segunda-feira, 3 de novembro de 2014

PAS392. O ouro dos confederados

Contexto da passagem: Cleo não foi longe. Os dois amigos acabaram por a encontrar em Wharton City e ficaram a saber que o mapa era bem mais importante do que se julgaria.
 
 
 
As lágrimas voltaram de novo aos olhos da radiante dama.
— Escute-me Jimmy— suplicou;— acreditar-me-á se lhe contar a história desse plano?
Taylor avaliou a proposta durante meio minuto e disse:
— Não prometo acreditá-la. Mas se quer perder o seu tempo nesse relato posso ouvi-la. Ela moveu afirmativamente a linda cabeça e murmurou num sussurro:
— De acordo. — Antes de fazê-lo, uma pergunta. Quantas partes do plano tem em seu poder?
— Só uma, a que tinha você.
— Outra vez a começar?
— Juro-lhe que unicamente possuo a de Elmer Tucney.
 — E a de você?
— Eu nunca tive nenhuma.
Jim passou a mão pelo rosto e disse:
— Creio que ficarei louco, Cleo.
— Deixe que lhe conte tudo do princípio e compreenderá.
— Está bem; comece, mas procure ser sincera naquilo que diga. Garanto-lhe que é a última oportunidade que lhe dou.
— Você lembra-se do final da nossa guerra civil, não é verdade, Jim?
— Prestei serviço no II Regimento de Infantaria do Kansas.
— Também se lembra das angústias porque passaram os confederados no último ano de guerra.
— Tenho uma ideia disso. O bloqueio do Atlântico foi a corda no pescoço do Sul que ameaçava estrangulá-lo por asfixia total.
 «Confesso que é uma boa dramática. Continue.
— As tropas e as povoações dos confederados careciam do mais essencial: roupas, calçado, alimentos, artilharia... Só tinham trigo e algodão. No princípio da guerra este era exportado para Inglaterra e o Sul recebia, em troca, aquilo que mais precisava para continuar a guerra. Depois começou o bloqueio e embora houvesse alguns homens arriscados que o rompiam de vez em quando, o seu valor não era bastante para inclinar a balança a nosso favor. As coisas chegaram a uma extrema gravidade quando os ingleses, presos pelos ianques, anunciaram que recusariam os envios de algodão de procedência rebelde. Assim o comunicou o general Lee ao Governo reunido em Richmond. Então pensaram-se em medidas que solucionassem o terrível problema. Certos agentes europeus, representantes de poderosas formas industriais, comunicaram que estavam dispostos a enviar ao Sul tudo que precisassem sempre que o risco fosse da Confederação e o preço pago pelo valor da mercadoria. Uma condição mais exigiam. Esse pagamento tinha de ser feita em ouro.
Cleo fez uma pausa e prosseguiu:
— Ouro onde arranjá-lo? Aquilo era comose nos tivessem pedido a Lua. Estávamos tão longe de o conseguir, que alguns pensaram na imediata capitulação honrosa diante do General Ulisses Grant. Então um membro do Governo solicitou ao Presidente Jefferson um prazo de três dias para pensar o que se tinha a fazer. Ele concedeu-lhe esse prazo e terminado esse prazo voltou a apresentar-se diante do Presidente, acompanhado por um capitão da cavalaria. Este era Roger Dixon. Imediatamente foi apresentado ao Presidente Jefferson. Dixon expôs o seu plano. Era o mais audaz e inverosímil de quanto podia ter ouvido o chefe do Governo nas trágicas circunstâncias por que passava a Confederação.
«Dixon era oriundo da Georgia, mas no ano de 1848 tinha ido à Califórnia com muitos outros homens um pouco mais abaixo de Atlanta. Ao rebentar a guerra, ele voltou para ocupar o seu lugar na luta que se ia travar, mas centenas de companheiros ficaram nas margens do Pacífico. Dixon dizia que esses homens eram ardentes partidários do Sul, porque o levavam no sangue, e que, se não se tinham apresentado para combater era devido à idade, doenças ou decerto ao egoísmo de terem alcançado o bem-estar. Mas se se tratava de «reunir ouro» eles dariam da melhor vontade metade da sua fortuna e alguns até toda para colaborar na vitória.
O presidente ouviu Dixon emocionado, mas o raio de esperança que tinha vislumbrado apagou-se--lhe ao lembrar-se de que a Califórnia se encontrava a mais de mil milhas de onde se encontravam e tinham que romper o cerco do rio Mississipi. Dixon garantiu que se lhe dessem homens decididos, ele podia ir e voltar em seis meses, contando que sempre o acompanhasse a sua boa estrela.
«Jefferson reuniu os membros do seu Governo e comunicou o projeto do capitão Dixon. Depois de uma curta discussão provou-se que a única possibilidade de vitória favorável aos Estados Confederados estava nas mãos de Dixon.
«O capitão e uma dúzia de homens e um representante do Governo completou o número até vinte. Com essa pequena força Dixon empreendeu a sua aventura. Cruzaram o Mississipi sem que os nortistas dessem por eles, cavalgaram pelas planícies do Texas e chegaram à Califórnia. Ali as esperanças de Roger foram superadas. Num mês reuniu ouro no valor de cinco milhões de dólares.
Jim deu um assobio e exclamou:
— Que me matem se esse ouro é o do plano! Cinco milhões.
— Não se precipite, Jim, e oiça a segunda parte da história.
— Sou todo ouvidos. Que se passou depois de Dixon ter o ouro?
— Tinha pensado permanecer mais tempo na Califórnia pois que o prazo combinado tinha sido de seis meses e julgava que podia reunir muito mais metal, mas as notícias que chegavam à Califórnia eram cada vez mais pessimistas. Vitórias e avanço dos ianques. Derrotas de retiradas dos seus rivais. Aquele ouro podia chegar ao seu destino quando, não fosse necessário. Assim decidiu regressar.
«Fundiu o ouro em lingotes, carregou os cavalos e empreendeu o caminho com os seus vinte homens. Ao chegar ao Texas, enviou dois mensageiros à frente para anunciar o êxito da expedição e que o Governo ultimasse o contrato com os agentes europeus.
«Tudo era alvoroço no pequeno destacamento quando um dia, a umas duzentas milhas do Mississípi, viram voltar os dois homens que se tinham adiantado.
«Veja aquele momento, a impressão entre aqueles homens que tinham jogado a vida naquela aventura, ao saber que a guerra tinha acabado. A capitulação tinha sido assinada duas semanas antes em Apomattese entre os generais dos Exércitos, Grant e Lee.
«Naquele dia a expedição não saiu do sítio em que tinha sido surpreendida pela notícia que modificava as coisas. Para Dixon não havia dúvida quanto ao destino que tinha que dar ao ouro. Era destinado ao Governo Confederado e este já não existia. Pois que tinha sido dissolvido, devendo ser devolvido a quem tão generosamente tinha respondido à chamada do Sul. Dixon assim o comunicou aos seus homens, dizendo-lhes que no dia seguinte retrocederiam para a Califórnia. Pela cara de alguns compreendeu que aquilo não ia ser tão fácil. Efetivamente ao amanhecer, quando chegou a hora de partir, um homem falou em representação da metade do pequeno destacamento.
«Disse que já que a guerra tinha acabado e que eles tinham exposto a vida, deviam repartir o ouro entre todos. Ao fim e ao cabo quem o tinha dado eram pessoas de fortuna e não precisavam dele. Eles, pelo contrário, eram uns esfarrapados, pertencentes ao Exército derrotado, que teriam que passar muita fome até encontrar trabalho.
«Dixon sabia que para subsistir aqueles homens que o tinham acompanhado iria ser muito duro, como previu o que tinha falado, mas por outra parte, não podia dar a sua aprovação em repartir o ouro já que isso constituía um roubo. Era um homem nobre e ao mesmo tempo amigo dos seus soldados. Mas deixou a amizade de lado e disse que ninguém tocaria num grama do metal. Então o outro respondeu que já não era obrigado a obedecer às suas ordens e que eles regressariam à sua terra.
«Dixon viu-os partir com pena, não porque julgasse que se iam embora, mas sim porque sabia que voltariam em seguida e tentariam apoderar-se dos lingotes ferindo e matando.
«O capitão e os seus dez soldados empreenderam o regresso à Califórnia. Estavam preparados para repelir qualquer ataque e este não se fez esperar. O resultado foi que Dixon perdeu dois homens e os outros deixaram quatro estendidos na planície.
«Roger pensou que não desistiriam dos seus propósitos, e que pelo contrário recrutariam mais gente para não falhar o segundo golpe. Então contando que demorassem vários dias até encontrar reforços que os ajudassem, mudou o rumo e dirigiu-se para o norte.
«Os tormentos que sofreram aqueles homens em marcha foram incríveis. Atravessaram regiões desertas, lutaram, sempre fugindo, com tribos nómadas de índios, suportaram o calor, a sede, e a fome... Finalmente, quando, lhes faltava uma centena de milhas para chegar a Rota de Santa Fé, foram vítimas de uma disenteria. Só ficaram Di-xon e quatro soldados.
«O capitão Roger pensou que nunca podiam chegar à Califórnia. Tinham ficado esgotados. Unicamente tinham de seres humanos a pele e os ossos. Eram cinco fantasmas. Moviam-se porque não queriam morrer de inação.
«Então, julgando que só se salvariam se avançassem sem a «carga» e os respetivos cavalos que a transportavam, tendo presente que o menor encontro com gente sem escrúpulos perigaria a riqueza que até então tão zelosamente tinham guardado, Dixon decidiu esconder o ouro.
«Enquanto o enterravam morreu outro homem. Assim, pois, ficaram quatro. Roger deu prova, uma vez 'mais, de que desejavam entregar o ouro aos seus legítimos donos. A terra, por azar, depositária do ouro era lisa como a palma da mão. Já deve conhecer, pelo menos de ouvido, a extensão das planícies que numa centena de milhas quadradas eram todas iguais. Dixon fez um plano partindo-o de forma a que o sítio assinalado no mapa ficasse um bocado em poder de cada um. A isso dedicou dois dias enquanto os seus homens descansavam e adquiriam forças. Depois falou aos sobreviventes e deu um bocado a cada uni. Separaram-se, quando chegaram à rota de Santa Fé para encontrarem-se ao fim de um ano, 3 de Maio, em Punkey Fulh. Dixon considerou necessário aquele prazo para que todos eles recuperassem a saúde e principalmente para despistar os renegados que os estariam esperando desde há semanas nos confins da Califórnia com o propósito de que o ouro não voltasse aos seus proprietários.
«A ideia não teria sido má se os quatro homens que tomaram o compromisso tivessem vivido até 3 de Maio do ano seguinte. Mas um deles morreu e antes de expirar confiou o segredo a alguém, confiando-lhe a sua parte do mapa e pedindo-lhe que fosse ao ponto de reunião em seu nome e devolvesse o seu pedaço ao capitão Dixon. Mas esse mandatário cegou com a ambição, organizou uma quadrilha e correu a Punkey Fulh no propósito de se apoderar, fosse como fosse, dos restantes pedaços do plano.
«Roger tomou mais precauções do que nunca. Tinham passado doze meses e não sabia se aqueles três rapazes pensariam da mesma maneira sobre o destino do ouro. A verdade é que em Punchey Fulh encontrou-se com dois que continuavam a pensar da mesma maneira. Faltava o terceiro. Falavam num reservado de um saloon quando se apresentou o mandatário do morto. Dixon não teve outro remédio senão aceitar a sua colaboração. Estavam conversando sobre a expedição que tinham de empreender ao lugar do tesouro quando ouviram passos no exterior. Roger teve um pressentimento e sacou os revólveres. No mesmo instante abriu-se a porta e apareceram homens armados. Dixon começou a disparar antes que eles tivessem começado e gritou aos seus fiéis companheiros que fugissem. Partiu os candeeiros e a sala tornou-se num inferno. Quando voltou à normalidade, Roger estava no chão ferido no peito. O pedaço do mapa que guardava tinha desaparecido.
«Esteve entre a vida e a morte e quando pôde viajar regressou a Geórgia com a sua família. Não conseguiu curar-se: A ferida recebida, consumia o um tormento maior para ele: ignorar a sorte que tinham corrido os seus amigos. Frequentemente delirava de noite imaginando que o ouro tinha caído nas mãos dos bandidos. Por fim... — Cleo fez uma pausa mordendo o lábio inferior e acrescentou: — em certa manhã de Setembro morreu...».
Caiu um pesado silêncio no quarto. Jim foi até à janela e olhou em frente. Não se via ninguém. Voltou-se e disse:
 — Como sabe, com tanto detalhe, a história do capitão Dixon?
— Sou sua filha —respondeu a jovem.

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