terça-feira, 24 de março de 2015

PAS447. Uma mulher a xerife

O trajo negro, de luto, fazia com que Faith Purvis parecesse duplamente bela.
O vestido que envergava, cingia-lhe as curvas do seu corpo jovem e bem formado.
Os cabelos loiros brilhavam como trigo e eram apertados sobre a nuca por uma fita preta.
O seu rosto denotava firmeza dominante do sentimento de pena que lhe tinha causado a morte de seu pai, o sheriff Purvis.
Faith encontrava-se à mesa de seu pai. Nas suas coz-tas, ficava a porta de ferro que dava acesso aos calaboiços. À esquerda, ficava-lhe o expositor dos anúncios, com os papéis das pessoas reclamadas pelas autoridades. A direita, o depósito das armas, com meia dúzia de rifles. Sob esse depósito, um gavetão para os revólveres e munições.
Do outro lado, em duas filas de cinco cadeiras cada uma, estavam sentados dez homens. Eram os mais representativos da cidade.
Por detrás da rapariga, sentados também, havia mais dois homens, cada um dos quais tinha a correspondente estrela, símbolo de autoridade. Eram os ajudantes do extinto sheriff.
— Homens! — disse Faith; era a única pessoa de pé. — Vocês conhecem-me. Sabem quais são os meus desejos, mas não estão inteirados das razões porque os convoquei.
— Para pedir vingança pela morte de seu pai, não? — disse um.
— Engana-se, senhor Powell — contestou ela friamente. — Não quero vingança, senão justiça. E espero que vocês ma proporcionem.
— Como! De que maneira? Não se consegue encontrar os assassinos.
— Mas há-de conseguir-se. Mas agora não quero falar disso, mas sim dos meus projetos. Quero, exijo justiça. No entanto, para obtê-la, é preciso que vocês, os representantes da cidade, nomeiem um novo sheriff. Um sheriff que se não deixe intimidar por ameaças, coações, nem aceite subornos para fechar os olhos e virar costas. É um representante da Lei assim, que desejo que vocês nomeiem.
— Não há quem queira aceitar o cargo, Faith — disse um dos presentes.
— Estamos cansados de procurar por todos os lados —disse outro.
— A nossa cidade tem muito má fama nesse sentido — queixou-se um terceiro.
—  Porque assim querem !... —respondeu ela sem pestanejar. — Porque são egoístas, olham só para os seus interesses e conveniências, sem se preocuparem com os outros. Nada lhes interessa, desde que vivam sem gran-des dificuldades, desde que os fugitivos que infestam a cidade os não incomodem, mesmo que tornem a vida impossível às pessoas decentes. Nomeiem um sheriff resoluto e valoroso e ofereçam-lhe o seu apoio incondicional. Verão quão depressa a cidade retoma o bom nome que não deve perder.
— As vezes — considerou um — não é só uma paga maior ou menor, mas mais talvez o ter-se vontade de aceitar o cargo.
— É que não há ninguém que queira seguir o caminho de seu pai, menina Purvis — disse outro.
— Meu pai era valente e honrado e por isso morreu. Cometeu-se aqui um crime disfarçado sob a classificação de legítima defesa. No fundo todos vocês estão convencidos disso mas nenhum se atreveu ainda a erguer a voz. -O único que o fez... morreu assassinado a sua voz estrangulou-se repentinamente na garganta.
— E é o que sucederá àquele que substituir a seu pai, Faith — disse um dos presentes.
Ela olhou com indignação para o que falara.
— Você, senhor Stunell, é dos que menos podem falar. Durante o tempo que meu pai foi sheriff, a cidade viveu em paz. O seu negócio prosperou notavelmente. Agora torna a descer. Porquê? Explique.
Stunell baixou os olhos, envergonhado.
— Eu digo-lhe. As pessoas dos ranchos vizinhos da cidade não se atrevem sequer a vir aqui à cidade, receosas de serem roubadas pelos gatunos. O gado mingua consideravelmente e, por conseguinte, os rancheiros sofrem graves prejuízos. Isto está sucedendo a três semanas apenas da morte do meu pai. O que será daqui a três meses?
— Bem — disse um dos presentes —, mas que podemos nós fazer se ninguém quer o cargo? Oferecemos um soldo muito superior ao habitual. Até já anunciámos isso nos jornais de outras cidades. Ninguém quer a estrela.
— Precisa-se de um homem duro, valente, rápido nas armas, que não tenha medo nem do próprio demónio— disse um outro.
— E onde o havemos de encontrar? — inquiriu um terceiro.
Houve um largo silêncio após a pergunta. Faith foi fitando um por um todos os presentes. Nenhum aguentou o seu olhar.
— Bem — disse por fim a rapariga —, eu sei onde poderão encontrar esse sheriff.
— Conhece-o?
— Como se chama?
— Onde está ele?
As perguntas sucediam-se nas bocas dos presentes. Deliberadamente, Faith fez uma pausa. Depois disse:
— Aqui.
— Aqui? E quem é? Algum dos seus ajudantes?
— Não. Eu simplesmente.
De novo reinou o silêncio.
Alguém explodiu:
— Mas isso é um absurdo! Uma mulher... armada em sheriff! Onde se viu semelhante farsa? — Numa cidade onde todos são uns farsantes — respondeu Faith, sem se alterar. Depois prosseguiu, com entusiasmo: — Eu posso ser o sheriff que desejam. Não sou tonta, tenho a coragem suficiente para enfrentar o mais perigoso criminoso, sei montar a cavalo como o melhor cavaleiro, e atiro tão bem como qualquer de vocês. Nomeiem-me sheriff da cidade e garanto-lhes que antes de dois meses reinará aqui uma tal tranquilidade como nunca conheceram.
— Você, sheriff! — grunhiu Stunell.
Faith fitou-o friamente.
— Não é altura de fazer comentários, mas dizer simplesmente sim ou não à minha proposta. Vocês todos representam a cidade que os nomeou membros do Conselho Municipal. Assim, o que decidirem será perfeitamente legal.
— Oh, céus! Se tal fizermos, toda a Nação se rirá de nós!— comentou um, levando as mãos à cabaça.
— Prefere o riso à ruína, senhor Webber? — perguntou ela.
— Claro que não, mas...
— E supõe que os fugitivos respeitarão o seu cargo, menina Purvis? — perguntou um indivíduo com todo o ar de um próspero comerciante.
— Respeitarão a única lei que conhecem. — A mão da jovem apontou para o armeiro. — E eu agirei de modo que não duvidem, senhor Otway.
Houve outra pausa embaraçosa.
— Bem — disse Faith, finalmente —, que decidem?
Tom Nyssen era o presidente do Conselho Municipal. Pôs-se de pé.
— Faith, nós vamos deliberar. Deixe-nos sós uns momentos, sim?
— Com muito gosto, senhor Nyssen.
— Vocês também — disse Nyssen aos comissários, que se puseram de pé e saíram para a rua.
Faith viu-se no quarto que fora de seu pai e onde o velho sheriff costumava dormir quando tinha gente a mais nos calaboiços. Aguardou, procurando dominar o seu nervosismo.
Sabia bem quão insólita era a sua proposta. Uma mulher sheriff! Era coisa que nunca se vira! Era certo que até certo ponto, Juanita Calamidad tinha feito coisa parecida, acompanhando Wild Bill Hickock nas suas andanças, mas jamais desempenhara um cargo oficial, embora mais de uma vez o tivesse ajudado a reduzir o número dos criminosos. Mas ela, agora, encarregar-se da vigilância duma cidade...
Apercebeu-se vagamente do murmúrio dos conselheiros, discutindo acaloradamente a sua proposta. Uma voz fez-se ouvir mais estridente, mas as demais impuseram--lhe calma. Por último, uma mão bateu à porta.
— Faith, já pode vir!...
Abriu a porta e enfrentou-se com os conselheiros. Olhou todos, um por um. E eles retribuíram-lhe o olhar. Nyssen adiantou-se uni passo.
— Faith, discutimos um pouco, temos de o confessar, mas finalmente acordámos aceitar a tua proposta.
 

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