sábado, 8 de novembro de 2014

PAS396. Ascenção e queda do vagabundo


Durante dois dias Jim, «O Calamidade», andou pelo bosque. Agora não tinha necessidade de caçar, pois possuía carne suficiente para vários dias, mas aquele lugar acalmava-lhe os seus excitados nervos. Andar pelo bosque e tomar banho num pequeno riacho representava um sedativo para ele. Antes de regressar a Los Hoyos sentou-se numa pedra e acendeu um cigarro.
Relembrou o motivo que o fez beber sem cessar. Aquilo passou-se dois anos atrás, e sem dúvida para ele parecia muito mais tempo. Nunca poderia esquecê-lo, era como um castigo que caíra sobre ele, e não obstante estava inocente. Não pôde fazer nada para o evitar.
Encontrava-se então no Arizona, juntamente com o seu irmão Gene, trabalhando num rancho. Gene tinha três anos menos do que ele e considerava-o como um filho, tendo com ele toda a classe de cuidados.
Celebrava-se um rodeo, vencendo ele as provas de tiro e de domar, e o seu triunfo, brilhantemente conseguido foi acolhido com alvoroço pelos vaqueiros da sua equipa, conseguindo que este fosse superior aos outros ranchos. Os rapazes, loucos de entusiasmo, celebraram o acontecimento bebendo em grande quantidade.
Jim quando deu conta, encontrava-se embriagado e cantando com os seus companheiros. Mas quando estavam na maior alegria soaram uns tiros, e não tardaram a comunicar-lhes que Gene tinha sido morto noutro saloon.
Louco de dor, Jim lançou-se sobre o corpo do rapaz, censurando-se por o ter deixado só, pois devia estar a seu lado como era seu dever, e não teria acontecido nada a Gene. Quando se ergueu, os vapores do álcool que nublavam o seu cérebro tinham desaparecido, e informou-se como se tinham passado as coisas.
Gene estabeleceu discussão com dois forasteiros, sendo a causa uma artista ruiva. O jovem ia a «sacar» contra um dos seus adversários, mas o outro antecipou-se e disparou contra ele. Caiu morto instantaneamente, tratando-se de um vil assassínio.
Jim não pronunciou uma só palavra. O seu semblante estava pálido como um morto e os seus olhos brilhavam ameaçadores.
Tão depressa enterrou Gene, Jim fez um embrulho das suas coisas. Em seguida montou no seu cavalo e afastou--se daquela terra onde o seu irmão encontrou a morte.
Três semanas andou na pista dos assassinos de Gene, até que, próximo da fronteira do Novo México, os encontrou. Os dois estavam a jogar o poker, colocou-se na sua frente e disse-lhes o seu nome. Imediatamente ficaram sós, compreendendo aqueles homens que o chumbo não tardaria a cruzar o espaço.
Os dois rufias tentaram realizar a mesma manobra: um deles atrairia a atenção de Jim, para dar tempo ao se companheiro de disparar contra ele. Mas enfrentando-os tinham Jim Carter, e este não era fácil que fosse surpreendido. Assim aconteceu. Os Colts de Jim apareceram nas suas mãos com uma rapidez espantosa, e disparou com raiva, não parando de o fazer até acabar com as balas.
Os corpos dos dois foragidos ficaram crivados de balas e todas certeiras. A menos perigosa teria bastado para tirar-lhes a vida.
Jim contemplou-os e os seus lábios murmuraram:
«Gene, estás vingado».
E afastou-se lentamente sem que ninguém se atrevesse a detê-lo.
Desde esse momento cavalgou à aventura, até deter-se em Los Hoyos. Não parava de beber, como se tentasse apagar da memória a imagem do irmão.
Ficou em Los Hoyos devido ao afeto que o velho caçador sentia por ele, deixando-lhe a sua casa durante a sua ausência.
O que primeiro o fez raciocinar debilmente foi a presença de Gladys Stone. A beleza daquela rapariga impressionou-o.
A segunda sacudidela que o fez estremecer todo o seu ser foi o empurrão que lhe deu Pete Kinton, e a forma cruel como matou Rowsey. Isso fez-lhe lembrar a morte de Gene e •produziu-lhe náuseas.
A terceira e definitiva foi a morte cruel dos dois vaqueiros.
Pela primeira vez pensou em deixar de beber, e que ainda podia ser útil aos seus semelhantes. Os seus temíveis Colts podiam semear o pânico entre aqueles assassinos, livrando os habitantes daquela parte do Novo México do pesadelo que os oprimia.
Quando chegou a sua casa lembrou-se que era domingo.
Notou-o ao ver as pessoas, cujas atitudes e indumentárias lhe deram a entender pelo que não pôde evitar que um irónico sorriso aparecesse nos seus lábios. Era assim todas as vezes que se tratava de um dia daqueles, pois não tinha que se preocupar com ter ou não dinheiro pois tinha a sua bebedeira assegurada, já que os convites viriam sem ele os pedir.
E tinha tomado a firme determinação de não voltar a beber uma gota de whisky. Tinha sentido o desejo louco de beber, mas lutou tenazmente para o dominar. Isto aconteceu no bosque onde se tornava mais fácil fazer, mas quando se encontrasse no povoado e em frente do saloon, seria então quando realizaria a prova suprema, no momento que pudesse ver whisky, quando o tivesse ao alcance da sua mão. Esta seria a prova definitiva.
Jim estendeu-se na cama com a cabeça apoiada entre as mãos e os olhos fixos no teto. Seria inútil dizer ao sheriff o que se tinha passado a noite passada. Não tinha prova alguma para apoiar a sua acusação contra Pete Kinton, e este era demasiado temido pelo sheriff que não o detinha.
Levantou-se e abriu o baú, apanhou o cinturão e colocou-o. As suas mãos acariciaram as coronhas dos revólveres, e fê-los girar velozmente. Os seus movimentos foram seguros e hábeis. Jim sorria ao pensar que continuava na posse da sua diabólica rapidez. Em breve seria conhecido de Pete Kinton, e estava convencido que o pistoleiro ia ter uma desagradável surpresa. Voltou a deixar o cinturão no seu esconderijo e saiu para a rua, encaminhando-se para o centro da povoação. Ninguém tinha notado nele a menor mudança, e sem dúvida tratava-se de um homem completamente distinto.
Apoiou-se a um poste, parecendo completamente indiferente a tudo que o rodeava. Viu chegar vários vaqueiros e sentiu um desejo desconhecido para ele desde há dois anos. Teria gostado de ir com eles a galopar alegremente depois de uma árdua semana de labor.
Um vaqueiro jovem e alegre desmontou agilmente e aproximou-se para lhe dizer:
— Como estás, Jim?
-- Bem, Gary. E tu?
— Perfeitamente — respondeu o rapaz enquanto olhava à sua volta com avidez. — Queres fumar?
— Aceito agradecido, rapaz.
Jim sabia qual era o motivo da ansiedade manifestada pelo rapaz, e sorriu ligeiramente ao agarrar a bolsa de tabaco. Gary Derek era um vaqueiro alegre e decidido, e fazia-lhe lembrar Gene, e não podia evitar sentir por ele um sincero afeto. Sabia que o jovem estava enamorado e que procurava a sua companhia como pretexto para se encontrar com Laura Lasky, a filha do comerciante. Não lhe importava aceitar a companhia do rapaz porque sabia que Gary o apreciava. Acabou de fazer o cigarro e acendeu-o.
— Obrigado, Gary.
— De nada, Jim. Sabes que sou teu amigo. Depois convido-te a beber.
-- Isso não aceitarei.
O jovem abriu os olhos, olhando o seu interlocutor com um brilho de espanto, raiando a estupidez.
- Não é possível, Jim! Negas-te a beber um copo de whisky?
-- Sim, Gary. Não quero voltar a beber.
— Isso é fantástico, Jim! — exclamou o jovem alegremente.

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