terça-feira, 1 de março de 2022

RB074.15 O misterioso mascarado volta a ajudar

A «Quebrada del Índio». 

Uma linha sinuosa na planície, a que certamente tinha correspondido, milhares de anos antes, um rio agora seco. 

As águas tinham formado uma espécie de parapeito, largo, cheio de voltas, de onde se via apenas a uns doze passos de distância. 

Roy parou o seu cavalo a uma distância de tiro de espingarda desse sítio. Contemplou com uma expressão preocupada aquela linha sinuosa. 

Singer tinha-lhe falado de cinco homens, mas, na realidade, dois bastariam. Roy encontrava-se a descoberto, enquanto os seus inimigos deviam estar a observá-lo de um lugar bem seguro, esperando que se aproximasse mais para o atingirem com as suas espingardas. 

Mas Roy mantinha-se à distância suficiente para que os tiros não o pudessem atingir. E foi ladeando pouco a pouco o terreno sem se aproximar mais. 

Então viu Ingrid. 

Tinham amarrado a rapariga e haviam-na deixado deitada no chão, a apenas cem metros da quebrada. 

Isso significava que quando ele se aproximasse para a salvar teria de ficar à mercê dos tiros deles, não só de espingarda, mas até de revólver. 

Claro que podia deixá-la. Podia esquecer Ingrid, que por causa do vestido vermelho era como uma mancha de sangue na planície. Mas a proximidade do tojo seco indicava a presença de escorpiões e serpentes. E esses animais poderiam sentir-se tentados a atacar uma vítima que se encontrava tão perto do solo e espantosamente imóvel pois não podia fugir. 

Roy sentiu umas gotas de suor a perlarem-lhe a testa. Tinha a certeza de que Ingrid o vira também, mas não o chamara porque percebera que aquilo era uma armadilha e não queria que ele se aproximasse. 

Nunca Roy vivera momento tão angustioso como aquele. O suor chegava-lhe aos lábios e parecia querer entrar-lhe na boca. 

Aproximar-se de Ingrid significava a morte, de modo que Roy continuou a ladear o terreno, não se aproximando de modo a ficar ao alcance dos tiros deles. Os seus inimigos deviam estar desorientados por aquela atitude, enquanto Roy continuava o caminho, fazendo os seus cálculos. 

Era evidente que os cinco atiradores estavam colocados em frente de Ingrid, supondo que ele se aproximaria imediatamente da rapariga. E com efeito teria sido isso que sucederia se Singer não o tivesse avisado da armadilha. 

Agora os pistoleiros deviam estar a voltar as suas armas para a direita, que era a direção que Ele levava. 

E, de repente, Roy lançou o seu cavalo a galope. 

Cinco tiros soaram quase ao mesmo tempo e as balas foram perder-se a pouca distância, já sem força. 

Roy dirigia-se em linha recta à «Quebrada del Índio», mas tinha deixado os seus inimigos para a direita e estes não podiam alcançá-lo. 

Chegou sem novidade à extremidade do velho rio e aí deixou o cavalo, seguindo a pé. Agora encontrava-se tão emboscado como os seus inimigos. Estes tinham sido surpreendidos por completo. 

Os seis homens — cinco de um lado e um do outro tinham que procurar-se naquele labirinto, mas sem vantagem para nenhum dos contendores. 

Roy decidiu-se a esperar. Não tinha a menor pressa. Era melhor que os seus inimigos fossem perdendo a paciência. Com todos os sentidos alerta, esperou durante quase uma hora. O silêncio podia cortar-se à faca. Aquela parte tão seca do deserto nem sequer iam os pássaros. 

Claro que o tempo trabalhava também contra Roy, ou melhor, contra Ingrid. Que sucederia se, entretanto, uma serpente se aproximasse dela? Como havia a rapariga de defender-se? 

Foi por isso que Roy se pôs em movimento e dentro em pouco teve ensejo de se felicitar por isso. Pareceu-lhe ouvir um sussurro a curta distância. Era evidente que alguém que se aproximara rastejando murmurara baixinho uma praga, ao bater com o pé num cacto, por exemplo. 

Roy esperou. Havia calculado de que lado apareceria o inimigo. Se se enganasse estava pronto. Mas não se enganou. 

O pistoleiro da «Amalgamated» apareceu justamente no sítio em que ele o esperava. O homem soltou um gemido quando a primeira bala de Roy lhe atravessou o peito. Tentou levar a mão ao gatilho, desesperadamente e as balas que Roy disparou a seguir cravaram-no por assim dizer na terra. 

Mas Roy não o viu cair. Pareceu-lhe subitamente ouvir um roçar atrás de si, apenas a uns cinco metros. Encontrava-se alguém atrás de si. Ia voltar-se, mas compreendeu que já não ia a tempo. Não o tinha perseguido um só homem, mas sim dois. Viu-o de relance, quando o outro lhe apontava raivosamente à cabeça. «Imbecil que eu fui — pensou Roy. —Imbecil...». Soou um tiro. 

Roy viu, numa espécie de alucinação que o seu inimigo levava as mãos à cabeça e caía para trás, largando a arma. Roy suspirou e sentiu-se renascer. Ainda bem que Bart estava atento! Aquele rapaz nunca falhava! 

Olhando para os dois homens caídos, Roy convenceu-se de que não o aborreceriam mais e prosseguiu então o seu caminho. Se era verdade o que lhe dissera Singer, só deviam agora restar três homens e não tinha razões para duvidar das informações do pistoleiro. Em voz baixa chamou: 

— Bart! Bart! 

O tiro que lhe salvara a vida tinha sido disparado a curta distância. O seu amigo devia estar por ali. 

— Bart! 

Então viu-o aparecer. Viu a máscara negra aparecer entre duas pedras, a uns vinte metros de distância. O efeito que produzia era fantasmagórico, mas Roy nunca sentira tanta alegria ao ver aquela cara irreconhecível, como naquele momento decisivo. Fez-lhe sinal, indicando que ia em perseguição dos outros pistoleiros. O emboscado assentiu. Logo a seguir envolveu-os de novo aquele sentimento de solidão que era quase angustioso. Roy continuou avançando, mas cada vez com mais precauções. 

Via a mancha vermelha que era o vestido de Ingrid. Isso servia-lhe de orientação. Quando ficou em frente dela, calculou que só uns poucos metros o deviam separar do esconderijo dos seus inimigos. 

Conteve a respiração. Durante momentos ficou sem saber se devia atacar ou continuar à espera. Por fim tornou uma decisão. Atacou! 

Apareceu bruscamente por um lado de um talude de terra, atrás do qual se encontrava apenas um inimigo. 

Este mostrou-se tão surpreendido como o primeiro, porque não o esperava. Ergueu o revólver demasiado tarde. Soltou um grito. E já não fez mais nada porque a bala de Roy penetrara-lhe entre os olhos e a morte foi instantânea. 

Naquele momento dois outros inimigos dispararam raivosamente, a pequena distância. Roy teve que meter a cabeça na terra para não ser atingido. Os dois inimigos tinham-lhe feito o pior que lhe podia suceder. Haviam-no imobilizado! 

Roy adivinhou o que sucederia. Enquanto um o fixava com os seus tiros o outro ia-se aproximando das suas costas. Roy não podia sequer voltar a cabeça e ver a dois passos de distância. Ouviu perfeitamente o ruído do seu corpo a arrastar-se pelo chão. Bastaria que Roy pudesse mudar de posição para acabar com ele, mas era isso justamente o que não podia fazer. 

Naquelas circunstâncias podia apenas confiar em Bart. De repente pensou: «E se Bart visse só um inimigo e não reparasse no outro? E se aquele conseguisse realmente colocar-se atrás de si.» 

Viu que chegara o momento de jogar tudo por tudo. Contou febrilmente os tiros do inimigo. Quando chegaram a seis... saltou. Se o inimigo levava dois revólveres estava liquidado. Mas tinha que confiar em que levasse só um. 

Enganou-se. O seu corpo apareceu a descoberto justamente no momento em que o inimigo punha o revólver no chão e se dispunha a tirar outro do coldre. As feições do homem revelaram assombro e horror ao mesmo tempo. Soou um tiro e o projétil atravessou o queixo do pistoleiro. 

A morte foi instantânea, porque a trajetória da bala levou-a ao cérebro. Mas Roy nem sequer teve tempo de o ver. Calculou que o outro estaria já em cima. Voltou-se, como um gato de barriga para cima, puxando do revólver. 

O segundo inimigo acabava de aparecer no alto do talude, apontando-lhe nervosamente a arma. Fez fogo. A bala roçou pelo rapaz que ripostou imediatamente, apertando o revólver com as duas mãos. Quase viu a trajetória da bala ao penetrar no coração do inimigo. Este soltou um rugido de fazer estremecer e caiu para a frente, de bruços. 

Deu quase uma volta no ar e foi cair no fundo do talude, junto de Roy. Este soltou um suspiro de alívio. Sentiu um enorme cansaço depois da tensão angustiosa a que os seus nervos tinham estado submetidos. Tinha vencido. Parecia-lhe ainda impossível, mas, com a ajuda de Bart, os cinco últimos pistoleiros da «Amalga-mated Trust» tinham sido mortos. 

Levantou-se despreocupadamente. Naquele momento, a bala, disparada a curta distância passou por assim dizer por entre os cabelos da sua cabeça. Roy caiu para trás, sentindo o sangue gelar-se-lhe. Mas o seu assombro foi tanto como o medo. 

Singer havia-lhe falado apenas de cinco pistoleiros e afinal eram seis. Era a parte mais miserável de urna armadilha miserável. Ia lançar mentalmente as culpas sabre Singer, quando de repente ouviu uma voz: 

— Roy! Atenção, Roy! Vou fazer-te uma proposta! 

Era a voz de Rawson, presidente da «Amalga-mated». Afinal Singer não o tinha enganada. Os pistoleiros eram cinco, mas o chefe tinha-os acompanhado e era isso que Singer não tinha tido maneira de saber. Uma omissão que só por milagre não custara a vida a Roy. 

A voz de Rawson voltou a ouvir-se. 

— Ouve-me bem, Roy. Estou a apontar a arma para a rapariga. Ou te entregas ou lhe meto cinco balas no corpo! 

Roy ficou paralisado. Agora não era de medo. Nem de assombro. Simplesmente não se reconhecia a si mesmo. Que lhe estava a suceder? Porque tinha sentido aquela brusca sensação de horror, como se a morte de Ingrid fosse para ele qualquer coisa de irreparável, uma coisa que não poderia suportar? Não quis dar crédito aos seus próprios sentimentos. Não quis confessar a si próprio que talvez a tivesse amado de uma maneira terna, protetora, com um carinho decente e limpo — desde o primeiro momento em que a vira. 

A voz de Rawson voltou a fazer-se ouvir. 

— Muito bem, Roy! Vejo que a rapariga não te interessa. Vou disparar! 

A voz saiu-lhe da garganta quase sem ele dar por isso. 

— Não dispare! 

— Muito bem. Então sai daí com as mãos para cima! 

Roy mordeu raivosamente os lábios até sangrarem. Mas obedeceu. Viu Rawson empunhando a espingarda, de pé, atrás de um montículo. Os olhos de Rawson chamejavam e parecia prestes a gritar. 

— Muito bem, Roy! Era assim mesmo que queria ver-te. Morrerás tu e a rapariga também! 

— Filho de uma cadela! 

Rawson, tomado de um súbito acesso de cólera, ergueu a arma para disparar. Nessa altura a cabeça saltou-lhe pelo ar. Tinham disparado a pequena distância dele, com um «Colt» 45, que é uma arma que provoca sempre aquele efeito, quando disparada de perto. 

— Magnífico trabalho, rapaz... magnífico trabalho! -- murmurou Roy, sentindo-se perder as forças. 

Fez uma saudação com a mão e a máscara negra desapareceu silenciosamente no talude. Como sempre, como de costume Bart retirava-se logo após ter completado o trabalho. Mas dessa vez Roy queria agradecer-lhe. Queria apertar-lhe a mão. 

— Bart! — gritou. — Bart. 

Mas o seu companheiro tinha já desaparecido. Os misteriosos recantos da «Quebrada del Índio» pareciam tê-lo tragado para sempre. Afinal de contas fora isso mesmo o combinado entre eles. Não deixar nunca que os vissem juntos. 

Roy suspirou, pensando que o amigo tinha muita razão para se afastar assim, mas quisera felicitá-lo e dizer-lhe que tinha atuado melhor do que nunca. Encontrou as cápsulas vazias do revólver. E viu outra coisa também: um objeto que brilhava. 

Era um relógio de ouro. Um magnífico relógio com tampa, sem corrente. Roy lembrava-se de o ter visto. As suas sobrancelhas arquearam-se e guardou o relógio num dos bolsos. 

Avançou então para Ingrid, depois de apanhar o revólver e o atirar para o fundo do talude. Era tempo. Se chegasse dois minutos mais tarde já não merecia a pena fazer nada por Ingrid. 

Uma serpente amarela, saída da areia, encontrava-se a três passos da rapariga. A sua cabeça tinha-se erguido e estava imóvel, pronta para atacar. Ingrid olhava-a corno que hipnotizada, sem sequer ter forças para gritar, para pedir socorro... 

Na altura em que o asqueroso réptil se lançava sobre ela, Roy apertou o gatilho. A cabeça do animal foi destruída, cortando-se assim a sua mortal carreira. Roy pensou que entre a cabeça da serpente e a de Rawson havia afinal muito pouca diferença. 

Quando chegou junto de Ingrid, viu que ela estava pálida como uma morta. Tinha aguentado até ao fim sem pedir socorro sequer, mas agora estava sem forças. 

Roy cortou-lhe as cordas que a prendiam. 

— Vamos rapariga... por favor trata de te pores em pé. 

— Aborrece-me que tenhas sido precisamente tu a salvar-me. - Para tua tranquilidade digo-te que o fiz bem contra a minha vontade. 

— E estive quase a morrer com... com esta roupa! 

— Pelo menos terias morrido parecendo uma mulher e não um aprendiz de ferreiro. 

— Aprendiz não. Oficial e oficial que conhece bem o seu ofício. 

Roy suspirou. 

—Porque havemos de estar sempre a discutir, Ingrid? 

— Deve ser porque no fundo nos odiamos. 

— Com certeza, mas agora temos de regressar à cidade. Precisas de beber um trago porque estás assustada. 

— E tu, não? 

— Eu preciso de dois. 

O regresso foi feito em silêncio. Ao chegar à cidade, Roy deixou Ingrid à porta do hotel e disse ao proprietário que lhe levasse uísque. 

— Bata à porta antes de entrar, sim? A rapariga deve estar a mudar de roupa. 

— Não sei se poderei. Tenho as mãos magoadas. 

— Pois ponha ferraduras novas e bata depois. 

Enquanto ela subia, o dono do hotel olhou Roy, piscando-lhe o olho. 

— Vejo que a rapariga lhe interessa mais, hem? 

— Quem disse que me interessava? 

— Pelos sintomas... 

— Ingrid não me interessa nada. Mais a mais é uma rapariguinha. 

— Deve ter uns dezassete anos. E muito bem aproveitados. 

— São poucos. Quantos anos tem o senhor? 

— Vinte e três. 

— Também não é velho. 

— Pois podia ter sido professor dela. Antes de tudo é preciso seriedade, caramba! 

O dono do hotel sorriu. 

— Não falemos mais nisso, venha tomar qualquer coisa. É por conta da casa. 

— Creia que desta vez preciso disso. E todas as pessoas honestas, da cidade, irão precisar também: Toda a organização da «Amalgamated» foi destruída. 

— Não sabe o que isso significa. Tonopah estava dominada pelos seus pistoleiros. Isso já não voltará a suceder. 

Roy bebeu o seu uísque e imediatamente começou a sentir-se mais animado. 

— É preciso avisar o xerife — disse. 

— Que grande desgosto ele vai ter. Não terá outro remédio senão demitir-se, agora que os seus protetores desapareceram todos. Ouça... 

— Que é? 

— Porque não fica você com esse lugar? 

— Eu serei toda a vida uma ave de arribação — respondeu Roy. 

Depois saiu. O sol brilhava. Parecia a Roy que brilhava mais, que tudo era maravilhoso naquela manhã. Viu então aparecer Key com um olho ainda tapado. 

— Olá, Key. 

— Olá, rapaz!  Corre por aí rumor que deste cabo da «Amalgamated».

— Vejo que as coisas aqui se sabem depressa. 

—Isso é assim. Quando se trata de tiros toda a gente sabe logo o que se passa. Quando se morre de morte natural, pelo contrário, nem se recordam das pessoas. 

— Tens razão. 

Roy passou a mão pela cara 

— Mas porque diabo me falas nisso? 

— É a propósito de Bart! 

— Que sucedeu a Bart? 

— Já várias vezes tenho tentado dizer-te, mas a conversa era demasiadamente triste e tenho-a sempre adiado. Bart morreu. 

Roy sentiu-se estremecer da cabeça aos pés. O dia que havia pouco lhe parecia tão alegre, achava-o agora sombrio. 

— Quando... sucedeu isso? 

— Devia estar aqui apenas há um dia. Eu e outro tipo é que o enterrámos. 

— E de que morreu? 

— Uma coisa disparatada. Uma coisa que pode suceder a qualquer pessoa. Caiu do cavalo com pouca sorte. 

Roy baixou a cabeça. A sensação de vertigem foi tão fatal que esteve a pontos de cair para a frente. 

— Que tens? 

— Nada... nada. 

Os nervos de Roy vibravam. Se Bart o tinha salvo apenas da primeira vez, quem o fizera das outras? Quem o tinha salvo, especialmente naquela manhã? 

De repente voltou-se. Parecia um autómato. 

— Mas o que vais fazer, Roy? Asseguro-te que o teu amigo nada sofreu. Nem sequer chegou a perceber o que se passou. E foi enterrado piedosamente! 

Roy pareceu já não ouvir aquelas palavras. Dirigiu-se ao sítio onde deixara o cavalo e montou. Encaminhou-se então, a passo para o sítio onde ainda funcionavam os escritórios das minas de Hada. Dessa vez encontrava-se apenas lá o marido. O resto do edifício parecia vazio. Roy desmontou lentamente. Na sua mão brilhava o relógio de ouro que há pouco encontrara. 

— Creio... que perdeu isto — disse para o homem que se aproximara. 

O outro pegou no relógio. A sua mão não tremia. 

— É possível! Ao mesmo tempo tirou de um dos bolsos uma fina máscara de seda preta. 

— Talvez queira guardar isto como recordação. Levava-a um homem que morreu num acidente e a quem ajudei a enterrar. Era um homem de cuja atuação eu me tinha dado conta. 

— Compreendo. 

Roy guardou a mascarilha. 

— A um homem que diz as coisas cara a cara e que não mata um inimigo podendo fazê-lo, há que ajudá-lo! — disse Flanagan. 

— Obrigado! 

— Eu é que agradeço, Roy. E devo-lhe sete mil e quinhentos dólares, não o esqueça. 

— Não os quero. Digo-lhe o que deve fazer com eles. Guarde-os para o seu primeiro filho, para que tenha uma educação esmerada. Se alguma vez lhe falar nisso, diga-lhe que é em recordação de um homem que nunca devia ter deixado de ser professor. 

Os dois homens apertaram as mãos. Não havia mais nada a dizer entre eles. 

Ao chegar à cidade, Roy foi ao hotel onde se alojava Ingrid. E fez aquilo que recomendara ao hoteleiro que não fizesse. Entrou sem bater. E aconteceu que Ingrid estava naquele momento a mudar de roupa. Não soltou nenhum grito ao vê-lo entrar. Nem sequer parou. Continuou simplesmente a fazer o que estava a fazer. 

— Sabes? — disse dai a instantes. — Começo a gostar deste género de roupa. 

— Mau é... 

— Porquê? 

— Porque terei de te oferecer mais alguma coisa. 

— O quê? Um vestido de noiva. 

Ingrid olhou-o pelo canto dos olhos. 

— Então no fundo não nos odiamos? Sim, mas é tanto no fundo que... que o ódio desapareceu. 

Ingrid sorriu. Sorriu de uma forma nova, inteiramente feliz talvez pela primeira vez na sua vida. 

— Mas senhor professor! Que sério que está! Não quer beijar-me? Apenas para aprenderes como se faz... como uma... lição. 

Ia experimentá-lo quando de repente a porta se abriu. 

Key entrou, muito decidido. O seu único olho destapado brilhava. 

— Estás aqui, Roy? Vou seguir o teu conselho e casar com a rapariga! E vou levá-la daqui mesmo que ela me dê outro soco! 

Roy murmurou: 

— Não ela não to dará — e acrescentou suavemente: — Tens de desculpar, mas desta vez serei eu a dar-to! 

Com a mão direita acertou em cheio no olho são de Key. 

— Mas que se passa? Que significa isto? — perguntou Key, espantado. 

Roy murmurou: 

— Vamos, Ingrid. A lição... Mas com este homem aqui... 

— Não te preocupes. Dentro de meia hora ele não vê absolutamente nada! 



FIM





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