terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

RB074.01 Diálogo entre o pistoleiro e a menina aprendiz de ferreiro

— Não saia! Vão matá-lo! Não saia!

Roy Williams voltou levemente a cabeça. Viu o rosto terrivelmente pálido da rapariga que se encontrava uns passos atrás de si. Viu o seu busto palpitante e reparou que a respiração dela era ofegante por causa do medo que sentia.

— És nova demais para dar conselhos., Ingrid — disse com suavidade,

Ela moveu a cabeça com desespero.

— Mas eu já não sou jovem, antes pelo contrário — disse então outra voz e, no entanto, acho que Ingrid tem razão.

Roy voltou a cabeça outra vez.

Quem falava era Tom, o ferreiro. Tom era um velho ferreiro. Que fazia o seu trabalho ajudado por uma órfã que tinha recolhido aos dois anos de idade. Agora, Ingrid era já uma mulherzinha; acabava de fazer dezassete anos. Mas vestia-se como um rapaz, sempre suja de carvão e não tinha nunca deixado crescer o cabelo para que não a incomodasse. Por outro lado, tinha aprendido umas quantas pragas com aquele que ela considerava como seu pai e que de vez em quando as empregava. Por tudo isso, Ingrid não parecia urna menina.

O velho Tom insistiu:

— Eles são três. Acabarão consigo, Roy.

— É possível.

— E diz isso com tanta calma?

— Contrataram-me para que os mate, não?

— Pelas barbas do Profeta! — gritou Ingrid — pagaram-lhe para que imponha a ordem e limpe a cidade, mas não para que se suicide!

— Mas este é um perigo normal — respondeu Roy. — Tenho que o enfrentar.

O velho Tom aproximou-se de Roy.

— Ouça, Roy, conheço-o há pouco tempo, mas acho-o simpático. Não gostaria de assistir ao seu enterro.

Roy não fez caso e aproximou-se mais da porta.

— Com mil diabos! — exclamou Ingrid. — Estará realmente louco?

Roy olhou-a com um sorriso divertido.

— Sabes que para rapariga praguejas como um ferreiro?

— Mas é que eu sou um ferreiro — disse orgulhosamente a rapariga.

— Sim, isso vê-se.

Ingrid observou as suas roupas miseráveis, manchadas de carvão, as unhas sujas, as mãos tisnadas, como se visse tudo aquilo pela primeira vez.

Urna sombra de pena passou na sua expressão.

Talvez só naquele momento visse aquilo em que nunca quisera reparar. Que não era uma mulher, mas apenas o ajudante do velho Tom, sempre suja de carvão e praguejando continuamente...

Mas não teve tempo de continuar a pensar no caso, porque nesse momento compreendeu que Roy tinha saído já.

— Roy!

O grito dela perdeu-se no vácuo.

Roy Williams tinha já saída da oficina, que era a última casa de Elko antes de chegar à planície. Tinha abandonado o precário refúgio daquelas paredes de adobe e de troncos. Agora encontrava-se só, com três pistoleiros, disposto a matar ou a morrer.

Ingrid soluçou:

— Pelas unhas de Belzebu. Vão matá-lo como a um cão!

O velho Tom aproximou-se dela e colocou-lhe carinhosamente as mãos nos ombros.

— Deixa, o assunto não te diz respeito, pequena. Ele dedica-se a isso... Sabe que na sua profissão tem de aceitar toda o género de riscos.

— Mas é que… que vão matá-Io! Vão matá-lo impunemente!

As mãos do velho Tom tremeram. Voltou-se para a rapariga arrapazada que tinha na sua frente e que conhecia há dezasseis anos, quando não era mais do que um bebé sem amparo.

— Mas... Ingrid…, o que é que se passa contigo?

A rapariga soluçou.

— O que tens? Com mil diabos! Desde que te conheci, com um ano, nunca mais te tinha visto chorar.

— É que tu... tu sempre me tinhas dito... que os homens não choram — murmurou ela.

O velho Tom fechou os olhos por um momento e começou a pensar se não teria estado a cometer um terrível engano naqueles dezasseis anos.


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