terça-feira, 6 de dezembro de 2016

PAS683. Assalto que degenera em violação e morte

Bruce passou a tarde inteira no sítio onde a linha terminava. Além do irlandês da mão esmagada, havia mais feridos. Os capatazes davam gritos e ordens para acelerar o trabalho e tinham-se produzido alguns acidentes.
Ao anoitecer, Bruce regressou acompanhado de Powers, o engenheiro, e dois capatazes. Quando entrou no seu vagão; já Lotte estava a fazer o jantar.
Bruce deixou a maleta negra sobre uma cadeira e dispunha-se a lavar-se quando a porta se abriu bruscamente e dois homens, com os rostos cobertos com lenços, entraram, empunhando um revólver cada um.
— Não faça disparates, doutor, e nada acontecerá — advertiu secamente um deles.
Lotte encontrava-se junto da mesa e ficou imóvel ao ver as armas. Bruce tão-pouco fez qualquer movimento. De repente, não compreendeu o que procuravam ali aqueles homens, mas depois lembrou-se da pasta de couro que Luther Brenton lhe tinha entregado e estremeceu.
Mais quatro homens, todos com os rostos tapados e empunhando pesados revólveres, foram entrando no vagão. O último fechou a porta e encostou-se a ela.
Três deles apressaram-se a fechar as janelas para que do exterior não pudessem observar o que se passava. Bruce foi empurrado até ao extremo do vagão pelo cano do revólver que se lhe apoiava no peito.
— Onde está o dinheiro dos salários? — perguntou o homem que o empunhava.
Bruce conhecia aquela voz, muito embora o indivíduo fizesse grandes esforços para a disfarçar. Tinha-a ouvido em qualquer parte, mas não podia recordar-se de onde havia sido.
— Não tenho dinheiro nenhum. Não sei nada dos salários. Passei o dia na linha e eu não sou o pagador — respondeu lançando um olhar para a sua esposa.
Também Lotte estava sob a ameaça de um revólver e a angústia refletia-se nos seus grandes olhos azuis. Estava pálida, mas conservava a serenidade.
— Não diga asneiras, doutor. Sabemos que Brenton o deixou aqui e não sairemos do vagão enquanto não o tivermos encontrado — disse outro dos assaltantes.
— É melhor que o diga a bem... ou terá de o dizer obrigado — acrescentou outro.
O médico fazia desesperados esforços para poder reconhecer aquelas vozes. Tinham de ser empregados das obras da via férreas porque nenhum dos homens e mulheres que se arrastavam pelos «saloons» podiam saber que Luther estivera ali por volta do meio-dia.
— Fale de uma vez, doutor disse o quinto assaltante.
Aquelas vozes... Cinco homens tinham falado e apenas a voz do que lhe apontava o revólver lhe fazia lembrar vagamente a de uma pessoa conhecida. O sexto assaltante não pronunciara ainda uma só palavra.
Continuava com as costas apoiadas na porta para impedir que alguém entrasse. Os seus olhos deram uma ordem a outro dos assaltantes para que não falassem mais e atuassem.
22
Três homens começaram a voltar frascos, a abrir gavetas e a forçar as portas dos pequenos armários. Bruce não se atrevia a fixar a vista no que continha a pasta do pagador porque receava que os ladrões adivinhassem o esconderijo pelo, brilho do seu olhar.
Lotte fitava fascinada o cano do revólver que apontava ao seu peito. Ergueu a cabeça e descobriu o frio olhar do ladrão fixo no seu pronunciado busto. Estremeceu ao perceber que nele brilhava uma chama de desejo. Instintivamente, retrocedeu um passo, tropeçou numa pequena mesa, sobre a qual ardia uma candeia de azeite, e deixou escapar um pequeno grito de dor quando queimou a mão ao roçar no vidro quente.
Um dos ladrões deu uma pancada no frasco da gaze e atirou-o ao chão, onde se fez em estilhaços. Descobriu a chave que Bruce guardara e apanhou-a. Com ela na mão, dirigiu-se para o médico e perguntou-lhe:
— De ande é esta chave?
Bruce compreendeu que era uma estupidez dizer que não sabia. Encolheu os ombros, decidido a não responder coisa nenhuma. Os ladrões não tinham reparado no armário dos medicamentos porque se encontrava na parte superior do vagão e parecia fazer parte do teto. Além disso, não podiam perder muito tempo porque se expunham a ser descobertos por alguém que necessitasse dos serviços do médico.
Este pensava que, se' conseguisse fazê-los perder tempo à procura do dinheiro, acabariam por se cansar e fugiriam para não serem apanhados. Havia muitos operários e empregados pelas proximidades e algum deles podia descobrir que se passava qualquer anormalidade no vagão.
O homem que estava à porta fez um novo gesto e outro dos ladrões agrediu o médico com duas violentíssimas bofetadas. A cabeça de Bruce embateu na madeira que formava a parede e, antes que se pudesse refazer dos golpes recebidos, mais duas bofetadas estalaram contra o seu rosto.
— Fala, maldito estúpido! -- ordenou o indivíduo que lhe batia.
O pobre tentou defender-se, mas um revólver enterrou-se-lhe brutalmente na boca do estômago e a dor forte que sentiu obrigou-o a contrair-se.
Um soco tremendo no queixo lançou-o novamente contra a parede e fê-lo cair de joelhos, enquanto o sangue lhe brotava dos lábios rebentados e gotejava sobre o pavimento.
Lotte soltou um grito de angústia e, esquecendo-se do revólver que estava apontado para ela, lançou-se para a frente, a fim de ajudar o marido.
O homem que a vigiava tentou detê-la e estendeu a sua mão suja. Os fortes dedos cravaram-se-lhe sobre o ombro e a fina blusa que vestia rasgou-se, deixando a descoberto o corpo de Lotte.
Bruce, ao ver a sua mulher seminua, levantou-se e, dominado pela ira e pelo ódio, bateu com quanta força tinha no rosto do indivíduo que estava à frente dele; mas, antes que pudesse correr em defesa da mulher, uns potentes braços imobilizaram-no e um novo soco deixou-o à beira da inconsciência.
Lotte tentou cobrir a sua carne nua e, desesperadamente, lançou-se em direção à porta, no desejo de fugir e pedir socorro; mas o homem que permanecia encostado a ela impediu-lhe a saída.
Rodeou-a com os braços e uma das suas mãos subiu até ao ombro e cerrou-se com força sobre ele. Lotte foi quem primeiro pressentiu o que ia acontecer.
Viu o intenso olhar daquele homem e também viu toda a vileza que havia na sua alma. Cheia de aflição e desespero, olhou em redor, procurando a ajuda do marido, mas este encontrava-se imobilizado e nada podia fazer.
Nos olhos dos outros ladrões havia a mesmo expressão que no olhar do homem que ainda não tinha falado. As mulheres eram muito poucas nas obras do caminho-de-ferro; apenas se podiam encontrar as raparigas dos «saloons».
 A sua intuição feminina descobriu-lhe a identidade do homem que dava as ordens aos outros ladrões. A verdade chegou até ao seu cérebro como se fosse a folha cortante de uma faca «sioux»..
— Tu! — exclamou.
Antes que pudesse soltar um grito, a mão do homem fechou-lhe a boca e deitou-lhe a cabeça para trás até que a nuca lhe doeu. Sentiu corno uma mão ardente lhe rasgava a roupa e, felizmente para ela, o próprio horror do que ia sofrer fê-la perder os sentidos.
O marido contemplou toda a cena através de um véu avermelhado que se lhe havia estendido sobre os olhos. Um sabor adocicado enchia-lhe a boca e mal podia mover os lábios, mas, ao ver como a sua esposa era empurrada brutalmente, soltou um rugido de fera ferida e logrou desprender-se da tenaz que o mantinha imóvel.
Não deu um só passo. O homem que se encontrava atrás de si disse-lhe:
— É o melhor que posso fazer por ti.
E com o cano do revólver golpeou fortemente a cabeça do médico. Este tombou como se tivesse sido ferido por um raio. Ouvira as palavras pronunciadas pelo seu inimigo, mas a mais completa escuridão apoderara-se dele enquanto caía.

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