinha feito e tentou afastar-se, mas os braços da jovem estavam fortemente enlaçados à volta do seu pescoço, impedindo-o de realizar o seu propósito.
De novo voltou a beijá-la, e acariciou com ternura a nuca de Gladys, enquanto a jovem permanecia agarrada ao seu pescoço com os olhos fechados.
Jim reagiu e afastou-se com suavidade. Sentiu-se confuso, não sabendo o que fazer e para mais vendo que Gladys ocultava o rosto entre as mãos. Acusou-se de ter abusado da jovem, pois pensava que ela estava assustada e não tinha podido reagir quando ele a beijou. Tinha--se aproveitado do agradecimento que Gladys tinha por ele. Mas rechaçou esse pensamento, pois parecia-lhe sentir ainda a pressão dos braços à volta do seu pescoço; e os seus beijos tinham sido correspondidos com ardor.
— Perdoe-me, portei-me como um selvagem.
Então ela levantou a cabeça. Se esperava vê-la zangada enganou-se, o seu semblante estava corado, os seus lábios entreabertos e as suas brilhantes pupilas irradiavam unia felicidade completa.
— Não me chames menina, Jim.
— Não devia beijá-la.
— Acaso não gostaste? — perguntou a jovem com malícia.
— Sim, mas expus-me a receber um balázio.
Gladys sorriu.
— Não, Jim. Fui eu a causadora. Como ia arrebatar-te o revólver e disparar?
O rosto de Jim tornou-se sério.
— Temos que esquecer isto, Gladys.
— Porquê, Jim? — perguntou ela angustiada.
— Sou um vagabundo. — Isso não é verdade. És o homem mais nobre e valente que conheci, e já conseguiste vencer o vício da bebida.
E apoiou a cabeça no seu ombro. Foi um gesto cheio de ingénua confiança. Jim acariciou-lhe os sedosos cabelos, e continuaram em silêncio.
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