domingo, 24 de outubro de 2021

CNT009.01 Planos sinistros

OS seis homens reuniram-se num ponto da floresta onde as árvores se agrupavam, espalhando sombras em toda a volta. Os seus rostos não inspiravam confiança e nos gestos, nervosos e desconfiados, havia algo de comprometedor. Sentaram-se no solo sobre o capim, e um deles parecia ter-se encontrado há pouco com os restantes, porque começou imediatamente a inteirá-los das novidades que trazia: 

— Os peles-vermelhas estão firmemente dispostos a aniquilar Forte Oregon a todo o custo, reapossando-se das suas terras, que se prolongam por toda a área até ao rio. O chefe «Abutre Negro» vai lançar em breve todos os «Sioux» sob o seu comando numa luta devastadora. 

— Que lhe prometeste? — perguntou um dos presentes. 

— A nossa estreita colaboração e auxílio. A nós pouco interessa o que possa vir a suceder a Forte Oregon e a todas as vidas que lá se encontram! O que importa é sacarmos benefícios de quem nos quer ajudar... e essa ajuda vem dos índios... 

— Que garantias nos dão eles? 

—Todas as peles que precisarmos, e ainda uma boa manada de cavalos das suas pastagens — o bastante para dentro de algum tempo fazermos negócio de monta no Sul... 

— Que teremos nós a fazer? 

— Matar à nascença todos os planos que visem prestar assistência ao Forte! Se esse objetivo for totalmente alcançado, os índios cumprirão a sua promessa. 

— Quando começamos? 

— Dentro de poucas horas. Os índios foram informados pelos seus mensageiros da planície de que a guarnição de Oregon aguarda ainda esta semana um importante carregamento de armas e munições, além de medicamentos para a enfermaria do Forte. O transporte será feito do Sul, pelo caminho de ferro. A composição do comboio será apenas formada pela máquina e pelo vagão com o carregamento. É o meio de transporte mais rápido e o que oferece melhor segurança aos fardos com medicamentos. 

— Nesse caso, não temos que andar muito para alcançarmos a estação do Caminho de Ferro que só pode ser a de Westville, a uma meia hora de caminho... 

- É essa mesmo. É daí que segue a carga para Oregon, e também já sei que o comboio parte amanhã de manhã ao seu destino. 

— E vai guardado? 

— Hum... não sei bem... Mas sei que o maquinista é o velho Saunders, Bill Saunders... 

— Onde atacaremos? 

— Na planície, onde não possamos deixar vestígios nem ser descobertos! É preciso que ninguém escape para não dar depois com a língua nos dentes... 

Neste instante ouviu-se uma exclamação abafada. quase impercetível, nas moitas próximas que circundavam o local. Os seis homens ergueram-se ao mesmo tempo, entreolhando-se em sobressalto. 

— Ouviram? 

— Seria o vento? 

— Ou algum animal? 

-- Escutem... 

A curta distância, as folhas secas caídas no solo estalavam à passagem de alguém que pretendia afastar-se apressadamente. Um dos componentes do grupo lançou-se para a frente com decisão, de mão apoiada na coronha do revólver. Os que aguardavam na expectativa viram-no regressar pouco depois arrastando um rapaz que não teria mais de quinze anos e que em vão se pretendia libertar das mãos de ferro que o seguravam. 

— Deixem-me em paz, por Deus!... — gritava o garoto. 

Os homens cercaram-no ameaçadoramente. e nas suas expressões ferozes vincava-se um misto de surpresa e de raiva. De súbito, um deles, o que trouxera as notícias aos companheiros, estendeu a mão para o rapaz, e com espanto bradou: 

— Mas este é o filho do velho Saunders. o maquinista! 

— Como sabes isso? 

— Nasci em Westville e não há ali alma que eu não conheça como os meus dedos. Além deste, o velho tem também uma linda garota... 

— Que fazias aqui, rapaz? — interpelou rudemente um dos homens. 

O pequeno encarou-o sem pestanejar: 

— Passei por acaso... não ouvi nada... 

O grupo soltou uma gargalhada. 

— Não ouviste? — continuou o bandido. —Acabas de lavrar a tua sentença, rapaz... É pena que a família Saunders fique apenas reduzida à pequena, porque tu hoje, e teu pai amanhã de manhã, vão baquear... 

O rapaz empalideceu, e os seus olhos, grandes e expressivos, tiveram um brilho de alarme. 

— Senhores, eu não fiz mal algum, e meu pai é um santo homem... 

O indivíduo que o interpelava teve um riso grotesco. 

— Sim, de facto és uma criança, e como tal vou dar-te mais algumas horas de vida. aqui muito quietinho amarrado a uma árvore sob a sombra amena da folhagem. Com o teu pai é que a história será outra... 

A um gesto seu o pequeno foi agarrado e manietado de pés e tronco à árvore mais próxima, sem que as suas lágrimas e brados fossem atendidos. Os homens instalaram ali mesmo o seu acampamento para passar a noite, que foi de permanente expectativa para o pequeno Saunders. Sentia dores violentas na cabeça e em todo o corpo, principalmente nos sítios em que as cordas se lhe cravavam na pele. Várias vezes se lembrou dos seus. O pai, que tinha serviço noturno na estação de Westville, não estaria em sobressalto pela sua ausência, por ignorá-la, mas Jane, a irmã, como não estaria inquieta por não vê-lo regressar? 

Quando a manhã chegou, desenhando melhor os contornos das árvores da floresta e dando um tom vivo aos pormenores, o pequeno Saunders, sem um minuto de sono. estava exausto. 

(Continua) 


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